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TEXTO COMPLEMENTAR 
 
Disciplina: Design de Interiores (Representação) 
Professor: Ricardo Augusto de Mello Granata 
 
Os interiores modernos no MoMA 
Sabrina Fontenele 
 
 
Acesso principal à exposição How should we live? Propositions for the Modern Interior em cartaz 
no Moma 
Foto Sabrina Fontenele 
 
A discussão sobre a habitação, salubridade e conforto esteve presente na pauta 
do movimento moderno, sendo as casas inclusive objeto de propostas arrojadas 
das vanguardas. Em 1927, a exposição de arquitetura moderna de Sttutgart 
colocava em evidência esses temas e convocava arquitetos, designers e outros 
profissionais a refletir sobre habitação e os espaços domésticos. 
Aproximadamente noventa anos depois, o Museu de Arte Moderna de Nova York 
lança um olhar apurado sobre os interiores modernos projetados na primeira 
metade do século 20. A associação entre as duas exposições não é casual. O título 
da exposição inaugurada no Moma no dia 01 de outubro de 2016, “How should we 
live? Propositions for the Modern Interior” (1), aponta diretamente para os temas 
lançados na amostra de 1927 e reforça o diálogo ao instalar logo no acesso 
principal da exposição o texto da equipe de curadoria ao lado do cartaz da 
amostra Die Wohnung, (Weissenhofsiedlung Werkbund Exposition). 
No texto de abertura, Juliet Kinchin (curadora) e Luke Baker (assistente de 
curadoria) nos informam que o recorte temporal se dá a partir de três décadas de 
 
produção (anos 1920 até 1950) e as grandes transformações e incertezas 
políticas, sociais e econômicas daquele período. Os diversos núcleos apresentam 
as novas maneiras de organizar os espaços e os lugares, o uso de modernas 
tecnologias e materiais: vidro, madeira, tecidos sintéticos, aços tubulares e 
plásticos. Importante dizer que Juliet Kinchin – que tem atuado no Departamento 
de Arquitetura e Design do Moma desde 2008 e também foi curadora de uma 
exposição nesse museu sobre as cozinhas modernas intitulada “Counter Space: 
Design and the Modern Kitchen” (2010-2011) – tem uma vasta experiência com a 
questão da domesticidade e dos interiores modernos (2). A curadora defende que 
cada proposição para o morar moderno apresenta uma visão coerente que 
corresponde a fatores externos variados como o clima, a legislação ou condições 
políticas, socioeconômicas e tecnológicas. 
Logo no acesso principal, a presença de um exemplar da famosa Cozinha de 
Frankfurt causa grande impacto ao visitante. Proposta por Margarete Schütte-
Lihotzky na década de 1920, alguns exemplares foram construídos entre 1927 e 
1929 e, recentemente, uma delas foi adquirida pelo acervo MoMA em 2009 e 
reconstruída nas proximidades do acesso principal. Ali são apresentadas as 
preocupações da arquiteta com o trabalho diário na casa – de acordo com as 
teorias contemporâneas sobre eficiência, higiene e fluxo – e sua busca por uma 
eficiência necessária no trabalho das mulheres. Além da própria cozinha, a 
projeção de um vídeo demonstra os estudos, as análises e finalmente a proposta 
para as práticas domésticas, informações que reforçam o avanço que foi essa 
cozinha na década de 1920. A possibilidade de se aproximar daquele espaço – até 
então conhecido apenas por desenhos e fotografias preto-e-branco – encanta os 
observadores logo de cara e demonstra a preocupação do MoMA com as questões 
da modernidade. Dentro da caixa onde está inserido, é possível visualizar seu 
interior a partir dos vãos das janelas e compreender seu espaço mínimo de 
circulação e, mesmo sem tocar os objetos desenvolvidos – depósitos de alumínio, 
bancada de corte, ou pequenos frascos de vidro pendurados – compreender o 
quão arrojado e inovador foi este projeto. 
 
Exemplar da Cozinha de Frankfurt (Margarete Schütte-Lihotzky, 1926-1927). 
Foto Sabrina Fontenele 
 
 
Além da arquiteta Margarete Schütte-Lihotzky, outras profissionais ganham na 
discussão pelos espaços domésticos modernos e pela rede de trabalho e parceria: 
Eileen Gray (Irlanda, 1878-1976), Charlotte Perriand (França, 1903-1999), 
Marguerita Mergentime (Estados Unidos, 1894-1941), Clara Porset (México, 1895-
1981), Ray Eames (1912-1988), Noemi Raymond (Americana, 1899-1980), Aino 
Aalto (Finlândia, 1894-1949) e Florence Knoll (Estados Unidos, 1917). A exposição 
demonstra o pioneirismo dessas profissionais e de seus trabalhos na discussão 
dos espaços modernos do início do século 20. Suas propostas estão presentes ao 
longo da exposição em objetos, croquis, estudos e ambientes reproduzidos 
espacialmente para a amostra. 
Além da Cozinha de Frankfurt, chamam a atenção outros três ambientes dispostos 
ao longo da exposição: 1) o quarto do apartamento de Philip Johnson (1930-1931), 
proposto por Lilly Reich e Ludwig Mies van der Rohe onde se apresenta uma 
tentativa de realizar nos Estados Unidos um cômodo barato, simples e 
decisivamente moderno; 2) o apartamento para um designer em Nova 
Iorque (Apartment for a New York Designer), proposto por Frederick Kiesler entre 
1935-1938, onde cores frias, formas orgânicas, materiais transparentes são 
utilizadas na organização de imóvel no contexto ainda de recessão americana; 3) 
uma unidade habitacional da Maison do Brasil na Cidade Universitária de Paris, 
onde Charlotte Perriand e Le Corbusier desenvolveram um espaço multifuncional, 
confortável e estimulantes para os estudantes. Em cada um dos espaços 
apresentados chama atenção o uso de materiais, de cores e da iluminação na 
organização de lugares de intimidade e/ou convívio dos habitantes. 
As discussões e ideias fomentadas pelo Moma é destaque na exposição que 
apresenta diversas propostas e soluções de concursos desenvolvidos a partir do 
programa Good Design (que teve início na década de 1940). São apresentados 
protótipos de mobiliários, croquis, desenhos e publicações que buscam 
demonstrar a participação dessa instituição na constituição de um legado do 
design moderno. Destacam-se, entre outros, alguns móveis – poltronas e cadeiras 
– desenvolvidos pelo casal Eames, por Eero Saarinen, entre outros. 
Aos que estiverem interessados em uma experiência ainda mais profunda com os 
ambientes modernos, em um dos lados da exposição foi construído o Cafe Velvet 
que reproduz o projeto de Lilly Reich e Mies van der Rohe para uma feira de moda 
em Berlim, em 1927, (Die Mode der Dame). Nesse terceiro andar do edifício do 
Moma, o espaço executado com tecidos e perfis metálicos possibilita aos visitantes 
tomar um café entre as cortinas de veludo com vista para o jardim das esculturas 
do próprio museu, sentado e cercado pelo mobiliário desenvolvido pelos 
arquitetos. A exposição faz qualquer visitante repensar as soluções de seu dia-a-
dia, de suas práticas e a modernidade de seu cotidiano. 
 
 
 
À direita, o apartamento para o jovem design de Nova York. 
Foto Sabrina Fontenele 
 
 
NOTAS 
 
1. Exposição “How Should We Live? Propositions for the Modern Interior”, 
curadoria de Juliet Kinchin (curadora) e Luke Baker (assistente de curadoria), 
Museum of Modern Art – MoMA, Nova York, 01 de outubro de 2016 a 23 de abril 
de 2017. 
2. Juliet Kinchin foi curadora em museus e galerias de Glasgow e do Museu 
Victoria & Albert de Londres. Além de professora de História da Arte e do Design 
na Escola de Artes de Glasgow e da Bart Graduate Center for Studies in Design 
em Nova Iorque, destaca-se pela produção bibliográfica relacionada aos temas da 
exposição, entre eles In the Eye of the Storm: Lili Mårkus and Stories of Hungarian 
Craft, Design and Architecture 1930–1960 (2008), Performance and the Reflected 
Self: Modern Stagings of Domestic Space, 1860-1914 (2008) e Hungary, Shaping 
a National Consciousness (2004). 
 
 
SOBRE A AUTORA 
 
Sabrina Studart Fontenele Costa é arquiteta e urbanista pela Universidade Federal 
do Ceará. Mestre e Doutora pela FAU-USP. Pesquisadora colaboradorade pós-
doutorado do IFCH Unicamp onde estuda questões como domesticidade, 
preservação e arquitetura moderna com apoio da Fapesp. Funcionária do Centro 
 
de Preservação Cultura da USP (CPC-USP). Autora do livro “Edifícios modernos e 
o traçado urbano no Centro de São Paulo” (Annablume, 2015). 
 
Fonte: FONTENELE, Sabrina. Os interiores modernos no MoMA. Resenhas Online, São Paulo, ano 
16, n. 180.02, Vitruvius, dez. 2016. 
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/16.180/6313>.