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Direitos Reais I

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DIREITOS REAIS I – PAULO FRANCO – 6º PERÍODO
pfmfranco@hotmail.com 
Bibliografia (focar em livros que trazem enunciados do CJF):
 Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald – bom para concursos
Gustavo Tepedino – o Professor gosta, mas minoritário (PGE)
Venosa
Caio Mário
Avaliações 
Prova escrita (com consulta, duas questões discursivas e quatro objetivas)
Prova oral (0,25 pontos por vir, até 0,75 pontos por responder)
Aula I – Introdução Histórica
Ao longo do tempo diversas teorias foram formuladas para conceituar a posse de modo que, atualmente, pode ser subjetiva ou objetiva, existindo também a teoria sociológica. No caso da posse subjetiva, segundo o desenvolvido por Savigny, existiriam dois elementos: corpus (posse física) e animus domini (vontade de ser dono); a época de criação essa teoria bem serviu as necessidades existentes, porém, atualmente já não se adequa a nossa realidade porque dá a posse um caráter instrumental em que ela servia apenas para assegurar o direito de outra pessoa, não fazendo diferença entre posse direta e indireta.
Posteriormente evoluímos então para a teoria objetiva da posse, que visava desprestigiar o elemento subjetivo no Direito Civil, pois que passava a focar no agir da pessoa, não mais atentando à sua intenção para avaliar sua boa-fé – esta olha para o saber ou dever saber daquele que age. A teoria objetiva foi pensada por Ihering que acreditava ter o elemento subjetivo créditos demais, seu pensamento trouxe dois elementos à posse: corpus (que aqui seria igual a uma destinação econômica, não voltado para o possuir em si mesmo, gerando um englobamento de novas situações jurídicas) e afectio tenendi – este se distingue do animus domini por necessitar apenas da aparência de dono, não tendo a ver com a intenção do agente – essa aparência vem pelo jus utendi (usar), jus fruendi (fruir), jus abutendi (dispor) ou jus vindicandi (reivindicar).
O direito de reivindicar pode estar ligado à posse direta, não somente a indireta. Aqui podemos falar do desforço imediato, direito inerente àquele que tem propriedade, também a posse, podendo estas coincidir ou não. Nessa noção existe também a limitação por abuso de direito. Na teoria subjetiva a posse tinha caráter instrumental, pois era referente à defesa do bem, nesse momento posse e propriedade se confundiam, valendo mais esta do que aquela – que apenas reforçava a ideia – e que era tida como um direito absoluto. No Direito Romano a propriedade tinha natureza jurídica de Direito de Personalidade, não de Direito Real economicamente valorável tal qual temos hoje – em que ela é mais do que um direito, é um dever cercado de função social.
O caráter absoluto da propriedade passou a ser questionado com o tempo, principalmente, no Direito Civil, através de uma publicização e uma socialização da filosofia base do mesmo. O Direito Privado passa ainda pela constitucionalização, aplicando-se os Direitos Fundamentais nas relações privadas – eficácia horizontal, de modo que ele deve obedecer regras do Direito Público.
A teoria adotada pelo CC/02 é a de Ihering, onde além da posse devemos ter a aparência de propriedade; teoria objetiva – art. 1.228. Caio Mário fez importante contribuição aqui ao reconhecer a teoria objetiva como extremamente importante, realizando uma junção de corpus com afectio tenendi. Permanecia, entretanto, a dificuldade advinda de uma suposta superioridade da propriedade à posse, pois que é extremamente importante reconhecer que esta também detém função social. A teoria objetiva carrega a crítica de que desprestigia a posse, ponto de onde surge uma terceira teoria: teoria da destinação social da posse ou teoria sociológica da posse, que vem para dizer que esta é de fato regida pelo corpus e pelo afectio tenendi, mas, para além disso, detém uma função social, de modo que o art. 1.228 deve ser lido à luz da mesma.
A dignidade da pessoa humana é o fundamento da função social (art. 1º, III da CRFB), ideia surgida da filosofia Cristã, pois foi o Papa Leão XIII o responsável por pregar a doutrina social da Igreja nas sociedades. A Constituição compromissória é aquela que carrega ideias contraditórias, sendo que o fato de termos a propriedade no art. 5º e a função social no art. 170 não gera uma inconstitucionalidade, pois que normas constitucionais originárias – estas jamais são inconstitucionais, apenas EC podem o ser. A função social da moradia é mais um dos fundamentos que temos para potencializar a função social da posse, o melhor exemplo é o do bem de família, que não pode ser penhorado, bem em que se resguarda o direito de moradia, não exatamente família.
O fundamento constitucional da função social da posse nasce da relativização da propriedade a partir do dito do art. 5º, XXIII, pois que se esta deixa de ser absoluta pode haver uma analogia, assim concluímos que o CC/02 adota a teoria objetiva com os contornos da teoria sociológica da posse.
A decadência é a perda do direito, já a prescrição é a perda da pretensão de se exigir um direito.
Aula II – Características dos Direitos Reais
Os Direitos Reais, art. 1.225, têm como primeira caraterísticas serem absolutos, pois oponíveis erga omnes (o que nasce com o devido registro). Isso significa dizer que qualquer um que tente violá-los sofrerá uma sanção jurídica, mas não significa dizer que são imponíveis. Em segundo lugar são direitos de sequela, ou seja, todo Direito Real acompanha a coisa, é propter rem.
Os Direitos Reais são adquiríveis por várias formas de transmissão, seja originária, seja derivada. Esta última é a mais usual em que tanto bônus, quanto ônus da coisa ficam para o adquirente. Já a primeira não carrega débitos ou direitos para o adquirente; ela se dá em casos específicos como, por exemplo, na compra de carros em leilão do DETRAN – (i) compra em hasta pública, ou na (ii) usucapião, uso da posse para gerar a propriedade – que pode ser de boa ou má-fé (esta em mais tempo, ex. quinze anos).
Litisconsórcio – necessário (deve citar todos os envolvidos na lide, ocorre segundo a lei ou a relação jurídica) ou facultativo (em que há um vínculo de comunhão, conexão ou afinidade). Unitário (mesma decisão para todos os envolvidos) ou simples (as decisões podem ser diversas). Essas classificações não necessariamente têm um vínculo fixo entre seus tipos, a usucapião, por exemplo, é litisconsórcio necessário, porém simples.
O terceiro exemplo de aquisição originária é a (iii) desapropriação realizada pelo Estado. Este, ao pagar a indenização devida, descontará os débitos existentes no imóvel. A indenização deve ser justa e prévia, mas traz problemas no que se refere a sua definição (deveria ser levado em conta o valor de mercado, somado a um x, ponto variável segundo a realidade fática).
Existem três formas de se macular a posse de alguém: esbulho (prejudica o direito de propriedade de alguém, mitigação à posse drástica), turbação (mais branda, em que alguém invade a posse sem impedir que se exerça o direito de propriedade, somente atrapalha; mitigação à posse branda). A primeira chama uma ação de reintegração de posse, já a segunda ação de manutenção de posse. A reintegração se diferencia da imissão, em que nunca houve posse, surgindo esta pela primeira vez, ex. casa leiloada onde a pessoa se recusa a sair.
Dado continuidade à caracterização dos Direito Reais é preciso salientar, em terceiro lugar, terem publicidade, caso contrário seu caráter absoluto ficaria ameaçado (novamente cite-se o registro). A quarta característica, muito importante, traz que são principalmente taxativos, ou seja, limitados ao disposto pelo art. 1.225 e incisos do CC/02 (uso, usufruto, propriedade, superfície, habitação, servidão, promitente comprador (Direitos Reais de fruição) também penhor, hipoteca, anticrese e enfiteuse (esses últimos são Direitos Reais de garantia, ligados a outro direito não necessariamente real, ex. direitos pessoais – que não são erga omnes, nem taxativos). A propriedade é o Direito Real mais importante, pois único direito real que incide sobreo próprio bem de alguém, direito real exercido sobre coisa própria, todos os demais envolvem coisa alheia.
As concessões de uso especial para fins de moradia não eram Direitos Reais, mas foram incluídas pela Lei 11.481/07 no rol do art. 1.225 do CC. A imprescritibilidade dos bens públicos impede sua usucapião, surge esse instrumento então para legitimar a posse que vige nessas circunstâncias (a exemplo aquela existente nas favelas) isso ocorre com base na teoria sociológica da posse, sendo importante porque gera um série de garantias, como por exemplo, o direito ao desforço imediato.
Os direitos reais de garantia são distinguidos das obrigações com eficácia real e são mais fáceis de se verificar, a exemplo o penhor: mútuo feneratício garantido com uma joia, vindo sob as regras aplicáveis aos direitos reais. As obrigações surgem a partir de um direito pessoal com cláusula de eficácia real, ex. doação com encargo de habitação. Esta cláusula visa garantir a uma obrigação pessoal prerrogativas dos direitos reais, suas características. Dentro dessa diferença temos os credores pignoratícios, hipotecários e anticréticos.
Dentro desse rol é preciso observar que a enfiteuse não se encontra expressa em lei, pois que foi retirada do ordenamento, valendo ainda aquelas já existentes. A enfiteuse diferenciava o domínio útil e o domínio direito, este era o detentor da propriedade nua (sem direito de usar, fruir etc.), já aquele tinha os direitos de propriedade, mas conjuntamente com outra pessoa, pagando um valor ?
Gravames são ônus reais; ou são as obrigações com ônus real ou são relacionados a um Direito Real de garantia.
A posse também não está prevista no dispositivo, surgindo aqui alguns debates. Para uma corrente, de início, não se enquadraria como Direito Real, mas seria um fato jurídico, já que (i) não adequada ao princípio da taxatividade (ii) gerando direitos independentemente de formalidade – teoria mais lógica para o Professor Paulo, porém minoritária. Na segunda corrente, seguindo o pensamento de Savigny, a posse seria um direito uma vez que outros decorrem da mesma (aparentemente contraria toda separação feita entre propriedade e posse). Esta é a teoria predominante, mas enfrenta conflitos internos para dizer se é o direito real ou pessoal, seguindo por esse último para não quebrar o princípio da taxatividade. O problema de ser um direito pessoal é que não se pode valer da flexibilidade do desforço imediato, pois o monopólio da jurisdição pertence ao Estado (observar que não o da Justiça, tanto que temos os meios alternativos de resolução dos conflitos). Por fim, para Teixeira de Freitas a posse seria um fato direito porque não depende de formalidades e é juridicamente assegurada pelo ordenamento.
Posse ad usucapionen – admite a usucapião. Posse ad interdict – não admite a usucapião.
No que se refere à posse, sendo o terreno de domínio público se faz necessária a concessão de direitos para fins de moradia, sendo privado é preciso a usucapião ou a expropriação social para fins de moradia (art. 1.228, §4º); segundo o Professor esse instituto criado pelo CC é problemático porque não caracteriza nem desapropriação, nem expropriação, nem mesmo usucapião. Na verdade a lei misturou todos os institutos: denomina expropriação; pede que se exerça posse mansa, plena e pacífica por cinco anos cumprindo a função social; para além, no §5º se impõe ao juiz a determinação de uma indenização ao proprietário. O instituto se aproxima da concessão para fins de moradia, mas tem tempo e indenização previstos.
A expropriação se diferencia da desapropriação por não gerar indenização, ocorre em duas hipóteses: plantação de plantas psicotrópicas e reconhecimento de exploração de mão-de-obra análoga à escrava (art. 243 p.u., CRFB – EC nº 81/14).
No Direito Civil a tipicidade se refere a estar previamente previsto em lei ou não; não exige que cada um dos direitos reais tenha sua formatação prevista em lei; exigir que o conteúdo do direito esteja previsto é diferente de se exigir a taxatividade. O princípio da tipicidade não se aplica aos direitos reais, assim a forma como são regulados fica a cargo do particular, assim, o quinto princípio e último é o da autonomia privada.
Multipropriedade ou time sharing – ex. casa de praia adquirida em grupo onde não se quer o exercício da propriedade em condomínio; divide-se o ano em meses que caberão plenamente a cada parte. Aqui há posse e propriedade plena durante certo período: cada um pode alugar, vender, penhorar, tudo no seu tempo e durante este (é propriedade plena porque pode ser oposta inclusive aos outros donos). Essa prática já existia no EUA e agora fica permitida no Brasil. Existe o direito de preferência, pois que em geral a relação é ligada às pessoas.
Aula III – Direitos possessórios
Existem dois tipos de direitos possessórios a se exercer sobre um bem: jus possidendi e jus possessionis. O primeiro decorre de uma relação jurídica em que alguém previamente adquiriu aquele direito de propriedade, tendo direitos de propriedade garantidos, sendo um poder de direito que não necessariamente está ligado à posse. O segundo decorre de uma relação fática, do exercício da posse meramente. É preciso observar, entretanto, que o direito de posse traz um poder de fato só exercido por quem a detém, sendo que o proprietário apenas o fará se também estiver ali. O direito de defesa é de quem tem o jus possessionis, mas não necessariamente de quem detém o jus possidendi.
O detentor é abordado no art. 1.198 do CC, aquele que exerce todos os direitos de posse, mas não é possuidor. Detenção é a posse degradada. As ações possessórias são permitidas a quem tem o jus possessionis, o poder de fato, seja possuidor, seja detentor. Enunciado 301 do CJF: o detentor pode defender a posse contra qualquer um que não seja o proprietário. O possuidor pode atuar contra o proprietário em dados casos, a exemplo, a locação de espaço comercial.
O possuidor tem basicamente três possibilidades de defesa (ações possessórias, interditos possessório): reintegração de posse (retomar o que se perdeu com esbulho), manutenção de posse (impedir que se perca a posse atentada por turbação), interdito proibitório (qualquer outra violação em sentido de ameaça; ex. ação de nunciação de obra nova – a começar; embargo de obra – já iniciada). Já o proprietário não conta com essas ações, sendo autorizado pelo ordenamento a ingressar com uma ação de imissão na posse, ação petitória, materializa o direito de petição. O art. 1.228 deve ser ligado ao art. 1.208 do CC; o detentor pode agir com desforço imediato, ele é o servo ou fâmulo da posse (cuida da posse a pedido de alguém) ou é alguém que esta ali por permissão (anterior) ou tolerância (posterior) do proprietário.
Quando o CC autorizou o desforço imediato foi como exceção, devendo ser então interpretado com restrição, pois que qualquer irrazoabilidade pode levar ao âmbito Penal. O ataque vindo contra o desforço imediato nunca é legítima defesa, pois não caracteriza reação a uma agressão injusta.
O princípio da boa-fé se refere sempre a boa-fé objetiva, pois que esta traz maior segurança jurídica as partes do que a subjetiva. A boa-fé envolve a cooperação (alusão: um jogo de frescobol, não de tênis), contendo alguns elementos: (i) venire contra factum proprium – vedação aos atos contraditórios (não se pode gerar em outras pessoas esperanças sobre aquilo que não se pode cumprir. O Estado ao motivar seus atos cria expectativas de seguranças nas pessoas no que se refere a um controle, assim também deveria respeitar esse pressuposto. Aqui é preciso observar a má-fé, se existente está presente o venire, se não, costuma-se utilizar da fala de ilicitude, passando ao segundo elemento). (ii) Inalegabilidade de nulidades formais; (iii) duty to mitigate the loss – impedir o agravamento da situação de alguém que incorre em dano. (iv) tu quoque – não se pode exigir de outrem aquilo que não se faz (exceptio adimpleti contractus), no entanto é preciso pensar no adimplemento substancialbaseado no princípio da manutenção dos contratos. (v) supressio (verwirkung) e surressio (erwirkung). Essas duas últimas figuras da boa-fé importante muito para os direitos reais, pois que podem permitir que a má-fé se transforme em boa-fé.
Aula IV – Detenção
Aquele que atua em causa própria tem legitimidade ordinária e isso só pode ser feito em vida. Sobrevindo a morte transmite-se o reflexo patrimonial, a exemplo, do dano moral (reflexo ou em ricochete); art. 943, CC. Aquele que atua em legitimidade extraordinária (autorizada por lei) atua em nome próprio, mas por um direito alheio, ex. MP defendendo Direito Individual Homogêneo.
A capacidade de ser parte se refere à personalidade jurídica (atributo que permite a obtenção de direitos e contração de deveres) e sua característica de capacidade de direito, já a capacidade de estar em juízo está ligada à capacidade de fato. A capacidade postulatória é a de postular em juízo, em geral, ligada aos advogados. Devido ao Estatuto da Pessoa com Deficiência atualmente o único absolutamente incapaz em nosso ordenamento é o menor de dezesseis anos – art. 3º do CC.
Segundo o STF os direitos relacionados a questões da ditadura são imprescritíveis.
A detenção é a posse degrada que não pode ser oposta ao proprietário, tendo, em primeira hipótese, um vínculo de autorização e dependência. Não é uma posse, mas um poder de fato, pois não se pode discutir a existência de direitos inerentes a sua presença na relação. A detenção deixa de ser detenção quando não conta com permissão ou tolerância, surgindo assim a posse injusta.
A detenção, quando passa pelo momento de disputa do bem, pode envolver violência, clandestinidade ou precariedade (no sentido da força do título, documento que a justifica) – momento T1. A posse injusta é clandestina, violenta ou precária, dependendo do conhecimento de alguém para sua caracterização (publicidade), envolvendo ainda o tempo (pois se pode tentar a retirada do indivíduo). O correto seria dizer posse pós-clandestinidade, pós-violência ou pós-precariedade, pois é injusta, mas ostensiva, pacífica ou mansa; a posse injusta é aquela que acontece após a cessação da clandestinidade, violência ou precariedade.
Uma vez na posse jamais se retorna à detenção, ou ela virará justa ou acabará por reclamação do proprietário. A detenção não questionada não permanece assim ad eternun, é possível convertê-la em posse uma vez que a subordinação seja rompida segundo o enunciado 301 do CJF – ex. fâmulo da posse. É preciso observar o âmbito de aplicação deste, voltado à relação de subordinação.
Em 28/09 uma pessoa invade um imóvel; há detenção. Em 28/10 duas outras pessoas percebem o fato; posse injusta. A partir daqui contará o prazo para a usucapião se tinha o proprietário igualmente a capacidade de notar a situação. O prazo da usucapião varia na situação fática conforme a destinação dada costumeiramente ao bem pelo proprietário, ex. casa de praia.
No exemplo de Gabriela na casa emprestada por Vinícius não havia uma relação de subordinação para ser rompida, mas a transmutação de detenção para a posse injusta veio pelo fato de ela se negar a sair do imóvel. Posteriormente a posse se tornou justa por força da boa-fé, a partir dos institutos de surresio e supressio devido à criação de uma expectativa de direito para Gabriela frente a inércia de Vinícius. Se Vini permanece reclamando após o “dia do ultimato” (quando ainda havia detenção – autorização) se manteria a questão na posse injusta, que poderá levar a uma ação de reintegração.
No caso da permissão ou tolerância há divergência na jurisprudência que, por vezes, pensa ser grave nascer da boa-fé um direito possessório, mas existindo também posições favoráveis ao fato. Na doutrina a maioria não aceita essa possibilidade, mas Cristiano Chaves de Farias é favorável.
O direito de retenção tem como pressuposto a posse justa. O art. 1.219, CC fala sobre esse nas situações em que se comprova a de boa-fé, se referindo as benfeitorias úteis e necessárias.
A quarta hipótese de detenção se refere às coisas ilícitas. Sobre essas recai sempre a detenção, pois que posse se dá apenas sobre bem lícitos. Ex. furto de uma carteira – posse (bem lícito de per si) x porte de drogas em grande quantidade – detenção (bem ilícito de per si); descaminho x contrabando etc. Obs. no Direito Real o que importa é sempre a coisa.
A quinta hipótese traz os bens públicos e aqui, para todos os efeitos, é necessário entender que a detenção não se transforma em posse. Temos como bens públicos (imprescritíveis, impenhoráveis e de alienabilidade condicionada a não afetação) os de uso comum (todos podem usar), os de uso especial (todos podem usar, mas há uma destinação, a chamada afetação, finalidade pública, ex. UFF) e os dominicais (não têm finalidade pública, destinação – podendo ser vendidos). Os bens dominicais são alienáveis, mas imprescritíveis e impenhoráveis. Um bem de uso comum e um bem de uso especial podem ser vendidos se desafetados (por nova lei ou decreto que revogue a ordem anterior).
Como regra, ao se ocupar um bem púbico se exerce detenção, não posse, logo, não há usucapião. Com relação aos bens dominicais surgiria uma dúvida porque constitucionalmente também se resguarda a função social; a doutrina majoritariamente não aceita a usucapião de bens públicos por motivos de prevalência do interesse público. Entretanto, esse é um dos casos em que a lei consagrou um direito não dado sequer pela jurisprudência: a Lei 11.977/09, “Programa Minha Casa, Minha Vida”, em seu art. 60 trouxe uma possibilidade de usucapião extrajudicial que autoriza que o indivíduo, apresentando um documento de prova de posse - concessão especial de direito real para fins de moradia - (art. 59) e preenchendo certos requisitos, transforme esta em propriedade (art. 60). Essa lei reconheceu uma situação fática, a grande ocupação de imóveis públicos por diversas famílias.
Imprescritibilidade se refere a não poder usucapir o bem público, ou seja, alcançar sua propriedade. É importante aqui perceber que propriedade não é posse, assim pode esta existir – Tepedino já havia alcançado esse raciocínio antes da Lei do “Minha Casa, Minha Vida”; caberá uma posse ad interdict (posse que por um título impede que outro tenha animus domini). Havendo a detenção do bem público se pode pleitear a posse no Cartório (art. 1.225, XI, CC), alcançada essa e passados cinco anos com todos os requisitos preenchidos se pode pedir a usucapião (Lei MCMV) – assim há tempo de o Estado tomar o bem de volta.
Nem toda posse justa é de boa-fé. Um ladrão rouba algo e vende a um camelô; este tem posse injusta (receptação; precariedade por falta de título), mas de boa-fé.
A MP 1.220 trouxe a matéria da concessão de uso especial para fins de moradia, legitimando o fato de que bem público admite posse (se existe presença por mais de cinco anos, sendo o bem de até 250m² e único da família). A especialidade da concessão é ser ato administrativo vinculado, aquele que deve vir segundo o que a lei dispuser, não havendo margem de discricionariedade. Este ato legitima a pose que já existia antes, mas não gerará jamais a propriedade. A concessão finda a detenção porque encerra o caráter de precariedade. No entanto, é preciso afirmar que ao entender majoritário há apenas e ainda uma detenção. O art. 5º da MP permite ao Estado dar outro bem no lugar daquele ocupado se existe interesse em destinação pública. É ato vinculado, mas precário, podendo assim a pessoa perder o direito. O art. 8º elenca hipóteses de perda do direito, uma delas a destinação diversa à moradia (inciso I), outra a compra de um imóvel para moradia.
A lei 11.977/09, Lei do MCMV, trouxe no art. 53 a hipótese de regularização fundiária, que vai desaguar na legitimação da posse. De início já se percebe a diferença para a concessão, pois se dá ao Poder Público a opção de avaliar a situação fática. Primeiramente cabe um licenciamento ambiental (§1º), após a análise do cumprimento de função social – uso aproveitado do solo,edificação da propriedade etc. (no caso há mecanismos de índole ambiental). O art. 59 corrobora a posse, não a detenção, pois desmembra a propriedade do Estado, dando a esse a posse indireta e àquele que tem o título do MCMV a posse direta, que será também justa – ad interdict. O dispositivo MCMV se diferencia da concessão que garante a moradia, pois traz a posse do lugar de fato ocupado, sendo os direitos maiores e voltados ao imóvel especificado. No primeiro caso caberá defesa até contra o próprio Estado. Ambos os direitos são transmissíveis aos herdeiros, desde que estes cumpram os requisitos legais.
Aula V – Aspectos processuais da posse
Em primeiro lugar é preciso entender os elementos da ação: partes, causa de pedir e pedido, também as condições da ação: legitimidade da parte e interesse de agir. A possibilidade jurídica do pedido atualmente é tida como pressuposto processual ou questão de mérito (julga improcedência) – tese preferida pelo Professor Paulo, pois se tida como condição traria a extinção do processo sem resolução de mérito, permitindo novo processo por até três vezes (após vem a perempção).
Os pressupostos processuais são demandas regularmente feitas por partes capazes para a jurisdição. Que, se ausentes, geram também a extinção do processo sem resolução de mérito, sendo esse pensamento criticado por não mudar o quadro anteriormente existente.
O art. 554 do NCPC permite que o juiz aproveite o pedido possessório feito independentemente da forma utilizada. O §1º traz a possibilidade de formação de um litisconsórcio passivo necessário simples, sendo multitudinário por incluir vários réus, mas não permitindo a limitação, o desmembramento, pois que isso somente ocorre no litisconsórcio facultativo.
O art. 555 do NCPC permite que o pedido possessório seja cumulado com o de perdas e danos e de indenização. O art. 556 trata do réu na contestação, abordando o pedido contraposto presente na situação em que este foi de algum modo lesado. Ex. locador que invade imóvel locado. Isso ocorre porque a ação possessória tem natureza dúplice, onde a negativa do pedido de uma parte gera a afirmação do direito de outra. O art. 557 proíbe que se debata propriedade em sede de ação possessória, salvo em face de terceiro.
O art. 558 diferencia a posse nova e a posse velha, se remetendo mais especificamente à primeira, pois de até um ano e um dia. A posse velha não conta com tal procedimento especial, mais célere, mas sim com o rito ordinário. (observar art. 1.224, CC e ECJF 495). Somente aquele que tem uma posse nova pode pleitear a decisão liminar, antecipar decisão por cognição sumária devido a existência de periculum in mora ou fumus boni juris (não exauriente), isto porque após o período de um ano e um dia diminui o teor da preocupação – o que não significa necessariamente a perda do direito à liminar.
No antigo CPC tínhamos aqui a medida cautelar ou a tutela antecipada, sendo que nas duas situações o juiz antecipava a decisão para evitar o perecimento do direito. Já atualmente, com o NCPC, encerra-se a ação cautelar, existindo ainda medidas cautelares incidentais, ou seja, surgidas no curso do processo. Sequestro serve para garantir a entrega de um bem, arresto serve para ?. A nova norma desmembrou a liminar em duas hipóteses: tutela de urgência, art. 300 do NCPC (provar o perigo da demora e direito aparente) e tutela de evidência, art. 311 (direito aparente). A primeira é desmembrada em antecipada (antecipar os efetivo da decisão final) e cautelar. A segunda nada mais é do que tutela a antecipada com base no art. 273, §6º do antigo CPC, antecipa a decisão final por ser o direito evidente. A liminar pode ser deferida sem que se ouça a outra parte, caso da posse nova, liminar inaudita altera pars; casos de tutela de urgência, evidência e monitória de evidência. O art. 311 fala sobre a tutela de evidência, estando aqui a reipersecutória (ligada a bens móveis).
Quando se descumpre súmula vinculante cabe reclamação
O art. 560 do NCP trata primeiramente da manutenção e da reintegração de posse e o art. 561 exige para tais determinadas provas: a posse, o ato de esbulho ou turbação e sua data. Esta vem definida pelo disposto no art. 1.224 do CC, abordando a data do conhecimento e inércia do proprietário, ou a data da tentativa de atuação e repressão violenta. Este artigo é fundamental então para definir quando a detenção vira posse injusta, também quando é a posse nova ou velha.
Assim, existem duas situações a serem observadas: (i) se todo mundo sabia da posse, menos o proprietário, prestigia-se a função social do bem usando-se desta data (cessar da clandestinidade, boa-fé) para a contagem; (ii) se apenas alguns sabiam surge o art. 1.224, prazo contado apenas quando o proprietário souber.
O 1.224 é incompatível com a função social no primeiro caso. O enunciado 495 do CJF afirma que o desforço imediato, art. 1.210 do CC, deve ser interpretado restritivamente, literalmente imediato ao esbulho ou a turbação, pois sua expansão legitimaria a autotutela que é afastada, em geral, em nosso ordenamento, assim não cabe no caso hipótese justificada por função social ou boa-fé para que este seja utilizado posteriormente. O art. 1.224 é incompatível com o art. 1.210 porque este deve ser imediato; embora se perca a posse no momento em que se tenta fazer algo, esse fazer não é considerado desforço imediato, devendo o autor não se utilizar da força, mas sim das ações possessórias. Ou seja, o art. 1.224 deve ser ampliado nas hipóteses de contagem do prazo, mas restrito no caso do desforço imediato.

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