Buscar

[Artigo] Redução de Danos - A estratégica. A definição do campo conceitual - ELISÂNGELA MELO REGHELIN

Prévia do material em texto

Dados Internacionais de Cata logação n;i 1'uhlii .n,fio (( 'II') 
( C â m a r a Brasileira do l.ivro, SI' . Brasil) 
Reghclin. Mlisangcla Melo 
Redução ilc danos : p revenção nu es t ímulo ao uso indevido de diogas iniciáveis / 
l :.lisangcl.i Melo Rrghclin. São Paulo : lulilora Re.isia .1 ••. Tribunais. 2tK)2 
Bibliografia. 
ISBN 85-201 2297 2 
I Danos (Direito e iv i l ) 2. Drogas inlravenos: Abuso I I nulo 
1)2 1620 C D U <l V>S D25 71 615 (W<) 
índ ices para ca tá logo s istemático: I . Danos: R e d u ç ã o : Drogas injcl.ívcis :'l Iso indevido Direiío 
34:368.025.71:615.099 2. Drogas i n j e l á v e i s : Uso indev ido . R e d u ç ã o de danos Di r e i t o 
< I <6H 1)25.71:615 099 
ELISÂNGELA MELO REGHELIN 
REDUÇÃO 
DE DANOS 
Prevenção ou estimulo ao 
uso indevido de drogas injeídveis 
EDITORA 
REVISTA DOS TRIBUNAIS 
3 
A ESTRATÉGIA DE REDUÇÃO 
D E DANOS: A DEMNIÇÃO 
DO C A M P O C O N C E I T U A I . 
SI M \ U I ( ) ; I ( K modelos de ic luçã • le d a n o s e de i c d i i , ; . i o d a olci 
i.i ; 2 I l i s tói icodo nu»\e iedu, io d . ' d a n o s puii.uania miei 
nacional: v2 I Inglaterra: 3.2 2 Nolan la : v2 3 I lança. ; 2 I Suíça; 
3.2.5 Alemanha: 3.2.6 Canadá; 3.2.7 A u iiáha ^ í B i a - i l Aspráti 
ea • lii ,h ileiías: inlei nações hospitalares. nmiinidades terapêuticas, nai 
eólicos anónimos e i eduçãode danos • 11 >enças infecto-contagio 
sas iclaeionadas ao u s o de drogas iniciáveis: > l I Síndrome da 
Imunodeficiência Adquirida \ids;3 I 2 Ih palites II c ( : 3.1 > Ma-
Lu ia: v i l Tuberculose 3.5 A c l i i ;ici i los | lograinas de icduçao de 
danos timtcmaaindacontraditiwii) 5 1 PM I I m r - p c i . : i . 'ii.»i - p . i u 
a implementação ilc um programa de re luçã i de danos v7 Pu gra-
mas de ledução ile danos como elo entii 1 I ' I • e 11 li .itam-, 111«> eon\n 
eional VN Programas de troca ile seiine.is \) \o de danos 
e i i sistema penitenciário 3 10 Sulisli111i< ,!->d.ih. iorna mjetáv el pela 
pie si i ição médica de mel adon a oral ; I I l \ controlado de diogas 
1.1 2 1'iesci ição médica de hei nina e t u i i i as dii i>' i 5 I : \i mas 
de Id ineciment i»de seiiniías 3 I I N. r o , s a l a -
O modelo ou es t r a t ég ia pic\a de redu ;ão ile ilanos e uma tenla-
t i \ de m i n i m i z a ç ã o das c o n s e q u ê n c i a s advei as do consumo de drogas 
do ponto de- \a da s a ú d e c dos seus aspecti 1 -ociais e e c o n ó m i c o s sem. 
necessariamente, redu/ i r esse consumo. 1 \i á s . este foi o sentido ilado pela 
p rópr ia O r g a n i z a ç ã o Mund ia l da Saúde , em I ' ; . ao ut i l izai c >ia nomen-
clatura, citando ainda, como exemplo ile aliei nalivas, a ime. i de sciinras 
e s t é i e i s \ saiu lo ao cont io le tia d i s s e m i n a ç ã o da A i d s entre i i s i i á i i n s de 
diogas in je táveis ( U l ) l s ) . Pm 1 1 , 1 • 4, o p róp r io Piogiama . l a s N a ç õ e s 1 ' iu 
das para o Cont i nlc do Uso de I )rogas U N I ) ( P endos ou a mesma estia 
meia I elaio que não e pietende. com r - s o . .•' >. ! u - e d < «dM • lo. o d i di 
! s i li M I i ,1 • l i I INK, \<) I " K A M I i M ( ' M l I I I M 75 
m i n u i ç ã o do consumo. P o r é m ha que se considerai que a reiiiiçã • pode 
acontecer somente a longo prazo, e que, por enquanto, devemos . leger 
prioridades Os Programas para Trocas de Seringas (PTS) e os programas 
ile m a n u t e n ç ã o de usuái ios de drogas o p i á c e a s , como a metad< »na, consti-
lu I H as esti a tég ias ma o. 11 'iihecidas de r e d u ç ã o de danos. \ I mal da dé 
. ada de SI), tais ideias c o m e ç a r a m a sei implementadas em Am . lerdã. 
lemia se que essa r e d u ç ã o da c o n t a m i n a ç ã o pelo \s da \i11> los e t l ire-
! im m e proporcional ao aumento d o consumo de drogas. Isso não ocor-
ieu. pelo c o n t r á r i o , aumentou a demanda por tratamento em \s partes 
1 ' mundo 
I te conceito tomou se mais con ique i ro no l inal da d é c a d a de S0, 
pi . a\e em razão da d i s s e m i n a ç ã o do \s da Aids entre ti a i á r ios 
de diogas injetáveis e t a m b é m em função de que as es t ra tég ias ate e n t ã o 
i i t i l i 'adas para tratai a q u e . t ã o do u s o de drogas não estavam solucionan-
1 <, mas sim agravanilo. o- problemas 
\ I ; - 1 1 n p i i nc íp ios e ações que c o m p ó e n i a es t ra tég ia da icdu< ao de 
l.mos:' 
a i e uma "pol i t ica s i ' , aal que \a minorar os eleitos neg itivos lo uso 
ile drogas";' 
h i "e uma pol í t ica de p r e \ e n ç ã o dos potenciais danos relacionados 
ao uso de droga, em vez de tentar prevenir o p rópr io uso de 
d i ' iga 'Y 
i ) "baseada em pi in ipios de saúde publica, a r e d u ç ã o de danos ote-
icce um conjunto de es t ra tég ias [Magmáticas , ainda que pro\s 
de c o m p a i x ã o , que são desenhadas paia i c d u / i i as c o n s e q i i é n e i a s 
danosas do comportamento aditivo, tanto para os consumidores 
quanto paia as comunidades nas quais eles v ivem" 
WOl) \ K . \ l e \ ()p i ii . p. 5i). 
O H A R i : . P. N I A V C O M B i ; , R . M A I I I I l . W S . A . l i l NI N u I . ( ' . 
I ) IU ' ( Kl Is. I : . The nritution ot rinix-iehitcri hmm. I ondon New York: 
Kiuitledge. IW2. Preta io, p. \ n i w iu 
' .I-V. ( '() M141 . Is l ! i lediietionol ilnig lel.iledhaiui aeoneeplti.il h.imcwoik 
lot iheois. piactiee and ie-rao li ín: ( ) 11 A R I : . P , NliNVl '< >MBI:, R , 
M A l ' 1 l l l i w S. A . I H N I N G . l i ('., I >RI ( Kl R. I / //. • n;lu tn-n trina: 
it liih ./Intiiu I niidon New Yorl Routlcdge. I"*'2. p I . 
| ) I ' N ( A N . I ) I . N K I I O I S( IN. I C l II I < iRI ).P. II \ \ S A I I IOS \
R I lai nnediietion: an emeigenes new. paiadigm lor ilrug ediu .ition tourni.il 
/)•/,: I ,im ,;. '/, '/. \ o l 21. ii -1. p. 2SI. | 
MARI \ I . ( i \ I laim i dih liou come a- vou a i . - ii\, li, tua; <r\.\o\. 
21. n '-. p I ' " " ' 
7(> Kl I H < v ) ni |)\N<)S 
O'Mare lambem elaborou uma hierarquia de ohjetivos que orientam 
a proposta de r e d u ç ã o de danos, lais como, pr imeiramente, e\r o com-
part i lhamento de seringas; em seguida, substituir o uso injelavel pelo uso 
n ã o parenteral. reduzir globalmente o uso de drogas e. per t i n i . in terrom-
pei esse uso 
I .m todas essas de f in ições ou metas propostas paia a r e d u ç ã o de danos, 
temos um mesmo ponto de partida: o dano associado ao usa A q u e s t ã o n ã o 
é mais prevenir o uso de drogas, simplesmente, mas redu/ i r os danos asso 
ciados a esse uso A r e d u ç ã o de danos t a m b é m abi ange m u d a n ç a s de ordem 
legislativa e de ordem cul tural , que vão acontecei no atendimento medico 
paia tratamento, na esfera da e d u c a ç ã o , na mídia , enf im, estimulando-se a 
m u d a n ç a na p e r c e p ç ã o das pessoas quanto às diogas e seus usuá r io s , a l é m 
da p r ó p r i a p r e v e n ç ã o com r e l a ç ã o a certas doi nça s . espet ialmente entre 
U l Ms. Analisemos as principais d i f e renças entre a perspectiva redutora de 
danos e o modelo tradicional \e em algun p m es. atualmente 
3.1 Os modelos de r e d u ç ã o de danos e de r e d u ç ã o da oferta 
()s Listados Unidos, a Suéc i a c alguns paíse asiáli i os têm ido hostis 
á ideia da r e d u ç ã o de danos, preferindo investir, com exclusividade, na 
r e d u ç ã o tia oferta. Os defensores do modelo de r e d u ç ã o de danos contra-
p õ e m a essas p o s i ç õ e s mais h e r m é t i c a s o argumento de que não pintemos 
despender dinheiro p ú b l i c o com programas ine l i . i/es. diante de epidemias 
de impactos ca tas t ró f i cos para toda a sociedade O quadio explicat ivo tle 
Wodak s auxil ia na c o m p r e e n s ã o tias d i f e renças i ntre a es t ra tég ia da redu-
ção de danos e a da r e d u ç ã o da oferta: 
i A Hl I A I : ('t»ni'tii(iti\ i / : / / < • . 
Ri ,!ti\ã> ' tli ihtl\t>\ 
R 
!« / / • , 
. / . • ( ido Kit /:.. 
' "1 V'U,'li /'•'.' l / l 
Aceita a incv Habilidadetle um dado ní- Palie lio | essup >s|i i ile que é |* • «sive 
vel tle ci •nsumode dmgas na sociedade. cheg.ir a n na s, icietlade scmdiogas 
Objelivo: ledu/ii as conset|iiências ( Hijetivo Inumai (|uali|iiei COM .iinii> 
adversas desse consumo. 
Iáilati/a a obtenção de melas " s u b bui.iti /a . obtenção de metas "óli 
nu mas-' a curto e médio prazo. l i . por- mas" (ali tinéneia 1 a l o u c o pi azo 
tanto, mais tolerante. 
(> I I A R I - , P. Redução de danos: alguns piau. ipios e a ação prática. In: 
M l SQl'1'1 \ . l .BASTOS.I I (Oigs.)/)/o.i;<;v, \i,h , v;/,i/éi.w.n,/<•inlutãn 
i/<• São Paulo: llueilec, PW-l. p f>s 7S 
\Y< H U K \lc> ( V cil . p s -
V IS I lí V I f i .1 \1 I I NK , " V > I K H V M I i o i >-.( ! 111 • | 77 
i liicntação: v i ^ ã o n adiei. • • í i l de s.m 
de públii . i 
Percebe os usuários de drogas como 
membros da sociedade e almeja 
i intesM i los a ela. 
I nlali/a a mensuraçãtule re- ullatlos no 
âu liiio da saúde, tia vida em socieda-
de e ila economia, frequentemente, 
, 'iu metas definidas e determinados 
. h e l b o s 
I nlali/a a efetividade e a relação cus-
l bencticio das intervenções 
I iplen ••nia as suas mtei wnções com 
. envolvimenlo relevante da popula 
I ulali/a a importância da cooperação 
interselorial entre as instituições do 
âmbito jnrídico-policial e da saúde. 
A proposta e amplamcnle adolada na 
I iu opa. no Canadá, na A u tiália c lia 
Nova Zelândia, entre i n i l i o s 
I nlali/a a prevenção e o tratamento dos 
ii ' u.ii ios de drogas, la/eiulocom que as 
ato idades de repressão se diiijam hasi 
ainente ao tráfico de grande escala 
lulga que as aliviílades ediu ativas re-
l lentes ás diogas devem • a de n.iiu 
i e/a factual, ler credibilidade junto ao 
público a l v o . baseai se e m pesquisas 
i l i a ç a i objetivos icalistas 
Inclui ihogas lícitas, como o álcool e o 
i ibaco 
I >á preleiência a utilização de lermi 
nologia neutra, não-pejorativa e cieu 
Mica 
(Inentação: politica populista 
Percebe os usuários de d i o g a s como 
marginais perante a sociedade, apenas 
aceitáveis desde que livres das drogas. 
Lntali/a a mensuração tia quantidade 
de drogas consumidas 
Pnlali/a a obtenção tle unia situação tle 
ausência absoluta tle consumo de dro-
gas, independentemente do preço a ser 
pago. 
\ intervenções s ã o p l a n e i a . l a s por 
auloi idades govei namentais, possivel-
menie com contribuições da socieda-
de de uni modo geial. 
A predominância das ações jiuidico-
polítieas e absoluta, o envolvimento 
das instituições de saúde é restrito e 
aceito tle nunlo relutante. 
I ' apoiada fortemente pelos listados 
Unidos, Suécia. Japão. Cillgapura, 
Malásia e alguns outros países asiáticos. 
láiíati/a a eliminação da i licita de dro-
gas, com tolerância zero cm relação a 
lodos os usuários, inclusive àqueles 
que Ia/em uso moderado 
As alividades educativas iclerentes às 
diogas veiculam unia mensagem única 
de abstinência: diga não às drogas!" 
Reslritme-se as dioeas ilú itas. 
Dá preleiência a ulili/ação tle termi-
nologia veemente e vali i.itiva. 
I lacando um paralelo entre o sistema tradicional da "guerra as dro-
e o sistema de r e d u ç ã o de danos, observa-se que paia o primeiro, o 
7S K l I W</ V ) D l : D A N I is 
u s u á r i o é a l g u é m que apenas usa drogas para ohter prazer, é um ser 
autodestrutivo. an t i soc ia l e anormal. A so lução e o tratamento que leve à 
abs t i nênc i a . A p u n i ç ã o serve para proteger a sociedade desse mal e para 
"salvar" o u s u á r i o . Já o sistema da r e d u ç ã o de danos percebe o u suá r io como 
sujeito ativo, ciente de seu comportamento, ainda que (pieira continuar fa-
zendo uso da droga. A m u d a n ç a de comportamento serve para e\r pro-
blemas maiores à sua própr ia s aúde e a tle seus parceiros e f i lhos. ' A ênfase 
à terapia que prega a abs t inênc ia dará lugar à r e d u ç ã o de danos, pr ior i /ando 
a melhora nas c o n d i ç õ e s gerais (f ís icas e sociah ) paia o u suá r io . 1 " 
( ) n ú m e r o de usuá r io s de diogas injetáveis em todo o inundo e estima 
do em. aproximadamente, cinco mi lhões de pessoas, loinando-sc assim uma 
"ca tás t ro fe medica internacional de difícil cont iol " 1 1 A título de ilustra-
ção , podemos citai outros dados preocupantes divulgados pelo Informe 
Mund ia l sobre Diogas da O r g a n i z a ç ã o das N a ç õ e s Unidas ( O N U ) em 22 
de janeiro de 2001: atual mente, há aproximadamente 180 m i l h õ e s de usuá-
t ios tio drogas em todo o planeta, ou seja. 4 . 2 r í da p o p u l a ç ã o mundial com 
idade acima de 15 anos. S ã o 1 I I m i lhões de usuá r ios de maconha. 29 m i -
lhões de u suá r io s de e s t i im i l an t e s / an fc t amín i eos , 1-4 m i l h õ e s de usuá r io s 
tle coca ína e 13.5 m i l h õ e s de usuá r io s de o p i áceo s . A l é m disso, a co ca í n a 
e os seus derivados, como o crack, foram os re- pousáve i s por dois te rços 
das i n t e r n a ç õ e s por d e p e n d ê n c i a . I J 
( ) uso de drogas por meio de seringas contaminadas lecebe pouca ou 
nenhuma proposta para sua prof i laxia ou s e g u r a n ç a na maioria dos pa í ses 
e, particularmente, no B r a s i l . " As formas injetáveis de co ca í n a , he ro ína e 
similares t ê m seu uso favorecido pelo fato de apieseiitaiem um inic io mais 
r á p i d o tios eleitos desejados e uma a ç ã o mais forte do que na forma oral 
ou ina la tór ia , a l é m de serem mais e c o n ó m i c a s 1 : Infelizmente, os recortes 
I I E N M A N . A. R. cl alu. Injcction drug useis a .ticial.aetors: a stigmati/.cd 
comimmityN participaiion in lhe s\e exchaii e programnies ol New Yoi k 
City. Aids Core. United States ol 'America, vol. 10, n. 4, p. 397-408. I99S. 
I O R M L N I I , I agia. Ministério muda abordagem para dependência O Estado 
de S.Paulo. 20.02.2001. p. A'). 
SAN IOS. R oseana Maria Maia, 1.1MA. Darcv Roberto O- jovens e as dro-
gas. Pediatria Moderna. Rio de Janeiro, vol. 33. u 4. p l(V> 174. abr. 1997. 
WASSERMANN, Rogério. Cai consumo de C IK una e heroína, d i / ONU Pa-
lha de S Paul,'. São Paulo. 23.OI.20OJ, p A I I 
SANTOS. Roseana Maria Maia, L I M A , Darcv Robeito. Op. cit. 
' " ' Adolescentes usuários informam que injetam uma dose um terço nienoi do que 
a dose oral ou inalatória, obtendo assim um efeilo maior, mais rápido e mais 
barato. Sobre o assunto, vide Roseana Maria Maia Santos e I).ue\o 
I ima. op cit 
•\ S I K \11 ( , l V \i I N I Ç Ã O I X ) ( X M I ' ( ) Ct INCI 11 l ' . M 71) 
í 
populacionais dos estudos sobre o uso de droga ilícita de que dispomos no 
Brasil não permitem a ident i f icação de n ú m e r o s expressivos tle casos de 
uso tle drogas injetáveis. 1 "' Já numa perspectiva internacional, em muitos 
p a í s e s , dados como esses encontram-se disponibi l izados, o que auxi l iou 
no nascedouro do projeto de r e d u ç ã o de danos, o qual passamos a apre-
sentar 
.3.2 H i s t ó r i c o do m o v i m e n t o de r e d u ç ã o de danos: p a n o r a m a in t e rna -
c iona l 
I mhoia o marco inic ia l do iníc io do movimento de r e d u ç ã o tle danos 
li nhã sitio a j C o n f e r ê n c i a Internacional^realizada em Liverpool , 1990, 1 6 
a necessidade de obter-se um reconhecimento c ien t í f ico tias p rá t i cas e 
sabei es que c o m p õ e m a proposta teve or igem a partir tia I I I C o n f e r ê n c i a 
Internacional, em 1992. 1 7 O tema passou a atrair estudiosos da área da 
s aúde (c l ín icos , pesquisadores, planejadores de po l í t i cas p ú b l i c a s ) , pro-
llssionais tias á reas jur íd ica , soc io lóg ica , filosófica, cientistas po l í t i cos , 
dentre outros 
() movimento passou a chamar a a t e n ç ã o tle ó rgãos que t iveram (e, 
anula t ê m ) papei destacado no â m b i t o tio pro ib ic ionismo, como a 
O r g a n i z a ç ã o Mund ia l da S a ú d e e o International Counci l onA l c o h o l and 
Ãt ld ic t ion ( 1 C A A ) , uma o r g a n i z a ç ã o n ã o - g o v e r n a m e n t a l que atua em 
c o o p e r a ç ã o tli ieta com a C o m i s s ã o sobre Drogas N a r c ó t i c a s das NaçoCS 
Unidas." 1 
Países como Alemanha . " Lspanha, Itália e Aus ina e s t ão implemen-
tando algumas medidas redutoras de danos. A G r é c i a e a F r a n ç a recente-
mente in ic iaram esse processo. : o A Aus t rá l i a , em 1989. já estava preocu-
pada com a q u e s t ã o , tanto que instalou, naquele ano. um c o m i t é paia tratar 
I ! \ I < )S. I rancisco Inát io. Ruma e n < onstnição: Aids ed/ocoA iiijt laveis na 
i ena • tuitemporânea. Rio de Janeiro: Rclumc-Diimará/ABIA/IMS-UERJ, 
1995. p. 125. 
1 ROMBERG, l i . The ideologies behind Iiaim reduetion. Tlu International 
Journal o)DrugPolicy. vol. 6. n. 3,p. 189, 1995. 
RI:ALE, Diva O caminho da redução de danos associados ao uso de drogas: 
ilo estigma à solidariedade, p. 76. 
RI A l E. Diva Op cit. 
MICHELS, 1 I.'*Harm reduetion" and lhe politicai conceptof lhe "warondrugs" 
inGermany. Aids- Fortini DAH Rand XII—Aspectos ofAids and Aids. Berlim: 
Deutsche Aids-Hilfe. 1993. 
IUCHS.W. J.. DEGKW1TZ, P. Ilarm reduetion in Europe: Ticnd, Movementl 
or Paradigma. /:///: Addh t. Res.. n I . p. 81-85. 1995. . 
BO RF.DDÇÂO D E D A N O S 
dos problemas da Aids , do uso de drogas i l íc i tas e da p ros t i t u i ção , o "Seleel 
Commi t tee on 11legal Drugs and Pros t i tu t ion" . 2 1 
E m todos os p a í s e s europeus mencionados, a l é m de Luxemburgo e 
S u í ç a , j á existem dados da O N U mencionando nina r e d u ç ã o significativa" 
no n ú m e r o de mortes por abuso (overdose) de drogas, exatamente onde 
existem programas de r e d u ç ã o de danos.*2 Analisemos alguns tios pr inc i -
pais modelos internacionais. 
3.2. / Inglaterra 
As primeiras i n t e r v e n ç õ e s no plano tia s aú d e coletiva no sentido tle 
r e d u ç ã o de danos datam de 1926, na Inglaterra, quando, no R e l a t ó r i o 
Rol lcs ton , um grupo de m é d i c o s b r i t â n i c o s proeminentes recomendaram 
a p r e s c r i ç ã o de o p i á c e o s por profissionais da s a ú d e . O objetivo era possi-
b i l i t a r ao u s u á r i o de droga uma vida "mais es táve l e útil à sociedade", e 
n ã o a i n t e r r u p ç ã o completa do uso daquelas drogas, por reconhecer-se que 
tal p r á t i ca estava intrinsecamente associada às ca rac t e r í s t i ca s de vida dos 
u s u á r i o s . 2 1 
E m 1985, em Liverpool , foi realizada uma expe r i ênc i a pioneira em re-
d u ç ã o de danos, a qual passou a ser reconhecida cientificamente no mesmo 
ano. tendo f icado conhecida c o m o " m o d e l o tle r e d u ç ã o de danos de 
Mersey" . 2 4 E m 1985, foi aberta a pr imeira c l ín ica para tratamento de de-
p e n d ê n c i a tle drogas em Liverpool (Drug Dependency C l i n i c ) ; até e n t ã o os 
pacientes eram tratados em c l ín icas privadas, por psiquiatras que mantinham 
o antigo sistema de p r e s c r i ç ã o de o p i á c e o s injetáveis para uso d o m é s t i c o . 
Tal p rá t ica faci l i tou a d i s p o n i b i l i z a ç ã o de equipamentos injetáveis e s t é re i s . 
L ive rpoo l é a maior cidade da p r o v í n c i a de Merseyside c nela foi re-
a l izada a I C o n f e r ê n c i a In te rnac iona l tle R e d u ç ã o de Danos Esse 
pionei r i smo aconteceu em r a z ã o da p r e o c u p a ç ã o com o grande consumo 
B A M M E R . G . , DOUGLAS, B , MOORE, M . . ( I I A I T E I I D A heroin mal 
for lhe ausiralian capital territory? An overvievv of fcasihility rescarch In: 
HEATHER. N , W O D A K , A., N A D L L M A N N . h , O T I A R E , P. (lieis.) 
P.svchoative drugs and harm reduetion: from faith to science. 2. ed. London: 
WhurrPiiblishcrs, 1993. p 137-152. 
WASSERMANN, Rogério. Op. cit. 
Secretaria da Saúde c do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, Seção de Con-
trole das DSTs/Aiib Boletim Epidemiológico Aids, ano V I I I . n. I -4. j a n - tle/. 
1997. 
O H ARL, P. Compassam anti success in Liverpool lhe Merscv harm reduciion 
modcl today. In: TREBACH, A. S., ZEESE. K. B t Eds.) Drugprohihition and 
lhe consciente ofnations. Washinuton: The Dm» Policy Eoundation, 1990. 
Chap. 7. p. 141 I 16 
A ESTRATÉGIA A D E F I N I Ç Ã O D O C A M P O C O N C E I I D A I S I 
tle h e i o í n a nos anos 80, o que acabou contr ibuindo para que Liverpool 
tivesse a mais alta taxa de casos de d e p e n d ê n c i a na Inglaterra -n*7l8j>or_ 
m i l h ã o de habitantes", enmmhToã m é d i a nacional era de 288 por m i l h ã o de 
habitantes: destes dependentes, 507o eram U D I s . G r a ç a s ao trabalho i n i - * 
ciado em 1985. atualmente, nessa reg ião , existe a segunda menor taxa de 
in fecção pelo YÍrus da Aids entre UDIs na Inglaterra: 6 por m i l h ã o . E m 
1080. valendo-se tio Mersey Regional Drug Tra in ing and Informat ion 
Centre, in ic iou se u m j l t ^ p r i n i e j x o s programas de trocas de seringas i n -
gleses, que era manejado pelos usuá r io s de drogas. Inicialmente, disfr i-
b u í i a m se seringas por meio dos agentes c o m u n i t á r i o s aos usuá r io s tle dro-
gas, ou e n t ã o servindo-se de fa rmác ias . A l é m disso, os m é d i c o s passaram 
a prescrever he ro ína e coca ína . Foi um programa inéd i to na Inglaterra e, 
provavelmente, no mundo . 2 5 Os f a rmacêu t i co s , hoje, podem aviar receitas 
paia drogas que s ã o fumadas e preparam-nas como "baseados" (cigarros 
nos tpiais diogas como he ro ína e metadona s ã o injetadas). A l é m dos "ba-
seados", t a m b é m existe a droga em ampola , tle forma l í qu ida ou em 
aerossol. : ' Em 1990, em Mersey, a taxa de crimes relacionados com dro-
gas caiu. Digno de ser melhor estudado, tal e p i s ó d i o não é um lato isola-
do Estudos v ê m demonst rando que d i m i n u í r a m o e m p r é s t i m o e a 
r eu t i l i zação de seringas contaminadas, reduzindo-se, t a m b é m , a f requên-
cia do uso inje távcl , tendo aumentado a procura por tratamento e c l ín i cas 
tle saúde . U m outro dado relevante é que os PRDs n ã o aumentaram o nú-
mero de UDIs , nem a f requênc ia de comportamentos violentos em reg iões 
p r ó x i m a s aos s e r v i ç o s , nem mesmo aumentaram o n ú m e r o de seringas 
abandonadas pelas ruas. 2 7 
Pata o êxi to da medida escolhida foi neces sá r io estabelecei uma rela-
çãi i de conf iança com os usuá r ios do se rv iço , importando muito a localiza-
ção geográf ica do mesmo, s seu funcionamento em horá r ios f lexíveis e sem 
f o r m a ç ã o tle "f i las" , o respeito à confidencialidade e ao anonimato. Para 
MINO. A. Analy.sescienlijiquede la litérature sur la rímiseconirolétdltervíne 
ou de inorphine. rcdtgcc à la demande de I Office Federal de la Santc Publi-
ipie. (ienève: Instiluitions Univcrsitaircs de Psychiatre, 1990 
R1I EY, D. 7/it harm reduetion model: pragmaticapproaches to drug use from 
the arca between intolerance and neglect. Otlavva: Canadian Centre on 
Substancc Abuse, 1994. 
PERRIN), Rcbeeca. American Collcge of Preventive Medicine Public Policy 
on ncedle-exchange programs to reduce drug-associated morbidity and 
mortalily. American Jotanal ofPreventive Medicine. United States of America, 
vol . IS. n. 2. p. I73-I7S. 2000. 
Um aspecto muito importante para o estabelecimento de um PRD ou Needle 
Exchange Ptogram (NEP) é a questão geográfica. A pressão para retirar os NEPs 
K l D l I Ç Ã O 01 IVXNOS 
faci l i tar u m p r ime i ro contato dos u s u á r i o s que não t inham coragem de 
acessar este t ipo de s e r v i ç o , adotaram-se a r t i cu lações , como o engajamento 
de f a r m á c i a s que garantissem o fornecimento gratuito de seringas e agu-
lhas e s t é r e i s (financiadas pelo S e r v i ç o San i t á r io Regional),-' ' estabeleceu-
se que grupos volantes recolheriam as seringas descartadas pela cidade, 
implementou-se o programa de agentes c o m u n i t á r i o s , outreachworkers,Wl 
ou t a m b é m denominados redutores de danos, para facilitar a l oca l i zação 
dos u s u á r i o s de drogas de mais difícil acesso. 1 1 As p rópr i a s c l ín icas tle tra-
tamento para dependentes de drogas passaram a atuar com esquemas flexí-
veis de p r e s c r i ç ã o tle metadona, h e r o í n a e creu k,v- oferecendo esquemas 
t e r a p ê u t i c o s de curta ou de longa d u r a ç ã o . A l é m disso, um centro de infor-
m a ç ã o e aconselhamento foi implantado, contando com uma biblioteca 
p ú b l i c a , um departamento de p u b l i c a ç õ e s e um s e r v i ç o de "disque-drogas". 
das áieas residenciais é muito forte ("not in mas hackyard") Reali/ou-se uma 
pesquisa entre 1994 e 1996. em vários pontos de Nova Iorque, envolvendo 805 
UDIs. Em Nova Iorque, portar agulhas ou seringas sem prescrição médica é 
ilegal, execto se pertencer a um NEP. Dos entres istados. 85' < disseram conhe-
cer os serviços dos NÉPs c a íocálização daqueles que estão mais próximos 
deles. E isso reproduz aqui a importância da localização de um serviço desta 
natureza. A participação nos NEPs está associada ao baixo índice tle contami-
nação pelo vírus da Aids (1,5íí7ano) se comparado aos índices de UDIs não-
participantes (5,3 rI/ano), conforme pesquisa de Dcs Jailais Alem disso, a 
descriminalização do porte de seringas e maioi facilidade para que os UDIs 
pudessem obtc-las seriam muito importantes. Quanto â venda em larmáeias, o 
problema é que elas não teriam condições para retirar tle circulação as seringas 
já utilizadas e os NEPs conseguem lazer isso Sobre o assunto, R. Rockwell 
cl alii , Cieogiaphic proximity, policy and uti l i /at ion ol syiinge exchange 
programmes, Aids Care. United States of America. w>l. 11, n 4, p. 437-442. 
1909, D O Des Jarlais et alii , HIV incidonec among injecling drug users in 
New York City syringe exchange programmes The I tiiu et. United States ol 
America, vol 348, p.987-9«) | , 1996. 
Eni 1996, na maioria tios estados americanos hav ia unia lei exigindo que os 
farmacêuticos avaliassem se o "comprador potencial pretendia usar as serin-
gas para um legítimo propósito médico". Uma segunda lei, que se mantinha 
em vigorem apenas dez. estados americanos, exigia receita médica para a ven-
da de seringas. 
' ' 1 Pessoas extraídas tio mesmo meio. usuárias ou e \s tle diogas. ou ainda 
profissionais que trabalham nessa área c que atuam cm programas nas ruas c 
locais frequentados por usuários tle drogas. 
" " REALE, Diva. Op. cit . p. 68-69. 
M A R K S . J. Dosagem tle manutenção tle heroina e cocaína. In: RIBEIRO, M . 
M . , SEIBEL, S. Drogas: a hegemonia do cinismo. São Paulo: Fundação 
Memorial da América I atina. 1997. p 269-281 
\ STR \ l l - i u \| I N I t ; Ã O I H H ' A N t l ' O C " O M " i : i H ' \ 83 
M a s o sucesso do modelo de Mersey só atingiu seu ápice com u apojo da 
pol íc ia loca l , 5 1 pois, se as a ç õ e s repressivas fossem cumpridas rigorosa-
mente, o ca rá t e r dos s e rv i ços ficaria prejudicado. Ass im é que a po l í c ia 
c o m e ç o u a participar do Conselho Consult ivo de Drogas e passou a coope-
rar com as autoridades sani tá r ias T a m b é m decidiu encaminhar.os U D I s 
aos centros referidos e dar apoio publico aos postos de Ixocas de seringas2^ 
Ava l i ações da p rópr ia pol íc ia c o n c l u í r a m que tais medidas estavam contr i -
buindo para uma r e d u ç ã o significativa nos índ ices de envolvimento c r i m i -
nal associado ao uso de drogas, passando, por conseguinte, à d e s i l u s ã o com 
a poli t ica proib ic ionis ta ." 
Importantes ins t i tu ições apoiaram, formal ou informalmente, o mode-
lo de Mersey, entre elas a "Mersey Regional Health Author i ty" , o 'Home 
( ) l l ice ' s Drug B r a n d i " , o "Royai College o f Psychiatrisls" e a The Royai 
Pharinaceutical Society", a lém de p u b l i c a ç õ e s especializadas como The 
I aiit t t e Druglink 
Deve havei um redimensionamento do papel tia polícia, sob a perspectivada 
redução tle danos. Por exemplo, a polícia holandesa, parliculai mente no caso 
de Rolerdã, preconiza a existência de uma "cooperação balanceada entre a força 
pi dicial c as agências de saúde, de bem-estarsocial, c jurídicas", erjue o "prin-
cípio tle redução tle danos no contexto policial signifique que o tráfico seja 
reprimido enquanto o usuário de droga seja deixado sozinho, o quanto possí-
v cl" , além de entenderem que "somente se causarem distúrbio inaceitável para 
outros cidadãos, especialmente em áreas residenciais, deve a polícia entrarem 
ação". 'lambem em Merseyside, na Inglaterra, a policia vem colaborando na 
operacionalização tia política tle redução tle danos. "Ambas são policias pio-
neiras no rcilireeionamento e na implementação desta nova filosofia de ação 
policial que enfatiza a redução dc demanda ao invés de redução de oferta " E o 
que di /em D Chappêí l , T. Reilsma, D. O C o n n e l l , I I . Slrãiig, 11 . Lavv 
enloieemcnt as a harm reduetion stiategv in Rolterdam and Merseyside. em N. 
1 leather. A. Wodak. E. E. Nadelmann, P. OHare (Eds.), T.sycho.itive drugs c* 
harm r, duction: fnunfaith tosciem e. London: WhurrPublishcrs. 1993. p. 120-
123 O tratamento dado pelos redutores de danos na Holanda aos usuários, 
chamando-os tle "cidadãos holandeses que consomem drogas", diverge muito 
tio tratamento dado pela sociedade americana, referindo-se aos UDIs como 
"pessoas que abusam das drogas". Em geral, a polícia está consciente da im-
portância da redução de danos e não interfere, o que tem gerado uma redução 
da criminalidade no momento cm que há o engajamento dos usuários desse 
sei v iço. Vitle Alex Wodak, Op. cit., p. 64. 
O T I A R E , P. Redução de danos: alguns princípios e a ação prática. In: 
MESQUITA, E., BASTOS, E. I , (Orgs.). Drogas eAids: estratégias de redução 
de danos. São Paulo: Hucitec, 1994. p. 68. 
EAZEY, C. An empirícal study of lhe relationships betweenhcroine addiction, 
crime and medicai treatmenl. In: O H A R E , P, N E W C O M B E , R , 
8 1 R E D U Ç Ã O D E D A N O S 
3.2.2 Holanda ) 
A pol í t i ca holandesa de r e d u ç ã o de danos c o m e ç o u nos anos 70 e an-
tecedeu a e m e r g ê n c i a da Aids , o que comprova que o assunto sempre foi de 
interesse à s a ú d e e ao bem-estar social naquele país .* ' 
Tim 1976, a chamada Lei Holandesa dp Ó p i o (Opium Act) passou a 
diferenciar o tratamento a ser dado às drogas com risco inace i táve l à s aúde 
(denominando-as ''drogas pesadas"), como h e r o í n a , c o c a í n a , anfetaminas 
e L S D , e à q u e l a s que oferecem riscos menores (denominando-as "drogas 
leves"), como a maconha e o haxixe, o que j á evidenciava um objetivo de 
m i n i m i z a ç ã o de danos, e não de e r r a d i c a ç ã o da droga il íci ta. Trata-se do 
p r i n c í p i o da " n o r m a l i z a ç ã o " , ou seja, a r e d u ç ã o da demanda mediante a 
i n t e g r a ç ã o social dos u s u á r i o s de drogas." 
A partir da í surgiram as cafctcrias, sendo, atualmente, cerca de 1.500 
na 1 Iolanda, das cpiais 500 localizam-se em A m s t e n i ã . , s Tais cafeterias s ão 
toleradas, desde que n ã o vendam diogas consideradas "pesadas", não ven-
dam drogas a menores de 16 anos, n ã o tragam problemas para a \a 
e n ã o façam propaganda acerca das d r o g a s õ ú do seu uso. 
A Le i do Ó p i o , de 1976, com algumas a l t e r ações , permite a posse de 
a t é 5 gramas de maconha, o que n ã o tem gerado aumento no consumo de 
drogas. Segundo o M i n i s t é r i o da P r e v i d ê n c i a Social , S a ú d e e Assuntos 
Culturais da Holanda, em 1976, 3% dos jovens entre 15 e 16 anos e I0c/o 
c o m faixa e tá r ia entre 17 e 18 anos haviam, ocasionalmente, usado haxixe 
ou maconha. E m 1985, os n ú m e r o s eram de 2 e 69r, respectivamente. U m 
n ú m e r o cada vez menor de adolescentes, nos Pa í ses Baixos, fuma produ-
tos de maconha."' 
MATTHEWS, A., BUNINCi, l i . C.DRUCKLR, l i The redm lion ofdrug-
related harm. London-New York: Routledgc, I 992. p. 154-161. 
CHAPPELL, D., R l i l T S M A , T., 0 ' C O N N E I L, D.. STRANG. H Op. cit.. 
p. 118-126. 
Idem. 
, W | BAR A I T A , Alessandro. Introdução a uma sociologia da droga. In: MESQUITA. 
F., BASTOS, P. K. (Orgs ) Drogas c Aids: estratégias de redução de danos. 
São Paulo: Hucitec. 1994. p. 49-50. 
M A R L A T T . G. A. Redução de danos no mundo: uma breve história In: 
M A R L A T T , G. A. et alii. Redução de danos: estratégias práticas para lidar 
com comportamentos de alto risco. Porto Alegre: Aitcs Médicas Sul, 1999. p. 
29-44. 
EENNEMA, .1. S A et alii. A'o evident e that liaim redm tion appioat h leads 
lo increa.se injection hehavior in Arns tentam, I9S9-I996. I rabalho apresentado 
na VI I I International Confcrence on lhe Reduetn MI ol Related Harm. Paris. 1997 
A ESTRATÉGIA \O D O C A M P O C O N C E I 1 1 1 \ 85 
Engeisman, 4" um dos principais defensores do modelo, diz que o povo 
h o l a n d ê s é sensato e p r a g m á t i c o , preferindo uma abordagem f ê a l i s t ã e pfá-
tica do problema das drogas a uma abordagem moralista e excessivamente 
d r a m á t i c a . T a m b é m refere que o problema do abuso de drogas n ã o deve seF | 
visto primordialmente como de pol íc ia e de j u s t i ç a , mas, essencialmente, 
como uma q u e s t ã o de s a ú d e e de bem-estar social. 
Em 1980, foi criada a[Sunkibodenjuma liga de usuár ios de drogas que 
tem trabalhado na f o r m u l a ç ã o de^pohticas púb l j ca s de s a ú d e juntamente 
com o Estado h o l a n d ê s . O se rv i ço munic ipa l Holandês entrega, s e i n ã n a l -
inente. grandes quantidades de seringas e agulhas novas para os junkiboden 
d i s t r i bu í r em e coletarem as usadas.4 1 Tal trabalho culminou c o m a implan-
t ação do pr imei ro Programa de Troca de Seringas, em 1984, em Amster-
d ã . 4 : Esse tipo de a s s o c i a ç ã o es tá c o m e ç a n d o a se desenvolver em outros 
pa í ses , como na Aus t rá l i a e na Alemanha, e j á vem desempenhando u n v 
importante papel na f o r m u l a ç ã o de pol í t i cas de s a ú d e , alterando posi t iva- ' i 
mente os quadros e p i d e m i o l ó g i c o s nacionais." 0 Os redutores de danos"ou 
tmtreach workers*1 s ão um importante suporte para uma c o n s c i ê n c i a mais 
ampla e para a p rópr ia i n se rção social do u s u á r i o de droga na sociedade. 4 5 
VAN AMEIJDEN, E.J.C. Evaluation of Aids-prevention measures among 
drug users: the Am.stcrdum experiente. Tese apresentada â Universidade dc 
Amstcrdã. 1994. 
VAN DEN HOEK. J. A. R , VAN I IA ASTRECHT.T. H. J. A . COU UNHO, 
R A. Risk reduetion among intravenous drug users in Amsterdam under lhe 
inlluenee of Aids. American Journal ofPublu Health, 19, p. 1.355-1.357. _ 
ENGEISMAN, E. M . Duth policy on the management ofdrug related pioblems. 
llritish Journal o] Addiction, 84, p. 211-218, 1989. u 
' " ' M \RLATT, G A . Harm reduetion: come as you are. Addiclnt liclun ior, vol. 
21. n. 6. p. 784, 1996. 
\'erifica-se que, enquanto o modelo inglês estruturou se a partir de justificati- . 
v as quanto à questão da saúde pública, o modelo holandês firmou-se a partir de 
uma articulação social entre o governo e um grupo não-govcrnamental, tendo 
um cunho mais político que o de Mersey. 
B \STOS, Francisco Inácio. Op. cit. 
' O lato é que o usuário de droga ilícita é percebido como alguém incapaz de 
cuidar de si mesmo, dado o caráter compulsivo que caracteriza o uso da droga. 
Também não são considerados capazes de se engajar em ações solidárias para 
com os seus iguais, imaginando-se que eles apenas sejam capa/es de organi-
/ar-se em grupos para providenciai a obtenção da droga. São percebidos, ge-
ralmente, como desviantes ou criminosos, o que dificulta o reconhecimento de 
qualquer qualidade positiva neles Sobre o assunto, Diva Reale. op. cit . p. 52. 
, M I K 1 E D M A N , S R , NI A K i U S . A . DES JARLAIS, I ) C. et al Social 
inlervcnlion against Aids among injecting drug users British Journal of 
\ddiction.n. 87. p. 393-404. 1992 
86 RI D l (,'ÃO D E D-xNOS 
Entretanto, quando as o r g a n i z a ç õ e s s ão formadas exclusivamente poi ex-
u s u á r i o s , como, por exemplo, os N a r c ó t i c o s A n ó n i m o s , existentes em vá-
rios p a í s e s , ou o grupo Le Patriarche, na F r a n ç a , a t e n d ê n c i a é a r e p r o d u ç ã o 
dos discursos e das p o s i ç õ e s po l í t i c a s de combate às drogas. 4 , 1 
Dentre os principais efeitos dessa po l í t i ca tolerante, ressaltamos a es-
tabilidade do n ú m e r o de dependentes, o baixo n ú m e r o de novos dependen-
tes 4 7 e a baixa taxa de mortalidade entre u suá r io s de drogas. Ademais , as 
i n t e r v e n ç õ e s de r e d u ç ã o de danos n ã o desencorajaram os u s u á r i o s na pro-
cura por s e r v i ç o s e tratamentos que tenham como meta a a b s t i n ê n c i a , em-
bora tenham demorado a estabelecer medidas efetivas para controlar a dis-
s e m i n a ç ã o tia Aids . 4 " 
Seria poss íve l aplicar-se o modelo h o l a n d ê s em outros pa í ses . ' O ho-
landês Van de Wijngaart não acredita nessa possibilidade: 
" N ã o há absolutamente qualquer garantia de que as tentativas tle i m i -
tar a po l í t i ca de drogas holandesa em outros pa í ses teria êxi to . . . Os c lcmcn-
los cruciais do contexto h o l a n d ê s parecem ser: a forte c r e n ç a na igualdade 
de direitos, a c r e n ç a na possibilidade e na legit imidade da i n t e r v e n ç ã o so-
cia l , um sistema robusto de p r e v i d ê n c i a social e p r o v i s ã o de a s s i s t ênc i a 
m é d i c a . F m c o m p a r a ç ã o , alguns aspectos tia s i t uação noite americana que 
parecem ser importantes determinantes tia natureza do 'problema tias dro-
gas' em seu te r r i tó r io (a ex i s t ênc i a de fortes polaridades sociais, a talta de 
a s s i s t ênc i a social adequada e o simples tamanho geográ f i co do pa í s ) n ã o se 
apl icam ao contexto da Holanda" . 4 0 
Todavia, Duncan e Nicholson-" acreditam que é viável a a p l i c a ç ã o do 
modelo h o l a n d ê s a outras realidades: 
" " F R I E D M A N , S. R . JONCi. W., W O D A K , A. ('omnuinity development as 
a response to Aids among drug injectais. \id\l 7. n 1, p S263-S269, 
1993. 
' " ' Seis estudos acerca tios PTS financiados pelo governo noi te-americano con-
cluíram que o programa reduziu, tle fato, a disseminação tia Aids sem que au-
mentasse o consumo de drogas. Sãoelcs: National Commissionon Aids (1991), 
US General Aeeounting Office (1993), Luric et al. (I ' )93). Salchcr (1995), 
National Research Council/Institutcof Medicine.) 1995). Office of lechnology 
Assessment (1995). É o que menciona Alex Wodak, op. cit. 
" S l BUNING, E., BRUSSEL, G V. The effeets of harm letluction in Amsterdam. 
EurAddictsRes.n. I . p .92 . 1995. 
, : " VAN DE WIJNGAART, G. I • Compeling perspt . tivt v on drug use: r/i< tlutch 
experience. Amsterdam: Svvets & Zcitlinger, 1991. p I 29. 
Apud K A P L A N , C D . et alii. Is tlutch tlrug policv ancxample to the v.orld'.' In: 
LEUW, E. M A R S H A L L , I I I . (Eds.). líehveen prohibition and legalization: 
the dutchexpeiiment in drin: policv. New York: Kuglei. l«><).J.p. 311. 329-330. 
•\R A 1'ÉíilA A DEFINIÇÃO D O C A M P O C O N C E U l i \ 87 
" L m nossa op in i ão , a exper i ênc ia holandesa (evidentemente, com al-
gumas a d a p t a ç õ e s locais) é, sem dúvida , um exemplo claramente relevante 
para o mundo. O apoio à nossa v isão deriva-se de diversos movimenfos 
locais, nacionais e internacionais que se e s t ã o organizando sob a bandeira 
tias reformas púb l i ca s de saúde mental e p r e v e n ç ã o da criminalidade para 
responder ao fracasso percebido no sistema de controle internacional.. . Se 
a polit ica holandesa de drogas é de fato o resultado racional de uma pol í t i -
ca consciente da tomada de dec i sõese r e so luções de problemas, e n t ã o a 
pol í t ica holandesa de drogas poderia ser um exemplo para o mundo. Tal 
polílit a é um exemplo para o mundo na medida em que a sociedade holan-
desa e uma precursora da ' m u d a n ç a tle metas' na es t ra tégia tle r e so lução de 
problemas sociais". 
Por outro lado, a Holanda tem sido criticada pelos Fstados Unidos e 
por alguns pa í s e s europeus com po l í t i cas mais proibicionistas, como a' 
Suéc ia A re je ição ao modelo ho landês t a m b é m existe dentro do p r ó p r i o 
país, quando os c i d a d ã o s holandeses referem o i n c ó m o d o que sofrem com 
o aumento constante no n ú m e r o de "turistas das drogas", como eles costu-
mam denominar as pessoas de pa í ses vizinhos que vão à Holanda para 
comprar drogas para o seu p rópr io consumo. U m outro problema grave tem 
s i t i o o tranco internacional tle drogas adquiridas na Holanda para revenda 
em outros pa íses . Por essas razões , o Min i s t é r io de S a ú d e Públ ica holan-
dês , a Hm tle impedir grandes compras de produtos de maconha para pos-
síveis revendas fora dos Pa í ses Baixos, reduziu a quantidade m á x i m a que 
as caleterias podem vender: de 30 para 5 gramas. A l é m disso, apesar de os 
inthv íduos poderem cult ivar a té 10 pés de maconha para uso pessoal, a 
p r o d u ç ã o em grande escala é proib ida . s i 
. v 2 ; I rança 
A França sempre se recusou a adotar medidas t e rapêu t i cas pertencen-
tes ao "modelo norte-aniericano de tratamento" por entender que le remos 
direitos humanos, como, por exemplo, as propostas das comunidades tera-
pêu t icas e os tratamentos de subs t i tu ição com metadona." Nesse assunto, 
adota prá t icas sustentadas cm c o n c e p ç õ e s inspiradas na ps i caná l i se e ga-
rante o d i re i to ao a tendimento gra tui to , o d i re i to ao anonimato e o 
M A R E A I I . G. A. Redução tle danos no mundo: uma breve história. In: 
M A R I A I T . G. A. et alii. Redução tle danos: estratégias práticas para lidar 
t om comportamentos de alto risco. Porto Alegre: Artes Médicas Sul 1999 p 
29-44. 
•*!' VAI I EUR. M , DEBOURG, A., MATYSIAK, J. C. La drogue sanspoudre 
aux yeux. Paris: Hachette, 1986. Vide também: BUCHER, R. Drogas e 
thogadição no Brasil Artes Médicas: Porto Aleere, 1992. 
88 R E D U Ç Ã O D E D A N O S 
voluntariado, a fim de garantir ao u s u á r i o que ele não sofrerá qualquer tipo 
de r e p r e s s ã o . " O voluntariado significa referir que o u s u á r i o de drogas é 
q u e m escolhe se quer ou n ã o ser_tratado, sistema este que pretende 
"desmedicalizar" o atendimento a t o x i c ó m a n o s . 5 4 À demanda do paciente 
pela "cura" acaba sendo considerada como um momento crucial , quando 
sé entrecruzam f o r m u l a ç õ e s conscientes e inconscientes. Mas tal solicita-
ç ã o n ã o basta, pois o futuro paciente d e v e r á passar, ainda, por algumas 
consultas preliminares antes do ingresso para o tratamento." Esse cará te r 
seletivo é realizado para produzir um "ajustamento t e r a p ê u t i c o " , porque 
são privi legiados os pacientes que atinjam, via consultas m é d i c a s , a condi-
ç ã o p s í q u i c a mais favorável para percorrer a " t ra je tór ia da cura" " 
As p rá t i ca s consagradas na c l ín ica do tratamento da d e p e n d ê n c i a de 
drogas, sustentadas por estes saberes particulares, t êm sido chamadas de 
"modelo de cura f r a n c ê s " . ' 7 A i m p l e m e n t a ç ã o desse sistema francês de tra-
tamento, que aconteceu aproximadamente nos anos 70, aproximadamen-
te, levou à c r i a ç ã o de se rv i ços especializados no atendimento a dependen-
tes distintos dos se rv i ços de s a ú d e em geral, especialmente do sistema psi-
q u i á t r i c o . Isso é considerado uma conquista dos especialistas franceses, a 
qual conduziu a uma e s p e c i a l i z a ç ã o em toxicomanias, p o r é m não impediu 
a continuidade de serv iços ps iqu iá t r i cos " c l á s s i cos " , que tratam d e p e n d ê n c i a 
de drogas com ênfase na t e r apêu t i ca p s i c o f a r m a c o l ó g i c a / 8 
ASSOCIATION NATIONAL DES INTERVENANTS EN TOXICOMANIES. 
Le modele de soins français. Revuede l.Anit Interventions, juin 1988. Vide 
t ambém: ASSOCIATION N A T I O N A L DES INTERVENANTS L N 
TOXICOMANIES. Toxicomanic cl Sida: prisc eu charge Revue de I 'Anil 
Interventions. n. 19,mr. 1989. 
, v " G U É G A N . N. Institutions et Sida: le Centre Medicai Marmottan. Paris, 1997. 
190 p. Memoirc de DHEPS. Rcscau des flautes Pturit < des Pratiques Sociales. 
Univcrsitc Paris I I I - Sorbonnc Nouvelle. 
( 5 < l "No Brasil, também a opinião consensual da comunidade formada por especi-
alistas cm drogas (psiquiatras c outros profissionais tia saúde adiantes neste 
campo específico) é de que a internação compulsória do dependente de droga 
não é tecnicamente adequada. No entanto, distintamente do que acontece na 
frança, a inexistência de uma política de saúde de drogas faz com que usuários 
I de drogas estejam sujeitos pela legislação vigente a serem submetidos a trata-
mentos compulsórios, muitas vezes por determinação judicial." E o que relere 
I Diva Reale, op. cit., p. 125. Em sentido contrário, sendo a favor da internação 
compulsória cm determinados casos, Eduardo Kalina. Dmgadicçâo II, Rio de 
Janeiro: Francisco Alves, 1988, p. 53-65. 
, v " REALE, Diva. Op. c i t , p. 127. 
1 , 7 1 ASSOCIATION NATIONAL DES INTERVENANTS EN TOXICOMANIES. 
Le modele de soins trançais. Revue de LAnit - Interventions, ju in 1988. 
REALE. Diva. Op cit . p I 28 (nota de rodapé <>8) 
A ESTRATÉGIA A DEFINIÇÃO D O C A M P O C O N C E I 1 U A I . 
()s dei cnsores do modelo de redução de danos apresentam algumas i m - I 
portantes crí t icas ao "modelo de cura francês", dentre as quais destacamos: 5 9 
a) baixa capacidade de absorver a clientela, pois u t i l i / a c r i té r ios de 
inc lusão mui to restritos; 
b) o funcionamento dos se rv iços n ã o atende à demanda: n ã o lunc io-
nam nos ho rá r io s noturnos e localizam-se (geograficamente) em 
locais distantes das á reas em que há c o n c e n t r a ç ã o de u suá r io s de \ 
drogas; 
c) elegem metas itleais para o sucesso do tratamento, como a absti-
nênc ia imediata, 
b l não oferecem programas alternativos para os usuár ios que n ã o se I 
enquadram nos cr i té r ios de a d m i s s ã o . 
N ã o é difícil imaginar que o "modelo de cura f rancês" tenha gerado 
dificuldades para aqueles usuá r ios tine t inham demandas menos ambicio-
sas Entretanto, os franceses t êm sido opostos a p rá t i cas t e rapêu t i cas como 
as a n g l o - s a x ô n i c ã s , que p r o p õ e m , por exemplo, a subs t i t u i ção da he ro ína 
(droga ilegal, geralmente usada por via inje tável) por metadona (droga l e : 
gal, usada por via oral) , pois entendem que n ã o fariam mais do que manter 
a d e p e n d ê n c i a . Da mesma forma, o p õ e m - s e ao modelo dos N a r c ó t i c o s 
A n ó n i m o s , pois, segundo eles, trata-se de uma " s u b m i s s ã o a um poder 
superior (...) sorte de re l ig ião privada". 6" 
I fin dos maiores opositores ao uso da metadona é Olievenstein, para 
quem é dever do Estado oferecer tratamentos que l ibertem o sujeito da 
d e p e n d ê n c i a e não apenas substituam a d e p e n d ê n c i a tle uma droga ilícita 
por outra lícita, esta ú l t ima sob controle do Estado."1 
Ja os a n g l o - s a x õ e s , principalmente os norte-americanos e os ingleses, 
consideravam melhor a d e p e n d ê n c i a substitutiva, porque ela favoreceria 
uma melhora da qualidade de vida para os h e r o i n ô m a n o s . 
Diante disso, coube às o r g a n i z a ç õ e s n ã o - g o v e r n a m e n t a i s uma luta 
muito intensa para a a d o ç ã o de medidas de r e d u ç ã o de danos na f r a n ç a . 
Como iliz. Reale:'-1 "Os usuá r io s de drogas, ao se organizarem, caminham 
'"" COPPEL, A. Les intervenants en toxicomanic, leSitia et la reduetion des ris-
ques cn Francc. Communications 62. Vivreaveelesdwgues. Paris: Semi, 1996. 
( p. I07. ~\ 
'"" VALLEUR, M . Drogues et droitsdu toxicomane, le point de vue du praticien. 
In: CABALLERO, F. DmguesetdivitsdeVhomme. Paris: Les Empêcheursde 
IVnseren Ronde. I992. 
OLIEVENSTEIN, C En désespoir de cause. In: HERVIEU, J.-M (Dir . ) .~ J 
I .'espirit des drogues: la dépendance hors la lo/'?Autretment 106. p. 28-3'), 1989. 
'' REALE. Diva. Op. cit., p. 135 
90 K E D f Ç Ã O D E D A N O S 
para o seu desvencilhamenlode uma identidade socialmente c o n s t r u í d a em 
torno do b i n ó m i o c r i m e - d o e n ç a , ganham vis ihi l idade e voz, tornando as 
po l í t i cas de drogas que endossam ' s o l u ç õ e s t e r ap êu t i c a s restritas' ou 'so-
l u ç õ e s repressivas' objeto de questionamentos". 
Hm r a z ã o da r e s i s t ênc i a ocorrida na F r a n ç a em adotar o modelo de 
r e d u ç ã o de danos, c r iou - sê um s i l ênc io nos pr imeiros anos de epidemia da 
Aids . Somente em j u n h o de 1994 o M i n i s t é r i o da S a ú d e francês passou a 
adotar, oficialmente, a pol í t ica de r e d u ç ã o de danos. 6 1 
.12.4 Suiça 
11 importante referir a expe r i ên c i a da Platzpit / (Parque da Agulha) . 
Tiata-se de um parque localizado cm Zur ique, o qual se tornou um local de 
encontro d i á r io para quase 3.000 consumidores de drogas pesadas e pe-
quenos traficantes de drogas, principalmente de drogas i l íc i tas , como he-
ro ína e c o c a í n a , entre 1988 e 1992. Naquele local, medidas preventivas e 
de r e d u ç ã o de danos foram implementadas, inclusive suspendeu-se a apl i -
c a ç ã o da l eg i s l ação repressiva naquele e s p a ç o geográ f i co . Por meio dessa 
e x p e r i ê n c i a foi poss íve l ter acesso à chamada "cena aberta'' do uso de dro-
gas, ou seja. o acesso a diversas laces de um universo tão escondido, o que 
permi t iu , inclusive, a r ea l i zação de alguns estudos.'' 1 
Naquele local, os u suá r io s podiam comprar e usar drogas numa área 
púb l i ca . As autoridades su í ça s fecharam o Platzpitz em 1992. optando por 
uma outra forma de abordagem que fosse mais segura e menos t r au má t i ca 
à comunidade local c aos p róp r io s u s u á r i o s : descentralizar os s e rv i ços e 
disponibi l izar h e r o í n a e outras drogas inje táveis para dependentes por meio 
ile p r e sc r i çõe s . O programa foi disponibi l izado cm oito cidades su íças e os 
dependentes selecionados t inham acesso a heroina, morfina e metadona 
inje tável , com direi to a acompanhamento m é d i c o , a l ém de s e rv i ços que 
i n c l u í a m alojamento e aux í l io na busca de emprego, tratamento para pro-
blemas s o m á t i c o s e p s iqu i á t r i cos , inc luindo a Aids , e aconselhamento para 
COPPEL, A. Op. cit. 
Idem. Vide também: L E H M A N , P. Thesniss natii <naldrua and ah ohot contrai 
policies, from resignation touardpublic engagement. (Apresentado no 37th 
International Institutc on lhe Prcvention niidTrcatmcnt ol Alcoholisin and 20lh 
Inslilule on lhe Prcvention and Trcalmcnt of Diug Dcpciidcncc, S ã o Paulo, 
1993.) 
VOGT. R Harm reduetion and law theieshoLl projecls in the social jield: 
the situation in S\\ The Fourth International Conferencc on the 
Reduetion of Drug-relatcd Harm. Rotlcrdam, mar. 1993.6 p. 
El ICHS, W. L , GROB. P. J. Harm reduetion in an onc drug secne. Eur. Addict. 
lies . n . l . p 106-1 14. 1995 
\ E S T R A T É G I A A D E I T N I Ç Ã O D O C A M P O C O N C E I I I \ 91 
problemas de famíl ia e de estilo de vida. O programa só aceitava usuá r io s 
altamente dependentes (aqueles que se injetavam há mui to tempo e que 
t inham um h i s tó r ico de fracasso nas tentativas de abandonar o uso de dro-
gas) A o final de 1994, o Departamento de P rev idênc i a Social de Zurique 
apresentou os resultados preliminares: 
a) a p r e sc r i ção de he ro ína é viável e não produziu um mercado negro 
de he ro ína desviada; 
b> a saúde tios dependentes inc lu ídos no programa melhorou visivel-
mente; 
v ) a p r e sc r i ção de hero ína , por si só, n ã o pode resolver os problemas 
que originalmente levaram à sua d e p e n d ê n c i a ; 
d) a p re sc r i ção de he ro ína é menos um programa medico do que uma 
abordagem s o c i o p s i c o l ó g i c a para um problema pessoal e social 
complexo; e 
( e) a he ro ína em si causa pouco ou nenhum problema quando usada 
tle maneira controlada e administrada em cond ições l i igienicas.com 
os clientes controlando sua dose.' ' / 
3.2.^ Alemanha 
f u i 1990, iniciou-se um programa de r e d u ç ã o tle danos em Frankfurt, 
Alemanha O programa tem sido visto pela maioria dos pa íses europeus 
como um verdadeiro modelo a ser seguido. S ã o inc lu ídos se rv iços como 
unidades móve i s para p r o v i s ã o de aconselhamento e se rv i ços de troca de 
sei ingás , acesso à troca de seringas em fa rmác ias nas zonas urbanas, pro-
gramas de baixa ex igênc i a para fornecimento de metadona, abrigos para 
pei noite de u suá r io s carentes de moradia, quatro centros de u rgênc i a para 
tratamento m é d i c o e t rês narcossalas. 6 6 -
3.2 <> Canadá 
\s medidas têm sitio tomadas no ( ' a n a d á , em se tratando de redu-
ç ã o tle danos. S ã o s e r v i ç o s como troca tle seringas, m a n u t e n ç ã o c o m 
metadona. p r e v e n ç ã o de problemas com á lcool (programas de consumo 
moderado) c e d u c a ç ã o voltada para a saúde tio ind iv íduo 
A filosofia canadense está bastada em uma e d u c a ç ã o sobre ic t lução 
de danos fundada no humanitarismo, no pragmatismo e em uma aborda-
gem cient í f ica de s aúde pf jbf icãru p r inc íp io b á s i c o é a a c e i t a ç ã o do usode 
MARLATT, G. A Op. cit 
Idem. 
92 K l ni C Ã O D E D A N O S 
drogas como sendo normal , e que ele es tá associado a benef íc ios e a riscos. 
Este uso n ã o pode ser e l iminado, mas podemos d iminu i r os seus danos. 
Mui tos jovens t ê m superado o uso de drogas. A e d u c a ç ã o deve ser isenta de 
julgamentos: ela requer um d i á l o g o aberto e o respeito à liberdade de as 
pessoas tomarem suas p róp r i a s d e c i s õ e s , enfatizando o apoio positivo dos 
parceiros e companheiros, e não a sua s e p a r a ç ã o ''7 
3.2.7 Austrália 
A Aus t rá l i a foi o pr imeiro país a adotar formalmente a r e d u ç ã o de da-
nos em sua po l í t i ca nacional de drogas. 6 S Em 1992, este país sediou a I I I 
C o n f e r ê n c i a Internacional sobre R e d u ç ã o de Danos Relacionados a Dro-
gas. Nessa C o n f e r ê n c i a , o e n t ã o minis t ro australiano dos Se rv i ços de Saú-
de. Peter Staples, afirmou: 6 ' 1 
"Desde sua i n c e p ç ã o em 1985, a Campanha Nacional da A u s t r á l i a 
contra o Abuso de Drogas especificou que seu objetivo impl íc i to era o tle 
' m i n i m i z a r os efeitos prejudiciais das drogas na sociedade australiana' 
Embora alguns possam considerar que tal objetivo representa uma ' o p ç ã o 
fraca' para l idar com as drogas, o governo australiano não pensa dessa 
maneira. O governo australiano não é conivente com o uso ou o mau uso tle 
drogas e acredita firmemente que uma abordagem de r e d u ç ã o de danos é 
realista. N ã o consideramos que uma sociedade livre de drogas seja uma 
meta a t ing íve l . A l é m tlisso, o governo australiano acredita que nossos es-
forços r e n d e r ã o frutos a longo prazo e p r o d u z i r ã o uma atitude r e sponsáve l 
para com as drogas cm nossa sociedade". 
Atualmente, o tabaco e o á l coo l s ã o considerados drogas i l íci tas na 
A u s t r á l i a , em r a z ã o de essas duas s u b s t â n c i a s serem r e s p o n s á v e i s pela 
absoluta maioria tios danos relacionados a drogas naquele país ' 
A Aus t r á l i a es tá considerando a possibilidade de fornecer he ro ína e 
outros o p i á c e o s para usuá r io s de drogas in j e t áve i s . 7 1Trabalharemos com 
esse assunto no subitem 3.12. 
" " RILEY, D. Op. cit. 
'"K) CROFTS, N. , HERKT. D. A history of peer-based < Img iiscrgroups in Austrália. 
Journal of Drug Issues, 25. p. 599-616, 1995. 
A p u d H E A T H E R , N . , W O D A K , A . , N A D E L M A N N , E . E . ,0 'HARE, P. (Eds.) 
Psychoative drugs i£ harm redudion:from faith to seience. 2. cá. bondou Whurr 
Publishers. 1993. 
1 C R O F T S , N , HERKT, D.Op cit 
" " B A M M E R . ( i . . DOUGLAS. B.. MOORE. M . , ( IIAPPELL. D Op cit 
A E S I R M I C l \I INIÇ NO D O C A M P O C l I N C E I II M 93 
3.3 Bras i l - As p r á t i c a s brasileiras: i n t e r n a ç õ e s hospitalares, comu-
nidades t e r a p ê u t i c a s , narcó t i cos a n ó n i m o s e r e d u ç ã o de danos 
Está incorporada ao senso comum brasileiro a ideia de in te rnação como 
o melhor tratamento para a d e p e n d ê n c i a q u í m i c a . 
Nas unidades ambulatoriais, o atendimento acontece segundo c r i t é r ios 
administrativos bem restritivos, como o atendimento regionalizado, com 
comprovante de res idênc ia atestando o pertencimento à reg ião coberta pela 
unidade, atendimento cm horá r io comercial, obrigatoriedade tle ident i f i -
cai se apresentando cédu la tle identidade, su je ição ao agendamento tle tr ia-
gem e ou consultas, para citar algumas tias ca rac te r í s t i cas gerais dos servi-
ços 
( > i a, estamos falando tle uma p o p u l a ç ã o altamente marginalizada, es-
tigmatizada, muitas vezes com estilos de vida desviantes e que são obriga-
dos a ultrapassar barreiras como as descritas para obterem um atendimento 
regular. 
Sabe-se que as primeiras garantias a serem dadas a um usuár io tle dro-
ga são: ele será respeitado cm sua c o n d i ç ã o " n ã o - c o n v e n c i o n a l " ; n ã o s e r ão 
impingidas a ele as re ta l i ações sociais habituais; e a sua demanda por ajuda 
mé t l i co -ps i co lóg i ca não o exporá a mecanismos legais repressivos A l é m 
disso, entre as barreiras mais comuns está a busca pela abs t inênc ia imedia-
ta e total. 
A l é m desses se rv iços púb l i cos , existem as c l ín icas privadas ps iqu iá -
tricas especializadas no tratamento tle dependentes tle drogas e as entida-
des sem fins lucrativos, em sua maioria mantidas por entidades religiosas. 
Alias . Bucher refere que "as ú l t imas representam a maioria tias entidades 
que tratam dos problemas decorrentes tio abuso tle drogas". ; Quase todas 
elas formam as chamadas "comunidades t e r apêu t i ca s " , uti l izando se, ge-
ralmente, de pressupostos religiosos expressos pelo desejo tle "querer sal-
var'' ou "querer convencer", a l ém de "recuperar as ovelhas desgarradas". 7 1 
Ressalvamos que i n ú m e r a s casas dessa natureza não possuem m é d i c o 
r e sponsáve l , nem sequei enfermeiros para o atendimento de qualquer emer-
gênc ia . Pessoas que param bruscamente de ingerir á lcool podem, em de-
co r rênc i a , sofrer, por exemplo, de problemas como o deliriam tremens. 
Nesses casos, a taxa de mortalidade costuma ficar entre 5 e 159í. Há, por 
vezes, necessidade tle in te rnação em unidade de tratamento intensivo. 7 4 A l ém 
tlisso, quando se pára de ingerir qualquer t ipo de droga, podem ocorrer 
" : ' BUCHER, R Dn>ga\ dmgadivão no lirasil. cit 
Idem. 
K \M< IS, Sérgio de Paula Alcoolism >hoj, Porto Alegre: Al les Médicas, 1987. 
RI I )l iÇÃ<) Dl-! D A N O S 
d i s tú rb ios do apetite, cio sono. a g i t a ç ã o , a l u c i n açõ es , tremores, sudorese, 
c o n v u l s õ e s , entre outros. E m muitos casos, a sob rev ivênc i a tio paciente 
d e p e n d e r á unicamente do tratamento medico que recebei s 
Os N a r c ó t i c o s A n ó n i m o s s ão o r g a n i z a ç õ e s que contam com a partici-
p a ç ã o de u s u á r i o s e de e x - u s u á r i o s de drogas. Tendem a reproduzir o mo-
delo convencional de resposta ao problema: r e fo rçam, exclusivamente, a 
a b s t i n ê n c i a como so lução . 7 r ' Na verdade, originam-se dos grupos denomi-
nados A l c o ó l i c o s A n ó n i m o s , os A A , criados em 1935. nos Estados U n i -
dos Atualmente. apenas na Inglaterra existem 1 500 grupos. 7 ' 
O trabalho realizado por essas o r g a n i z a ç õ e s tem a sua i m p o i t â n c i a , 
principalmente nas comunidades em que não se d i spõe de recursos e de 
intra-estrutura para melhores s e rv i ços m é d i c o s e ps i co lóg icos . I azem par-
te dessa filosofia os grupos conhecidos como A l -Al iou , para os familiares 
do u s u á r i o de drogas, e o A L - A t t c n , voltado ao púb l i co jovem 
A partir de 1994, o Programa Nacional de DS 1 /Aids , do Min i s t é r i o da 
S a ú d e , aprovou a r e a l i z a ç ã o de u m Estudo sobre Compor t amen to e 
S o r o p r e v a l ê n c i a para Aids entre U D I s , denominado Projeto Brasil , o pr i -
meiro estudo m u l t i c ê n t r i c o em nível nacional a ser desenvolvido, in ic ia l -
mente, nas cidades de Santos. Rio de Janeiro, Salvador, l lajaí e Campo 
Grande. 7 ' ' Este projeto recrutou 668 U D I s . Desse aproximadamente 35% 
referiram j á ter recebido algum tipo de tratamento anteriormente à entre-
vista. Esse i tem apresentou grande v a r i a ção entre as cidades porque parte 
da amostra foi obtida jun to a c l ín icas de tratamento, como é o caso do Rio 
de Janeiro, onde 197c referiram ter algum tratamento anterior. Ja em Salva-
dor esse índ ice foi de 8 r< e a amostra foi obtida ditetamente nas ruas. Quanto 
ao tipo ile tratamento ut i l izado, a primeira modalidade a destacarmos foi a 
" i n t e r n a ç ã o " , referida por 697c, 70%, 52'.? e 54','? dos entrevistados, em 
Santos. Rio de Janeiro. Itajaí e Centro Oeste, n [lectivamente 
A e x c e ç ã o ficou por conta de Salvador, onde a "terapia ti adicional ' ' 
ocupou o pr imeiro lugar, com 29 (;?. Cabe registtar que no questionaiio do 
Projeto Brasil não houve d i f e r e n c i a ç ã o entre a in t e rnação ocon ida em hos-
pital p s i q u i á t r i c o ou em "comunidade t e r apêu t i ca" , esta úl t ima em voga no 
'"• EDYVARDS, Urifl i th. O tratamento do alcoolis <u>. San Paulo: Maitins f o n -
tes. 1987.p 173-209. 
1 , 1 REALE. Diva. Op. cit., p. 170. 
o : ' EDWARDS.Grif l i lh .Op.e i t ,p . 173-209. 
, ; " RAMOS. Sérgio de Paula. Alcoolismo hoje, cit 
, 7 " BUENO, R . C A R V A L H O . I I B. . TURIENZO, ( i . MESQUITA. I . , 
ANDRADE. ' ! . BASTOS. E. I. et alii. Diferences in \ot ial demographie patiem 
and ri.sk heluivior of hrazilian IDU.s. V I I I lutei national Conletcnce on the 
Reduetion of Drug Related Harm Paris. |997 P iog i am A- Absttacts. p 6 \ 
\ S I R A t l l i l V \T INIÇ V I 1)1 o \ M I ' 0 ( '< >N( I 111 Vl 95 
Brasil , apesar de uti l izarem, geralmente, t écn icas de convencimento calca-
das em pr inc íp ios religiosos, não dispondo de profissionais de s aúde em 
seus quadros funcionais /" 
No que tange especificamente à e s t ra tég ia de r e d u ç ã o de danos no 
Brasil , ela ainda é percebida apenas como uma d e s i g n a ç ã o para estratégias 
de p r e v e n ç ã o à Aids entre usuár ios de drogas injetáveis . 
A primeira iniciativa de um programa de troca de seringa no Brasil 
os 0 1 teu em Santos, São Paulo, em I9S9, tendo havido, inclusive, p e r s e c u ç ã o 
penal ao coordenador do Programa Munic ipa l , Fáb io Mesquita, e ao Se-
cretái io Munic ipa l da S a ú d e , David Capistrano, cujo resultado foi o arqui-
vamento por falta de provas s l Foi en tão que o programa, em virtude de 
ordem judicial , deixou de distribuir as seringas, pois, segundo alguns , isso 
significaria induzir, instigai ou auxil iai pessoas a usarem drogas e, portan-
to, poderia ser equiparado ao tráfico ilícito. Os íncs. I e I I I . do § 2" , do art. 
12, da Le i 6.368/76, os quais versam sobre t rá f i co i l í c i to de diogas . 
cr iminal izam a conduta de quem "induz, instiga ou auxilia a l g u é m a usar" 
ou " i o i i l r ib t i i de qualquerforma para incentivar ou difundir" o uso indevido 
ou o ti á t i co il ícito de subs t ânc i a s entorpecentes, respectivamente.*' 
i ) pi ogi ama persistiu apenas com os sei v iços de i n fo rmações , u i onse-
lliamentos, d i s t r ibu ição de frascos de agua destilada, hipoclori to de s ó d i o , 
l enços umedecidos em álcool e preservativos, para a p r e v e n ç ã o da Aids 
entre usuár ios de diogas injetáveis . 1 " 
( ) pr imeiro programa de trocas de seringas, oficialmente financiado 
pelo Projeto Brasil , mencionado no subitem 3.3, foi o Projeto de R e d u ç ã o 
de l )anos entre U D I s de Salvador, em 1995." Nesse caso. não houve pro-
Bl l( 'HER, R. Diogas .. drogadição no Brasil, >. it., p. 323. 
"" MESQUITA, I C. Diogas injetáveisc Aids. In: PAIVA. V (Org i. Em tempos 
./, Aitls. São Paulo: Suinnius, 1992. 
I mie cl al. ( 1993) analisaram vários PIS nos EUA, Canadá c Europa. Esse 
i ando é parte de seis pesquisas encomendadas pelo National Inslituteol I lealth/ 
( enters for Diseasc Contrai, os quais recomendaram, de forma unânime, que 
i governo dos EUA adolassc a troca de seringas para prevenção da Aids entre 
1 DIs. lais estudos são taxativos ao afirmar que os PT não aumentam o uso de 
il i ogas, como cm alguns lugares, mas ale conli ibiiem para a sua diminuição. 
( hilro argumento muito utilizado paia combater os PIS também foi derruba-
do E comum a alegação de que a população usuária de dioga é retrataria a 
modificações de comportamento Diversos trabalhos (Des Jarlais et al., 1995) 
contestam essa afirmação, referindo que é mais fácil os UDIs nãocompartilha-
i cm seringas usadas do que garantir o uso regular de prescrv aliv os. 
, M | REALE, Diva. Op. cit , p 171. 
ANDRADE,T M. .NONATO.J .M . A L V E Z , A . Q . , C O U T I N H O , M . C . F i r s t 
needle exchange program in Brazil. V I I International Conferencc on thei 
Reduetion of Drug-Related Harm Hobart. 1996. p. V7. 
K l D l I Ç Ã O D l D A N O S 
blcmas com a j u s t i ç a local porque, certamente, causou boa i m p r e s s ã o o 
fato de o projeto ser desenvolvido pelo Centro de Estudos e Terapia do Abuso 
de Drogas - Cetad, l igado à Universidade Federal da Bahia, com 12 anos 
de ex i s t ênc i a , sendo re fe rênc ia nacional sobre o assunto. 8 5 
E m 1996. o mesmo programa organizou a primeira r e u n i ã o dos proje-
tos de r e d u ç ã o de danos do Bras i l . Nesse mesmo ano, t iveram in íc io os 
projetos em Porto Alegre e em Sorocaba. 
En i 1997 foram criados outros projetos: o da Prefeitura Munic ipa l de 
l lajaí , o Projeto Bocada, da Secretaria tia S a ú d e do listado tle S ã o Paulo, o 
projeto do N ú c l e o de Estudos e Pesquisas em A t e n ç ã o ao Uso de Drogas -
Nepad, tia Universidade do Estado do Rio de laneiro, e o da A s s o c i a ç ã o 
Santista de P r e v e n ç ã o e Pesquisa em DST/Aids e Secretaria Munic ipa l da 
S a ú d e de Santos. Ainda em 1997 foram cr iado, projetos em S ã o José tio 
Rio Preto, em uma parceria entre a Faculdade de Medicina e a Prefeitura 
M u n i c i p a l , o projeto em S ã o Vicente, pela Secretaria Munic ipa l de S a ú d e , 
e em F l o r i a n ó p o l i s , pela Secretaria Estadual tia Saúde . 
E m 1997, foi criada a A s s o c i a ç ã o Brasileira de Redutores tle Danos 
(Aborda ) . 8 f , Ta l a s s o c i a ç ã o foi o resultado da a u t o - o r g a n i z a ç â o tle usuá r ios 
de drogas, e x - u s u á r i o s , t é c n i c o s tle diversas á reas e pessoas atinadas com 
o p r o p ó s i t o de p r e v e n ç ã o à Ai t ls e outras d o e n ç a s . No mesmo ano. ocorreu, 
no Distr i t t ) Federal, o I Encontro Nacional da a s s o c i a ç ã o r e c é m criada, com 
a e l e i ç ã o da primeira tliretoria e a o f ic ia l i zação dos estatutos. Entre 1997 e 
1999, a Aborda acompanhou o surgimento de a s s o c i açõ es estaduais, como 
a Aprenda, tle S ã o Paulo, a Acorda , de Santa Catarina e a A.Rede, tio Rio 
Cirande do Sul . a l ém tle ter sitio membro fundador da Rede 1 atino A m e r i -
cana de R e d u ç ã o de Danos (Relard) e da Rede Brasileira de R e d u ç ã o de 
Danos. E m 1998, aconteceu, na capital paulista, a IX C o n f e r ê n c i a Interna-
cional tle R e d u ç ã o tle Danos. s 7 
E m 199S, foram criados os projetos tle S ã o Leopoldo, no Rio Grande 
do Sul , tle Curi t iba, no Pa raná , e tle R i b e i r ã o Pieto, em S ã o Paulo 
Em 1999, foram ci iados vai ios projetos em São Paulo. No Rio (irande 
do Sul , merecem destaque Pelotas, pela universidade local, Rio Grande e 
Santa Mar ia . Pelo Brasil , C u i a b á , no Estado do Mato Grosso, c Bras í l ia , no 
Dis t r i to Federal 
| S S | CENTRO DE PESQUISA E M PSICOBIOLOti IA Cl ÍNICA(CPPC). Encon-
tro de centros brasileiros de tratamentos de de/h ndência de drogas. São Paulo: 
Afip, 1989. 
I M ' BIANCARELLI,Aurel iano Associação reúne "trocadores" de seringa Folha 
de S. Paulo. São Paulo, 21.11.1997, Caderno Cotidiano 3. p. 13. 
, s ' SIQUEIRA, Domiciano. Editorial. Aborda, Poi to Alegre, n . l .p . 2-3, mar.-abr. 
1999. 
MS I i: vrí-íil \ ii 11 r. i<. 'a i 1 ii 1 1 A M I ' ( > ( ( ) ' . ( i 111 \ 97 
Apenas para citar algumas estimativas, calcula-se que 2.000 usuá r io s 
de drogas injetáveis estejam, hoje, envolvidos, de alguma forma," confos 
programas nacionais de r e d u ç ã o de danos, o "que representa ehi fòTiiõ de" 10 
a 15% dos dependentes injetáveis do p a í s . 8 8 E m S ã o José dó RiõTfeTô , o 
projeto "Ta L i m p o " , que trabalha com "craqueiros"," 9 mostrou que 44% 
dos dependentes estavam com Ait ls . O meio de c o n t á g i o é quase sempre 
sexual, e como o crack™ gera uma d e p e n d ê n c i a mais ráp ida e forte do que 
as demais drogas, seus usuá r io s chegam a vender o que têm para ob t ê - l p , 
inclusive o p róp r io c o r p o 9 1 Eni Ribe i rão Preto, m u n i c í p i o que ocupa a 6* 
c o l o c a ç ã o em n ú m e r o de casos de Aitls no Brasil e é o 3.° colocado no es-
tado tle S ã o Paulo, o uso tle drogas contribui para 3 I % tios casos de Aids 
notificados, sendo que, destes, 55% são usuá r ios de drogas in je táveis . 1 , 2 E m 
190o. foram recolhidas 600 mi l seringas em todo o país , o dobro do tpie foi 
arrecadado em 1998.'" 
I i n (ermos de legislação, convém citar a I ,ei estadual paulista 9.758/97, 
publicada no Diário Oficial de São Paulo em 17.09.1997 T a m b é m c o n ~ 
vém referir a l eg i s l ação estadual do Rio Grande do Sul , Lei 11.562, de 
28.1 2.2000, publicada no DOEcm 29.12.2000. Esta lei trata das ativida-
des tle r e d u ç ã o de danos entre usuár ios de drogas endovenosas, visando 
M A N C A R E I I I , Aureliano. Encontro discute troca de scrinea Folha de S. 
Paulo. São Paulo, 08.11.1999, caderno São Paulo, p. 6. 
'"" l Isuário tle crack, droga derivada tia cocaína com formato semelhante a uma 
pedra, a qual é fumada. 
'"" ( rack: nome onomatopaico de um derivado da planta de coca A preparação 
"caseira" da droga é obtida habitualmente pela adição tle bicai bonato de sódio 
ao cloridrato tle cocaína (o pó de cocaína). Esse preparado, após ser aquecido, 
transforma-se cm uma pedra, cuja quebra em partes menores pioduz um som 
caractei ístico, D crack. Outra forma de preparo substitui o cloridrato pela pasta 
básica, produto intermediário obtido pela cocção (cozimento) das folhas de coca 
misturadas ao querosene. O crack produzido a partir da "pasta básica" (às ve-
zes conhecido como "casca") contém querosene, responsável por uma maior 
lo\icitladc ao oiganismo quando de sua inalação. Também pode-se adicionar 
acido sulfúrico, metanol e ácido benzóico, o que tia/ conscqiiêni ias clínicas e 
neuropsiquiátricas desastrosas quando comparado com a forma em pó dessa 
substância. A cocaína c or/w-Jtpodcm indu/ir convulsões, atrofia cerebral difusa 
e lesões cardiovasculares sistémicas Loque dizem Fernando Madalena Volpe 
et alii. Vasculhe cerebral c uso tle cocaína e crack, Revista Brasileira </e Psi-quiatria, São Paulo, vol. 21, n. 3, p. 174-6, jul.-set. 1999. 
" " BIANCARELI I.Aureliano Folha US Paulo, São Paulo. 12 12 1999. cader-
no Cotidiano 3. p. 7. 
' : ' MORAES. Sílvia Helena Possali. Breve história da redução de danos em Ri-
beirão Preto. Aborda, Porto Alegre, n. 2, p. 3, nov. tle/. 1999. 
CARVALHO, Vânia. Programa troca 316 seringas em um mês Folha de S. 
Paulo São Paulo, 12 I 1.1999, caderno Ribeirão, p. 2 
K l l ) l ' ( , 'ÀO D l : D A N O S 
prevenir e reduzi r a t r a n s m i s s ã o de d o e n ç a s e da S í n d r o m e da 
I m u n o d e f i c i ê n c i a Adqui r ida - Aids/Sida, entre outras p ro v i d ên c i a s . C u m -
pre salientar que a nova Le i federal 10.409/2002, no § 2 . ° d o a r t . 12, adotou 
a R e d u ç ã o de Danos como po l í t i ca de s a ú d e púb l i ca , reflctindo um grande 
a v a n ç o em termos legais. 
A r e g i ã o Sul do Brasil conta com a segunda maior inc idênc ia nacional 
de casos de Aids . Segundo a v a l i a ç õ e s dos casos notificados no Rio Grande 
do Sul , a té m a r ç o de 1997, Porto Alegre e a r eg ião metropolitana reuniam 
80.8% dos casos notificados. 
C o m r e l a ç ã o à Aids no Rio Cirande do Sul. em dezembro de 1995, a 
categoria de e x p o s i ç ã o predominante era a dos usuár ios de drogas injetáveis . 
com 33% dos casos notificados, seguida dos homo e bissexuais masculi-
nos, com 2 2 r í . No m ê s subsequente, a pa r t i c ipação dos UDIs aumentou 
para 40%, enquanto os homo e os bissexuais masculinos responderam por 
29% dos casos."1 
3.4 D o e n ç a s infecto-contagiosas re lac ionadas ao uso de drogas 
i n j e t á v e i s 
3.4.1 Síndrome da Imunodeficiência Adquirida Aids 
A Aids é uma d o e n ç a causada pelo ví rus da imunode f i c i ênc i a humana 
e pode destruir a capacidade epie o corpo normalmente possui para comba-
ter i n f e c ç õ e s e d o e n ç a s . O v í rus da Aids pode ser transmitido mediante 
contato sexual, comparti lhamento de agulhas, seringas e outros equipamen-
tos de in jeção de drogas ( incluindo-sc a d iv i são de recipientes já usados, a 
u t i l i z ação do ê m b o l o sujo da seringa para misturar a s o l u ção da droga, o 
emprego de uma seringa usada para distr ibuir ou preparar a droga, a extra 
ç ã o da droga de um filtro de a l g o d ã o compai t i lhado poi outras pessoas, 
raspar a colher que vai ao fogo, enxaguar a agulha na água utilizada por 
outra pessoa...), ou via t r an s fu são de sangue de uma pessoa que esteja 
infectada. T a m b é m é poss íve l a t r a n s m i s s ã o de m ã e para filho, durante a 
gravidez, parto ou a m a m e n t a ç ã o no seio.9* 
'"" SECRETARIA DA SAÚDE E DO MEIO A M B I E N T E DO RIO GRANDE 
DO SUE. (Programa Estadual de DST/Aidsdo Rio Grande do Sul) - Boletim 
Epidemiológico. Foram consultados boletins reterentes aos anos de 1995. 1996 
c 1997 (anos V I , V I I e V I l l ) . 
r>" I N C I A R D I , James A. , SURRATT, Hilary L . . PECH ANSK Y, Flávio. Redução 
de risco para HIV/Aids entre usuários de drogas: um guia para trabalhadores 
e aconselhadores de saúde pública. Porto Alegre, 39 p., especialmente p. 21 -
25. Trata-se de uma obra financiada pelo Instituio Nacional de Abuso de Dro-
cas dos Estados 1 Inidos (Nida). 
\ S I K \ I (.1 \O D O C A M P O O i N O I I D A I 9 9 
A evo lução da epidemiologia da Aids no mundo pode sei resumida em 
três fases principais. U m primeira fase ocorreu entre as d é c a d a s de 70 e 80, 
quando a epidemia c o m e ç o u a disseminar-se com rapidez, principalmente 
entre a p o p u l a ç ã o homossexual masculina, nos Estados Unidos e na Euro-
pa l Ima segunda fase aconteceu entre usuár ios de drogas injetáveis e, pou-
co depois, a Aids j á atingia a p o p u l a ç ã o de heterossexuais em pa íses da 
Alue a do Sul e no Caribe. A terceira etapa sucedeu entre heterossexuais, 
mais recentemente, nas áreas metropolitanas dos Estados Unidos e tia Eu-
ropa Podas essas fases têm sido bastante associadas ao abuso de drogas. 
.Alem do que, os índ ices relacionados à Aids ( inc idênc ia e mortes) e s t ão 
d iminu indo entre a p o p u l a ç ã o de homens homossexuais brancos em ex-
tensa s á reas urbanas nos F.UA, tendo sido percebido um aumento no índice 
entre homens homossexuais não -b rancos nessas áreas. '" 1 
A t r a n s m i s s ã o do vírus pela via sexual e pelo uso de drogas in ic iáveis 
está aumentando em todoo mundo, bem como a t r a n s m i s s ã o perinatal,pois 
um n ú m e r o significativo de mulheres infectadas e s t ão em idade fértil. Vale 
ainda referir que mais de dois terços dos parceiros heterossexuais tle mu-
Ihetes contaminadas são usuár ios tle drogas intravenosas. A u t i l i zação de 
thogas intravenosas t a m b é m é responsáve l por 30' 7t dos casos femininos 
entre adolescentes, quer por via direta. quer por meio tio parceiro sexual. 9 7 
A p r e o c u p a ç ã o com esse assunto tão p o l é m i c o é procedente, lemos 
tle observar que a via proibi t iva da livre o b t e n ç ã o tle seringas e agulhas 
impede o acesso legal a elas, mas não evita que as drogas sejam injetadas. 
A l é m tlisso, há que se preocupar com a q u e s t ã o da r e c o n t a m i n a ç ã o , pois, 
geialmcnte, os usuá r ios de drogas j á contaminados tendem a não mais evi -
tai o comparti lhamento. O problema é que a r e c o n t a m i n a ç ã o é mui to pre-
jut l i t ial, porque o soropositivo recebe uma carga v irai diferente que pode 
alterai sua imunidade ou agravai a d o e n ç a . ' s 
( ) uso tle seringas esterilizadas mesmo obtidas i l icitamente levou 
a uma r e d u ç ã o do risco tle c o n t a m i n a ç ã o pela Ait ls tle forma significativa 
em cidades como Nova Iorque (80%), Glasgow (84%), Lund (82%) e 
Siilnei (84%) . Os usuá r io s têm demonstrado a i m p o r t â n c i a do uso de 
set ingás esterilizadas e desca r t áve i s , desde que tenham mais facilidade 
paia ob tê las."" 
'"" HAVERKOS, Harry W. HIV/Aids and diug abuse; cpidemiology and 
prcvention. Journal Addu tive Discutes, United States of America, vol. 17, n. 
4. p. 91-103. 1998. 
1 9 1 ' SANTOS, Roseana Maria Maia, L I M A , Darcy Roberto. Op. cit. 
| , ) s ' MENDES, Alex. Contaminação pode vir dos cachimbos usados para fumara 
droga Diário da Regido, São José do Rio Prelo, 18.12.1999. 
'"" SANTOS, Roseana Maria Maia, I IMA. Darcy Roberto. Op. i it.

Continue navegando