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Investigação Preliminar

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Investigação Preliminar
Parte 1
Eliomar Pereira: a investigação criminal é definida como uma “Pesquisa, ou conjunto de pesquisas, administrada estrategicamente, que, tendo por base critérios de verdade e métodos limitados juridicamente por direitos e garantias fundamentais, está dirigida a obter provas acerca da existência de um crime, bem como indícios de sua autoria, tendo por fim justificar um processo penal, ou sua não instauração, se for o caso, tudo instrumentalizado sob uma forma jurídica estabelecida por lei”.
Para doutrina majoritária, é uma fase pré-processual, meramente administrativa.
A investigação preliminar realiza um juízo de tipicidade de conduta, busca enquadrar um fato numa hipótese criminal prevista em lei.
Classificação de acordo com a autoridade que a preside:
Administrativa: a mais comum, conduzida pela Polícia Judiciária
Judicial: presidida pelo Juiz; mas sem caráter jurisdicional, é anterior ao processo propriamente dito; a investigação é sempre pré-processual
A fase preliminar não tem autonomia, ela é dispensável pelo titular da ação penal.
Elementos que justificam a existência da investigação preliminar:
Busca VIABILIZAR o início do processo, no sentido de avançar na IDENTIFICAÇÃO dos elementos de autoria e materialidade, realizando um juízo mínimo para a deflagração de um processo criminal (obtenção de justa causa).
Funciona como GARANTIA de direitos fundamentais, tanto da vítima quanto do investigado.
Possui uma função SIMBÓLICA, de comunicar à sociedade de que o possível crime está sendo apurado; busca assegurar a paz social.
É um FILTRO para evitar acusações infundadas; evita um processo penal leviano, temerário. Como diz o Prof. Aury Lopes, o processo penal propriamente dito já é uma pena em si, portanto, há que ser iniciado somente se realmente necessário.
Classificação quanto ao órgão que conduz a investigação:
Investigação administrativa:
Policial
Policial militar
Administrativa em sentido estrito (Receita Federal, Tribunal de Contas, CADE etc.)
Procedimento de Investigação Criminal – PIC (Ministério Público)
Parlamentar (CPI e CPMI)
Investigação judicial:
Investigação preliminar de autoridades com foro por prerrogativa de função o Relator gerencia a investigação, possuindo autoridade para deferir medidas, independentemente de serem medidas com reserva de jurisdição ou não
Investigações privadas / particulares:
Buscam apurar práticas lesivas à concorrência, de pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos ligados ao setor empresarial.
Classificação quanto ao investigado:
Foro privilegiado: membros do MP, da magistratura, agentes políticos
A quem cabe conduzir a investigação? Quais autoridades podem investigar?
Participações da Polícia Militar, Polícia Rodoviária, Polícia Ferroviária exercem atividades de polícia administrativa e não de polícia judiciária.
Participação de Guardas Municipais e Polícias Legislativas protegem determinados bens e direitos e acabam exercendo alguma investigação preliminar nos respectivos âmbitos de atuação.
Participação da ABIN Operação Satiagraha: segundo o STJ, a ABIN não pode participar de investigação criminal.
Participação de membros do TCU, CGU, autoridades aduaneiras etc.
Para o Prof. Márcio Anselmo, efetivamente podem ocorrer tais participações, desde que essas participações sejam devidamente autorizadas e requisitadas e que a função de investigação criminal seja diretamente exercida pela Polícia Judiciária – Polícia Federal ou Polícias Civis (únicas competentes para exercer a função de investigação criminal).
Parte 2
Órgãos encarregados da investigação
Juizado de instrução: centralizado na figura do juiz, com participação auxiliar da polícia; modelos francês, argentino, espanhol e, no Brasil, a investigação de autoridades com foro privilegiado, em que compete ao Relator definir e autorizar TODAS as diligências, não só as com reserva de jurisdição o Relator exerce uma função de direção da investigação.
Promotor investigador: centralizado na figura do Promotor, com participação auxiliar da polícia; predominante na Europa continental, como Itália e Portugal; embora formalmente de atribuição do Promotor, as investigações acabam ficando, na prática, a cargo da Polícia, que tem estrutura mais adequada para essa função; é bem criticada por violar em sistema acusatório, tendo como principal investigador o órgão acusatório, que não teria interesse em obter provas relevantes à Defesa, passaria tão somente a buscar a comprovação da hipótese acusatória inicialmente concebida.
Inquérito policial: o protagonismo é realizado pela Polícia; como na Inglaterra, que tem o Chef Officer, análogo ao Delegado de Polícia, com a diferença de que aquele também oferece acusação, assemelhando-se, a partir daí, à figura do Promotor; modelos da Inglaterra, Austrália e Brasil; em tese, garante uma maior imparcialidade à investigação, visto que realizada por um terceiro que não é o órgão da acusação e tende a ser mais permeável a outras hipóteses investigativas.
O sistema de investigação preliminar brasileiro, regido pelo CPP, atribui a função de investigar a/ao:
Polícia Judiciária (Civil ou Federal), sob a presidência do Delegado de Polícia;
Ministério Público, por meio dos PIC’s, sob a condução do Promotor de Justiça.
Problemas de legalidade da investigação realizada pelo MP: é um procedimento regido apenas por Resoluções do CNMP, não prevista no CPP.
Os PICs não têm qualquer controle judicial, diferentemente do inquérito policial, que, a partir do momento em que é instaurado, é registrado e encaminhado à autoridade judicial para controle.
Os PICs, em alguns casos, são remetidos à Polícia para continuação das investigações.
Existência de procedimentos em duplicidade, um no âmbito policial outro no âmbito ministerial, visto que a instauração do PIC não é conhecida pela Polícia Judiciária, na maioria das vezes.
Para alguns autores, após o MP desistir da investigação e encaminhá-la à Polícia, esta não seria obrigada a continuar com os trabalhos.
Para o Prof. Márcio Anselmo, é necessário que a investigação pelo MP seja submetida a regras e que seja realizada apenas excepcionalmente, quando satisfeitos determinados requisitos, como, por exemplo, nos casos de falhas e deficiências da autuação da Polícia Judiciária.
Para o Prof., o sistema de investigação preliminar brasileiro tende a ser um sistema que garante os direitos do investigado, quando em comparação com os sistemas criticados pela doutrina – como o sistema italiano criticado por Ferrajoli –, à medida que prevê a assistência de advogado no interrogatório, a exigência de prévia autorização judicial para a realização de medidas cautelares e restritivas de direitos etc.
Parte 3
Atuação do juiz na investigação preliminar
Tem uma função de GARANTE ou de INVESTIGADOR.
No direito brasileira, o juiz deve exercer uma função de GARANTE dos direitos do investigado e da vítima, tendo em vista que exerce papel relevante nas medidas sujeitas à reserva de jurisdição, de modo a promover a efetividade das investigações.
Funções exercidas pelo juiz na investigação preliminar:
CONTROLE JUDICIAL LATO SENSU: controle de prazos, de tramitação etc.
CONTROLE DA PRISÃO EM FLAGRANTE: verifica se a prisão preenche os requisitos necessários para sua efetivação, se deve ser homologada, mantida ou relaxada.
AUTORIZAÇÃO DE MEDIDAS RESTRITIVAS DE DIREITO: aprecia pedidos de quebras de sigilo, cautelares de busca e apreensão, interceptações telefônicas, telemáticas, infiltração policial, ação controlada, acordos de colaboração premiada etc.
O objetivo é o controle e garantia dos direitos do investigado.
Nas investigações de pessoas com foro privilegiado, o Relator PRESIDE a investigação, autorizando ou não diligências investigativas, o que pode implicar a sua contaminação como julgador posterior do caso.
Hoje, o entendimento jurisprudencial é de que cabe ao Relator destes casos uma autorização para o indiciamento, submetendo o Delegado de Polícia a obter essaautorização antes de indiciar (ato este que é privativo do Delegado).
Discute-se muito o modelo de um JUIZ DE GARANTIAS, que acompanha a fase de investigação preliminar, competindo-lhe a autorização das medidas cautelares, diligências investigativas etc. Num segundo momento, passaria a atuar o JUIZ DA AÇÃO PENAL. Isso é importante porque elimina a presunção de parcialidade do juiz que acompanha o inquérito, deferindo medidas de cunho bastante restritivo aos direitos do investigado. O juiz que toma conhecimento profundo da investigação e influi diretamente na mesma, ao deferir diversas medidas em seu bojo, acaba sendo contaminado e torna-se parcial para o posterior processamento e julgamento da ação penal.
Atuação nas Audiências de Custódia: além disso, compete ao juiz ratificar a prisão em flagrante ou cautelar do investigado.
Parte 4
Os atos de investigação preliminar
Atos iniciais: 
A investigação surge com a notícia de um crime (interna – pela própria autoridade policial – ou externa – por requisição do MP, do juiz ou do ofendido) ou com a prisão em flagrante.
Basta uma denúncia anônima para iniciar-se uma investigação? Segundo entendimento majoritário, não. É preciso que haja outros elementos incorporados a ela, que lhe garantam coerência e autenticidade.
O termo inicial do início da investigação é a DATA DA PORTARIA inaugural do inquérito.
A requisição de uma autoridade judiciária ou do Ministério Público pode ser descumprida? Alguns autores defendem que não, que a requisição DEVE ser atendida. No entanto, a doutrina mais correta, para o Prof. Márcio Anselmo, é a de que, em alguns casos, ela pode ser descumprida, quanto se depararem com outras circunstâncias que desautorizam a investigação (excludentes de ilicitude, atipicidade etc.).
Quanto ao requerimento do ofendido, é preciso que haja:
Narração dos fatos
Uma possível identificação do autor
Indicação de testemunhas / provas
Atos de investigação (arts. 6º e 7º do CPP)
Competência / atribuição para investigar:
Relacionadas a interesse da União / crimes de competência da Justiça Federal Polícia Federal
Investigações de caráter residual Polícia Civil
Critérios de definição de competência / atribuição interna da Polícia Judiciária:
Matéria: homicídios, fraudes, lavagem de dinheiro etc.
Território: região, bairro etc.
Não há competência territorial para a investigação preliminar!
Prazo de duração da investigação: o CPP estabelece alguns prazos. No caso de investigados presos, haveria uma PRAZO FATAL. Mas, nos demais casos, há seguidas dilações de prazo, que levam que a investigação dure por um prazo muitas vezes não razoável.
No ordenamento chileno, há um prazo fatal de dois anos.
O CPP prevê uma série de diligências a serem realizadas pela autoridade policial:
Exame do local do crime
Apreensão de provas destinadas ao esclarecimento dos fatos
Oitivas de testemunhas e do investigado
Reconhecimento de pessoas e de coisas
Acareação
Exame de corpo de delito / outros exames periciais
Identificação do investigado (datiloscópico ou outro meio)
Reprodução simulada dos fatos (desde que não contrarie a moralidade ou ordem pública)
Representação por medidas cautelares sujeitas à reserva de jurisdição (quebras de sigilo, busca e apreensão, ação controlada, infiltração policial, interceptação telefônica, acordo de colaboração premiada, sequestro e bloqueio de bens, prisões cautelares – temporária ou preventiva)
Ponto importante: a cadeia de custódia; um procedimento para se resguardar que determinada prova ou objeto apreendido seja resguardado até o final do processo, com a garantia de autenticidade e inviolabilidade dos dados.
Ato de indiciamento
Superada a fase dos atos de investigação, há um momento em que a autoridade policial irá exercer um juízo de valor sobre os resultados dos trabalhos e diligências empreendidos; é o ato final da investigação preliminar momento do indiciamento.
Indiciamento: análise técnico-jurídica dos fatos para que a autoridade policial possa indiciar uma determinada pessoa pela prática de uma infração penal, quando presentes indícios suficientes de autoria e materialidade.
A partir do indiciamento, o indivíduo passa da condição de suspeito/investigado para a de indiciado (provável autor, responsável penal pelos fatos apurados).
Para o Prof. Márcio Anselmo, o ato de indiciamento é privativo da autoridade policial, sendo ilegal uma requisição do MP ou do Judiciário neste sentido.
O indiciamento, ainda, tem uma função de explicitar e identificar a posição da pessoa investigada, “garantindo-lhe” que conheça a sua condição.
O indiciamento deve ser um ato fundamentado da autoridade policial. Não pode ser uma mera indicação de uma pessoa pela prática de um fato, deve haver a indicação de elementos da investigação preliminar que permitiram concluir pelo indiciamento do investigado.
Para o Prof. Márcio Anselmo, o ato do indiciamento, embora administrativo, tem efeitos processuais. As consequências vão muito além do abalo psíquico e moral causado no indiciado, passando a haver registros na folha de antecedentes da pessoa, surgindo a sua titularidade do direito de defesa no procedimento.
O indiciamento deve ser sempre ANTERIOR ao interrogatório do indiciado. Não deve existir interrogatório sem indiciamento!
Esse momento deve marcar, ainda, o acesso pela Defesa a TODOS os elementos indiciários existentes relacionados ao indiciado, para que seja viabilizada a defesa técnica já no momento do interrogatório.
É um ato declaratório da autoridade policial, que explicita sua ideia de “culpa”, em sentido lato, do investigado.
Parte da doutrina, afirma que o indiciamento não tem esse feito, porque não vincula o Ministério Público, titular da ação penal.
No entanto, para o Prof., esse entendimento é frágil, porque a denúncia, de igual modo, não vincula o juiz, mas, ainda assim, possui relevantes efeitos concretos.
 Para Aury Lopes Jr., ao longo da investigação preliminar, o investigado é submetido a um sistema escalonado – progressivo ou regressivo – de culpabilidade. Ele fica sujeito a cargas de juízo sobre sua conduta – suspeito, investigado, indiciado, denunciado, réu, condenado etc.)
Ponto importante: a Lei de Lavagem previu que, havendo o indiciamento, a autoridade policial pode determinar o afastamento do indiciado pelo crime de lavagem caso ele seja servidor público. Portanto, há, sim, efeitos concretos ao investigado gerados pelo indiciamento.
Relatório: ato final da investigação preliminar.
Narra os atos de investigação praticados, as conclusões, os elementos probatórios angariados, remetendo a investigação à autoridade judiciária e ao MP, que avaliarão a possibilidade oferecimento de denúncia, de arquivamento ou de requisição de diligências complementares.
Quando o MP entende pela realização de diligências complementares, o CPP determina que essas sejam IMPRESCINDÍVEIS ao oferecimento da denúncia. Assim, a autoridade policial pode se recusar a cumprir diligência que não está a seu cargo, que poderia ser cumprida pelo órgão ministerial ou pelo juízo.
Em relação ao arquivamento, ou o juiz acata o pedido ou remete os autos ao Procurador-Geral para que este ofereça denúncia, designe outro membro do MP para oferecê-la ou insista no pedido de arquivamento, ao qual o juiz será obrigado a atender (art. 28 do CPP).
Para haver o desarquivamento do inquérito, é IMPRESCINDÍVEL que haja PROVA NOVA (art. 18 do CPP). Trata-se de uma garantia do investigado, para que não haja reabertura de investigação sem qualquer alteração do quadro fático.
Parte 5
Valor probatório dos atos da investigação preliminar
Grande parte da doutrina costuma negar qualquer valor probatório dos atos da investigação. Para o Prof. Márcio Anselmo, essa afirmação é falaciosa porque quase a totalidade dos elementos probatórios levados à ação penal são produzidos na fase pré-processual.
Considerada a estrutura da investigação preliminar, nota-se que apenas a prova testemunhal é que será reproduzida, produzida novamentena fase judicial.
As provas materiais e documentais são pré-constituídas e são simplesmente transportas para a ação penal. A prova documental é submetida a um contraditório diferido ou postergado; somente em momento posterior, no curso da ação penal, tal prova será submetida ao contraditório.
A prova pericial muitas vezes também é produzida no curso da investigação preliminar. Assim, somente na ação penal é submetida ao contraditório, quando as partes podem indicar assistentes técnicos, formular esclarecimentos complementares aos peritos etc.
Os meios de obtenção de prova (busca e apreensão, quebras de sigilo, interceptação telefônica etc.) são realizadas no curso da investigação preliminar e elas, de fato, produzem elementos de informação relevantes, com certa força probante. De igual modo, essas medidas serão posteriormente submetidas ao contraditório judicial.
Portanto, para o Prof. Márcio Anselmo é problemático negar o valor probatório aos elementos colhidos na fase investigatória.
O Prof. Gustavo Badaró distingue as provas entre provas pré-constituídas e provas constituendas.
As PRÉ-CONSTITUÍDAS já existem, elas simplesmente entrarão no procedimento pela autoridade policial e depois serão submetidas ao contraditório no curso da ação penal.
Já as CONSTITUENDAS, como a testemunhal, serão produzidas em contraditório no curso da ação penal. assim, os depoimentos colhidos na investigação teriam a finalidade apenas de confrontar os colhidos em juízo, como forma de dar maior ou menor credibilidade às palavras do depoente.
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
As provas cautelares são submetidas posteriormente ao contraditório judicial.
As não repetíveis não são submetidas em razão do desaparecimento da prova, como, por exemplo, a morte de uma testemunha.
As antecipadas são produzidas em contraditório desde o início, diante do grave risco de perecimento da prova, mediante o incidente de produção antecipada de provas.
O reconhecimento de pessoas e coisas é REPETÍVEL OU NÃO?
Embora haja divergência na doutrina, para o Prof. Márcio Anselmo, o reconhecimento deve ser IRREPETÍVEL. O argumento é o de que, se essa prova for repetida na fase judicial, ela estará viciada pelo ato anterior produzido na fase de investigação.
Portanto, é importante considerá-lo como prova irrepetível e submetê-la, já na investigação, a cautelas distintas, mais exigentes, como a participação da Defesa, tudo a fim de garantir maior higidez desta prova.
Como se dá a utilização / o transporte dos atos de investigação no curso da ação penal?
Em relação às provas pré-constituídas (documentais, por exemplo), não há maiores discussões. Elas serão inseridas no processo e serão submetidas ao contraditório.
A prova pericial, quando realizada na investigação preliminar, não precisa ser refeita. Sua repetição, muitas vezes, é inviável, dado o decurso do tempo. Mas, de igual modo, deve ser garantido o contraditório a posteriori sobre a perícia.
A prova testemunhal, indubitavelmente, deverá ser produzida em contraditório, ressalvadas as hipóteses de prova irrepetível (não é mais possível produzi-la) e a de produção antecipada (ainda que de forma antecipada, ela deve ser produzida em contraditório).
Com base no art. 155 do CPP, o juiz pode basear sua decisão apenas numa prova irrepetível?
Sem dúvida, há questionamentos quanto a isso. Afinal, a prova irrepetível foi produzida SEM contraditório. Há possíveis contrariedades a instrumentos internacionais de direitos humanos, em que pese a conformidade, a princípio, com o teor do art. 155 do CPP.
Para o Prof. Aury Lopes Jr., o inquérito policial / a investigação preliminar deve ser excluído fisicamente da fase judicial do processo. A investigação deveria servir apenas para a formação o juízo do órgão de acusação, para fins de oferecimento da denúncia (opinio delicti). É uma garantia de isenção e imparcialidade do órgão julgador, que não deve ter contado com atos puramente investigativos.
Um problema prático é que o juiz, mesmo não tendo acesso físico à investigação, pode ter tomado conhecimento sobre os fatos, ao determinar medidas submetidas à reserva de jurisdição.
Diante desse problema, o Prof. Aury Lopes defende a existência de um JUÍZ DE GARANTIAS, distinto do JUIZ DA AÇÃO PENAL.
A investigação preliminar deve atingir um grau maior de certeza ou basta um mero juízo de probabilidade para sua conclusão e remessa ao órgão acusador?
Para o Prof. Alexandre Morais da Rosa, a fase de investigação seria uma fase de pré-jogo, bastante relevante porque é nela que são produzidos os elementos que serão levados à fase do jogo propriamente dito, a fase do processo penal, em contraditório.
Parte 6
A figura do investigado e seu defensor
Para doutrina clássica, o procedimento da investigação preliminar possui natureza inquisitiva, via de regra não submetido a nenhum ato de contraditório.
Hoje prevalece o entendimento de que há um contraditório mitigado, permitindo que em alguns atos haja maior participação da Defesa. Embora não seja processo, a investigação possui grande relevância para a fase posterior, pois é nela que são produzidos os primeiros elementos probatórios.
A investigação preliminar não deve se dirigir apenas à Acusação, mas também à Defesa e ao Juízo.
A participação da Defesa:
A alteração do Estatuto da OAB pela Lei nº 13.245/2016 incluiu previsões que asseguram uma maior participação da Defesa nos procedimentos investigatórios.
Art. 7º São direitos do advogado:
XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital;
XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração: 
a) apresentar razões e quesitos;
No mesmo sentido a Súmula Vinculante nº 14: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.”.
Polêmica: exame dos autos pelo advogado sem procuração
Problema da prospecção e captação de clientes nas portas de órgãos e repartições públicos por advogados que ficam no aguardo por um flagrante, uma prisão etc.
Polêmica: investigações complexas com extensão das medidas a direito de terceiros
Casos de quebras de sigilo, por exemplo. Os dados dos terceiros devem ter o sigilo preservado.
Para o Prof. Márcio Anselmo, é a partir do momento do indiciamento que surge a necessidade, o dever de assistência do investigado por advogado, sob pena de nulidade. Antes do indiciamento, é claro que o investigado tem o direito de ser assistido por advogado, mas caso não o seja, não haveria invalidade dos atos praticados.
O Prof. sugere que, no ato de indiciamento, a autoridade presidente da investigação deveria elencar os elementos de informação que apontam para determinada pessoa como autor de uma infração penal e, em seguida, conceder um prazo, antes do interrogatório, para a Defesa apresentar elementos que possam, eventualmente, infirmar a conclusão da investigação. Depois disso, a autoridade poderia reavaliar sua posição, mantendo ou não o indiciamento.
Quando o investigador não possuir advogado, é necessário que seja assistido por Defensor Público.
Apresentação de razões e quesitos pela Defesa:
Em relação às razões, segundo o Prof.é necessário que se estabeleça um prazo, a partir do indiciamento, para que isso seja feito, de modo que a autoridade da investigação possa analisá-los antes do interrogatório e da conclusão do procedimento.
Em relação aos quesitos, é importante assegurá-los como forma de dar maior validade às provas periciais produzidas no bojo da investigação preliminar. De igual modo, o Prof. defende o estabelecimento de um prazo para que a Defesa possa apresentá-los. é uma forma de melhor concretizar a garantia do contraditório na fase investigativa.
Além disso, o Prof. entende que a previsão do Estatuto da OAB assegura também a possibilidade de indicação de assistente técnico pela Defesa na realização da perícia.
Investigação privada
Comuns em grandes estruturas empresariais, em grandes corporações, principalmente em decorrência da Lei Anticorrupção, que mencionou os programas de compliance.
Além da participação da defesa técnica, há uma ampliação do âmbito de atuação privada na investigação preliminar, com a possibilidade de realização de procedimentos de auditoria, fiscalização etc., hoje cada vez mais comuns no ambiente empresarial.
O Prof. Márcio Anselmo entende ser válida a possibilidade de realização de investigação criminal privada, sobretudo nos casos de falhas e ineficiências do órgão responsável pela investigação preliminar. Tudo em garantia dos direitos da vítima ou do investigado.
O procedimento da investigação preliminar, embora tradicionalmente inquisitivo, está sendo cada vez mais dando espaço à garantia do contraditório – embora este seja, por óbvio, mitigado, pois não faria sentido haver duas fases com contraditório pleno. A participação da Defesa na investigação preliminar pode colaborar com o procedimento e servir como filtro a fim de evitar a instauração de um processo criminal temerário, desnecessário. Com tudo isso, busca-se garantir uma investigação preliminar mais democrática, respeitosa dos direitos e garantias fundamentais.

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