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LUIZ F GOMES, teoria do delito

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Leitura Obrigatória
PROFESSOR: LUIZ FLÁVIO GOMES
SUMÁRIO DAS AULAS:
Aula 1: síntese histórica das idéias penais e direito penal e constituição;
Aula 2: princípios constitucionais penais;
Aula 3: teorias do delito e teoria constitucionalista do delito;
Aula 4: tipo, tipicidade material e tipicidade conglobante;
Aula 5: resultado jurídico, imputação objetiva, imputação subjetiva e 
imputação pessoal.
AULA 3: TEORIAS DO DELITO E TEORIA 
CONSTITUCIONALISTA DO DELITO
1. Evolução do conceito de delito
Durante o século XX foram desenvolvidos muitos conceitos de delito. Os principais são: 
a) o causal-naturalista (ou causalista); 
b) o neokantista; 
c) o finalista; 
d) o funcionalista teleológico ou teleológico-racional (Roxin);
e) o funcionalista sistêmico (Jakobs). 
No Brasil, até 1970, predominou a teoria causalista do delito (Bento de Faria, Nélson Hungria, 
Basileu Garcia, Magalhães Noronha, Aníbal Bruno, Paulo José da Costa Júnior etc.). Dessa época 
até hoje, passou a preponderar a teoria finalista (Mestieri, Dotti, Toledo, Damásio, Mirabete, 
Fragoso, Tavares, Cirino dos Santos, Bitencourt, Prado, Capez, Greco, Queiroz, Nucci.
A integração sistemática entre Constituição, Política criminal e Direito penal deve nos conduzir 
a reestruturar a própria teoria do delito, que já não pode ser compreendida e ensinada desde 
a perspectiva puramente legalista (ou formalista). O Direito penal, sendo o instrumento mais 
poderoso de exercício do poder, não pode ser estruturado exclusivamente no texto legal, 
senão também com os limites e restrições impostos pela ou derivados da Constituição.
1.1. Teoria causalista ou causal-naturalista 
Essa primeira teoria do delito se deve a von Liszt e Beling e enfocava a conduta como simples 
movimento corpóreo de fazer ou não fazer. O crime, naquele tempo (final do século XIX e 
princípio do século XX), era dividido em duas partes: objetiva e subjetiva. 
•	 Parte objetiva: era constituída da tipicidade e da antijuridicidade. A 
tipicidade, como se sabe, foi desenvolvida por Beling, em 1906; 
•	 Parte subjetiva: era a culpabilidade, que consistia no vínculo do 
agente com seu fato que se dá pelo dolo ou pela culpa. Como se vê, 
nesse período, dolo e culpa faziam parte da culpabilidade.
1.2. Teoria neokantista 1
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Dentre as inúmeras diretrizes que tentaram superar o formalismo legalista do positivismo 
jurídico deve ser destacado o neokantismo por sua significação metodológica e particular 
incidência na Ciência penal. O finalismo, em seguida, foi não só reação ao formalismo 
positivista como ao próprio neokantismo. A Escola de Kiel (que foi sustentada pelo nazismo), 
não quis superar o positivismo, senão o próprio Direito penal, instrumentalizando-o para 
atingir suas finalidades autoritárias.
Essas três correntes penais foram marcadas pelo:
•	 método teleológico neokantista em que o Direito penal existe para a 
proteção de valores;
•	 ontologicismo, no qual o Direito penal deve ter como premissas 
básicas algumas estruturas lógicas que vinculam o legislador e 
•	 método intuitivo (irracionalismo da Escola nazista).
O formalismo a que se reduziu o positivismo jurídico (de Binding e de Rocco) é o seu ponto 
mais crítico. O positivismo jurídico − que considerava a “lei” como puro “factum” − reafirmou 
a substantividade jurídica da função penal, rendendo homenagem à segurança jurídica e 
levando a extremos de precisão a análise sistemática do delito. Mas padeceu de um excessivo 
formalismo, de sutilezas, de abstração, que separaram o Direito da realidade. Talvez isso tenha 
ocorrido pelo evidente mimetismo das técnicas do Direito privado, isto é, por ter se valido 
dessas técnicas sem sentido crítico. A maior preocupação dos positivistas era construir um 
sistema lógico, um verdadeiro palácio do Direito. Não procuravam (prioritariamente) alcançar 
a justiça em cada caso concreto, senão a construção de um sistema lógico.
O positivismo jurídico enfocou o delito de forma equivocada e insatisfatória. As três categorias 
fundamentais do delito até então admitidas (ação, antijuridicidade e culpabilidade), com 
efeito, eram descritas - segundo a perspectiva da teoria causalista da ação - de forma não 
consistente. 
A ação, no esquema positivista causalista (ou causal-naturalista), era concebida como 
movimento corporal que produzia uma determinada modificação no mundo exterior. Essa 
concepção naturalista da ação não podia explicar, por exemplo, a omissão, pois a essência 
desta não é naturalista, senão normativa. Omitir não significa “não fazer”, senão “não fazer o 
que o ordenamento jurídico espera” que seja feito; a omissão implica uma referência à “ação 
esperada”, uma valoração que emana da lei. No crime omissivo o sujeito responde não porque 
simplesmente omitiu, mas sim, porque não praticou a conduta esperada e determinada pelo 
ordenamento jurídico.
O mesmo acontecia com a antijuridicidade, que era isenta de todo significado valorativo 
(aliás, desvalorativo) no esquema positivista. A antijuridicidade expressaria só uma relação 
lógica de contradição entre o fato acontecido e a norma concreta considerada, mas sem 
carga de desvalor algum, neutra (concepção formal da antijuridicidade). Mesmo quando, 
posteriormente, admitiu-se a concepção material da antijuridicidade, com a inclusão do bem 
jurídico na teoria do delito, pouco mudou, porque o bem jurídico foi compreendido em 
termos naturalísticos1 e a antijuridicidade passa a ser o perigo ou lesão do bem jurídico, no 
sentido de causa de um perigo ou de uma lesão, isto é, no sentido naturalístico. Dessa forma, 
não poderiam ser compreendidos, por exemplo, os denominados requisitos subjetivos do 
injusto, pois se o decisivo era a lesão ao bem jurídico, esta era independente de tais requisitos; 
e, em conseqüência, teria que considerar antijurídica toda ação contrária ao bem jurídico, 
embora não concorresse o especial ânimo requerido pela lei.
Finalmente, o esquema positivista admitiu (no momento da configuração da culpabilidade) a 
supremacia psicológica. Com efeito, aparecia a culpabilidade como nexo psicológico (anímico) 
entre o autor e o fato antijurídico (teoria psicológica da culpabilidade); o dolo e a culpa eram 
suas espécies, isto é, a forma pela qual o agente se vinculava com seu fato. Imputabilidade e 
dolo e culpa eram os requisitos da culpabilidade. 
De acordo com essa concepção subjetivo-descritiva da culpabilidade o crime conta com duas 
partes: uma objetiva e outra subjetiva: à primeira pertencem a tipicidade e a antijuridicidade 
e à segunda a culpabilidade, que abarca tudo que se refere ao plano subjetivo e que permite 
descrever a relação psicológica entre o sujeito e sua ação antijurídica. Tal concepção, porém, 
não explicava a imputabilidade nem as causas de exclusão da culpabilidade que não afetam 
a relação psicológica mencionada; nem explica a culpa ou a culpa inconsciente, onde falta 
1 Interesse da vida que devia se constatar empiricamente (Liszt, 1884). 2
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necessariamente toda relação espiritual entre autor e fato.
Na visão neokantista, a ação deixa de ser entendida como mero movimento corporal em sentido 
naturalístico para se destacar seu significado social: prefere-se falar em comportamento 
humano ou de conduta e não mais só de ação. Radbruch (1904, Ûber den Schuldbegriff )destacaria a impossibilidade de utilizar um superconceito (Oberbegriff ) de ação que abarcasse 
a ação e a omissão. A concepção meramente descritiva, neutra e objetiva da tipicidade, de 
outro lado, não se coaduna com a descoberta dos requisitos normativos e subjetivos do 
tipo. A crítica dos neokantistas ao conceito naturalístico de ação tem procedência. Tal como 
concebida, não explicava no Direito penal a omissão. 
A antijuridicidade deixa de ser concebida como expressão lógica de uma contradição entre 
a conduta e a lei, quer dizer, em seu sentido formal. Passa a ser admitida como danosidade 
social, com ajuda do conceito do bem jurídico. 
Com isso, as relações entre tipicidade e antijuridicidade são entendidas de outra maneira: 
aquela não é a descrição neutra de um processo externo, senão a concreção das características 
essenciais do injusto: os tipos penais são tipos do injusto. A antijuridicidade, junto com a 
culpabilidade, serão as duas características materiais do delito, enquanto a tipicidade − antes, 
de igual categoria que a antijuridicidade − conservará exclusivamente uma função formal de 
garantia. 
A concepção neoclássica, própria do método teleológico dos neokantianos, conduziu a 
uma configuração não só psicológica da culpabilidade, senão também normativa”. Em 
outras palavras, a culpabilidade é vista também como reprovação. Isso permitia explicar a 
culpabilidade nos casos onde falta o nexo psicológico entre o autor e o resultado, e vice-
versa: fundamentar a ausência de culpabilidade, apesar da existência de referido nexo 
psicológico. Assim, por exemplo, Quem falsifica uma assinatura ameaçado por uma arma 
na cabeça atua dolosamente em relação ao falso, mas não podia agir de modo diferente. 
Há vínculo psicológico entre o agente e a conduta (há dolo), mas não há exigibilidade de 
conduta diversa, ou seja, não há culpabilidade, não há reprovabilidade, em razão da coação 
moral irresistível.
Fundamentalmente, a transformação da culpabilidade de “psicológica” para “psicológico-
normativa” deve-se a Frank que, em 1907, descobriu o requisito da exigibilidade de 
conduta diversa. Esse mesmo requisito foi posteriormente aprofundado por Goldschimit e 
Freudental.
1.3. Teoria finalista
O neokantismo foi uma resposta à estreita interpretação da realidade penal levada a cabo 
pelo positivismo naturalista. O neokantismo reagiu contra o causalismo e o finalismo lançou 
suas críticas contra o neokantismo. A fenomenologia, para a qual o Direito penal deve partir 
de algumas premissas pré-estabelecidas (a ação é finalista, a culpabilidade é normativa etc.), 
constitui a essência do finalismo. E é, por sua vez, uma resposta ao unilateral ponto de vista 
teórico-cognoscitivo do neokantismo. 
A doutrina finalista aparece nos anos trinta do século XX, quando se achava em pleno auge 
o neokantismo. O pensamento finalista foi uma resposta à obra de Schwinge: Teleologische 
Begriffsbildung im Strafrecht, publicada em 1930, que é produto e culminação do pensamento 
neokantiano. 
A obra que iniciou a corrente finalista foi Kausalität und Handlung (Causalidade e Ação), de 
Hans Welzel, cujas idéias se concretizam posteriormente em outros artigos e monografias2. A 
incidência delas na sistemática penal viria a ocorrer em 1939, ano em que Welzel publica seus 
Studien zum System des Strafrechts (Estudos sobre o sistema do Direito penal).
A ação, para Welzel (1939), é, ao mesmo tempo, causal e final. Às ciências naturais interessa 
a ação como fenômeno do mundo natural, como fato causal. Mas ao Direito, que pertence 
à ordem do pensar, só interessa a dimensão ou aspecto final enquanto essência da ação, 
imanente à mesma. 
2 Über die Wertungen im Strafrecht: sobre as valorações no Direito penal (1932) e Naturalismus und 
Wertphilosophie im Strafrecht: sobre Naturalismo e Filosofia dos valores no Direito penal (1935) 3
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É interessante destacar − mais do que o conceito de ação ou de culpabilidade em Welzel − a 
repercussão metodológica que têm as estruturas lógico-objetivas welzelianas. Estamos nos 
referindo ao caráter vinculante delas, que operam (ou deveriam em sua concepção operar) 
como limite ao próprio legislador, e não simplesmente para integrar as lacunas (interpretação) 
do Direito positivo. No tempo de Welzel notava-se muito abuso do Direito penal, e ninguém 
falava em limites ao legislador. Todo o sistema finalista de Welzel foi construído sobre essa 
base: o Direito penal possui certas premissas que devem ser reconhecidas pelo legislador.
Em suma, segundo o finalismo, as estruturas lógico-objetivas (da ação e da culpabilidade), 
portanto, limitariam a vontade do legislador, que deixaria de ser absolutamente livre. 
O finalismo de Welzel, entretanto, apesar do seu evidente direcionamento para o objetivismo 
ontologicista, não conseguiu uma efetiva superação do positivismo legalista. Isso, talvez, 
fosse sua meta inicial, mas não foi alcançada. Nem Welzel nem seus seguidores conseguiram 
transformar o Direito penal formalista do século XX em instrumento que pudesse fazer justiça 
em cada caso concreto.
Apesar de o finalismo partir da existência de certos conceitos ou realidades pré-jurídicas, 
como a ação final e a capacidade de autodeterminação do ser humano conforme seus 
fins, não conseguiu a desejada aproximação com a realidade concreta, ficando ancorado 
nas referidas estruturas lógico-objetivas, sem transcendê-las. Se de um lado seu método 
dedutivo axiomático faz derivar as soluções jurídicas dos dados ontológicos mencionados, de 
outro, acentua a importância do pensamento abstrato-sistemático. Com razão os penalistas 
da Escola de Kiel (Segunda Guerra Mundial) afirmavam que “Welzel proporcionou à dedução 
lógico-dogmática uma força desconhecida desde os tempos de Binding”. 
Com base na doutrina finalista também foi possível construir um Direito penal positivista 
legalista, pouco preocupado com a solução justa do caso concreto. Aliás, de todo enfrentamento 
entre os neokantistas e positivistas ou mesmo entre finalistas e positivistas, dois aspectos 
ganham relevância: o isolamento do Direito penal diante da realidade e o desenvolvimento 
teórico do Direito penal, que foi muito superior aos outros ramos do Direito. 
A causa principal de uma relativa aceitação do finalismo pela jurisprudência e doutrina 
clássicas no Brasil foi, então, a seguinte: perceberam depois de um certo tempo que mesmo 
adotando o finalismo ainda era possível conviver com o positivismo legalista, com os ditames 
da lei.
Na teoria do delito, várias foram as repercussões do finalismo de Welzel: o dolo e a culpa, como 
dados integrantes da ação, passaram a fazer parte do tipo (leia-se: do fato típico). Deixaram 
de integrar a culpabilidade, que se transformou em puro juízo de censura, de reprovação. 
Eliminados os requisitos subjetivos da culpabilidade, nela somente restaram requisitos 
normativos: 
a) imputabilidade; 
b) potencial consciência da ilicitude e 
c) exigibilidade de conduta diversa.
Todos esses requisitos são normativos porque devem ser aferidos pelo juiz. Nem a 
imputabilidade nem a consciência da ilicitude, que se acham na cabeça do agente, devem 
ser enfocados desde essa perspectiva. Cabe ao juiz examinar em cada caso concreto se o 
agente tinha capacidade de entender ou de querer e, ademais, se tinha possibilidade de ter 
consciência da ilicitude, ainda que seja nos limites de sua capacidade de compreensão do 
injusto - numa “valoração paralela na esfera do profano” (Mezger, Tratado de derecho penal, 
trad. de 1955), isto é, valoração do injusto levada a cabo pelo leigo, de acordo com sua 
capacidade de compreensão.
O dolo e a culpa integram a tipicidade ou contariam comdupla posição, isto é, estariam na 
tipicidade e também na culpabilidade?
1.4. Atuais tendências do Direito penal no plano dogmático 
(orientações teleológicas e funcionalistas − Roxin e Jakobs)
O Direito positivo, o mundo dos valores (reconhecidos desde a perspectiva de quem conhece 
a realidade) e a esfera ontológica constituíram o centro de gravidade da evolução do sistema 4
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penal, até a década de sessenta. 
Os três momentos mais significativos da dogmática penal, conseqüentemente, até então, 
foram: o positivista naturalista (teoria causal da ação); o neokantiano (teoria dos valores) e 
o finalista (teoria finalista da ação); respectivamente. Em outras palavras, as três etapas mais 
significativas da teoria do delito até a década de sessenta foram: o causalismo, o neokantismo 
e o finalismo. 
Todos os penalistas do século XX (causalistas, neokantistas ou finalistas) que construíram 
suas doutrinas sobre bases eminentemente positivistas (mera interpretação da lei penal e 
sua sistematização) entendem (tal como Binding, que é o pai do positivismo jurídico) que a 
Ciência do Direito penal esgota-se na Dogmática penal. 
Fizeram, assim, só Dogmática. E foram acríticos, assépticos, neutros, não se preocuparam com 
a construção de uma ciência evolutiva. Afastaram-se da realidade e elaboraram um Direito 
penal extremamente formalista e conservador (proteção do status quo). Não estudaram 
Criminologia, não se aprofundaram na Política criminal. Não admitiram os postulados 
político-criminais dentro da teoria do delito. Aceitaram o método meramente subsuntivo em 
relação à tipicidade (fato típico é o descrito na lei). Glorificaram o legislador, poucas vezes 
foram críticos em relação à caótica legislação.
No panorama dogmático-penal seguinte (aos anos sessenta) ganharam protagonismo 
considerações axiológicas (valorativas ou normativas), de raízes neokantianas; uma busca de 
soluções ad hoc (o justo em cada caso concreto), cuja origem reside nas orientações críticas 
da dogmática dedutivo-abstrata dos anos anteriores.
A característica predominante da moderna dogmática jurídico-penal é a teleológico-
valorativa, com a conseguinte tendência à normativização das categorias do sistema penal 
(da tipicidade, antijuridicidade etc.). O delito, desse modo, já não conta só com uma dimensão 
natural ou ontológica (fática), mas também com uma dimensão axiológica (valorativa), 
retratada na exigência da imputação objetiva bem como do resultado jurídico relevante. 
Está se produzindo uma revisão geral do pensamento dogmático acrítico. A ciência penal, na 
atualidade, está aberta aos princípios político-criminais e preocupa-se com a solução justa de 
cada caso concreto.
Destacam-se na atualidade as propostas dogmáticas funcionalistas ou teleológicas. O 
ponto comum entre elas consiste na pretensão de construir sistemas abertos aptos para uma 
permanente orientação às exigências político-criminais assim como à própria evolução dos 
conhecimentos.
Considera-se como ponto de partida do moderno pensamento teleológico-valorativo o livro 
Kriminalpolitik und Strafrechtssystem� e, mais recentemente, a obra Grundfragen des modernen 
Strafrechtssystems�. 
No âmbito da atual tendência à normativização do sistema penal (e particularmente do delito: 
o delito e o Direito penal não podem abrir mão de um momento axiológico fundamental) e 
suas categorias, convém distinguir duas sub-orientações teleológico-funcionalistas: 
•	 a moderada: que é sustentada por Roxin (1997) e seus seguidores5. 
•	 a radical: representada pelo funcionalismo-sociológico ou sistêmico 
3 Política Criminal e Sistema do Direito Penal, de Roxin, obra programática cuja primeira edição alemã 
veio a público em 1970.
4 Fundamentos dos modernos sistemas penais, obra coletiva compilada por Schünemann e publicada em 
1984.
5 Saiba mais sobre a orientação sustentada por Claus Roxin nas seguintes obras: ROXIN; Claus. Política Criminal 
e Sistema Jurídico-Penal, trad. de Luís Greco, Rio de Janeiro: Renovar, 2000; ROXIN; Claus. A apreciação jurídico-penal 
da eutanásia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 8, fascículo 32, São Paulo, 2000; ROXIN; Claus. A culpabilidade 
como critério limitativo da pena. Revista de Direito Penal, nº 11/12, 1973, Rio de Janeiro: Borsoi, p.7 e ss.; ROXIN; Claus. A 
teoria da imputação objetiva. Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 10, fascículo 38, São Paulo, 2002; ROXIN; Claus. 
Culpa e responsabilidade. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano I, nº 4, Lisboa: Aequitas, 1991, p.503 e ss; ROXIN; 
Claus. Funcionalismo e imputação objetiva no Direito Penal, 3ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2002; ROXIN; Claus. Problemas 
atuais da política criminal. Revista Ibero-Americana de Ciências Penais, vol. 2, fascículo 4, Porto Alegre, 2001; ROXIN; 
Claus. Sobre a fundamentação político-criminal do sistema jurídico-penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 9, 
fascículo 35, São Paulo, 2001. �
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(teoria dos sistemas) de Jakobs6. 
A pretensão de Roxin consiste em superar as barreiras existentes entre o Direito penal e a 
Política criminal, fazendo do sistema penal um instrumento válido para a solução satisfatória 
(político-criminalmente) dos problemas reais levados para o sistema penal. Sua preocupação 
é, portanto, prática. 
Sugere Roxin a decidida orientação do sistema do Direito penal às valorações da Política 
criminal, isto é, todas as categorias do sistema penal (tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade 
e punibilidade) seriam redefinidas em função das exigências político-criminais. Um bom 
exemplo dessa interferência da Política criminal no Direito penal pode ser dado com o 
princípio da insignificância, que contava com pouco (ou nenhum) espaço dentro do Direito 
penal formalista e lógico-dedutivista. Na medida em que orientações político-criminais de 
cunho minimalista (Direito penal mínimo) ganham terreno no âmbito penal, já não podemos 
enfocar a tipicidade de maneira puramente formalista (ou naturalista ou finalista); só pode ser 
típico o fato ofensivo relevante. Em se tratando de uma ofensa insignificante, ínfima, embora 
o fato seja formalmente típico, materialmente não o é (porque o Direito penal só deve intervir 
quando necessário, posto que é a ultima ratio). Por considerações de ordem político-criminal 
o fato insignificante deixa de ser típico, isto é, está fora do Direito penal. 
Com a reorientação de todas as categorias e subcategorias do sistema penal procura Roxin 
evitar o lamentável contra-senso que propiciava o positivismo jurídico, com seus excessos 
abstrato-dedutivos, que muitas vezes apresentava uma interpretação dogmaticamente 
correta e impecável mas que, do ponto de vista político-criminal, não resolvia o problema 
concreto de forma adequada e satisfatória. 
Jakobs, por seu turno, pretendendo uma nova fundamentação da dogmática jurídico-penal 
e do sistema, correlaciona a missão do Direito penal (de prevenção geral) com a perspectiva 
sociológico-funcionalista. 
A teoria luhmaniana dos sistemas permitiria, no seu entender, a renormativização das velhas 
categorias da dogmática, inservíveis por sua vinculação às inexpressivas estruturas lógico-
objetivas e conceitos pré-jurídicos.
Jakobs, desde logo, diferentemente de Roxin, torna absoluto o critério funcional, rejeitando 
toda limitação que proceda do âmbito ontológico (teoria finalista de Welzel) ou mesmo do 
sentido ordinário da linguagem ou dos postulados político-criminais (Roxin). 
As orientações moderadas(Roxin, 1970), por seu turno, não conferem tanta magnitude ao 
sistema, nem às exigências derivadas dele, conservando certa operatividade aos limites 
externos ao Direito penal ancorados na esfera do ser (natureza das coisas) ou no âmbito da 
própria linguagem. Ademais, o funcionalismo moderado de Roxin orienta as categorias do 
sistema do Direito penal às finalidades da política criminal (intervenção mínima, exclusiva 
proteção de bens jurídicos, resultado jurídico relevante etc.) que são várias e diversas entre si 
e que se limitam reciprocamente. 
Em suma, enquanto para Jakobs, 1984, somente são decisivas as necessidades “sistêmicas”, 
orientadas ao princípio supremo da “função do Direito penal” (a prevenção-integração), 
Roxin dá acolhimento a valores e princípios garantistas no momento de configurar o sistema 
do Direito penal (direito positivado) e da dogmática jurídico-penal (que deve estudar, 
sistematizar e criticar o direito positivado). Enquanto na teoria teleológico-funcional (Roxin) 
o sistema penal deve ser orientado para as finalidades político-criminais, na construção 
sistêmica (Jakobs) o sistema penal deve ser orientado para as necessidades sistêmicas.
As teorias funcionalistas radicais (Jakobs e seus seguidores) têm como ponto comum a 
mudança do centro de atenção do sistema social, subordinando, a seu bom funcionamento 
− à produção de um eficaz consenso −, qualquer valoração ética, política, individual ou 
coletiva.
� Saiba mais sobre a orientação sustentada por Jakobs nas seguintes obras: JAKOBS, Günther. A Imputação 
Objetiva no Direito Penal, trad. de André Luís Callegari, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000; JAKOBS, Günther. 
Fundamentos do direito penal, trad. de André Luís Callegari, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003; JAKOBS, Günther. 
Sociedad, norma, persona. Trad. Manuel Cancio Meliá e Bernardo Feijoó, Bogotá, UEC, s/d; JAKOBS, Günther. Derecho 
penal-PG. Trad. Cuello Contreras e Serrano Gonzalez de Murillo, Madri, Marcial Pons, 1995. �
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Desde essa ótica sistêmica do funcionalismo radical, o indivíduo não é mais que um “subsistema 
físico-psíquico”, mero centro de imputação de responsabilidades e o próprio Direito um 
“instrumento de estabilização social, de orientação das ações e de institucionalização das 
expectativas”. Ao “subsistema penal” corresponde assegurar a “confiança institucional” dos 
cidadãos, entendida a referida função como forma de integração no sistema social.
A violação de uma norma (o delito) é considerada socialmente disfuncional, porém, não 
porque lese ou coloque em perigo determinados bens jurídicos, senão porque questiona a 
“confiança institucional” no sistema. O delito é, antes de tudo, para o funcionalismo radical, 
“expressão simbólica de uma falta de fidelidade ao Direito”: uma ameaça para a integridade e 
estabilidade sociais, particularmente nocivo quando a infração aparece de modo manifesto, 
visível. A teoria sistêmica, por isso, adota um enfoque “sintomatológico”, preocupando-se 
mais com a manifestação do fato disfuncional do que com as causas do conflito que possam 
gerar o delito. A pena, por isso mesmo, tem finalidade de reforçar o conteúdo da norma (isto 
é, o Direito penal).
Para a teoria sistêmica, sustentada pelo funcionalismo radical, o Direito penal não se limita 
a proteger bens jurídicos, senão funções, isto é, a confiança institucional no sistema assim 
como a segurança dos co-associados em seu bom funcionamento. 
Para comprovar, fundamentar e graduar a culpabilidade não interessa se o sujeito podia e/
ou devia comportar-se de outra forma: a exigência funcionalista de restabelecer a confiança 
no Direito mediante a contraposição simbólica de uma pena será o critério decisivo, 
exacerbando-se assim a concepção “normativista”, que prescinde de todo conteúdo 
psicológico-cognoscitivo no juízo de reprovação.
A pena não é examinada desde um enfoque valorativo (fins ideais da mesma), senão funcional, 
dinâmico, como qualquer outra instituição social (funções reais que a pena desempenha em 
função do bom funcionamento do sistema).
A pena, segundo a teoria sistêmica, cumpre uma função de prevenção integradora, que é 
distinta dos objetivos retributivos, de prevenção geral e especial, que lhe atribuía a dogmática 
tradicional. Se o delito lesa os sentimentos coletivos da comunidade, isto é, o considerado 
por “bom e correto”, a pena simboliza a necessária reação social: esclarece e atualiza 
exemplarmente a vigência efetiva dos valores violados pelo criminoso, impedindo que se 
diluam e percam eficácia; reforça a convicção coletiva em torno da transcendência desses 
valores; fomenta e canaliza os mecanismos de integração e de solidariedade social frente ao 
infrator e devolve ao cidadão honesto sua confiança no sistema.
A primeira crítica que se pode formular contra o funcionalismo sistêmico consiste na sua falta 
de cientificidade (alto déficit empírico).
A crítica básica centra-se na tendência à neutralidade valorativa, típica da análise sociológica 
(positivista ou sistêmica).
No que concerne à teoria do delito, as diferenças marcantes entre o funcionalismo moderado 
(Roxin) e o radical (Jakobs) são as seguintes:
•	 para Roxin o fato punível é composto de tipicidade, antijuridicidade e 
responsabilidade. Esta última (a responsabilidade) cuida de saber se 
o agente imputável é ou não merecedor da pena. Seu pressuposto 
é a culpabilidade bem como a necessidade preventiva da pena. A 
pena tem finalidade preventiva (geral e especial), não retributiva. 
A culpabilidade não funciona como fundamento da pena, mas sim, 
apenas como limite dela;
•	 para Jakobs todas as categorias do delito (tipicidade, antijuridicidade, 
etc.) devem ser interpretadas de acordo com o fim da pena, que é o 
preventivo geral positivo (leia-se: a pena existe para reafirmar o valor 
da norma violada; a pena é um reforço da vigência da norma; a pena 
reafirma a ordem jurídica e isso incrementa a atitude de confiança 
e fidelidade ao Direito; a pena exercita a fidelidade ao Direito). O 
Direito penal não existe para proteger bens jurídicos, mas sim, para 
reafirmar o conteúdo comunicativo da norma. O Direito penal existe 
para cumprir uma função de tutela das normas, independentemente 
do seu conteúdo. �
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Parece não haver dúvida que a doutrina brasileira já alcançou, com certa pacificidade, o 
terceiro estágio, ou seja, a teoria finalista. Pelo menos essa é a posição majoritária. De qualquer 
modo, na atualidade, como você leu, a concepção de delito que encontra maior ressonância 
constitucional e maior afinidade com o tipo de Estado democraticamente consagrado que 
adotamos é a que considera o delito como uma ofensa intolerável ao bem jurídico, protegido 
pela norma penal e, ao mesmo tempo, objetivamente imputável ao risco proibido criado. Isso 
é o que estamos denominando de teoria constitucionalista do delito (ou do fato punível), 
cujas bases teóricas encontram forte ressonância na teoria funcionalista de Roxin, como você 
acabou de estudar. 
2. Bases constitucionais da teoria constitucionalista do delito 
Do ponto de vista analítico, preocupa-se a teoria do fato ou do injusto punível em apontar 
quais são os pressupostos da punição, ou seja, quais são as categorias do fato ou do injusto 
punível. Ela pode ser construída a partir:
•	 de realidades físico-naturalistas (assim ocorreu com o causalismo de 
von Liszt e Beling, por exemplo);
•	 de realidades ontológicas (finalismo de Welzel, por exemplo);
•	 das finalidades da pena (sistemateleológico-racional de Roxin ou 
funcionalista sistêmico de Jakobs, por exemplo) etc. 
Estamos assumindo que a teoria do fato punível deve ser elaborada a partir das finalidades 
do Direito penal, quais seja, a de proteção de bens jurídicos, de estabelecer um conjunto 
de garantias frente ao ius puniendi, de redução da violência (inclusive a estatal) e de evitar 
a vingança privada. Importa sublinhar que as finalidades do Direito penal (aquilo que se 
pretende com o sistema) não se confundem com suas funções (funções reais desempenhadas 
pelo sistema na prática), que podem ser:
•	 legítimas: de proteção de bens jurídicos ou 
•	 ilegítimas: função promocional e simbólica.
 
E se o Direito é um conjunto de normas (como efetivamente é), suas finalidades somente 
podem ser cumpridas por meio dessas normas de conduta e de sanção. 
Silva Sánchez (1992, p. 373), com precisão, afirma: 
Dentro da perspectiva teleológico-funcionalista, estimo que a elaboração categorial 
e sistemática da teoria do delito deve ter como ponto de referência os complexos fins 
legitimadores do Direito penal (...) a orientação funcional teleológica do sistema somente 
pode acontecer por meio da mediação da teoria das normas jurídico-penais (...) as normas 
constituem o instrumento essencial de que se serve o Direito penal para o cumprimento 
dos seus fins (...) as normas primárias expressam o objetivo de regulação do Direito penal 
mediante o estabelecimento de diretrizes de conduta (...) a doutrina da antijuridicidade penal 
(do injusto penal) está atrelada à missão das normas primárias, enquanto a doutrina das 
demais categorias do fato punível acha-se presidida pela missão das normas secundárias. 
Em conclusão: os fins do Direito penal condicionam imediatamente a estrutura e o conteúdo 
das normas jurídico-penais e, mediatamente, a configuração das categorias do delito e seu 
respectivo conteúdo.
Ampliando-se um pouco mais a conclusão que acaba de ser transcrita, cabe sublinhar: os 
princípios, normas e valores típicos do Estado Constitucional e Democrático de Direito condicionam 
os fins legitimadores do Direito penal, que por sua vez condicionam o conteúdo e a estrutura das 
normas penais, que por seu turno condicionam o conteúdo e a estrutura da teoria do fato ou 
injusto punível. 
É nesse sentido que se pode falar de uma teoria constitucionalista do fato ou do injusto 
punível, que tem a pretensão não só de apresentar um novo modelo de compreensão do 
delito, senão também de superar, definitivamente, o sistema puramente formalista do século 
XX. 
3. Finalidades do Direito penal e teoria do delito
Como acabamos de sinalizar, a teoria do delito pode ser construída a partir de realidades �
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físico-naturalistas (causalismo, por exemplo) ou ontológicas (finalismo, por exemplo), das 
finalidades da pena (sistema teleológico ou racional-final de Roxin, por exemplo), da missão 
sistêmica ou funcionalista do Direito Penal (Jakobs), etc.
A premissa da qual estamos partindo enlaça a teoria do delito com as finalidades do 
Direito penal de proteção de bens jurídicos, de estabelecer um conjunto de garantias 
frente ao ius puniendi, de reduzir a violência − inclusive a estatal − e de evitar a vingança 
privada (Sánchez, 1992).
Como você viu na Unidade 1, são muitos os princípios constitucionais (explícitos e implícitos) 
que interferem diretamente na existência e legitimidade do Direito penal (intervenção 
mínima, exclusiva proteção de bens jurídicos, ofensividade etc.). Tais princípios constituem 
limites intransponíveis e guias seguros para se definir o conteúdo do Direito penal. As normas 
penais, que são o veículo de expressão do Direito penal, não podem ter outro significado 
senão o de alcançar seus fins estabelecidos legitimamente (proteção de bens jurídicos, 
redução da violência, conjunto de garantias). 
A norma penal primária (que cuida do âmbito do proibido) determina (na teoria do fato 
punível) o conteúdo do fato contrário ao Direito (leia-se: do fato antijurídico ou injusto penal). 
A norma penal secundária que disciplina o âmbito da sanção correlaciona-se com a esfera da 
sancionabilidade da conduta proibida. 
É preciso, destarte, enfatizar as funções das normas penais para se revelar o estreito vínculo 
que existe de um lado entre norma penal primária e o injusto penal (este entendido como 
fato materialmente típico e antijurídico) e, de outro, entre a norma penal secundária e a 
sancionabilidade. 
Todo o âmbito do injusto penal está atrelado à violação da norma primária (ofensa ao bem 
jurídico protegido). Todo o âmbito da sancionalidade (ou punibilidade) está vinculado à 
violação da norma secundária (descumprimento da norma imperativa de conduta). 
A concepção teleológico-constitucional de delito, como se vê, é normativista, no sentido de 
que está intimamente atrelada às normas. Nisso se distingue diametralmente dos sistemas 
punitivos em curso, que não transcendem em geral o nível da legalidade. São, portanto, 
legalistas. O fato para ser típico no sistema legalista basta adequar-se à letra da lei. O fato 
para ser típico no sistema normativista (teleológico-constitucional) precisa adequar-se à lei 
e, mais que isso, necessita afetar o bem jurídico protegido pela norma primária. O sistema 
legalista é ontológico e em certo sentido naturalístico. O normativista é axiológico, porque 
depende da violação dos valores protegidos pela norma. Repassar as funções da norma penal 
pode ser sumamente relevante para se compreender o sistema normativista ou axiológico 
(teleológico-constitucional).
4. Funções da norma penal e teoria do delito
Norma jurídica é gênero que pertence à norma jurídico-penal. A norma é extraída dos textos 
legais. Não se pode nunca confundir a lei com a norma, muito menos a lei penal com a norma 
penal. Os textos legislativos são os veículos das normas. Lei penal incriminadora é o conjunto 
dos dados descritivos formais do delito. Normas são os comandos emanados dessa lei (ou 
dessas leis). 
A lei penal, de qualquer modo, não é neutra. Toda lei penal existe em razão de uma valoração 
legislativa. Segundo a concepção que adotamos não existe texto legislativo incriminador que 
não esteja em função da: 
a) revelação de algum valor indispensável para a convivência humana;
b) determinação de alguma conduta (de uma pauta de conduta).
As normas penais, por isso mesmo, são divididas (num primeiro momento) em duas 
categorias: 
•	 normas primárias (ou normas de conduta): indicam o que está 
proibido ou determinado. Revelam o valor protegido e qual é a pauta 
de conduta exigida para que se respeite esse valor. 
•	 normas secundárias (ou normas de sanção): orientam quais são as 
conseqüências jurídicas do seu descumprimento. �
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É comum na doutrina distinguir na lei penal o preceito primário (descrição típica da conduta) 
do preceito secundário (sanção). A divisão entre normas primárias (de conduta) e secundárias 
(de sanção) nada tem a ver com essa classificação, como você verá em seguida. 
Normas primárias ou de conduta (Verhaltensnormen): são todas as que definem, determinam 
ou delimitam o âmbito do proibido (e, em conseqüência, da liberdade) e dirigem-se a todas 
as pessoas.
As normas primárias, de outro lado, são normas de mandamento (determinam uma conduta) 
ou de proibição (proscrevem determinada conduta). 
Há portanto as:
•	 normas mandamentais - nos crimes omissivos. Por exemplo: 
omissão de socorro. O legislador manda que o sujeito pratique uma 
determinada conduta:que preste socorro.
•	 normas proibitivas - nos crimes comissivos ou cometidos por ação. 
Por exemplo: homicídio. O legislador proíbe a realização de uma 
determinada conduta – é proibido matar. 
Normas de sanção ou secundárias (Sanktionsnormen): são todas as que cuidam do castigo 
penal, ou seja, que delimitam ou demarcam o âmbito do punível. Essas normas têm como 
destinatárias as pessoas em geral (antes do cometimento do delito) e os violadores dela 
(depois do delito). Quem as aplica é o juiz. 
Na verdade, existem duas categorias de normas secundárias: as que impõem penas e as 
que impõem medida de segurança. As primeiras vinculam-se diretamente com as normas 
primárias; as segundas dependem da infração da norma primária e também da constatação 
da periculosidade do agente (Silva Sanchez, 1992). 
As normas primárias, por sua vez, não só existem para a revelação da importância de um 
determinado valor (aspecto valorativo da norma primária), como também para estabelecer 
uma determinada pauta de conduta (aspecto imperativo da norma primária).
De todo exposto infere-se que das leis penais (uma única ou um conjunto delas) extraímos 
duas normas penais: a primária (âmbito do proibido) e a secundária (âmbito da sanção). Da 
norma primária decorre: (a) a norma primária valorativa (que sinaliza a relevância de um 
determinado valor); (b) a norma primária imperativa (que impõe uma determinada pauta 
de conduta). Exemplificando: do enunciado legal contido no art. 121 do CP (matar alguém 
– Pena de seis a vinte anos de reclusão), devemos extrair a norma de conduta ou primária (é 
proibido matar) assim como a norma de sanção (pena de seis a 20 anos). Da norma primária 
devemos extrair os dois aspectos examinados: a norma primária valorativa (essa norma 
indica a relevância de um bem jurídico, no caso, a vida) e a norma primária imperativa (que 
nos impõe uma determinada pauta de conduta, no caso, a obrigação de não matar, dever de 
respeitar o valor vida).
A norma de sanção é dirigida imediatamente ao juiz, que está obrigado a impor a pena 
cominada quando verificado seu pressuposto (que é a realização da conduta proibida); 
mediatamente é dirigida a todos.
A norma de conduta é imediatamente dirigira a todos, que devem atentar não só para o 
valor que ela tem como importante como também para a pauta de conduta imposta. Por 
conseguinte, detrás da norma primária de conduta estão o bem jurídico que se pretende 
proteger assim como a pauta de conduta esperada. Quanto ao bem jurídico, para descobri-lo 
temos que perguntar: por que o legislador proíbe ou determina a conduta? Por exemplo: por 
que o legislador proíbe matar? Porque quer fazer com que todos compreendam a relevância 
do bem jurídico vida. Proibindo a morte, qual comportamento espera (e exige) o legislador 
de todos nós? O de respeitar o valor vida. É exigido de todos nós que nos comportemos de 
forma a não afetar esse bem jurídico (nem dolosa, nem culposamente).
A ordem lógica, portanto, é esta: a lei revela a norma de conduta (norma primária) e esta 
revela o valor que se reputa importante proteger bem como a pauta de conduta esperada. A 
lei (matar alguém, CP, art. 121) exprime a norma primária de conduta (é proibido matar) e esta 
revela o valor que se pretende tutelar (a vida) assim como o comportamento que devemos 
adotar (de respeito ao valor vida). A norma de conduta, em suma, revela não só a pauta 10
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de conduta que o ordenamento jurídico espera de todos nós (não podemos matar) como 
também a importância do valor que se pretende assegurar (vida). Afetado o bem jurídico 
incide a norma secundária (norma de sanção). 
Fundamental é perceber que o legislador, quando elabora as normas de conduta (que são 
normas proibitivas, nos crimes comissivos ou são mandamentais, nos crimes omissivos), enfoca 
a realidade numa perspectiva ex ante (antes do cometimento de qualquer infração); quando 
elabora as normas de sanção (punitivas) enfoca a mesma realidade desde a perspectiva ex 
post. 
Do exposto infere-se que as normas penais primárias são valorativas, pois existem para nos 
chamar a atenção para alguns valores relevantes, e também imperativas, porque impõem 
coativamente uma determinada pauta de conduta a todos. 
A construção de um Direito penal regido pelo paradigma da ofensividade, de cunho 
teleológico-constitucional (material e garantista) − que é o que estamos sustentando nesta 
Disciplina − parte da premissa básica de que a norma penal (primária) possui caráter acentuada 
e prioritariamente valorativo7, isto é, ela existe para a tutela de alguns bens ou interesses 
(de especial relevância) consubstanciados em relações sociais valoradas positivamente pelo 
legislador para constituir o objeto de uma especial e qualificada proteção, como é a penal8. 
O aspecto valorativo da norma primária, embora não seja o único, vem em primeiro lugar. 
Ocupa posição destacada. Aliás, sem afetação concreta do valor positivamente enfocado 
pelo legislador não que se pode falar em crime. 
Exclusivamente quando o bem existencial (consubstanciado numa relação social e valorado 
positiva e juridicamente) resulta significativamente afetado, perturbando a convivência em 
sociedade, é que a (drástica) sanção penal deve ter incidência.
Se a norma penal primária (para além de impor coativamente uma determinada pauta de 
conduta) existe sobretudo para sinalizar a relevância de um determinado bem jurídico, não 
basta (para a existência do fato punível) a mera intenção do autor (sua “vontade má”) ou que 
a conduta apenas se exteriorize (princípio da materialidade da ação ou do fato) ou tampouco 
que se realize formalmente a descrição da lei (subsunção formal do fato à descrição legal). A 
adequação típica formal da conduta é necessária, porém, não suficiente. Tipicidade legal não 
é a mesma coisa que tipicidade penal (material). Tipo penal não é a mesma coisa que lei penal. 
O tipo penal não pode ser entendido em sentido puramente positivista formalista, senão no 
sentido de um tipo de injusto (que é expressão de um fato valorado negativamente).
Somente quando a conduta dotada de periculosidade (criadora ou incrementadora de riscos 
proibidos relevantes) alcança o núcleo de garantia e proteção da norma, que expressa um 
bem ou interesse jurídico, é que se pode falar em um fato punível penalmente relevante. 
Mas admitir, desde logo, o caráter preponderantemente valorativo da norma penal primária 
não significa concluir que dela tenha que ser excluída a característica da imperatividade. Na 
norma penal primária, portanto, dúvida nenhuma pode existir, é uma norma de valoração 
bem como norma de determinação, de imposição de condutas, conforme Cobo de Rosal, 
García-Pablos de Molina e Rodriguez Mourullo. No caso do artigo 121 do Código Penal, por 
exemplo, do qual nos valemos uma vez mais, a norma penal primária que daí emana (que está 
detrás da letra da lei) não só retrata um juízo de valor positivo em relação ao bem existencial 
vida, como estabelece coativamente (mediante pena) uma determinada pauta de conduta, 
qual seja, dever de respeitar a vida alheia, dever de não matar. Da norma primária emana, 
como se vê, a exigibilidade de uma determinada conduta. A norma exige de todos que se 
comportem de uma determinada forma. 
Aqui reside a chamada exigibilidade da conduta, que decorre da imperatividade da norma. E 
se o sujeito se comporta de modo diferente (matando alguém, por exemplo), cabe verificar se 
7 Confira Cobo Del Rosal y Vives Antón, Derecho penal-PG, p. 248 y ss; Rodríguez Mourullo, p. 
324); Bajo Fernández (1977, p. 25). Sobre a recepção da concepção valorativa pelo Código Penal de 1944 
(texto refundido de 1973), confira García Arán(1995, p. 27). O princípio da ofensividade fundamenta-se na 
consideração do delito como um ato desvalorado, isto é, contrário à norma de valoração: assim Carbonnell 
Mateu ( p. 209). Com relação às concepções valorativa e imperativa da norma penal leia Huerta Tocildo, (p. 
17-20); Schünemann, ( p. 75-76); Bacigalupo (1986, p. 61); Silava Sánchez (1992, p. 334); Jescheck ( p. 318); 
Torres Herrera ( p. 35); De La Cuesta (1996, p. 149).
8 Sobre a polêmica acerca do caráter valorativo da norma penal conferir ainda Bacigalupo (198�, p. �5) e 
Octavio de Toledo y Ubieto ( p. 87). 11
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era possível (nas circunstâncias em que agiu ou não agiu) comportar-se de modo diverso. A 
exigibilidade de conduta diversa, que exprime o conteúdo da (reprovação da) culpabilidade, 
tem vinculação estreita com o aspecto imperativo da norma primária. Diferentemente, o 
aspecto valorativo dela tem íntima conexão com o injusto penal (com o fato proibido).
Correlacionando a teoria das normas com a teoria do delito e a culpabilidade temos que 
inferir o seguinte: 
(a) a norma primária valorativa está no centro do injusto penal (entendido 
como fato materialmente típico e antijurídico); 
(b) a norma primária imperativa fundamenta a culpabilidade (entendida 
como poder agir de modo diverso, conforme o Direito, conforme a pauta 
de conduta emanada da norma imperativa) e 
(c) a norma secundária expressa a categoria da punibilidade. 
O crime, entendido como fato punível, possui três requisitos: 
a) fato materialmente típico; 
b) antijuridicidade e 
c) punibilidade. 
Os dois primeiros relacionam-se com a norma primária valorativa; o último (punibilidade) com 
a norma secundária (ou de sanção). Já a culpabilidade está atrelada com o aspecto imperativo 
da norma (que exige uma determinada pauta de conduta). O agente se torna culpável na 
medida em que não atua conforme o Direito, conforme essa pauta de conduta (emanada da 
norma imperativa).
�. Sistemas de delito 
a) Sistemas bipartidos
Chamam-se bipartidos os sistemas que procuram definir o delito com apenas dois requisitos. 
Como veremos em seguida, inúmeras correntes (no Direito penal) sustentam que bastariam 
duas categorias para a revelação do que se entende por delito. 
1’) Teoria do tipo de injusto
O primeiro sistema bipartido de delito (na sua formulação clássica) “afirma a unidade 
conceitual entre a tipicidade e a antijuridicidade, como dados integrantes do tipo de injusto, 
que admitem operacionalização analítica separada, mas não constituem categorias diferentes 
do injusto penal. O tipo legal é a descrição da lesão de bens jurídicos e a antijuridicidade é um 
juízo de valoração do comportamento descrito no tipo legal, formando o conceito de tipo de 
injusto”.�
Encaixam-se nessa formulação tanto a concepção original sintética de delito da teoria 
causalista (ou causal-naturalista), que dividia o delito em duas partes (objetiva e subjetiva), 
como o conceito de tipo de injusto do neokantismo (Mezger), que passou a entender que a 
tipicidade era a ratio essendi da antijuridicidade (fundindo-se, com isso, os dois requisitos). O 
crime, portanto, seria o fato antijurídico + culpabilidade.
2’) Teoria dos elementos negativos do tipo
Enquadra-se ainda nessa estrutura bipartida a chamada teoria dos elementos negativos do 
tipo, que concebe as causas de exclusão da antijuridicidade (justificantes, tal como a legítima 
defesa, estado de necessidade etc.) como dados típicos negativos. No homicídio, v.g., 
deveríamos ler a figura típica da seguinte maneira: “matar alguém, salvo em legítima defesa, 
estado de necessidade etc.”. A presença de uma causa justificante significaria exclusão da 
tipicidade, não da antijuridicidade.
É criticável essa teoria porque, sobretudo, nega autonomia para as causas justificantes (cf. 
Gomes, L.F., Erro de tipo e erro de proibição. 5. ed., São Paulo: RT, 2001, p. 80 e ss.). 
3’) Corrente finalista brasileira dissidente
9 Cf. SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 3. 12
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No Brasil, como sabemos, posição peculiar é ocupada por uma parte da doutrina finalista 
(Damásio de Jesus, por exemplo)10 que não concebe a culpabilidade como integrante do 
conceito de delito, senão como pressuposto da pena. Crime, portanto, seria (só) “o fato típico 
e antijurídico”. Há autonomia da tipicidade frente à antijuridicidade, porém, exclui-se da 
teoria do delito a culpabilidade.
Essa é uma corrente aceitável, porque a culpabilidade efetivamente não faz parte do 
conceito de delito. De qualquer modo, esta última categoria não pode ser enfocada só como 
pressuposto da pena (todos os requisitos do fato punível, na verdade, são pressupostos da 
pena). A crítica que se pode fazer contra essa corrente consiste na pouca importância que 
concede para a punibilidade (ameaça de pena). Recorde-se: sem ameaça da pena o crime 
(fato típico e antijurídico) não conta com nenhuma efetividade penal. A punibilidade abstrata 
(fato formalmente ameaçado com pena) é absolutamente imprescindível para a efetividade 
do delito. Se o legislador descrever uma determinada forma de ofensa a um bem jurídico e 
não cominar nenhuma pena, isso se transforma em puta recomendação moral. A efetividade 
do delito requer a cominação de pena. Com isso então se conclui que quatro são as categorias 
penais mais relevantes: tipicidade, antijuridicidade, punibilidade e culpabilidade. 
4’) Corrente bipartida teleológica
É acolhida, por exemplo, por Silva Sánchez11, que assume que o delito conta com dois aspectos 
fundamentais: por um lado é infração da norma primária (antijuridicidade) e, por outro, é um 
fato que contém os pressupostos de aplicação da norma secundária (sancionabilidade).
b) Sistemas tripartidos
O sistema tripartido clássico (amplamente majoritário na doutrina penal atual) não só sustenta 
que são três as categorias que compõem o delito (tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade) 
como admite a plena autonomia de cada uma delas. Crime, portanto, seria o fato típico, 
antijurídico e culpável (exigindo-se três estágios autônomos de valoração).12
O traço diferenciador essencial (entre algumas correntes do sistema bipartido e o sistema 
tripartido) reside na relação que deve haver entre a tipicidade e antijuridicidade. Há quem 
não admite autonomia entre elas; outros pensam o contrário.
Há correntes que admitem uma unidade conceitual entre tais categorias (Jescheck/Weigend; 
Otto; Silva Sánchez; Cobo/Vives;13 nessa mesma linha, como vimos, está a teoria dos elementos 
negativos do tipo). Outras assinalam a independência entre elas. Seguem essa linha tripartida 
o modelo clássico (ou causal-naturalista) de injusto ou de fato punível (Von Liszt/Beling), o 
modelo neokantiano e o modelo finalista (Welzel). 
c) Sistema quadripartido
Na atualidade é bastante minoritária a corrente que acolhe esse sistema. Dois dos seus 
principais expoentes são Marinucci e Dolcini,14 que salientam que todo requisito do delito 
é pressuposto indispensável para a aplicabilidade da pena e que a sistemática que melhor 
reflete a fisionomia do delito seria a composta de quatro requisitos: fato humano típico, 
antijuridicidade (do fato típico), culpabilidade (do fato típico e antijurídico) e punibilidade 
abstrata (do fato típico, antijurídico e culpável).
d) Sistema quintupartido
10 Cf. JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte general. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 151. Na mesma linha: 
DELMANTO, DOTTI,MIRABETE, CAPEZ etc. 
11 Cf. SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. Aproximación al derecho penal contemporâneo, cit., p. 378.
12 É ainda ampla a gama de doutrinadores brasileiros que seguem esse modelo tripartido: BITENCOURT, 
PRADO, ROGÉRIO GRECO, TOLEDO etc.
13 Cf. sobre o assunto SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível, cit., p. 2 e p. 10 e ss. 
14 Cf. MARINUCCI, Giorgio; DOLCINI, Emilio. Corso de diritto penale, cit., p. 4�7 e ss. 13
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Há ainda a corrente que sustenta que o delito conta com cinco requisitos: conduta, tipicidade, 
antijuridicidade, culpabilidade e punibilidade. O ponto alto desse sistema reside na autonomia 
que se dá para a conduta (que teria também, frente aos demais requisitos do delito, sua 
independência).
A falta de qualquer um dos requisitos elencados impediria a aplicação da pena. Se se trata de 
aplicar a medida de segurança (a um louco inimputável, por exemplo), naturalmente deve-se 
prescindir da culpabilidade (mas entra em seu lugar a periculosidade). 
Considerando-se que cada um desses requisitos desempenharia um papel relevante dentro 
da teoria do fato punível, teriam que ser analisados (necessariamente) de forma separada e 
sucessiva. Cada um dos requisitos descritos, de outro lado, seria pressuposto do outro: estão, 
portanto, enunciados em uma ordem lógico-sistemática. Essa ordem seqüencial e lógica 
se expressa da seguinte maneira: o crime (entendido como injusto ou fato punível) exige 
conduta humana, tipicidade (da conduta humana), antijuridicidade (da conduta humana 
tipicamente ofensiva), culpabilidade (da conduta humana tipicamente ofensiva e antijurídica) 
e punibilidade (da conduta humana tipicamente ofensiva, antijurídica e culpável).
O fato punível é um fenômeno único, porém, no momento de estudá-lo a melhor metodologia 
consiste em individualizar um por um os seus componentes, seu valor e suas funções. Assim a 
teoria do injusto ou do fato punível pode concretamente ajudar a práxis judiciária e assegurar 
a certeza do Direito penal, especialmente quando o que se quer é fazer a subsunção de um 
fato real à lei penal incriminadora. 
De forma descritiva pode-se dizer que crime seria a conduta típica e antijurídica, atribuível a 
um sujeito culpável e submetida à ameaça de uma pena.
e) Nossa posição
Partindo-se da premissa de que a teoria do delito emana da teoria das normas (concepção 
constitucionalista do delito), impõe-se considerar desde logo que as duas grandes categorias 
básicas (os dois níveis macrovalorativos) do delito são: 
(1ª) da contrariedade do fato ao Direito (aqui reside o injusto penal, que implica a violação da 
norma primária de valoração) e 
(2ª) da sancionabilidade penal (leia-se: da punibilidade abstrata ou ameaça de pena).
 
Dentro da primeira categoria (fato contrário ao direito) temos que distinguir dois subníveis 
(ou categorias), que devem (pela relevância e funções que desempenham) ser considerados 
autonomamente. São eles: tipicidade penal e antijuridicidade. 
Crime, portanto, é o fato formal e materialmente típico + contrário ao Direito (tipicidade + 
antijuridicidade). Mas não se pode esquecer que esse conceito de crime, sem a ameaça da 
pena, não conta com efetividade penal. Para além das duas categorias anteriores ainda existe 
uma terceira: a punibilidade (que consiste na ameaça de pena). Todas possuem sua relevância 
dentro do Direito penal.
Os denominados “crimes” de responsabilidade da lei do impeachment (Lei 1.079/50) 
constituem exemplo marcante de “crime sem pena”. Logo, não contam com efetividade 
penal. 
A culpabilidade, por seu turno, que é apontada por grande parte da doutrina como 
requisito do crime, na verdade, não o é. Culpabilidade é um dos fundamentos (e também 
pressuposto) indeclináveis da pena. Está, portanto, fora do conceito de injusto penal (leia-se: 
do delito entendido como injusto penal) ou mesmo do conceito de fato punível. Em suma, a 
culpabilidade não pertence ao conceito de crime (em nenhum dos seus sentidos). Como juízo 
de reprovação, retrata o requisito da imputação pessoal (há, portanto, em Direito penal, a 
imputação objetiva, a dimensão subjetiva e a imputação pessoal). 14
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Do mesmo modo, também está fora do conceito de injusto penal (e do fato punível) a 
periculosidade (que é a base e o fundamento da medida de segurança). A culpabilidade e 
a periculosidade, na verdade, desempenham outra função no Direito penal: são os elos de 
ligação (os fundamentos) entre o fato punível e, respectivamente, a pena e a medida de 
segurança.
Bibliografia
Bitencourt, Cezar Roberto e Muñoz Conde, F., Teoria geral do delito, São Paulo: Saraiva, 2000.
Roxin, Claus, Derecho penal-PG, t. 1, trad. de Luzón Pena et alii, Madrid: Civitas, 1997;
Mir Puig, Santiago, Derecho penal-PG, 5ª ed., Barcelona, 1998.
M. Cobo del Rosal e T.S. Vives Anton, Derecho penal-PG, 4ª. ed., Valencia: Tirant lo blanch, 
199�.
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