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3970 CRÍTICA DA RAZÃO PURA

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INTRODUÇÃO (B) B 1 
 
 
1 
 
DA DIFERENÇA ENTRE CONHECIMENTO PURO 
E CONHECIMENTO EMPIRICO 
 
 
Não resta dúvida de que todo o nosso conhecimento começa 
pela experiência; efetivamente, que outra coisa poderia despertar e 
pôr em ação a nossa capacidade de conhecer senão os objetos que 
afetam os sentidos e que, por um lado, originam por si mesmos as 
representações e, por outro lado, põem em movimento a nossa 
faculdade intelectual e levam-na a compará-las, ligá-las ou separá-
las, transformando assim a matéria bruta das impressões sensíveis 
num conhecimento que se denomina experiência? Assim, na ordem 
do tempo, nenhum conhecimento precede em nós a experiência e é 
com esta que todo o conhecimento tem o seu início. 
Se, porém, todo o conhecimento se inicia com a experiência, 
isso não prova que todo ele derive da experiência. Pois bem poderia 
o nosso próprio conhecimento por experiência ser um composto do 
que recebemos através das impressões sensíveis e daquilo que a 
nossa própria capacidade de conhecer (apenas posta em ação por 
impressões sensíveis) produz por si mesma, acréscimo esse que não 
distinguimos dessa I matéria-prima, enquanto a nossa atenção não 
despertar por um longo exercício que nos torne aptos a separá-los. 
B 2 
Há pois, pelo menos, uma questão que carece de um estudo 
mais atento e que não se resolve à primeira vista; vem a 
ser esta: se haverá um conhecimento assim, independente da 
experiência e de todas as impressões dos sentidos. Denomina-se a 
priori esse conhecimento e distingue-se do empírico, cuja origem é 
a posteriori, ou seja, na experiência. 
Esta expressão não é, contudo, ainda suficientemente definida 
para designar de um modo conveniente todo o sentido da questão 
apresentada. Na verdade, costuma dizer-se de alguns 
conhecimentos, provenientes de fontes da experiência, que deles 
somos capazes ou os possuímos a priori, porque os não derivamos 
imediatamente da experiência, mas de uma regra geral, que todavia 
fomos buscar à experiência. Assim, diz-se de alguém, que minou os 
alicerces da sua casa, que podia saber a priori que ela havia de ruir, 
isto é, que não deveria esperar, para saber pela experiência, o real 
desmoronamento. Contudo, não poderia sabê-lo totalmente a priori, 
pois era necessário ter-lhe sido revelado anteriormente, pela 
experiência, que os corpos são pesados e caem quando lhes é 
retirado o sustentáculo. 
Por esta razão designaremos, doravante, por juízos a priori, 
não aqueles que não dependem desta ou daquela experiência, I mas 
aqueles em que se verifica absoluta independência de toda e 
qualquer experiência. Dos conhecimentos a priori, são puros 
aqueles em que nada de empírico se mistura. Assim, por exemplo, a 
proposição, segundo a qual toda a mudança tem uma causa, é uma 
proposição a priori, mas não é pura, porque a mudança é um 
conceito que só pode extrair-se da experiência. 
B 3
 
 
 
 
II 
 
ESTAMOS DE POSSE DE DETERMINADOS CONHECIMENTOS 
A PRIORI E MESMO O SENSO COMUM NUNCA DELES 
É DESTITUIDO 
 
 
Necessitamos agora de um critério pelo qual possamos 
distinguir seguramente um conhecimento puro de um 
conhecimento empírico. É verdade que a experiência nos ensina, 
que 
algo é constituído desta ou daquela maneira, mas não que não 
possa sê-lo diferentemente. Em primeiro lugar, se encontrarmos 
uma proposição que apenas se possa pensar como necessária, 
estamos em presença de um juízo a priori; se, além disso, essa 
proposição não for derivada de nenhuma outra, que por seu turno 
tenha o valor de uma proposição necessária, então é absolutamente 
a priori. Em segundo lugar, a experiência não concede nunca aos 
seus juízos uma universalidade verdadeira e rigorosa, apenas 
universalidade suposta e comparativa (por indução), de tal modo 
que, em verdade, antes se deveria dizer: tanto quanto até agora nos 
foi dado I verificar, não se encontram exceções a esta ou àquela 
regra. Portanto, se um juízo é pensado com rigorosa 
universalidade, quer dizer, de tal modo que, nenhuma exceção se 
admite como possível, não é derivado da experiência, mas é 
absolutamente válido a priori. A universalidade empírica é, assim, 
uma extensão arbitrária da validade, em que se transfere para a 
totalidade dos casos a validade da maioria, como, por exemplo, na 
seguinte proposição: todos os corpos são pesados. Em 
contrapartida, sempre que a um juízo pertence, essencialmente, 
uma rigorosa universalidade, este juízo provém de uma fonte 
particular do conhecimento, a saber, de uma faculdade de 
conhecimento a priori. Necessidade e rigorosa universalidade são 
pois os sinais seguros de um conhecimento a priori e são 
inseparáveis uma da outra. Porém, como na prática é umas vezes 
mais fácil de mostrar a limitação empírica do que a contingência 
dos juízos e outras vezes mais conveniente mostrar a 
universalidade ilimitada, que atribuímos a um juízo, do que a sua 
necessidade, é aconselhável servirmo-nos, separadamente, dos dois 
critérios, cada um dos quais é de per si infalível. 
B 4 
É fácil mostrar que há realmente no conhecimento humano 
juízos necessários e universais, no mais rigoroso sentido, ou seja, 
juízos puros a priori. Se quisermos um exemplo, extraído das 
ciências, basta volver os olhos para todos os juízos da matemática; 
se quisermos um exemplo, tirado do uso I mais comum do 
entendimento, pode servir-nos a proposição, segundo a qual todas a 
mudanças têm que ter uma causa. Neste último, o conceito de uma 
causa contém, tão manifestamente, o conceito 
B 5 
de uma ligação necessária com um efeito e uma rigorosa 
universalidade da regra, que esse conceito de causa totalmente se 
perderia, se quiséssemos derivá-lo, como Hume o fez, de uma 
associação freqüente do fato atual com o fato precedente e de um 
hábito daí resultante (de uma necessidade, portanto, apenas 
subjetiva) de ligar entre si representações. Poder-se-ia também 
demonstrar, sem haver necessidade de recorrer a exemplos 
semelhantes, a realidade de princípios puros a priori no nosso 
conhecimento, que estes princípios são imprescindíveis para a 
própria possibilidade da experiência, por conseguinte, expor a sua 
necessidade a priori. Pois onde iria a própria experiência buscar a 
certeza, se todas as regras, segundo as quais progride, fossem 
continuamente empíricas e, portanto, contingentes? Seria difícil, por 
causa disso, dar a essas regras o valor de primeiros princípios. Neste 
lugar podemo-nos bastar com ter exposto, a título de fato, 
juntamente com os seus critérios, o uso puro da nossa capacidade de 
conhecer. Todavia não é apenas nos juízos, mas ainda em alguns 
conceitos, que se revela uma origem a priori. Eliminai, pouco a 
pouco, do vosso conceito de experiência de um corpo tudo o que 
nele é empírico, a cor, a rugosidade ou macieza, o peso, a própria 
impenetrabilidade; restará, por fim, o espaço que esse corpo (agora 
totalmente desaparecido) ocupava e que I não podereis eliminar. De 
igual modo, se eliminardes do vosso conceito empírico de qualquer 
objeto, seja ele corporal ou não, todas as qualidades que a 
experiência vos ensinou, não poderíeis contudo retirar-lhe aquelas 
pelas quais o pensais como substância ou como inerente a uma 
substância (embora este conceito contenha mais determinações do 
que o conceito de um objeto em geral). Obrigados pela necessidade 
com que este conceito se vos impõe, tereis de admitir que tem a sua 
sede a priori na nossa faculdade de conhecer. 
B 6
III 
 
A FILOSOFIA CARECE DE UMA CIÊNCIA QUE DETERMINE 
A POSSIBILIDADE, OS PRINCIPIOS E A EXTENSÃO DE TODO 
O CONHECIMENTO A PRIORI 
 
O que é mais significativo 1 ainda [do que as precedentes 
considerações] é o fato de certos conhecimentos saírem do campo 
de todas I as experiências possíveis e, mediante conceitos, aos quais 
a experiência não pode apresentarobjeto correspondente, 
aparentarem estender os nossos juízos para além de todos os limites 
da experiência. 
A 3
É precisamente em relação a estes conhecimentos, que se 
elevam acima do mundo sensível, em que a experiência não pode 
dar um fio condutor nem correção, que se situam as investigações 
da nossa razão, as quais, por sua importância, consideramos I 
eminentemente preferíveis e muito mais sublimes quanto ao seu 
significado último, do que tudo o que o entendimento nos pode 
ensinar no campo dos fenômenos. Por esse motivo, mesmo 
correndo o risco de nos enganarmos, preferimos arriscar tudo a 
desistir de tão importantes pesquisas, qualquer que seja o motivo, 
dificuldade, menosprezo ou indiferença. [Estes problemas 
inevitáveis da própria razão pura são Deus, a liberdade e a 
imortalidade e a ciência que, com todos os seus requisitos, tem por 
verdadeira finalidade a resolução destes problemas chama-se 
metafísica. O seu proceder metódico é, de início, dogmático, isto é, 
aborda confiadamente a realização de tão magna empresa, sem 
previamente examinar a sua capacidade ou incapacidade.] 
B 7
Ora, parece sem dúvida natural que, abandonando o terreno da 
experiência, se não proceda imediatamente à construção de um 
edifício, com os conhecimentos que se possuem sem saber donde e 
a crédito de princípios cuja origem se ignora, sem que primeiro se 
tenham assegurado os seus fundamentos mediante cuidadosas 
investigações e [o que é mais], sem que já 
________________ 
 
¹ A: Mas o que é mais significativo. 
de há muito se não tivesse levantado a questão de saber como 
poderia o entendimento ter atingido esses conhecimentos a priori e 
qual a extensão, o valor e o preço que possuem. I De fato, nada 
seria mais natural, se por esta palavra [natural] entendermos o que I 
de modo razoável e justo deveria suceder; mas, se por ela se 
entende o que habitualmente acontece, então nada de mais natural 
e compreensível do que se ter omitido por muito tempo esta 
indagação. Pois que uma parte desses conhecimentos, [como sejam 
os de] a matemática, há muito que é do domínio da certeza, dando 
assim favorável esperança para os outros, embora estes últimos 
possam ser de natureza completamente diferente. Além disso, 
quando se ultrapassa o círculo da experiência, há a certeza de não 
ser refutado pela experiência. O anseio de alargar os 
conhecimentos é tão forte, que só uma clara contradição com que 
se esbarre pode impedir o seu avanço. Esta contradição, porém, 
pode ser evitada se procedermos cautelosamente na elaboração das 
nossas ficções, sem que por isso deixem de ser menos ficções. A 
matemática oferece-nos um exemplo brilhante de quanto se pode ir 
longe no conhecimento a priori, independente da experiência. É 
certo que se ocupa de objetos e de conhecimentos, apenas na 
medida em que se podem representar na intuição. Mas facilmente 
se deixa de reparar nesta circunstância, porque essa intuição 
mesma pode ser dada a priori e, portanto, mal se distingue de um 
simples conceito puro. Seduzido ¹ por uma tal prova de força da 
razão, I o impulso de ir mais além não vê limites. A leve pomba, ao 
sulcar livremente o ar, cuja resistência sente, poderia crer que no 
vácuo melhor ainda conseguiria I desferir o seu vôo. Foi 
precisamente assim que Platão abandonou o mundo dos sentidos, 
porque esse mundo opunha ao entendimento limites tão estreitos 2 
e, nas asas das idéias, abalançou-se no espaço vazio do 
entendimento puro. Não reparou que os seus esforços não 
logravam abrir caminho, porque não tinha um ponto de apoio, 
como que um suporte, em que se pudesse firmar e aplicar as 
A 4 
B 8 
A 5 
 
B 9 
____________________ 
 
¹ A: Encorajado. 
² A: opõe ao entendimento demasiados obstáculos diversos. 
suas forças para mover o entendimento. É, porém, o destino 
corrente da razão humana, na especulação, concluir o seu edifício 
tão cedo quanto possível e só depois examinar se ele possui bons 
fundamentos. Procura então toda a espécie de pretextos para se 
persuadir da sua solidez ou [até] para impedir [inteiramente] 
semelhante exame, tardio e perigoso. Enquanto construímos, algo 
nos liberta de todo o cuidado e suspeita, e até falsamente nos 
convence de aparente rigor. E que uma grande parte, talvez a maior 
parte da atividade da nossa razão, consiste em análises dos 
conceitos que já possuímos de objetos. Isto fornece-nos uma porção 
de conhecimentos que, não sendo embora mais do que 
esclarecimentos ou explicações do que já foi pensado nos nossos 
conceitos (embora ainda confusamente), são apreciados, pelo menos 
no tocante à forma, como novas intelecções, embora, no tocante à 
matéria ou ao conteúdo, não ampliem os conceitos já adquiridos, 
apenas os decomponham. I Como este procedimento dá um 
conhecimento real a priori e marca um progresso seguro e útil, a 
razão, sem que disso se aperceba, faz desprevenidamente 
afirmações de espécie completamente diferente, em que acrescenta 
a conceitos dados ¹ outros conceitos de todo alheios [e precisamente 
a priori,] ignorando como chegou a esse ponto e nem sequer lhe 
ocorrendo pôr semelhante questão. Eis porque tratarei 
primeiramente da distinção dessa dupla forma de conhecimento. 
B 10 
 
 
 
[IV] 
DA DISTINÇÃO ENTRE JUIZOS ANALITICOS 
E JUIZOS SINTÉTICOS 
 
Em todos os juízos, nos quais se pensa a relação entre um 
sujeito e um predicado (apenas considero os juízos afirmativos, 
porque é fácil depois a aplicação aos negativos), esta relação é 
possível de dois modos. Ou o predicado B pertence ao sujeito A 
_____________________ 
 
¹ Em A acrescenta-se: a priori. 
como algo que está contido (implicitamente) nesse conceito A, ou B 
está totalmente fora do conceito A, embora em ligação com ele. No 
primeiro caso chamo analítico ao juízo, no segundo, I sintético. 
Portanto, os juízos (os afirmativos) são analíticos, quando a ligação 
do sujeito com o predicado é pensada por identidade; aqueles, 
porém, em que essa ligação é pensada sem identidade, deverão 
chamar-se juízos sintéticos. I Os primeiros poderiam igualmente 
denominar-se juízos explicativos; os segundos, juízo extensivos; 
porque naqueles o predicado nada acrescenta ao conceito do sujeito 
e apenas pela análise o decompõe nos conceitos parciais, que já nele 
estavam pensados (embora confusamente); ao passo que os outros 
juízos, pelo contrário, acrescentam ao conceito de sujeito um 
predicado que nele não estava pensado e dele não podia ser extraído 
por qualquer decomposição. Quando digo, por exemplo, que todos 
os corpos são extensos, enuncio um juízo analítico, pois não preciso 
de ultrapassar o conceito que ligo à palavra corpo para encontrar a 
extensão que lhe está unida; basta-me decompor o conceito, isto é, 
tomar consciência do diverso que sempre penso nele, para encontrar 
este predicado; é pois um juízo analítico. Em contra-partida, quando 
digo que todos os corpos são pesados, aqui o predicado é algo de 
completamente diferente do que penso no simples conceito de um 
corpo em geral. A adjunção de tal predicado produz, pois, um juízo 
sintético. 
A 7
B 11
[Os juízos de experiência, como tais, são todos sintéticos, pois 
seria absurdo fundar sobre a experiência um juízo analítico, uma 
vez que não preciso de sair do meu conceito para formular o juízo e, 
por conseguinte, não careço do testemunho da experiência. Que um 
corpo seja extenso é uma proposição que se verifica a priori e não 
um I juízo de experiência. Porque antes de passar à experiência já 
possuo no conceito todas as condições para o meu juízo; basta 
extrair-lhe o predicado segundo o princípio de contradição para, 
simultaneamente, adquirir a consciência da necessidade do juízo, 
necessidade essa que a experiência nunca me poderia ensinar. Pelo 
contrário, embora eu já não incluía no conceito de um corpo em 
geral o predicadodo peso, esse conceito indica, todavia, um objeto 
da experiência 
B 12
obtido mediante uma parte desta experiência, à qual posso ainda 
acrescentar outras partes dessa mesma experiência, diferentes das 
que pertencem ao conceito de objeto. Posso ainda previamente 
conhecer o conceito de corpo, analiticamente, pelas características 
da extensão, da impenetrabilidade, da figura, etc., todas elas 
pensadas nesse conceito. Ampliando agora o conhecimento e 
voltando os olhos para a experiência de onde abstraí esse conceito 
de corpo, encontro também o peso sempre ligado aos caracteres 
precedentes e, por conseguinte, acrescento-o sinteticamente, como 
predicado, a esse conceito. E pois sobre a experiência que se funda 
a possibilidade de síntese do predicado do peso com o conceito de 
corpo, porque ambos os conceitos, embora não contidos um no 
outro, pertencem, contudo, um ao outro, se bem apenas de modo 
contingente, como partes de um todo, a saber, o da experiência, que 
é, ela própria, uma ligação sintética das intuições.] 1. 
I Nos juízos sintéticos a priori falta, porém, de todo essa ajuda. 
Se ultrapasso o conceito A ² I para conhecer outro 
A 9 
B 13 
__________________ 
 
¹ Em lugar desta alínea lia-se em A: Donde resulta claramente: 1.° que 
pelos juízos analíticos o nosso conhecimento não é ampliado mas o conceito, 
que já possuo, é desenvolvido e tornado compreensível para mim próprio; 2.° 
que nos juízos sintéticos devo ter, além do conceito do sujeito, alguma coisa de 
diferente, X, sobre o qual se apóia o entendimento para conhecer que o 
predicado, que não está contido nesse conceito, todavia lhe pertence. 
Nos juízos empíricos, ou de experiência, não há dificuldade alguma, 
pois este X é a experiência completa do objeto que eu penso pelo conceito A, o 
qual exprime apenas uma parte dessa experiência. Na verdade, embora não 
inclua já no conceito de um corpo em geral o predicado do peso, esse conceito 
não designa menos uma parte da experiência total e a essa parte posso, pois, 
acrescentar ainda outras partes dessa mesma experiência, como pertencentes ao 
conceito do objeto. Posso previamente conhecer o conceito de corpo, 
analiticamente, pelos caracteres da extensão, de impenetrabilidade, de figura, 
etc., que são todos pensados nesse conceito. Se alargar agora o meu 
conhecimento e me voltar para a experiência, donde extraí este conceito de 
corpo, encontro também o peso, unido sempre aos caracteres precedentes. A 
experiência é, portanto, aquele X que está fora do conceito A e sobre o qual se 
funda a possibilidade de síntese do predicado B do peso com o conceito A. 
 
² A: Se devo sair do conceito A. 
conceito B, como ligado ao primeiro, em que me apoio, o que é que 
tornará a síntese possível, já que não tenho, neste caso, a vantagem 
de a procurar no campo da experiência? Tomemos a proposição: 
Tudo o que acontece tem uma causa. No conceito de algo que 
acontece concebo, é certo, uma existência precedida de um tempo 
que a antecede, etc. e daí se podem extrair conceitos analíticos. Mas 
o conceito de causa está totalmente fora desse conceito e mostra 
algo de distinto do que acontece; não está, pois, contido nesta 
última representação. Como posso chegar a dizer daquilo que 
acontece em geral algo completamente distinto e reconhecer que o 
conceito de causa, embora não contido no conceito do que acontece, 
todavia lhe pertence e até necessariamente? Qual é aqui a incógnita 
X em que se apóia o entendimento quando crê encontrar fora do 
conceito A um predicado B, que lhe é estranho, mas todavia 
considera ligado a esse conceito? ¹. Não pode ser a experiência, 
porque o princípio em questão acrescenta esta segunda 
representação à primeira, não só com generalidade maior do que a 
que a experiência pode conceder, mas também com a expressão da 
necessidade, ou seja, totalmente a priori e por simples conceitos. 
Ora é sobre estes princípios sintéticos, isto é, extensivos, que 
assenta toda a finalidade última do I nosso conhecimento 
especulativo a priori, pois os princípios analíticos sem dúvida que 
são altamente importantes e necessários, mas apenas servem I para 
alcançar aquela clareza de conceitos que é requerida para uma 
síntese segura e vasta que seja uma aquisição verdadeiramente 
A 10
B 14
nova 2. 
_________________ 
¹ A: mas que se encontra, contudo, ligado a esse conceito? 
² Em A a este parágrafo seguia-se apenas a seguinte alínea, 
substituída em B pelos §§ V e VI: 
Há aqui, pois, um certo mistério *, cujo descobrimento tão-só pode 
fazer seguro e digno de confiança o progresso no campo ilimitado do 
conhecimento intelectual puro; a saber, descobrir, com a universalidade 
apropriada, o fundamento da possibilidade dos juízos sintéticos a priori, 
penetrar as condições que tornam possível cada espécie, e ordenar todo esse 
conhecimento (que constitui o seu gênero próximo) num sistema, englobando 
as suas fontes originais, divisões, extensão e limites, sem se restringir a um 
esboço rápido, mas 
[V] 
 
EM TODAS AS CIÊNCIAS TEÓRICAS DA RAZÃO 
ENCONTRAM-SE, COMO PRINCÍPIOS, JUÍZOS 
SINTÉTICOS A PRIORI 
 
1. Os juízos matemáticos são todos sintéticos. Esta proposição 
parece até hoje ter escapado às observações dos analistas da razão 
humana e mesmo opôr-se a todas as suas conjecturas; é, contudo, 
incontestavelmente certa e de conseqüências muito importantes. 
Como se reconheceu que os raciocínios dos matemáticos se 
processam todos segundo o princípio de contradição (o que é 
exigido pela natureza de qualquer certeza apodítica), julgou-se que 
os seus princípios eram conhecidos também graças ao princípio de 
contradição; nisso se enganaram os analistas, porque uma 
proposição sintética pode, sem dúvida, ser considerada segundo o 
princípio de contradição, mas só enquanto se pressuponha outra 
proposição sintética de onde possa ser deduzida, nunca em si 
própria. 
Antes de mais, cumpre observar que as verdadeiras 
proposições matemáticas são sempre juízos a priori e não 
empíricos, porque comportam a necessidade, que não se pode 
extrair da experiência. I Se não se quiser admitir isso, pois bem, 
limitarei a minha tese à matemática pura, cujo conceito já de si 
exige que não contenha conhecimento empírico, mas um 
conhecimento puro e a priori. 
B 15
À primeira vista poder-se-ia, sem dúvida, pensar que a 
proposição 7 +5 = 12 é uma proposição simplesmente analítica, 
resultante, em virtude do princípio de contradição, do conceito 
________________ 
 
determinando-o de maneira completa e suficiente para todos os usos. Basta por 
agora acerca dos caracteres particulares que têm em si os juízos sintéticos. 
* Se houvesse ocorrido a uma antigo levantar somente esta questão, 
ter-se-ia esta, por si só, fortemente oposto a todos os sistemas da razão pura até 
aos nossos dias e poupado tantos ensaios vãos, que tão cegamente se 
empreenderam, sem saber do que propriamente se tratava. 
da soma de sete e de cinco. Porém, quando se observa de mais 
perto, verifica-se que o conceito da soma de sete e de cinco nada 
mais contém do que a reunião dos dois números em um só, pelo 
que, de modo algum, é pensado qual é esse número único que reúne 
os dois. O conceito de doze de modo algum ficou pensado pelo 
simples fato de se ter concebido essa reunião de sete e de cinco e, 
por mais que analise o conceito que possuo de uma tal soma 
possível, não encontrarei nele o número doze. Temos de superar 
estes conceitos, procurando a ajuda da intuição que corresponde a 
um deles, por exemplo os cinco dedos da mão ou (como Segner na 
sua aritmética) cinco pontos, e assim acrescentar, uma a uma, ao 
conceito de sete, as unidades do número cinco dadas na intuição. 
Com efeito, tomo primeiro o número sete e, com a ajuda dos dedos 
da minha mão para intuir o conceito de cinco, adicionei-lhes uma a 
uma,mediante este processo figurativo, as unidades que primeiro 
juntei I para perfazer o número cinco e vejo assim surgir o número 
doze. No conceito de uma soma de 7 + 5 pensei que devia 
acrescentar cinco a sete, mas não que essa soma fosse igual ao 
número doze. A proposição aritmética é, pois, sempre sintética, do 
que nos compenetramos tanto mais nitidamente, quanto mais 
elevados forem os números que se escolherem, pois então se torna 
evidente que, fossem quais fossem as voltas que déssemos aos 
nossos conceitos, nunca poderíamos, sem recorrer à intuição, 
encontrar a soma pela simples análise desses conceitos. 
B 16
Do mesmo modo, nenhum princípio de geometria pura é 
analítico. Que a linha reta seja a mais curta distância entre dois 
pontos é uma proposição sintética, porque o meu conceito de reta 
não contém nada de quantitativo, mas sim uma qualidade. O 
conceito de mais curta tem de ser totalmente acrescentado e não 
pode ser extraído de nenhuma análise do conceito de linha reta. 
Tem de recorrer-se à intuição, mediante a qual unicamente a síntese 
é possível. 
É certo que um pequeno número de princípios que os 
geômetras pressupõem são, em verdade, analíticos e assentam sobre 
o princípio da contradição; mas também apenas servem, como 
proposições idênticas, para o encadeamento do método e 
I não preenchem as funções de verdadeiros princípios; assim, por 
exemplo, a=a, o todo é igual a si mesmo, ou (a + b) > a, o todo é 
maior do que a parte. E,contudo, mesmo estes axiomas, embora 
extraiam a sua validade de simples conceitos, são admitidos na 
matemática apenas porque podem ser representados na intuição. O 
que geralmente aqui nos faz crer que o predicado destes juízos 
apodíticos se encontra já no conceito e que, por conseguinte, o juízo 
seja analítico, é apenas a ambigüidade da expressão. Devemos, com 
efeito, acrescentar a um dado conceito determinado predicado e essa 
necessidade está já vinculada aos dois conceitos. Mas o problema 
não é saber o que devemos acrescentar pelo pensamento ao 
conceito dado, é antes o que pensamos efetivamente nele, embora de 
uma maneira obscura. Então é manifesto que o predicado está 
sempre, necessariamente, aderente a esses conceitos, não como 
pensado no próprio conceito, antes mediante uma intuição que tem 
de ser acrescentada ao conceito. 
B 17 
2. A ciência da natureza (physica) contém em si, como 
princípios, juízos sintéticos a “priori”. Limitar-me-ei a tomar, 
como exemplo, as duas proposições seguintes: em todas as 
modificações do mundo corpóreo a quantidade da matéria 
permanece constante; ou: em toda a transmissão de movimento, a 
ação e a reação têm de ser sempre iguais uma à outra. Em ambas as 
proposições é patente não só a necessidade, portanto a sua origem 
a priori, mas também que são proposições sintéticas. Pois no 
conceito de matéria não penso a permanência, penso apenas a sua 
presença no espaço que preenche. Ultrapasso, assim, o conceito de 
matéria para lhe acrescentar algo a priori que não pensei nele. A 
proposição não é, portanto, analítica, mas sintética e, não obstante, 
pensada a priori; o mesmo se verifica nas restantes proposições da 
parte pura da física. 
B 18 
3. Na metafísica, mesmo considerada apenas como uma 
ciência até agora simplesmente em esboço, mas que a natureza da 
razão humana torna indispensável, deve haver juízos sintéticos a 
priori; por isso, de modo algum se trata nessa ciência de 
simplesmente decompor os conceitos, que formamos a priori 
acerca das coisas, para os explicar analiticamente; o que 
pretendemos, 
pelo contrário, é alargar o nosso conhecimento a priori, para o que 
temos de nos servir de princípios capazes de acrescentar ao 
conceito dado alguma coisa que nele não estava contida e, 
mediante juízos sintéticos a priori, chegar tão longe que nem a 
própria experiência nos possa acompanhar. Isso ocorre, por 
exemplo, na proposição: o mundo tem de ter um primeiro começo, 
etc. Assim, a metafísica, pelo menos em relação aos seus fins, 
consiste em puras proposições sintéticas a priori. 
 
 
VI 
 
B 19
PROBLEMA GERAL DA RAZÃO PURA 
 
Muito se ganha já quando se pode submeter uma 
multiplicidade de investigações à fórmula de um único problema, 
pois assim se facilita, não só o nosso próprio trabalho, na medida 
em que o determinamos rigorosamente, mas também se torna mais 
fácil a quantos pretendam examinar se o realizamos ou não 
satisfatoriamente. Ora o verdadeiro problema da razão pura está 
contido na seguinte pergunta: como são possíveis os juízos 
sintéticos a priori? 
O fato da metafísica até hoje se ter mantido em estado tão 
vacilante entre incertezas e contradições é simplesmente devido a 
não se ter pensado mais cedo neste problema, nem talvez mesmo 
na distinção entre juízos analíticos e juízos sintéticos. A salvação 
ou a ruína da metafísica assenta na solução deste problema ou 
numa demonstração satisfatória de que não há realmente 
possibilidade de resolver o que ela pretende ver esclarecido. David 
Hume, o filósofo que, entre todos, mais se aproximou deste 
problema, embora estivesse longe de o determinar com suficiente 
rigor e de o conceber na sua universalidade, pois se deteve apenas 
na proposição sintética da relação do efeito com suas causas 
(principium causalitatis), julgou ter demonstrado que tal 
proposição a priori era totalmente impossível; segundo o seu 
raciocínio, tudo o que denominamos metafísica mais não seria do 
que simples ilusão de um pretenso conhecimento racional daquilo 
que, de fato, era extraído da experiência e 
B 20
adquirira pelo hábito a aparência de necessidade; afirmação esta que 
destrói toda a filosofia pura e que nunca lhe teria ocorrido se tivesse 
tido em mente o nosso problema em toda a generalidade, pois então 
seria levado a reconhecer que, pelo seu raciocínio, também não 
poderia haver matemática pura, visto esta conter, certamente, 
proposições sintéticas a priori; o seu bom-senso, por certo, tê-lo-ia 
preservado dessa afirmação. 
Na solução do problema enunciado está, simultaneamente, 
inclusa a possibilidade do uso puro da razão na fundamentação e 
desenvolvimento de todas as ciências que contém um conhecimento 
teórico a priori dos objetos, isto é, a resposta às seguintes 
perguntas: 
Como é possível a matemática pura? 
Como é possível a física pura? 
Como estas ciências são realmente dadas, é conveniente 
interrogarmo-nos como são possíveis; que têm de ser possíveis 
demonstra-o a sua realidade*. No que respeita à metafísica, pelo seu 
escasso progresso até hoje realizado e porque não pode dizer-se de 
nenhuma até agora apresentada que tenha alcançado o seu propósito 
essencial, há motivo bastante para se duvidar da sua possibilidade. 
B 21 
Em certo sentido, contudo, esta espécie de conhecimento tam-
bém deve considerar-se como dada e a metafísica, embora não seja 
real como ciência, pelo menos existe como disposição natural 
(metaphysica naturalis), pois a razão humana, impelida por 
exigências próprias, que não pela simples vaidade de saber muito, 
prossegue irresistivelmente a sua marcha para esses problemas, que 
não podem ser solucionados pelo uso empírico da razão nem por 
princípios extraídos da experiência. Assim, em 
__________________ 
 
* No respeitante à física pura, poder-se-ia ainda duvidar da 
sua existência real. Mas basta dar um relance de olhos às diferentes 
proposições que aparecem ao princípio da física propriamente dita 
(empírica), como sejam as da permanência da mesma quantidade de 
matéria, da inércia, da igualdade da ação e reação, etc., para logo 
nos convencermos de que constituem uma physica pura (ou 
rationalis) que, como ciência especial, bem merece ser exposta, 
separadamente, em toda a sua extensão, quer esta extensão seja 
maior ou menor. 
todos os homens e desde que neles a razão ascendeà especulação, 
houve sempre e continuará a haver uma metafísica. E, por 
conseguinte, também acerca desta se põe agora a pergunta: I como é 
possível a metafísica enquanto disposição natural? ou seja, como é 
que as interrogações, que a razão pura levanta e que, por 
necessidade própria, é levada a resolver o melhor possível, surgem 
da natureza da razão humana em geral? 
B 22
Como, porém, até agora todas as tentativas para dar resposta a 
essas interrogações naturais, como seja, por exemplo, se o mundo 
tem um começo ou existe desde a eternidade, etc., sempre 
depararam com contradições inevitáveis, não podemos dar-nos por 
satisfeitos com a simples disposição natural da razão pura para a 
metafísica, isto é, com a faculdade pura da razão, da qual, aliás, 
sempre nasce uma metafísica (seja ele qual for); pelo contrário, tem 
que ser possível, no que se lhe refere, atingir uma certeza: a do 
conhecimento ou ignorância dos objetos, isto é, uma decisão quanto 
aos objetos das suas interrogações ou quanto à capacidade ou 
incapacidade da razão para formular juízos que se lhes reportem; 
consequentemente, para estender com confiança a nossa razão pura 
ou para lhe pôr limites seguros e determinados. Esta última questão, 
que decorre do problema geral acima apresentado, poderia 
justamente formular-se assim: como é possível a metafísica 
enquanto ciência? 
A crítica da razão acaba, necessariamente, por conduzir à 
ciência, ao passo que o uso dogmático da razão, sem crítica, leva, 
pelo contrário, a afirmações sem fundamento, a que se podem opor 
outras por igual verossímeis e, consequentemente, ao cepticismo. 
B 23
Esta ciência também não poderá ser de uma extensão 
desencorajante, pois não se ocupa dos objetos da razão, cuja 
variedade é infinita, mas tão-somente da própria razão, de 
problemas todos eles engendrados no seu seio e que lhe são propos-
tos, não pela natureza das coisas, que são distintas dela, mas pela 
sua própria natureza; portanto, uma vez que tenha aprendido a 
conhecer a sua capacidade em relação aos objetos que a experiência 
lhe pode apresentar, ser-lhe-á fácil determinar de 
maneira completa e segura a extensão e os limites do seu uso, 
quando se ensaia para além das fronteiras da experiência. 
Podem e devem-se pois considerar sem efeito todas as ten-
tativas empreendidas até hoje para constituir, dogmaticamente, uma 
metafísica, porque o que numa ou noutra há de analítico, ou seja, 
mera decomposição de conceitos que residem a priori na razão, não 
é ainda a finalidade, é apenas um preliminar à autêntica metafísica, 
que deve alargar sinteticamente o conhecimento a priori. Esta 
análise é imprópria para este fim, porque apenas mostra o que está 
contido nestes conceitos e não como os alcançamos a priori para 
depois podermos determinar a sua aplicação válida em relação aos I 
objetos de todo o conhecimento em geral. Para desistir destas 
pretensões pouca abnegação é necessária, porque as inegáveis 
contradições da razão consigo mesma, inevitáveis no processo 
dogmático, há muito que tiraram à metafísica todo o prestígio. Será 
necessária maior firmeza para não nos deixarmos tolher pela 
dificuldade intrínseca e pela resistência externa e, deste modo, 
estimularmos, finalmente, graças a um tratamento diferente e em 
total oposição ao seguido até agora, o crescimento próspero e 
fecundo de uma ciência imprescindível à razão humana, a que se 
podem cortar os ramos que se vão erguendo, mas a que não se 
podem extirpar as raízes. 
B 24
 
 
VII 
 
IDÉIA E DIVISÃO DE UMA CIÊNCIA PARTICULAR 
COM O NOME DE CRITICA DA RAZÃO PURA 
 
De tudo isto resulta a idéia de uma ciência particular [que se 
pode chamar Crítica da razão pura] ¹ . [Porque ²] a razão é a 
faculdade que nos fornece os princípios do conhecimento 
___________________ 
 
¹ A: que pode servir à Crítica da Razão Pura. Segue-se a alínea: Chama-
se puro todo o conhecimento ao qual nada de estranho se encontra misturado. 
Porém, um conhecimento é denominado sobretudo absolutamente puro, quando 
não se encontra nele, em geral, nenhuma experiência ou sensação; quando é, 
por conseguinte, possível completamente a priori. 
² A: Ora. 
a priori. Logo, a razão pura é a que contém os princípios para 
conhecer algo absolutamente a priori. Um organon da razão pura 
seria o conjunto desses princípios, pelos quais são adquiridos todos 
I os conhecimentos puros a priori e realmente constituídos. A 
aplicação pormenorizada de semelhante organon proporcionaria um 
sistema da razão pura. Como este sistema, porém, é coisa muito 
desejada e como resta ainda saber se também [aqui] em geral é 
possível uma extensão do nosso conhecimento e em que casos o 
pode ser, podemos considerar como uma propedêutica do sistema 
da razão pura, uma ciência que se limite simplesmente a examinar a 
razão pura, suas fontes e limites. A esta ciência não se deverá dar o 
nome de doutrina, antes o de crítica da razão pura e a sua utilidade 
[do ponto de vista da especulação] será realmente apenas negativa, 
não servirá para alargar a nossa razão, mas tão-somente para a 
clarificar, mantendo-a isenta de erros, o que já é grande conquista. 
Chamo transcendental a todo o conhecimento que em geral se 
ocupa menos dos objetos, que do nosso modo de os conhecer, na 
medida em que este deve ser possível a priori ¹ . Um sistema de 
conceitos deste gênero deveria denominar-se filosofia 
transcendental. Mas esta filosofia é, por sua vez, demasiado 
ambiciosa para podermos começar por ela. Como esta ciência 
deveria conter, integralmente, tanto o conhecimento analítico como 
o conhecimento sintético a priori, abrangeria, para o nosso 
desígnio, extensão demasiado vasta, pois não devemos levar a 
análise senão até ao ponto em que nos é indispensável para 
compreender, em toda a sua I extensão, os princípios da síntese a 
priori, único objeto de que nos ocupamos. Desta investigação 
tratamos presentemente. Não podemos verdadeiramente chamar-lhe 
doutrina, mas apenas crítica transcendental, porquanto a sua 
finalidade não é o alargamento dos próprios conhecimentos, mas a 
sua justificação, e porque deve fornecer-nos a pedra de toque que 
decide do valor ou não valor de todos os conhecimentos a priori. 
Semelhante crítica é, por conseguinte, uma preparação, tanto quanto 
possível, para um organon e, caso este organon não fosse viável, 
B 25
B 26 
____________________ 
 
¹ A: do que dos nossos conceitos a priori dos objetos. 
pelo menos para um canon da razão pura, mediante o qual, em todo 
o caso, poderia ser exposto mais tarde o sistema completo da 
filosofia da razão pura, quer consista em extensão quer em 
limitação do conhecimento racional, tanto analítica como sinte-
ticamente. Que isto seja possível e mesmo que um sistema como 
este possa ser de uma extensão bastante reduzida para que 
esperemos acabá-lo inteiramente, pode-se já conjecturar 
antecipadamente pelo fato de o nosso objeto não ser aqui a natureza 
das coisas, que é inesgotável, mas o entendimento que julga a 
natureza das coisas, e ainda o entendimento considerado 
unicamente do ponto de vista dos nossos conhecimentos a priori, 
cujas riquezas não podem ficar-nos escondidas, pois não precisamos 
de as buscar fora de nós e tudo faz presumir que serão assaz 
restritas, para que possam ser totalmente captadas, julgadas quanto 
ao seu valor ou desvalor e apreciadas corretamente. I [Menos ainda 
se deverá esperar aqui uma crítica de livros e sistemas da razão 
pura; apenas fazemos a crítica da própria faculdade da razão pura. 
Só com fundamento nesta crítica se possui uma pedra de toque 
segura para apreciar o valor filosófico de obras antigas e modernas 
que se ocupam desta questão; de outro modo, o historiador e o 
crítico incompetentes ajuízam as asserções sem fundamento dos 
outros pelas suas próprias asserções, igualmenteinfundadas.] 1 . 
A 13
B 27
A filosofia transcendental é a idéia de uma ciência 2 para a qual 
a crítica da razão pura deverá esboçar arquitetonicamente o plano 
total, isto é, a partir de princípios, com plena garantia da perfeição e 
solidez de todas as partes que constituem esse edifício. [E o sistema 
de todos os princípios da razão pura]. Se esta mesma crítica já não 
se denomina filosofia transcendental é apenas porque, para ser um 
sistema completo, deveria conter uma análise pormenorizada de 
todo o conhecimento humano a priori. É certo que a nossa crítica 
deverá apresentar uma enumeração completa de todos os conceitos 
fundamentais, que 
__________________ 
 
¹ Acrescentamento de B. Em sua vez, em A aparecia um título de 
parágrafo: II. Divisão da filosofia transcendental. 
² A: é aqui apenas uma idéia de uma ciência. 
constituem esse conhecimento puro. Contudo, como é razoável, 
dispensa-se da análise exaustiva desses mesmos conceitos, bem 
como da recensão completa dos que deles são derivados; em parte, 
porque essa análise não seria conforme à finalidade da crítica, não 
tendo a dificuldade que se depara na síntese, seu verdadeiro objeto; 
em parte, porque seria contrário à unidade do plano empreender a 
justificação de tal analise e de tal derivação, o que, tendo em vista 
o fim visado, pode muito bem dispensar-se. Tanto a integridade da 
análise dos conceitos a priori, como da dedução dos que mais tarde 
deles derivem, são de resto fáceis de obter, desde que esses 
conceitos tenham sido de início expostos como princípios 
pormenorizados da síntese e nada lhes falte com respeito a este fim 
essencial. 
A 14 B 28 
À crítica da razão pura pertence, pois, tudo o que constitui a 
filosofia transcendental; é a idéia perfeita da filosofia 
transcendental, mas não é ainda essa mesma ciência, porque só 
avança na análise até onde o exige a apreciação completa do 
conhecimento sintético a priori. 
Na divisão desta ciência dever-se-á, sobretudo, ter em vista 
que nela não entra conceito algum que contenha algo de empírico, 
ou seja, vigiar para que o conhecimento a priori seja totalmente 
puro. Daí resulta, que os princípios supremos da moralidade e os 
seus conceitos fundamentais, sendo embora conceitos a priori, não 
pertencem à filosofia transcendental, [porque, não obstante não 
serem por si mesmos os fundamentos dos preceitos morais, os 
conceitos de prazer e desprazer, de desejos e inclinações, etc., 
todos de origem empírica, devem estar necessariamente incluídos 
na elaboração do sistema da moralidade pura, pelo menos no 
conceito do dever, enquanto obstáculos que deverão ser transpostos 
ou enquanto estímulos que não deverão converter-se em móbiles] 
14. Por isso, a filosofia transcendental outra coisa não é que uma 
filosofia da razão pura simplesmente especulativa. Pois tudo o que 
é prático, na medida em que 
A 15
 
B 29
_______________ 
 
14 A: porque nela deviam ser pressupostos os conceitos de prazer e 
desprazer, de desejos e de inclinações, de vontade de escolha, etc., que são 
todos de origem empírica. 
contém móbiles, refere-se a sentimentos que pertencem a fontes de 
conhecimento empíricas. 
Se quisermos agora proceder à divisão desta ciência a partir do 
ponto de vista universal de um sistema em geral, deverá a crítica, 
que agora empreendemos, conter, em primeiro lugar, uma teoria 
dos elementos, em segundo lugar uma teoria do método da razão 
pura. Cada uma destas partes principais deveria ter uma subdivisão, 
da qual, por enquanto não temos de expor os princípios. Parece-nos, 
pois, apenas necessário saber, como introdução ou prefácio, que há 
dois troncos do conhecimento humano, porventura oriundos de uma 
raiz comum, mas para nós desconhecida, que são a sensibilidade e o 
entendimento; pela primeira são-nos dados os objetos, mas pela 
segunda são esses objetos pensados. Na medida em que a 
sensibilidade deverá conter representações a priori, que constituem 
as condições I mediante as quais os objetos nos são dados, pertence 
à filosofia transcendental. A teoria I transcendental da sensibilidade 
deve formar a primeira parte da ciência dos elementos, porquanto as 
condições, pelas quais unicamente nos são dados os objetos do 
conhecimento humano, precedem as condições segundo as quais 
esses mesmos objetos são pensados. 
B 30 
A 16 
 
 
 
Em lugar dos dois primeiros artigos da edição B encontrava-se em A: 
 
 
INTRODUÇÃO A 1 
 
I — Idéia da filosofia transcendental 
 
A experiência é, sem dúvida, o primeiro produto que o nosso 
entendimento obtém ao elaborar a matéria bruta das sensações. Precisamente 
por isso é o primeiro ensinamento e este revela-se de tal forma inesgotável no 
seu desenvolvimento, que a cadeia das gerações futuras nunca terá falta de 
conhecimentos novos a adquirir neste terreno. Porém, nem de longe é o único 
campo a que se limita o nosso entendimento. É certo, que a experiência nos diz 
o que é, mas não o que deve ser, de maneira necessária, deste modo e não de 
outro. Por isso mesmo não nos dá nenhuma verdadeira universalidade e a 
razão, tão ávida de conhecimentos desta espécie, I vê-se mais excitada por ela 
do que satisfeita. Ora, semelhantes conhecimentos universais, que ao mesmo 
tempo apresentam o carácter de necessidade interna, devem, 
independentemente 
A 2 
da experiência, ser claros e cerros por si mesmos. Por esse motivo se intitulam 
conhecimentos a priori; enquanto tudo aquilo que, pelo contrário, é extraído 
simplesmente da experiência, é conhecido, como se diz, apenas a posteriori ou 
empiricamente. 
Agora se vê, o que é muito importante, que mesmo às nossas experiências 
se misturam conhecimentos que devem ter uma origem a priori e que talvez 
apenas sirvam para fornecer uma ligação às nossas representações sensíveis. 
Com efeito, se dessas experiências retirarmos tudo o que pertence aos sentidos, 
ainda ficam certos conceitos primitivos e os juízos deles derivados, conceitos e 
juízos que devem ser formados inteiramente a priori, isto é, independentemente 
da experiência, pois que, graças a eles, acerca dos objetos que aparecem aos 
nossos sentidos se pode dizer ou pelo menos se julga poder dizer mais do que 
ensinaria a simples experiência e essas afirmações implicam uma verdadeira 
universalidade e uma rigorosa necessidade, que o conhecimento empírico não 
pode proporcionar. 
 
Neste ponto inicia-se em B um novo artigo com o seguinte título: 
 
III 
 
A filosofia carece de uma ciência que determine a possibilidade, os 
princípios e a extensão de todo conhecimento a priori.

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