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ISSN 2176-1396 HISTÓRIA DA INFÂNCIA NO BRASIL Angelica Cristina Henick 1 - UNIOESTE Paula Maria Ferreira de Faria 2 - SÃO BRAZ Grupo de Trabalho – Educação da Infância Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O presente artigo elaborado para o Trabalho de Conclusão de Curso, nível de pós-graduação em Educação Infantil, na Faculdade São Braz, tem como objetivo apresentar um pouco da história da criança no Brasil, abordando sobre o processo de mudanças na concepção de infância, como ela era vista em meados do século XII, XIII e como é vista nos dias atuais. Percebem-se muitas mudanças, pois há muitos anos atrás a criança era vista como um “adulto em miniatura”, no qual a única diferença era o tamanho, sua estatura. Com o passar do tempo, a criança passou a ser vista como inocente e engraçadinha, e proporcionava aos seus pais e amas-de-leite divertimento e distração. No Brasil, é por volta do século XX que a criança começa a ter certo valor, sendo reconhecida na sociedade, e ter seus direitos minimante assegurados pelo Estado, onde são criadas leis trabalhistas e entre outras em prol da defesa da criança e adolescente. A trajetória da criança e adolescente no Brasil é marcada por diversas privações e dificuldades. Ao estudá-la evidenciam-se diversas consequências enfrentadas pelas crianças, como, maus tratos, abusos sexuais, mortalidade infantil, miséria, fome, crianças sem teto, sem família e escrava do trabalho. A concepção de infância de hoje é decorrente de constantes transformações socioculturais, na qual mudaram os valores, os significados, as representações e papéis das crianças e adolescentes dentro da sociedade. Para os estudos e compressões acerca do tema, utilizou-se de referenciais como Philipe Ariés (1978), Dourado (2009), Edson Passeti (s/a), Schultz e Barros (2011), Lima (2001), entre outros autores que discutem a temática. Palavras-chave: História da infância. Crianças e adolescentes. Brasil. 1 Mestranda em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Cascavel. Pedagoga recém-formada no Núcleo de Estudos e Defesa dos Direitos da Infância e Juventude – NEDDIJ. E-mail: angelica.henick@hotmail.com 2 Graduada em Psicologia pela Universidade Tuiuti. Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior pelo Centro Universitário UNINTER. Especialista em Concepção Sistêmica com enfoque na área escolar pelo Centro Universitário Positivo (2005). Especialista em Psicopedagogia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2004). Graduanda em Pedagogia pelo Centro Universitário Claretiano (2014 - em curso). Professora orientadora Educacional na Faculdade São Braz, trabalhando com Ensino a Distância e correção de Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs). E-mail: paula.faria@saobraz.edu.br 25825 Introdução Na sociedade atual encontram-se crianças em diversas situações, como, estudando, brincando, viajando, e muitas outras sendo “paparicadas”. Mas e por volta do século XII, XIII, como ela era vista, quais eram suas necessidades, haviam diferenças entre as crianças das famílias dos brancos e dos negros? Quais as diferenças entre o adulto e a criança? Diante desses diversos questionamentos, propõe-se pesquisar e compreender a história da criança no Brasil, realizando apontamentos das dificuldades, misérias, abusos, falta de respeito, exploração que as crianças brasileiras sofreram até que foram vistas como seres com necessidades, com especificidades e que precisam de um atendimento diferenciado. Por volta do século XIX passando para o XX, é que a criança e seus comportamentos são cada vez mais objeto de estudo de pesquisadores da Psicologia, Sociologia, Antropologia, Educação e áreas afins, com o intuito de compreender as mudanças que ocorreram na concepção de infância (OLIVEIRA, 2002) Mas para entender e compreender essas mudanças e o espaço que a criança tem na sociedade de hoje é preciso realizar uma viagem no tempo, na história, buscando assim, a reconstrução do passado de diferentes crianças. Diante disso, propõe-se neste artigo abordar a história da infância através de uma busca bibliográfica sobre essa temática, buscando-se a compreensão de como foi se construindo a concepção e o sentimento pela criança com o passar dos anos. 1.A concepção de Infância O sentimento pela infância nem sempre existiu. Por muitos anos as famílias encaravam a mortalidade infantil como algo natural, uma fatalidade, neste período os pais não tinham sentimento pelo filho que nasceu e logo morreu, pois sabiam que logo seria substituído por outro filho. A preocupação com a educação pedagógica e a inserção das crianças na sociedade são ideias e inquietações do fim do século XIX e início do século XX. Percebe-se a falta de sentimento pela infância no século XII, diante da citação de Ariés, o qual afirma que “[...] à arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. É difícil crer que essa ausência se devesse a incompetência ou a falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo” (ARIÉS, 25826 1978, p. 50). Ou seja, a família não percebia as necessidades específicas das crianças, não as via como um ser com peculiaridades e que precisavam de atendimento diferenciado. Neste período, a única diferença entre o adulto e a criança era o tamanho, a estatura, pois assim que apresentavam certa independência física, já eram inseridas no trabalho, juntamente com os adultos. Os pais contavam com a ajuda de seus filhos para realizar plantações, a produção de alimentos nas próprias terras, pescas, caças, por isso, assim que seus filhos tinham condições de se manterem em pé, já contribuíam para o sustento da família. Com essas condições, não passavam pela fase de brincar, estudar e se divertir como ocorre com crianças da sociedade atual, ou seja, não experimentavam o período da infância e juventude. A educação escolar era apenas de técnicas, de aprender o como fazer, assim, a criança tinha sua formação em meio aos adultos, realizando as mesmas tarefas que eles, carregando as mesmas quantidades que eles, sem diferenciação alguma. Nesse tempo, não se sentia a necessidade de escola, da educação formal, do ensino pela ciência, como temos hoje nas instituições de ensino. A partir do Renascimento Italiano no século XV, ocorre uma diferença quanto à descoberta da infância, no qual a criança passa a ser vista como, [...] um ser inacabado, vista como um corpo que precisa de outros corpos para sobreviver, desde a satisfação de suas necessidades mais elementares, como alimentar-se. Os primeiros anos de vida são para ela, o tempo das aprendizagens do meio que a cerca. Brinca com outras crianças da sua mesma idade e até maiores do que ela; arrisca-se em busca de saberes que lhe poderão ser úteis para viver em comunidade (PASSETTI, s/a. p. 1-2). Nesse período do século XV é que os adultos, os pais, a comunidade em geral começa a perceber que a criança precisa do momento de diversão, de se relacionar com pessoas da sua idade. Por volta do século XVI e XVII ocorre outra mudança em relação às crianças - um traje especial passa a distinguir as crianças dos adultos. Philippe Ariés afirma que Essa especialização do traje das crianças, e, sobretudo dos meninos pequenos, numa sociedade em que as formas exteriores e o traje tinham uma importância muito grande, é uma prova da mudança ocorrida na atitude com relação às crianças (ARIÉS, 1978, p. 157). Com essa “nova” forma de distinção das crianças e dos adultos, evidencia-se uma mudança significativa quanto ao sentimento da infância,assim sendo, a criança passa a ser 25827 vista como gentil, carismática, afetuosa e cheia de graça, passando a ser fonte de distração para os adultos, tanto para os pais como para as amas. Nesse momento, ocorre um novo sentimento pela criança, no qual ela passa a ser “paparicada”, ou seja, tratada com carinho e atenção, ganhando afago das pessoas ao seu redor. Verifica-se esse novo sentimento pela infância, com a afirmação de Ariés (1978, p. 158) “(...) em que a criança, por sua ingenuidade, gentileza e graça se tornava uma fonte de distração e de relaxamento para os adultos, um sentimento que poderíamos chamar de “paparicação”. O autor Austero Fleury em “História Social da Criança e da Família” de Ariés define paparicação sendo Quando os adultos fazem-nas [as crianças] cair numa armadilha, quando elas dizem uma bobagem ao tirar uma conclusão acertada de um princípio impertinente que lhes foi ensinado, os adultos dão gargalhadas de triunfo por havê-las enganado, beijam- nas e acariciam-nas como se elas tivessem dito algo correto [era a paparicação] [...] (ARIÉS, 1978, p. 159). Em meados do século XVII essa “paparicação” não se limitava apenas às crianças nascidas de famílias com maior poder financeiro, viam-se crianças de famílias de classes baixas sendo paparicadas. Ariés (1978, p. 163) alega que “as crianças dos pobres eram especialmente mal-educadas, pois só fazem o que querem, sem que os pais se importem (mas não por negligência), chegando mesmo a ser idolatradas; o que as crianças querem os pais também querem”. Evidencia-se o quanto a criança se tornou alvo de distração, momento em que os pais ou amas de leite se divertem vendo as brincadeiras e travessuras das crianças. No entanto nem todas as pessoas viam as crianças desta forma, algumas as viam como desperdiço de tempo e insuportável o tempo gasto em prol delas, era o lado negativo do sentimento de infância. Por volta do século XVII, forma-se outro sentimento de infância, no qual se desenvolveu entre os moralistas e educadores da época, inspirando a educação até o século XX. As distrações, brincadeiras e diversões que as crianças traziam até então, foram deixadas de lado, assim: 25828 [...] o apego à infância e à sua particularidade não se exprimia mais através da distração e da brincadeira, mas através do interesse psicológico e da preocupação moral. A criança não era nem divertida nem agradável: “Todo homem sente dentro de si essa insipidez da infância que repugna à razão sadia; essa aspereza da juventude, que só se sacia com objetos sensíveis e não é mais do que o esboço grosseiro do homem racional” (ARIÉS, 1978, p. 162). Agora a visão era de que “Só o tempo poderia curar o homem da infância e da juventude, idades da imperfeição sob todos os aspectos”, assim falava “el discreto de Balthazar Gratien, um tratado sobre educação de 1646[...]” (ARIÉS, 1978, p. 162). Assim percebe-se que vem ocorrendo uma diferença quanto ao sentimento da infância, no entanto para compreender dessa forma, é preciso analisar de acordo com o contexto da época, com a forma com que o povo desse período via até então a criança, pois como afirma Ariés, essas opiniões: já foram interpretadas por alguns historiadores como uma ignorância da infância. No entanto, devemos ver nelas o inicio de um sentimento sério e autêntico da infância. Pois não convinha ao adulto se acomodar à leviandade da infância: este fora o erro antigo (1978, p. 162). Posteriori será abordado mais especificamente sobre a infância no Brasil, apontando elementos importantes para a compreensão acerca deste tema, analisando o contexto histórico, político e social no qual estavam inseridas, e enfrentando diversas dificuldades para a sobrevivência. 2.1 A infância no Brasil: sua história A trajetória da criança e adolescente no Brasil é marcada por diversas privações e dificuldades. Ao estudá-la evidenciam-se diversos problemas enfrentados por elas, tais como, maus tratos, abusos sexuais, mortalidade infantil, miséria, fome, crianças sem teto, sem família, escrava do trabalho, isso tudo sendo causado por negligência do Estado, da família e da sociedade em geral. No Brasil os primeiros modelos de crianças foram trazidos pelos Jesuítas, essas diferenciavam-se muito das crianças brasileiras; e muito pouco com as descobertas europeias sobre a infância. Neste contexto propagam-se duas representações infantis: uma mística repleta de fé, é o mito da criança-santa; a outra de uma criança que é o modelo de Jesus, muito difundida pelas freiras carmelitas. Inspirados por estas imagens, capazes de transcederem aos pecados terrenos, os jesuítas vêem nas crianças indígenas “o papel em blanco” que desejam escrever; antes que os adultos com seus maus costumes os contaminem. (PASSETI, s/a p. 3). 25829 Para os Jesuítas “A puberdade era entendida como o momento da passagem da inocência original da infância à idade perigosa do conhecimento do bem e do mal, em que a criança assumiria o comportamento do adulto” (NETO, 2000, p. 105). Assim, entendiam que a criança deveria receber “luz”, ser “modulada”, antes que atingisse a idade da puberdade, momento esse, que já seriam corrompidos pelos adultos que estão a sua volta. Diante dessa problemática, e para que pudesse “modular” as crianças e evitar que seguissem os costumes dos adultos, os Jesuítas criaram o projeto pedagógico de colonização jesuítica, no qual tinha como missão divulgar a fé cristã e catequisar os indígenas. Para os Jesuítas, “A infância é percebida como momento oportuno para a catequese porque é também momento de unção, iluminação e revelação [...] Momento visceral de renúncia, da cultura autóctone das crianças indígenas” (DEL PRIORI, 1995, apud PASSETI s/a, p. 4). Assim, as crianças que resistiam a esse projeto, que não queriam participar, os jesuítas dizia que estavam em “tentação demoníaca”, o mau já havia habitado neles. Os jesuítas viam a catequese como forma de “conservar a docilidade e a obediência da criança, mais uma forma de ação que acabava por negar a cultura indígena” (NETO, 2000, p. 106). Mas com essa prática pedagógica, aproveitavam também para explorar o trabalho dos indígenas e as riquezas naturais de suas terras (NETO, 2000). No entanto, mesmo com essa proposta pedagógica para as crianças, os jesuítas enfrentaram um grande problema, os quais não conseguiam enquadrar as crianças abandonadas, órfãs e migrantes em seu projeto pedagógico. Presenciavam por volta do século XVIII: [...] um estrondoso número de bebês abandonados que eram deixados pelas mães à noite, nas ruas sujas. Muitas vezes eram devorados por cães e outros animais que viviam nas proximidades ou vitimados pelas intempéries ou pela fome (NETO, 2000, p. 107). Para diminuir as situações de abandono e sofrimento na época da Colônia e prosseguindo durante o império, é instalada no Brasil, uma instituição de origem medieval, chamada a Roda dos Expostos. De acordo com Passeti: 25830 Esta roda era uma espécie de dispositivos onde eram colocados os bebês abandonados por quem desejasse faze-lo. Apresentava uma forma cilíndrica, dividida ao meio, sendo fixada no muro ou na janela da instituição. O bebê era colocado numa das partes desse mecanismo que tinha uma abertura externa. Depois, a roda era girada para o outro lado do muro ou da janela, possibilitando a entrada da criança para dentro da instituição. Prosseguindo o ritual, era puxada uma cordinha com uma sineta, pela pessoa que havia trazido a criança, a fim de avisar o vigilante ou a rodeira dessa chegada, e imediatamente a mesma se retirava do local (PASSETI, s/a, p. 9).Esta foi uma forma encontrada para que as pessoas levassem os bebês não desejados para a roda, sendo garantido o anonimato do expositor, e assim não as deixando jogadas nas ruas, lixeiros, portas de igrejas e casas de outras famílias. O fenômeno de abandonar crianças é muito antigo, na época da Colônia muitas crianças eram largadas por diversos fatores, tais como falta de recursos financeiros, filhos fora do casamento, escravas que tinham filhos com seus senhores e entre outros, e então depois que nasciam as mulheres precisavam dar um “fim” na criança, momento o qual aconteciam os casos de bebes jogados em becos, lixeiras, nas portas de outras famílias, igrejas. Quanto à instalação da roda dos expostos, Passeti salienta que: a primeira foi aberta na Santa Casa de Misericórdia em Salvador, no ano de 1726. Ainda no período colonial, uma segunda e última roda é estabelecida em Recife. Mesmo, após a independência do Brasil, essas rodas continuaram a funcionar. Em 1825, uma outra roda é instalada na Santa Casa de misericórdia de São Paulo (PASSETI, s/a, p. 10). No entanto, a Roda dos Expostos não perdurou por muito tempo, por volta do século XIX no Brasil essas instituições começaram a ser fechadas, pois passaram a serem consideradas contrárias aos interesses do Estado, as rodas começam a “receber críticas de médicos higienistas, que viam esta forma de assistencialismo como responsável pelas mortes prematuras de crianças” (PASSETI, s/a, p. 11). Com essas instituições fechadas, as crianças passaram a ser vistas como marginais, que estavam largadas a marginalidade e vadiagem nas ruas, diante desse cenário, era necessário alguma providência, sendo a educação como solução. Desta forma, “Caberia ao Estado implantar uma política de proteção e assistência à criança, a qual foi estabelecida por meio do Decreto 16.272, de novembro de 1923” (NETO, 2000, p. 110). Consequentemente, a criança deveria ter seus cuidados higiênicos, saúde e educação atendidas, buscando a reintegração da criança na sociedade. Mas é somente a partir dos anos de 1960, que começam fundas mudanças na concepção e formas de assistência às crianças abandonas, Neto afirma que 25831 No ano de 1964, o governo militar introduziu, mediante a Lei 4.513 de 1º de dezembro de 1964, a Política Nacional do Bem - Estar Social do Menor, cabendo a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) sua execução. Seus objetivos eram cuidar do menor carente, abandonado e delinquente, cujos desajustes sociais se atribuíam aos desafetos familiares (NETO, 2000, p. 111). Em vários Estados foram instaladas as FEBEM´s (Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor) que tinham como objetivo, substituir os antigos "Aprendizados de Menores", para adequar a assistência que antes era quase exclusiva da Igreja, como exemplo as rodas dos expostos e as casas de misericórdia. Os Juizados passaram a encaminhar as crianças órfãs ou abandonadas para essas fundações, e que lá ficavam esperando ser adotadas, enquanto recebiam um ótimo tratamento e uma boa orientação pelas saudosas "damas de caridade", bondosas senhoras que se dedicavam voluntariamente. Posteriormente, houve a Constituição Cidadã de 1988, com a qual foram inseridos os Direitos Internacionais da Criança. Em 1990 o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) vêm para garantir os direitos das crianças e adolescentes, como consta no art. 4º o qual determina que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, entre outros mais que asseguram a criança e adolescentes de ter seu desenvolvimento na sociedade em que vive (DIGIÀCOMO; DIGIÀCOMO, 2013, p. 5, 6). A partir da Constituição, em 1993 tem-se a promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), nº 8.742, que regulamenta e estabelece normas e critérios para a organização da assistência social em prol da infância, à adolescência e à velhice, o amparo às crianças e adolescentes carentes, a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência, entre outros que estão instituídos no documento. Com a implementação dessas e outras Leis, é que o Estado assume suas responsabilidades sobre a assistência de crianças e adolescentes, tornando-se sujeitos de Direitos. No entanto, mesmo com essas medidas e Leis a favor da criança, havia muitos casos de crianças abandonadas, o número de mortalidade também continuava a crescer, crianças largadas à própria sorte. Esse cenário se mantem há muitas décadas, onde se percebe que o Estado privilegia apenas as esferas privadas, as quais vão lhe render algo mais lucrativo do que as políticas sociais em prol das crianças. 25832 De acordo com Dourado (2009) os processos sociais e econômicos que sustentam e consolidam o capitalismo são fundamentais para as mudanças ocorridas em relação ao papel da criança na sociedade. Isso por que o valor econômico dos filhos das famílias ricas sofre alteração, pois as classes médias e altas entendiam que seus filhos deveriam dar continuidade aos seus projetos de acumulação econômica. Desta forma passaram a preocupar-se com a educação de seus descendentes. As famílias pobres que viviam no campo e passaram a viver na área urbana, sofreram na adaptação da mudança do campo para a cidade, pois se sentiam constrangidos por não conseguirem se sustentar na cidade, já que não tinham mais suas terrar para realizar as plantações e cultivos para se alimentar, que até então, contavam com a ajuda de suas crianças para cultivarem. As famílias ricas vendo suas crianças como importantes para darem segmento aos seus negócios percebem a necessidade de se construir um aparato pedagógico, para atender essas crianças que não poderiam mais ser educadas pelas famílias. Mesmo com a percepção da importância da educação para o desenvolvimento, a educação escolar no Brasil chegou tardiamente. De acordo com Del Priore (2013, p. 10) [...] tanto a escolarização quanto a emergência da vida privada chegaram com grande atraso. Comparado aos países ocidentais onde o capitalismo instalou-se no alvorecer da Idade Moderna, o Brasil, país pobre, apoiando incialmente no antigo sistema colonial e, posteriormente, numa tardia industrialização, não deixou muito espaço para que tais questões florescessem. Sem a presença de um sistema econômico que exigisse a adequação física e mental dos indivíduos a esta nova realidade, não foram implementados os instrumentos que permitiriam a adaptação a este novo cenário. Percebe-se que diante do cenário econômico, político, social e cultural em que o Brasil se encontrava não se sentia a necessidade de instrumentalizar e ensinar os sujeitos. No Brasil “o ensino público só foi instalado, e mesmo assim de forma precária, durante o governo do marquês de Pombal, na segunda metade do século XVIII” (DEL PRIORE, 2013, P. 10). Por muito tempo a educação dos filhos dos pobres foi o trabalho, momento no qual trabalhavam junto com seus pais, aprendendo a cultivar, plantar, colher e pescar. Neste tempo, os filhos dos pobres não tinham acesso ao saber como os filhos das elites, percebe-se essas diferenças na afirmação de Del Priore: 25833 no século XIX, a alternativa para os filhos dos pobres não seria a educação, mas a sua transformação em cidadãos úteis e produtivos na lavoura, enquanto os filhos de uma pequena elite eram ensinados por professores particulares (DEL PRIORE, 2013, p. 10). A educação da sociedade brasileirafoi um fator de extrema importância, o qual serviu para separar as classes em empregados e patrões, colocando a disposição a educação que era necessária a cada um para exercer seu papel. Aos empregados a educação do aprender a fazer e para os filhos de patrões a escola que ensina a comandar, a mandar, a aumentar os lucros de uma empresa. Diante dessa forma de educação imposta para os brasileiros percebe-se a discrepância que existe na sociedade, percebe-se a que as crianças estão fadadas, ao sofrimento que enfrentam diante das desigualdades impostas para cada classe. Assim, conclui-se que são diversos fatores, eventos, culturas, momentos históricos e políticos que influenciaram na forma de perceber a criança e juventude, suas necessidades, seus sofrimentos, angústias, cada qual tratando a infância da forma em que a compreendiam. Assim, é preciso estudar a história das crianças para se compreender a forma como hoje são tratadas, o espaço que adquiriram, as leis que as defendem, tudo sendo um processo histórico, alavancado de contradições durante todo o período. Considerações Finais Com os estudos realizados sobre a infância, percebe-se que esta sempre foi alvo de abandono, miséria, sem seus direitos garantidos, tendo que enfrentar diversos desafios para sua sobrevivência, vivendo da própria sorte. Por muitos anos a criança foi vista como os adultos, sem distinção alguma, tendo que ajudar no trabalho pesado, sendo abusada, exploradas por diversos senhores capitalistas. No Brasil a concepção de infância tomou novos rumos a partir do século XX, onde se percebeu as necessidades específicas e peculiares para a sobrevivência da infância e juventude. Dando início às discussões em prol dos direitos das crianças, nos quais sindicalistas e a sociedade civil buscam efetivar ações de assistência e proteção à infância, como leis trabalhistas, pediatras e higienistas que desenvolviam trabalhos voltados para a saúde e bem-estar das crianças. O sentimento que se tem hoje de criança e infância é uma mistura de espanto, pena, amor, carinho, compreensão, a depender das condições de vida de cada uma. Algumas têm acesso a diversos recursos, enquanto outras não têm um mínimo para a sobrevivência. 25834 No entanto, a percepção e o sentimento pela infância, seus direitos e necessidades peculiares ao momento em que a criança se encontra, não nasceram de uma hora para outra nem seguiu uma linearidade, mas sim foi um longo processo de transformação cultural, histórica e política, o qual, os seres mais inocentes é que pagam e sofrem as consequências e brutalidades da sociedade. Assim, conclui-se que a concepção de infância de hoje é decorrente de constantes transformações socioculturais, na qual mudaram os valores, os significados, as representações e papéis das crianças e adolescentes dentro da sociedade. Mesmo diante dessas mudanças de concepção e visão acerca das crianças e adolescentes, é preciso se repensar as condições que o Estado, as famílias, escolas e sociedade em geral proporcionam as crianças, pois elas serão os adultos de amanhã. REFERÊNCIAS ARIÉS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2. Ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978. DEL PRIORE, Mary. História das crianças no Brasil. 7ª ed., 1ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2013. DIGIÁCOMO, Murilo José.; DIGIÀCOMO, Ildeara de Amorim. Estatuto da Criança e Adolescente; anotado e interpretado. Curitiba, SEDS, 2013. DOURADO, Ana Cristina Dubeux. História da Infância e Direitos da Criança. Edição Especial Salto para o Futuro. Ano 19 – Nº 10 – Setembro/2009. LIMA, Letícia Conceição de AlmeiDa e. A educação da criança no Brasil – (RE) Contando Histórias. Revista Paradoxa- Projetivas múltiplas em educação UNIVERSO, vol. 8, nº 10/11, 2001. NETO, João Clemente de Souza. História da Criança e do Adolescente no Brasil. Revista unifeo, revista semestral do Centro Universitário FIEO – ano 2, nº 3 (2000). OLIVEIRA, Zilda Ramos de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. – São Paulo: Cortez, 2002. – (Coleção docência em formação). DEL PRIORI, Mary. História da criança no Brasil. In: PASSETI, Edson. As crianças brasileiras: um pouco de sua história. Texto mimeografado [S.I: s.n]. SCHULTZ, Elisa Stroberg. BARROS, Solange de Moraes. A concepção da infância ao longo da sua história no Brasil contemporâneo. Lumiar, revista de Ciências Jurídicas, Ponta Grossa, vol. 3(2): 137-147, 2011.
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