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Integração dos portadores de deficiência

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Integração dos portadores de deficiência: uma questão psicossocial
Rosana Glat1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Endereço: Rua São Francisco Xavier, 524-10º andar, bloco C 20550-013-Rio de Janeiro, RJ
A integração social e educacional dos portadores de deficiências é atualmente a palavra de ordem em Educação Especial, norteando não só as políticas públicas (Canzianni, 1994; MEC/SEE, 1993; 1994) e as propostas de atendimento de diferentes tipos de instituições (Pereira, 1994), como, principalmente, o posicionamento teórico dos profissionais da área (Edler, 1994). De fato, é raro o congresso, seminário, curso, ou reunião de Educação Especial em que esse tema não seja debatido. Inclusive, a própria revista da Secretaria de Educação Especial do MEC intitula-se lntegração! No entanto, apesar de toda esta mobilização, em nosso país (a não ser em casos de experiências isoladas e pouco divulgadas), esta proposta tarda a concretizar-se.
A dificuldade em se transformar o discurso sobre a integração em uma prática generalizada e permanente tem sido atribuída a diversos aspectos como o despreparo dos profissionais, a descontinuidade dos programas e planos educacionais, a falência do ensino público, a falta de recursos e vontade política de nossos dirigentes, etc. Porém, pouca ênfase é dada ao aspecto psicossocial da questão. E nesta direção que pretendemos conduzir nossa análise.
O primeiro ponto que precisa ser enfatizado é que a questão da integração dos portadores de deficiências ou excepcionais, como são popularmente conhecidos, é similar em vários aspectos à problemática enfrentada por outros grupos de pessoas estigmatizadas, como os aidéticos, ex-presidiários, homossexuais, minorias raciais, etc. Todos estes indivíduos, por uma razão ou outra, são afastados física ou moralmente do convívio cotidiano da sociedade, deixando de usufruir, conseqüentemente, das oportunidades e experiências abertas às demais pessoas consideradas "normais" (Goffman, 1982; Glat, 1991).
A marginalização dos deficientes, ou seja, a sua não-integração, remetenos, portanto, à discussão do conceito de anormalidade ou excepcionalidade. O que é ser excepcional? Como já discutido em diversas ocasiões (Glat, 1988; 1989; 1991) ser excepcional é ser raro ou diferente. O estranho, o diferente, o inesperado sempre chama atenção e, freqüentemente, causa nas pessoas reações como curiosidade, espanto, surpresa, repulsão e, até mesmo, medo.
Estas reações ocorrem porque tudo que é diferente, que foge à norma que é anormal - ameaça a nossa frágil estabilidade social. Toda interação social é, por natureza, perigosa, porque nunca sabemos ao certo como a outra pessoa vai reagir ao nosso contato, e vice-versa. Por isto, tentamos ter o máximo possível de previsão sobre o comportamento (ou aparência do outro) para que saibamos como agir em relação a ele. As pessoas consideradas anormais, ou desviantes, nos perturbam porque não sabemos exatamente como lidar com elas.
No caso dos deficientes, um outro fator psicológico contribui para a aversão que a maioria das pessoas (ostensivamente, ou não) sente em relação a eles. Devido a esta fragilidade natural do ser humano, gostamos de pensar sobre nós mesmos como pessoas completas, constantes e permanentes. A visão do deficiente perturba-nos porque eles nos remete à nossa falta, instabilidade e efemeridade (Glat, 1988; 1991). Nas palavras de Fedida (1984):
O deficiente é sempre o sobrevivente, o que escapou de um cataclisma, de umacatástrofe que já se produziu e que nos ameaça interiormente, que nos pode acontecer... O deficiente constitui uma figura da negação violenta que desencadeia todas as nossas negações (p.145).
Sob este prisma, podemos dizer que o deficiente representa um espelho no qual vemos refletida a nossa própria fragilidade, a nossa própria deficiência. E esta visão nos assusta e enraivece (quer tenhamos consciência destes sentimentos ou não). Então, para não vermos mais nossa imagem caricaturada, temos vontade de quebrar ou afastar o espelho. Por isso, é tão difícil a aceitação do deficiente como igual: porque aceitá-lo significa aceitar nossa imperfeição e alteridade.
Conseqüentemente, para aliviar a tensão e o sentimento de desconforto que o deficiente provoca e diminuir a probabilidade de conflito, a tendência da sociedade como um todo, e de cada um de nós individualmente, é rejeitar estes indivíduos, colocando-os à margem do processo social.
Esta marginalização dos deficientes, que em sociedades menos complexas era espontânea (porém não menos cruel), em nossa sociedade contemporânea tornou-se um processo extremamente sofisticado, envolvendo todo um grupo de pessoas responsáveis por identificar, julgar e classificar estes indivíduos, São os especialistas, que Ullman e Krasner (1969), muito apropriadamente, denominaram de "rotuladores oficiais da sociedade" (p. 21). Estes profissionais têm como função não apenas avaliar ou diagnosticar os anormais, mas também garantir, sob o manto de tratamento, reabilitação ou educação especial, que "eles fiquem em seu lugar - à margem da comunidade - e não ameacem a estabilidade do sistema, não subvertam a ordem, o status quo, a normalidade..." (Glat, 1988, p. 12).
É importante ressaltar que o rótulo de anormal ou excepcional tem um dupla função (Glat, 1991): ao mesmo tempo que serve como "ingresso numerado indicando em que lugar o indivíduo deverá sentar no Teatro da Vida, também determina que papel ele deverá representar nesse Teatro!" (p. 9). Além disto, não só a pessoa estigmatizada passa a agir em função dos padrões de comportamento esperados para o seu papel (os únicos que lhe foram ensinados), como todos os outros atores contracenam com ela de acordo com o estereótipo específico de sua categoria de estigma, reforçando ainda mais esta situação (Glat, 1989; Goffman, 1982; Orno te, 1989).
Como lembra Schneider (1985), "os outros não se relacionam com o indivíduo desviante em si, mas sim com o seu rótulo, criando uma relação de distância e despersonalização" (p. 73). Assim, o papel de desviante ou anormal, que no caso das pessoas deficientes é vitalício, estrutura suas relações sociais, e determina suas oportunidades e experiência de modo geral, criando para o indivíduo uma vida "excepcional" (Glat, 1898, 1991; Goffman, 1982; Telford e Sawrey, 1984, e outros).
Por isto, ao contrário do que geralmente se proclama, a questão da integração dos portadores de deficiências não é apenas um problema de política educacional, nem se resume a colocar estas crianças em classes regulares. Como já discutimos, integração refere-se ao relacionamento entre pessoas, e isso é um pouco mais complexo do que garantir a matrícula na escola pública.
É verdade que muitos países desenvolvidos têm demonstrado que é possível, através de planejamento cuidadoso, apoio governamental e campanhas de opinião pública, integrar, em grande parte, pessoas portadores de deficiências em situações de trabalho, moradia e educação. Porém, mesmo nos países em que a integração de alunos ditos excepcionais no sistema regular de ensino é rotina, a integração social destes indivíduos raramente acontece e, quando muito, fica restrita ao ambiente da sala de aula. Poucas destas crianças ou adolescentes desenvolvem relações de amizade com seus colegas "normais", e muito menos participam com eles das atividades de lazer da comunidade adequadas para sua faixa etária (MacMillan, 1977).
A experiência relatada por pessoas portadoras de deficiências, de vários países do mundo, confirma que, independentemente do nível social, tipo de atividade profissional ou ambiente escolar, suas relações sociais, de maneira geral, restringem-se a outras pessoas portadoras do mesmo tipo de deficiência, seus familiares e os profissionais que os atendem (Glat, 1989;1992(2)).
Não estamos, com isto, querendo minimizar a importância de se desenvolverem programas para integrar os portadores de deficiências, na medida de suas possibilidades, no sistema regular de ensino ou no mercado de trabalho. A segregaçãoeducacional e profissional destes indivíduos é, sem dúvida, um dos fatores principais de perpetuação do seu papel de "excepcional", independentemente do tipo ou grau de deficiência.
Entretanto, integração social é, antes de mais nada, um processo subjetivo e afetivo, e esta relacionado à representação social - os estereótipos - que as pessoas de modo geral têm a respeito dos deficientes. Esta representação social inclui a atuação dos profissionais especialistas que, como já comentamos, perpetuam a segregação e dependência de "sua" clientela, decidindo sobre seu destino e servindo de intermediários em sua relação com o mundo (Glat, 1989; Omote, 1980(3)).
Os especialistas de modo geral e, conseqüentemente, os familiares por eles orientados, relacionam-se com os deficientes de maneira estereotipada, ensinando e reforçando atitudes de dependência e infantilização. O auto-conceito e visão de mundo destes indivíduos são ignorados, não sendo levados em consideração na elaboração de programas de atendimento ou nas propostas de integração. Não é de se espantar que o progresso nessa área seja tão lento!
O grande entrave para a integração dos portadores de deficiências reside, na verdade, no fato de nem a sociedade, nem eles mesmos estarem preparados para este processo ou, necessariamente, desejarem-no. Uma integração efetiva implica uma mudança de atitude tanto da parte dos "normais", quanto dos deficientes que deverão se desligar de seu grupo de referência - onde se identificam e pelo qual são aceitos - para disputar um lugar na sociedade mais ampla. Em uma pesquisa realizada com mulheres portadoras de deficiência mental (Glat, 1989) foi possível observar que apesar de a vida social destas pessoas ser limitada às fronteiras do seu grupo, parecia relativamente satisfatória: "Assim, embora em seus testemunhos muitas tenham comentado 'não ter nenhum amigo fora' (da instituição), ninguém manifestou diretamente o desejo de os ter, nem se queixou da solidão" (p. 211).
Estes dados têm sido confirmados em debates e conversas informais com pessoas portadoras de outros tipos de deficiências. Novamente, não estamos querendo minimizar os efeitos deletérios da segregação social em que a maioria destas pessoas vive, nem muito menos propor que elas estejam mais felizes e realizadas "guardadinhas" nas escolas especiais e oficinas protegidas. Entretanto, esta questão é bastante complexa e controvertida, e não pode ser resolvida unilateralmente, "de cima para baixo", pelos especialistas.
Esperar que a sociedade receba de braços abertos os deficientes é uma utopia, por todas as razões discutidas anteriormente. A maioria nunca aceita espontaneamente a minoria. A minoria sempre é que tem que lutar para ser aceita e decidir, individualmente e enquanto grupo, o quanto ou até que ponto quer se integrar. Em outras palavras, a integração dos grupos minoritários é para eles, de uma certa forma, uma equação custo-benefício: como usufruir das oportunidades sociais, ao mesmo tempo mantendo suas características, sejam elas raciais, culturais ou comportamentais.
O ponto que queremos ressaltar é que não se pode integrar o outro. Cada um que se integre - se puder e se quiser. É claro que nós, especialistas, temos uma função essencial em facilitar e promover este processo. Mas, para isto, é necessário que transformemos o nosso papel tradicional de "donos" dos excepcionais ou mediadores de sua relação com o mundo, para nos tornarmos, para estes indivíduos, pontos de referência e suporte ou, quando muito, modelos de formas adaptativas de relacionamento e comportamento.
Desnecessário dizer que é fundamental também o trabalho estreito de orientação e apoio às famílias, visando reverter o processo castrador de socialização que estas pessoas sofrem, assim como promover a sua integração plena no círculo familiar. Só assim será possível auxiliá-los a adquirir, desde cedo, independência e autonomia - pré-requisitos para integração na sociedade ampla.
Esta integração na sociedade representa, para os portadores de deficiência, um processo de participação social e política, seja individualmente, seja através dos movimentos emergentes de autodefesa (PeopleFirst(4), Centro de Valorização da Vida, Associação da Pessoa Surda, Associação dos Deficientes Físicos, Rompendo Barreiras, etc).
Porém, mais do que qualquer outra coisa, integração representa um processo de valorização pessoal. Pois, enquanto o deficiente não for tratado, pelo menos por aqueles que lidam com ele (especialistas e familiares), como uma pessoa íntegra, igual às outras, apesar de suas particularidades, com toda a complexidade emocional e existencial de qualquer ser humano e, sobretudo, como uma pessoa que é capaz (a não ser, talvez, nos casos mais prejudicados) de fazer op
Referências Bibliográficas
Canzianni, M. de L. (1994) A CORDE coordena as ações do Governo voltadas para as pessoas portadoras de deficiências. Revista Integração, 5(12), 2-4.
Edler, R.E. (1994) Panorama internacional da integração e enfoque nacional. Revista Integração, 5 (11), 9-13.
Fédida, P. (1984) A negação da deficiência. Em, M.I.D. Neto (Org.) A Negação da Deficiência: a Instituição da Diversidade. Rio de Janeiro: Achiamé/Socius.
Glat, R. (1988) Integração do excepcional: realidade ou mito?Mensagem daAPAE, XV(49), 11-14.
Glat, R. (1989) "Somos Iguais a Você": Depoimentos de Mulheres com Deficiência Mental. Rio de Janeiro:
Glat, R. (1991) A integração dos excepcionais. Impulso 5 (10), 7-22.
Goffman, E. (1982) Estigma - Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar Editores.
MacMillan (1977)Mental Retardation in School and Society. Boston: Little Brown and Company.
MEC/SEE (1993) Política Nacional de Educação Especial. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto.
MEC/S EE (1994) Diretrizes de atuação e ações prioritárias. Revista Integração, 5 (11), 28-29.
Omote, S. (1989) Estereótipos a respeito de pessoas deficientes Mensagem da APAE, XVI (53), 18-24.
People First Oregon (1983) Self-A dvocay is. Tacoma, WA: People First of Washington.
Pereira, O.S. (1994) Educação integrada./te Wsto Integração, 5 (11), 6-8.
Schneider, D. (1985) Alunos excepcionais: um estudo de caso de desvio. Em, G. Velho (Oxg.).Desvio eDivergência: uma Crítica da Patologia Social Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.
Telford, C.W. e Sawrey, J.M. (1984)0 Indivíduo Excepcional Rio de Janeiro: Zahar Editores.
Ullman, L.P. e Krasner, L. (1969) A Psychological Approach to Abnormal Behavior. Englewood Cliffs, NY: Prentice-Hall.
Maria Tereza Égler Mantoan. INCLUSÃO ESCOLAR O que é? Por quê? Como fazer? São
Paulo : Moderna , 2003. — (Coleção cotidiano escolar)
Integração ou inclusão?
Tendemos, pela distorção/redução de uma idéia, a nos desviar dos desafios de uma mudança efetiva de nossos propósitos e de nossas práticas.
A indiferenciação entre o processo de integração e o de inclusão escolar é prova dessa tendência na educação e está reforçando a vigência do paradigma tradicional de serviços educacionais. Muitos, no entanto, continuam mantendo-o ao defender a inclusão!
A discussão em torno da integração e da inclusão cria ainda inúmeras e infindáveis polêmicas, provocando as corporações de professores e de profissionais da área de saúde que atuam no atendimento às pessoas com deficiência — os paramédicos e outros, que tratam clinicamente crianças e jovens com problemas escolares e de adaptação social. A inclusão também “mexe” com as associações de pais que adotam paradigmas tradicionais de assistência às suas clientelas; afeta, e muito, os professores da educação especial, temerosos de perder o espaço que conquistaram nas escolas e redes de ensino; e envolve grupos de pesquisa das universidades (Mantoan, 2002; Doré, Wagner e Brunet, 1996).
Os professores do ensino regular consideram-se incompetentes para lidar com as diferenças nas salas de aula, especialmente atender os alunos com deficiência, pois seus colegas especializados sempre se distinguiram porrealizar unicamente esse atendimento e exageraram essa capacidade de fazê-lo aos olhos de todos (Mittler, 2000).
Há também um movimento de pais de alunos sem deficiências, que não admitem a inclusão, por acharem que as escolas vão baixar e/ou piorar ainda mais a qualidade de ensino se tiverem de receber esses novos alunos.
Os dois vocábulos — “integração’’ e “inclusão” —, conquanto tenham significados semelhantes, são empregados para expressar situações de inserção diferentes e se fundamentam em posicionamentos teórico-metodológicos divergentes. Destaquei os termos porque acho ainda necessário frisá-los, embora admita que essa distinção já poderia estar bem definida no contexto educacional.
O processo de integração escolar tem sido entendido de diversas maneiras. O uso do vocábulo “integração” refere-se mais especificamente à inserção de alunos com deficiência nas escolas comuns, mas seu emprego dá-se também para designar alunos agrupados em escolas especiais para pessoas com deficiência, ou mesmo em classes especiais, grupos de lazer ou residências para deficientes.
Os movimentos em favor da integração de crianças com deficiência surgiram nos Países Nórdicos, em 1969, quando se questionaram as práticas sociais e escolares de segregação. Sua noção de base é o princípio de normalização, que, não sendo específico da vida escolar, atinge o conjunto de manifestações e atividades humanas e todas as etapas da vida das pessoas, sejam elas afetadas ou não por uma incapacidade, dificuldade ou inadaptação.
Pela integração escolar, o aluno tem acesso às escolas por meio de um leque de possibilidades educacionais, que vai da inserção às salas de aula do ensino regular ao ensino em escolas especiais.
O processo de integração ocorre dentro de uma estrutura educacional que oferece ao aluno a oportunidade de transitar no sistema escolar — da classe regular ao ensino especial — em todos os seus tipos de atendimento: escolas especiais, classes especiais em escolas comuns, ensino itinerante, salas de recursos, classes hospitalares, ensino domiciliar e outros. Trata-se de uma concepção de inserção parcial, porque o sistema prevê serviços educacionais segregados.
E sabido (e alguns de nós têm experiência própria no assunto) que os alunos que migram das escolas comuns para os serviços de educação especial muito raramente se deslocam para os menos segregados e, também raramente, retornam/ingressam às salas de aula do ensino regular.
Nas situações de integração escolar, nem todos os alunos com deficiência cabem nas turmas de ensino regular, pois há uma seleção prévia dos que estão aptos à inserção. Para esses casos, são indicados: a individualização dos programas escolares, currículos adaptados, avaliações especiais, redução dos objetivos educacionais para compensar as dificuldades de aprender. Em suma: a escola não muda como um todo, mas os alunos têm de mudar para se adaptarem às suas exigências.
A integração escolar pode ser entendida como o “especial na educação”, ou seja, a justaposição do ensino especial ao regular, ocasionando um inchaço desta modalidade, pelo deslocamento de profissionais, recursos, métodos e técnicas da educação especial às escolas regulares.
Quanto à inclusão, esta questiona não somente as políticas e a organização da educação especial e da regular, mas também o próprio conceito de integração. Ela é incompatível com a integração, pois prevê a inserção escolar de forma radical, completa e sistemática. Todos os alunos, sem exceção, devem freqüentar as salas de aula do ensino regular.
O objetivo da integração é inserir um aluno, ou um grupo de alunos, que já foi anteriormente excluído, e o mote da inclusão, ao contrário, é o de não deixar ninguém no exterior do ensino regular, desde o começo da vida escolar. As escolas inclusivas propõem um modo de organização do sistema educacional que considera as necessidades de todos os alunos e que é estruturado em função dessas necessidades.
Por tudo isso, a inclusão implica uma mudança de perspectiva educacional, pois não atinge apenas alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades de aprender, mas todos os demais, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral. Os alunos cora deficiência constituem uma grande preocupação para os educadores inclusivos. Todos sabemos, porém, que a maioria dos que fracassam na escola são alunos que não vêm do ensino especial, mas que possivelmente acabarão nele! (Mantoan, 1999)
O radicalismo da inclusão vem do fato de exigir uma mudança de paradigma educacional, à qual já nos referimos anteriormente. Na perspectiva inclusiva, suprime-se a subdivisão dos sistemas escolares em modalidades de ensino especial e de ensino regular. As escolas atendem às diferenças sem discriminar, sem trabalhar à parte com alguns alunos, sem estabelecer regras específicas para se planejar, para aprender, para avaliar (currículos, atividades, avaliação da aprendizagem para alunos com deficiência e com necessidades educacionais especiais). 
Pode-se, pois, imaginar o impacto da inclusão nos sistemas de ensino ao supor a abolição completa dos serviços segregados da educação especial, dos programas de reforço escolar, das salas de aceleração, das turmas especiais etc.
Na perspectiva de o “especial da educação”, a inclusão é uma provocação, cuja intenção é melhorar a qualidade do ensino das escolas, atingindo todos os alunos que fracassam em suas salas de aula.
A metáfora da inclusão é o caleidoscópio. Essa imagem foi bem descrita pelas palavras de uma de suas grandes defensoras, Marsha Forest. Tive o privilégio de conhecê-la, em Toronto, no Canadá, em 1996, quando a visitei em sua casa. Infelizmente, ela faleceu em 2001, quando estava de malas prontas para vir ao Brasil, para participar de um grande evento educacional e conhecer os projetos inclusivos de nossas redes pública e privada.
Em sua homenagem, destaco como Marsha se refere ao caleidoscópio educacional: O caleidoscópio precisa de todos os pedaços que o compõem. Quando se retiram pedaços dele, o desenho se torna menos complexo, menos rico. As crianças se desenvolvem, aprendem e evoluem melhor em um ambiente rico e variado.
A distinção entre integração e inclusão é um bom começo para esclarecermos o processo de transformação das escolas, de modo que possam acolher, indistintamente, todos os alunos, nos diferentes níveis de ensino.
Temos já um bom número de idéias para analisar, comparar, reinterpretar. Elas serão certamente retomadas, revisadas e ampliadas no que trataremos a seguir.
MANTOAN, M. T. E. Caminhos pedagógicos da inclusão. São Paulo, Memnon Edições Científicas, 2001.
Os anos  60 foram marcados  por várias iniciativas implementadas  na  área da educação especial, refletindo num aumento considerável de serviços de ensino especial.
A partir do final dos anos 1960, e de modo Mais destacado nos anos 1970, as reformas educacionais alcançaram a área de educação especial sob a égide dos discursos da normalização e da integração. A educação especial constou como área prioritária nos planos setoriais de educação, após a Emenda constitucional de 1978 e a Lei nº. 5692/71, de reforma do 1º e 2º graus, e foi contemplada com a edição de normas e planos políticos de âmbito nacional: as  definições  do Conselho Federal de Educação sobre a educação escolar dos excepcionais, as resoluções dos Conselhos Estaduais de Educação sobre diretrizes de educação especial, a criação dos setores de educação especial nos sistemas de ensino, a criação das carreiras especializadas em educação especial na educação escolar (os professores dos excepcionais) e também no campo de reabilitação (a constituição das equipes de reabilitação/ educação especial). (FERREIRA, 2006, p. 87)

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