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Revista de Gestão USP, São Paulo, v. 16, n. 3, p. 49-64, julho-setembro 2009 a) Informações relativas ao autor: Ana Akemi Ikeda Professora Livre docente Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade Universidade de São Paulo Professora de marketing da FEA/USP, vice coordenadora do MBA Marketing da FIA (Fundação Instituto de Administração) Endereço: Av Prof Luciano Gualberto 908 – FEA/USP 05508-900 Cidade Universitária São Paulo/SP e-mail: anikeda@usp.br tel: 11-30915817/5879 b) Área temática: Outros temas (pesquisa em administração) c) Título do artigo: Considerações Sobre Pesquisa Qualitativa Em Administração: Uma Discussão De Suas Características, Usos E Aplicações CONSIDERAÇÕES SOBRE PESQUISA QUALITATIVA EM ADMINISTRAÇÃO CONSIDERATIONS ON QUALITATIVE RESEARCH IN BUSINESS RESUMO A pesquisa qualitativa apesar de bastante utilizada na prática executiva é relativamente pouco discutida em textos acadêmicos em sua acepção geral, ainda que haja exceções como a de Godoy (1995 a,b,c); Silva et al. (2006) entre outros. Frequentemente, os artigos e livros sobre o assunto focam a descrição dos métodos e técnicas específicas utilizadas nas investigações tais como entrevistas em profundidade, discussão em grupo, estudo de casos, etnografia, teoria fundamentada entre outros. O objetivo deste ensaio, por outro lado, é fazer algumas considerações sobre a pesquisa qualitativa em suas características, usos e aplicações na área de administração em seu contexto geral. Para isso são analisados diversos pontos de vistas dos autores, cotejando-os e analisando-os. Inicialmente são feitas considerações sobre o propósito da pesquisa; diferenças entre indução e dedução; explicação dos termos metodologia, método, técnica e procedimentos; e comparação entre orientação positivista e interpretativista. Em seguida centra-se na discussão do paradigma qualitativo. Para isso são apresentadas as origens da pesquisa qualitativa; campo, validade e confiabilidade; triangulação. Algumas críticas habituais são abordadas ao final. Conclui-se que a pesquisa qualitativa é um termo abrangente que cobre muitos conceitos, métodos, técnicas e procedimentos o que pode obscurecer seu entendimento, mas proporciona caminhos novos, criativos e eficazes para estudos em administração. Palavras chaves: Pesquisa qualitativa; administração; triangulação; validade, confiabilidade. ABSTRACT Qualitative research although very frequently used in companies is relatively little discussed in academic texts in its global context. Some exceptions are Godoy (1995 a, b, c); Silva et al. (2006) to name a few. The approaches of qualitative researches’ articles and books often focus specific methods or techniques used in those investigations, for instance in depth interview, focus group, case studies, ethnography, grounded theory, and others. The objective of this essay on the other hand is to discuss characteristics, uses, applications of qualitative research in business area. Thus some authors are compared and analyzed. First there are considerations regarding research purpose; differentiation between induction and deduction; methodology, method technique and procedures; and positivism and interpretativism. Following there is a discussion about the qualitative paradigm where the origin of qualitative research is presented as well as its field; explanation of validity and reliability in qualitative research; and triangulation. Finally usual critics appear to show some weakness. The conclusion is that while qualitative research is seen as a broad term that covers many concepts, methods, techniques, and procedures that can obscure its understanding, it also can be very useful creating new, creative, and efficient ways to work in business studies. Key words: Qualitative research; administration; triangulation; validity; reliability. RESUMEN La investigación cualitativa, a pesar de utilizarse mucho en la práctica ejecutiva es relativamente poco discutido en la literatura académica en su sentido general, aunque hay excepciones, como Godoy (1995 a, b, c), Silva et al. (2006) entre otros. A menudo, los artículos y libros sobre el tema se centran en la descripción de métodos específicos y técnicas utilizadas en las investigaciones, tales como entrevistas en profundidad, grupos de discusión, estudios de caso, etnografía, teoría fundamentada nos dados y otras. El objetivo de este trabajo, por otra parte, es discutir la investigación cualitativa en sus características, usos y aplicaciones en la esfera de la administración en su contexto global. A esto se discutieron diversos puntos de vista de los autores, los cotejando y analizando. Inicialmente se hacen consideraciones sobre el propósito de la investigación; las diferencias entre la inducción y la deducción; explicación de los términos metodología, método, técnica y procedimientos, y la comparación entre la orientación positivista y interpretativista. A continuación, se centra en la discusión del paradigma cualitativo. Para tanto son presentadas las orígenes de la investigación cualitativa; campo, validez y confiabilidad; triangulación. Al final se abordan algunas de las críticas habituales. Se concluye que la investigación cualitativa es un término amplio que abarca muchos conceptos, métodos, técnicas y procedimientos que pueden oscurecer su comprensión, pero ofrece nuevas caminos, creativos y eficaces para los estudios en administración. Palabras Clave: investigación cualitativa; triangulación; validez y confiabilidad 1 INTRODUÇÃO Quando se imagina um arqueólogo realizando pesquisas é muito comum se pensar em escavações, pincéis e outros artefatos; na antropologia, a convivência com povos e grupos específicos. Em estudos da área de administração é mais difícil haver uma predominância de métodos e técnicas de pesquisa. As alternativas são variadas e abundantes, o que se transforma em desafio entender as situações em que cada método ou técnica pode ser empregada. Por exemplo, enquanto a pesquisa qualitativa tem florescido em muitos campos das ciências sociais, seu uso ao mesmo tempo tem se tornado fragmentado e incoerente (ATKINSON, 2005). Se a proliferação de métodos qualitativos de pesquisa de um lado pode confundir, de outro lado pode trazer novas e diversificadas formas de se fazer pesquisa. Há tantas formas de se fazer pesquisa que o pesquisador deve analisar com cuidado as condições e recursos para se extrair o máximo de informações úteis para o conhecimento. Este trabalho traz uma discussão inicial sobre pesquisa qualitativa explorando e discutindo seus principais aspectos. Faz isso por meio de pesquisa bibliográfica ponderando e cotejando os pontos de vista de diversos autores. Possui duas partes principais, na primeira parte analisa-se a pesquisa em administração em seu contexto geral: o propósito da pesquisa; debate entre indução e dedução; diferenças entre metodologia, método, técnica e procedimento; e diferenças entre orientação positivista e interpretativista. Na segunda o foco é o paradigma qualitativo, onde são discutidas as suas origens, campo, validade e confiabilidade, triangulação e finalmente apresentadas algumas críticas à pesquisa qualitativa. 2 PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO Nesta parte a pesquisa em administração é examinada nos aspectos de propósito; indução e dedução; os termos metodologia, método, técnica e procedimento; e orientação positivista versus interpretativista. 2. 1 Propósito de uma pesquisa Todos os administradores em algum tempo na sua carreira irão fazer uso da pesquisa como fonte de informações. Os resultados de pesquisapodem ser preciosas fontes de informações para melhorar o processo de tomada de decisões. As pesquisas não resolvem os problemas de fato ou tomam as decisões. Podem gerar informações que podem guiar as decisões e ações da administração. Pesquisa tem diferentes significados dependendo do público. No entanto, das diversas definições parece haver um acordo de que pesquisa (MILIKEN, 2001): (i) é um processo de investigação e inquirição; (ii) é sistemático e metódico; (iii) aumenta o conhecimento. Remenyi (1996) enfatiza que há algumas principais perguntas a serem feitas no início da pesquisa: (i) Por que pesquisar? Está ligado ao fato que há muitas questões e assuntos os quais o conhecimento é incompleto; (ii) O que pesquisar? (e onde) pesquisar? As duas questões estão intimamente relacionadas. Procura-se saber onde há especialidade e interesse considerando as restrições monetárias e de tempo; (iii) Como pesquisar? Existem diversas técnicas e metodologias apropriadas para cada problema. A técnica deve se adequar ao problema e à competência do pesquisador; (iv) Quando pesquisar? A situação em a pesquisa seria oportuna. Há também a questão de ética em pesquisa. Como desenvolver a pesquisa sem ferir os princípios do pesquisador e do pesquisado? Em administração há muitas questões sem resposta pela natureza em constante mudança em que opera. Hussey e Hussey (1997) afirmam que o propósito da pesquisa pode ser resumido em: Revisar e sintetizar um conhecimento existente, Investigar uma situação ou problema existente, Proporcionar soluções para um problema, Explorar e analisar questões mais gerais, Construir ou criar um novo procedimento ou sistema, Explicar um novo fenômeno, Gerar novo conhecimento, Qualquer combinação dos itens mencionados. É bom deixar claro que é possível desmembrar esses itens em outros, por exemplo: entender melhor um problema; auxiliar a decisão; aprofundar-se num assunto; ou ampliar o conhecimento existente. Para se chegar a um resultado o pesquisador tem diversas opções tanto em termos de projeto como em termos de métodos e técnicas. O projeto de pesquisa pode ser de cunho acadêmico, desenvolvido, por exemplo, por meio de monografias, dissertações mestrado, teses de doutorado, livros e artigos científicos ou comercial (feito por empresas de pesquisa e ou consultoria). Os objetivos, metodologia, tempo e custo devem se adequar tornando viável o projeto. De acordo com Remenyi (1996) a maioria dos projetos de pesquisa acadêmica contém cinco fases gerais: revisão da literatura, formalização da questão de pesquisa, coleção de evidências (qualitativas e/ou quantitativas), análise das evidências, e desenvolvimento das conclusões. O pesquisador deve escolher um conjunto de ferramentas de pesquisa que o ajudará a coletar evidências, analisar evidências e a produzir achados importantes para o aumento de conhecimento de um determinado assunto. O ponto inicial de toda pesquisa é focar claramente que o propósito é adicionar algo de valor ao corpo de conhecimento do assunto. Significa que uma questão não respondida ou problema não resolvido será identificado e estudado e o pesquisador irá tentar produzir uma resposta adequada à questão ou ao problema. Hussey e Hussey (1997) ressaltam que é importante considerar a experiência e habilidades do pesquisador para o desenvolvimento da pesquisa. De fato é comum encontraram-se estudos com erros e omissões, principalmente por falta de conhecimento dos autores. Em estudos quantitativos erros estatísticos são comuns e em qualitativos a falta de profundidade e capacidade de análise são alguns exemplos. Conforme defendem Amaratunga; Baldry; Sarshar; Newton (2002) a pesquisa deve ser conduzida no espírito da investigação que se baseia em fatos, experiência e dados, conceitos e construtos, hipóteses e conjecturas, princípios e leis. Vale ressaltar que muitas vezes a pesquisa desenvolvida possui tanto características qualitativas quanto quantitativa,s. Parry (1998) dá alguns exemplos dessa interconexão entre dados e análises qualitativos e quantitativos, ilustrados pela Figura 1. Figura 1 - Exemplos de relacionamento entre dados e análises qualitativos e quantitativos Fonte: Baseado em PARRY, Ken W. Grounded Theory and social process: a new direction for leadership research, Leadership Quartely, v. 9, n. 1, p. 85-106, Spring 1998. Neste trabalho o foco de análise é a pesquisa qualitativa na academia e não a pesquisa comercial ainda que a discussão também seja útil para a última. Kekäle (2001) defende que basicamente a ciência é perseguida de duas formas: por indução ou por dedução, objetos de análise do próximo item. 2.2 Indução e dedução Andreani e Conchon (2002) enfatizam que o debate indução-dedução é importante para os estudos qualitativos porque é a essência do método científico. O raciocínio indutivo envolve o processo de desenvolvimento de teoria. Inicia-se com observações de exemplos específicos e procura- Dados Quantitativos Dados Qualitativos Análise Qualitativa Análise Quantitativa • Análise qualitativa de retórica quantitativa • Etnoestatística (argumentos baseados em dados quantitativos) • Surveys • Experimentos • Entrevistas estruturadas • Observação estruturada • Observação participante • História de vida • Grounded Theory • Análise de conteúdo se estabelecer generalizações sobre o fenômeno sob investigação; ou seja, do particular para o geral. A pesquisa indutiva é um estudo na qual a teoria é desenvolvida da observação da realidade empírica; assim inferências gerais são induzidas a partir de exemplos específicos (HUSSEY; HUSSEY, 1997). De outro lado, o processo na dedução envolve o teste da teoria. Ou seja, começa com uma teoria ou generalização e procura ver se a teoria se aplica a casos específicos (HYDE, 2000). Dessa forma, casos específicos são deduzidos a partir de inferências gerais. O método dedutivo é referido, muitas vezes como o que se move do geral para o particular. Os partidários das abordagens indutivas querem que a pesquisa qualitativa assegure as idas e vindas entre a coleta de dados e análise, entre o campo e a teoria. Para eles, o método indutivo responde às regras científicas e é capaz de gerar as teorias (Glaser, Strauss, 1967). A Figura 2 resume de forma ilustrativa esse raciocínio. Figura 2 – Processo indutivo versus processo dedutivo Fonte: Baseado em HUSSEY, Jill; HUSSEY, Roger. Business Research. A practical guide for undergraduate and postgraduate students, Houndmills, Basingstoke, Hampshire: Palgrave, 1997. Andreani e Conchon (2002) mostram a metodologia indutiva e dedutiva nas diversas fases de pesquisa (Quadro 1). Quadro 1 - Metodologia indutiva e dedutiva Métodos Indutivo (compreender novas vias) Dedutivo (testar as hipóteses) Fase 1 Concepção da pesquisa Definição da situação e do caso a ser estudado de forma empírica. Determinação da estrutura de pesquisa a partir de teorias e de conceitos existentes. Geral Teoria Generalização/ Inferências gerais Particular Teste da teoria Casos específicos Particular Observações de exemplos específicos Realidade empírica Geral Generalizações Desenvolvimento de teoria Processo indutivo Processo dedutivo Fase 2 Elaboração de um instrumento de pesquisa Elaboração de um instrumento segundo uma metodologia adaptativa e criativa. Elaboração das hipóteses teóricas a serem testadas antes de ir a campo. Fase 3 Coleta de informações Exploração da situação e aprendizagem do cliente por entrevista ou por observação. Testede hipóteses por meio de entrevista de campo. Fase 4 Análises Análise de idéias, pesquisa de novas informações, estudo de relações de causa e efeito, geração de hipóteses. Verificação de hipóteses pela análise estatística dos resultados de estudo. Fase 5 Validação Confrontação de informações entre diferentes fontes, pesquisa de concordância entre as entrevistas, validação por triangulação. Análise estatística das margens de erro. Demonstração empírica da validade dos resultados. Fonte: ANDRÉANI, Jean-Claude; CONCHON. Fiabilité et validité des enquetes qualitatives. Un état de lárt en marketing. Revue Française du Marketing, n. 201, p. 5-21, Paris: Mar 2005, p. 8. Há mais de quatro décadas Machlup (1963) já criticava a confusão e o mau uso das palavras relacionadas à pesquisa como metodologia, método e técnicas. Dessa forma, o próximo tópico tenta elucidar e organizar o sentido desses termos em pesquisa. 2.3 Metodologia, método, técnica e procedimento Turato (2003) explica que metodologia “é a disciplina que se ocupa de estudar e ordenar (no possível) os muitos métodos que concebemos, além de suas origens históricas, seus embasamentos paradigmáticos acompanhados de suas relações teóricas, suas características estruturais e as especificidades de seus alvos” (p. 153). Hussey e Hussey (1997, p. 20) definem metodologia como “a abordagem do processo inteiro de um estudo de pesquisa”. Assim, metodologia de pesquisa refere- se à estrutura de procedimentos na qual a pesquisa é conduzida e descreve uma abordagem a um problema que pode ser operacionalizada em um programa de pesquisa, ou seja, uma estrutura operacional na qual os fatos são colocados de forma que os significados possam ser vistos mais claramente. Contempla uma avaliação crítica de estratégias de pesquisa alternativa e métodos (REMENYI et al., 1998). Deve ser lembrado que as metodologias fornecem linhas, orientações, em vez de prescrições de como as pesquisas devem ser conduzidas. Método, por sua vez, deriva do latim methodus e do grego methodos onde o prefixo meta significa “por meio de”, e hodos “caminho, estrada”, exprimindo assim, etimologicamente, um caminho através do qual se procura chegar a algo ou um modo de fazer algo (WEBSTER, 1997). Outra definição é “um conjunto ordenado de procedimentos que servem para descobrir o que se ignora ou para provar o que já se conhece” (JOLIVET, 1975, p. 144). Para Alves (2000, p. 10) o método científico está no campo da teoria, é um ato de contemplação do pesquisador; enquanto que técnica é a transformação do conhecimento contemplativo em receita de como fazer coisas com as mãos. Técnica é a utilização de instrumentos de pesquisa que permite o pesquisador fazer e ver a emergência dos dados, para serem registrados nas anotações para depois serem estudados e organizados à luz de um quadro de referenciais teóricos. Já a palavra procedimento vem do latim pro “à frente”, e cedere “avançar” o que implica nos passos do caminhar e nas providências da operacionalização (TURATO, 2003). Consequentemente, o método viabiliza o projeto de pesquisa; a técnica o método; e os procedimentos a técnica; o que significa que a abrangência também varia conforme ilustra a Figura 3. No entanto, vale ressaltar que nem sempre é fácil ou possível visualizar as fronteiras que separam esses conceitos. Figura 3 – Abrangência das palavras usadas em pesquisa Fonte: Baseado em Turato (2003) Os anos de 1980 e 1990 testemunharam uma aplicação crescente de métodos qualitativos em estudos do comportamento do consumidor. Tal fato levou a uma divisão entre pesquisadores com base na orientação metodológica ou uma cisão entre positivistas e interpretativistas. O próximo tópico discute e compara as duas orientações. 2. 4 Orientação positivista versus interpretativista Metodologia Método Técnica Procedimento Viabiliza Viabiliza Viabiliza Filósofos científicos e pesquisadores se engajam em longos debates epistemológicos sobre como conduzir melhor as pesquisas. O debate tem sido centrado em fundamentalmente duas escolas de pensamento. De um lado os positivistas lógicos que usam métodos quantitativos e experimentos para testar generalizações hipotético-dedutivas. Uma das maiores implicações dessa abordagem é a necessidade da independência do observador em relação ao sujeito sendo observado, e a necessidade de se formular hipóteses para verificação ou teste subseqüente. Os positivistas procuram explicações causais e leis básicas, e geralmente reduzem o todo para o mais simples possível para facilitar as análises. De outro há os interpretativistas que usam abordagens qualitativas e naturalísticas para a partir de uma forma indutiva e holística entender a experiência humana em um dado contexto. A abordagem interpretativa tenta entender e explicar um fenômeno, em lugar de procurar causas externas ou leis básicas. Também rejeita as crenças dos eventos serem independentes (AMARATUNGA; BALDRY; SARSHAR; NEWTON, 2002). Segundo Baker (2001) a distinção entre as duas abordagens baseia-se na filosofia pessoal de cada pesquisador com respeito a como conduzir a pesquisa. Os positivistas enfatizam os procedimentos dedutivos ou hipotéticos-dedutivos para estabelecer e explicar padrões de comportamento, ou seja, envolve o estabelecimento de uma hipótese e a conclusão retirada a partir dela, a coleção de dados apropriados para testar a conclusão e a rejeição ou afirmação da conclusão. Trata-se de identificar padrões ou relacionamentos. Os interpretativistas procuram estabelecer as motivações e ações que levam a esse padrão de comportamento. A seleção de uma estratégia de pesquisa é fortemente influenciada pela preferência do pesquisador. Os interpretativistas argumentam que padrões estatísticos ou correlações não são compreensíveis por si mesmos. É necessário descobrir os significados (motivos) que as pessoas dão às ações que levam a tais padrões. Embora uma oposição entre “positivismo” e “interpretativismo” seja uma simplificação exagerada, é útil observar algumas diferenças. O Quadro 2 mostra algumas dessas diferenças. Quadro 2 - Abordagens positivista e interpretativa da pesquisa Positivista Interpretativa Autores de referência Galileu Galilei (1564-1642) René Descartes (1596-1650) Auguste Comte (1798-1857) Claude Bernard (1813-1878) Ivan Pavlov (1849-1936) Émile Durkheim (1858-1912) Wilhelm Dilthey (1833-1912) Franz Brentano (1838-1917) Edmund Husserl (1859-1938) Sigmund Freud (1856-1939) Bronislaw Malinowski (1884-1942) Margareth Mead (1901-1978) Claude Lévi-Strauss (1908- ) Grande área de estudo Ciências da natureza Ciências do homem Conceitos Estrutura, fatos sociais e naturais. Significados e desenvolvimento sociais Fenômenos humanos apreendidos Métodos Quantitativo Inferência estatística (teste de hipóteses) Relações causais Mensuração Qualitativo Geração de hipóteses, especulativo Interações Processos Escopo Busca explicação das coisas Livre do contexto Generalizações, leis Considera a realidade objetiva, tangível e única. Interesse é focado no que é geral, médio e representativo para que seja possível generalização estatística e previsão. Busca compreensão do Homem Dependente do contexto Discernimento Realidade socialmente construída e múltipla. Interesse focado naquilo que é específico e singular. Papel do pesquisador Observador não envolvido. Pesquisador como analista objetivo e intérprete de uma realidade social tangível. Ativamente envolvido. O pesquisadornão é independente do que está sendo pesquisado, mas está intrinsecamente ligado a ele. Análise Objetiva Abstrata Fixa Livre de valores Subjetiva Fundamentada Flexível Política Fonte: Baseado em Decrop (1999); Silverman (1998) e Turato (2003). Baseado nesse cenário, o próximo item abordará especificamente do paradigma qualitativo, analisando origens; campo; validade e confiabilidade; triangulação; e finalmente as críticas. 3 O PARADIGMA QUALITATIVO A valorização da natureza da pesquisa qualitativa já variou muito ao longo do tempo. Já foi bastante popular no início do século decresceu de importância com as estatísticas e mensurações quantitativas e agora parece emergir com nova força, empregando métodos e técnicas oriundas de diversas áreas como antropologia, sociologia, psicologia entre outras. Gummesson (2000) argumenta que metodologias qualitativas apesar de fornecerem ferramentas poderosas para pesquisa em diversas áreas da administração ainda são usadas em grau limitado. Universidades e escolas de negócios frequentemente resistem ao seu uso e as classificam como de segunda categoria. Por outro lado autores como Belk (1995); Malhotra e Peterson (2001); Goulding (2005) e Levy (2005) ressaltam que estudos de comportamento do consumidor caminham para paradigmas qualitativos que reconhecem a riqueza das informações e detalhes do universo dos indivíduos e grupos. Sutton (1997) também afirma que agora, depois de muita resistência, a pesquisa qualitativa goza de ampla legitimidade entre pesquisadores organizacionais. 3.1 Origens da pesquisa qualitativa Hamilton (1994) apud Miliken (2001) argumenta que a obra “Discurso do método” (1637) de Descartes (1596-1650) inaugurou o campo da pesquisa qualitativa, com o discurso do método para bem conduzir a própria razão e procura da verdade nas ciências. Foi seguida pelo trabalho de Kant (1724-1804) “Crítica da Razão Pura” (1781) onde o autor reviveu a distinção encontrada em Aristóteles entre o conhecimento prático e teórico. No início do século XX a Escola de Chicago, nos anos 20 e 30, exerceu uma forte influência procurando desenvolver uma metodologia interpretativa. A abordagem, “fatias da vida” vislumbrava a cidade de Chicago como um laboratório social que continha uma comunidade heterogênea com diferentes características. O objetivo era conduzir estudos em profundidade de grupos específicos que pudessem fornecer um caleidoscópio social. Foi bastante valorizada por um bom tempo, mas obscurecida pelas abordagens quantitativas, já que o governo americano necessitava de informações estatísticas com o advento da segunda guerra mundial. Denzin e Lincoln (2000) apresentam uma análise histórica de pesquisa qualitativa cobrindo o século XX e, especificamente, os Estados Unidos, que eles chamaram de sete momentos da pesquisa qualitativa. A data de origem da pesquisa qualitativa, no entanto, é questionável porque em campos como a antropologia e arqueologia, sociologia, e outros a essência da pesquisa é qualitativa, que existe desde que o homem começou a se preocupar com o conhecimento. De qualquer forma a perspectiva histórica da pesquisa qualitativa mostra que ela marcou fortemente os avanços no campo da administração. Os estudos de tempos e movimentos de Frederick Taylor, o casal Gilbert, e os estudos de Elton Mayo na na Western Eletric em Hawtorne próximo à Chicago também empregaram técnicas qualitativas para chegarem a resultados que marcaram a teoria geral em administração. 3.2 O campo da pesquisa qualitativa A pesquisa qualitativa é um campo por si mesmo; atravessa disciplinas, esferas e assuntos. É rodeada por uma complexa família de termos interconectados, conceitos, e suposições. Tem histórias separadas e distintas em educação, comunicação, ciências sociais, comunicação, psicologia, área médica, antropologia e sociologia (DENZIN; LINCOLN, 2000). Qualquer definição de pesquisa qualitativa seria incompleta, pois opera em vários contextos e momentos. De qualquer forma Denzin e Lincoln (2000) sugerem uma definição genérica: Pesquisa qualitativa é uma atividade situada que localiza o observador no mundo. Consiste de um conjunto de práticas materiais interpretativas que tornam o mundo visível. Essas práticas transformam o mundo. Elas modificam o mundo em uma série de representações, incluindo notas de campo, entrevistas, conversas, fotografias, gravações, e memorandos. Nesse nível, a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem interpretativa e natural do mundo. Isso significa que pesquisadores estudam as coisas em seus locais naturais, tentando dar sentido ou interpretar os fenômenos em termos dos significados que as pessoas atribuem a eles (p. 3). Os autores ressaltam também que a palavra qualitativa implica em ênfase nas qualidades das entidades e processos e significados que não são experimentalmente examinados ou mensurados em termos de quantidade, montante, intensidade ou freqüência. Os pesquisadores reforçam a natureza da realidade socialmente construída, a relação íntima entre o pesquisador e o que está sendo estudado e as restrições situacionais que dão forma à investigação. Para Silverman (1998) a pesquisa qualitativa é definida não como um conjunto de técnicas livres, mas baseada em alguma perspectiva analiticamente demarcada; um ponto forte específico é a habilidade de focar na prática real in situ observando como as organizações são representadas; expões melhor como as pessoas “fazem as coisas” em vez de como as pessoas “vêem as coisas”; não é apenas exploratória ou uma estória contada. Bogdan e Biklen (1982) apontam as principais características da pesquisa qualitativa: (i) Os dados são coletados, em geral, em cenário natural e o pesquisador é o instrumento chave na coleta de dados; (ii) é descritiva; (iii) preocupa-se com o processo em vez de simplesmente com resultados ou produtos; (iii) tende a analisar os dados de forma indutiva; (iv) enfatiza o “significado”. Bogdan e Biklen (1982) usam a pesquisa qualitativa como um termo “guarda-chuva” para se referir a diversas estratégias de pesquisa que compartilham de certas características. Os dados coletados são ricos em descrição de pessoas, lugares, e conversações e não facilmente manejados por procedimentos estatísticos. As questões de pesquisa não são moldadas por variáveis operacionais, mas são formuladas para investigar toda sua complexidade, dentro de um contexto. Embora pesquisadores que conduzem pesquisa qualitativa possam tomar o foco à medida que coletam os dados, eles não abordam a pesquisa com questões específicas a serem respondidas ou hipóteses a serem testadas. Estão preocupados com a compreensão do comportamento a partir do sistema de referência do próprio indivíduo. Causas externas são de importância secundária. Há uma vasta literatura que aborda os métodos e abordagens. A pesquisa qualitativa é inerentemente multi método; o que assegura melhor entendimento do fenômeno analisado. Flick (2004) argumenta que a combinação de múltiplas práticas metodológicas num estudo pode ser entendida como uma estratégia que adiciona rigor, amplitude, complexidade, riqueza e profundidade para qualquer investigação. A pesquisa qualitativa segundo Baker (2001) é útil nas seguintes situações: Exploração preliminar tradicional; Escolha e filtro de idéias; Exploração de comportamento complexo; Desenvolvimento de modelos de comportamento explanatórios; Para habilitar o pesquisador a enxergar o mundo da perspectiva do informante; Identificação das necessidades não preenchidas e meios de satisfazê-las. Snow (1999) identifica três vias para o desenvolvimentoteórico no contexto da pesquisa qualitativa: (i) descoberta teórica, envolve a emergência da teoria tal como a preconizada por Glaser e Strauss (1967); (ii) extensão teórica, em vez de desenvolver nova teoria, amplia a teoria ou formulação conceitual já existente para novas e diferentes categorias, contextos, processos ou mesmo para outros níveis de teoria; e (iii) refinamento teórico, envolve a modificação de perspectivas existentes através da extensão ou inspeção da teoria, ou aspectos da teoria, com novo material. Quanto às duas tradições metodológicas, Wilson (1982) apud Flick (2004) enfatiza que as abordagens qualitativas e quantitativas são complementares, e devem dar suporte um ao outro em vez de serem competitivos ou mutuamente exclusivos. O emprego de um método particular deve basear- se na natureza do problema de pesquisa, ou seja, “o problema direciona os métodos e não o inverso”. É justo afirmar que a pesquisa qualitativa não é mais vista como “especulativa” ou “soft” como era considerado no passado. No entanto, algumas das críticas contra a pesquisa qualitativa não são inteiramente sem fundamento (GOULDING, 2005), ocorrendo o mesmo em estudos quantitativos que têm muitas restrições nas questões estatísticas e de projeto. Para Sandelowski (1997) pesquisa qualitativa é um termo que designa uma variedade de práticas que ao mesmo tempo trivializam e proclamam diferenças. É usada para descrever ou significar: (i) certos paradigmas de investigação (como naturalista, construtivista, fenomenológico, ou, geralmente, qualquer coisa não positivista); (ii) tipos e fontes de dados (como estórias, relatos, notas de campo, comportamento, fotografias, artefatos, e documentos); (iii) métodos de pesquisa (como grounded theory, fenomenologia e etnografia); (iv) técnicas para coleta de dados (como entrevistas e observação); (v) técnicas para análise de dados (como comparação constante, conteúdo, narrativa, temática fenomenológica, ou, geralmente, qualquer análise que não seja estatística); e (vi) técnicas de interpretação (como hermenêutica e construção de grounded theory). Ademais o termo também é usado para significar uma alternativa ou um adjunto da pesquisa quantitativa e também para significar qualquer coisa não quantitativa e um remédio para todos os males das investigações da corrente quantitativa/positivista. Gilgun (2006) menciona quatro alicerces da pesquisa qualitativa, são eles: (i) achados da pesquisa, teoria, e princípios metodológicos. Compõem uma vasta gama de perspectivas e informações que são amplamente disponíveis aos pesquisadores e que as escolhem de forma seletiva; (ii) especialidade do pesquisador. É obtida pela experiência, pela educação e treinamento formal, pelo acompanhamento e estudo de pesquisas, teorias e metodologias; (iii) informantes ou respondentes – preferências, desejos, culturas, valores, e qualquer consideração importante para eles. Conhecê-los e entendê-los faz com que as descobertas da pesquisa sejam úteis; e (iv) a pessoa do pesquisador – valores pessoais e experiências pessoais. 3.3 Validade e confiabilidade em pesquisa qualitativa Em termos quantitativos validade tem o significado de “a determinação de se um instrumento de mensuração realmente mede o que é suposto medir” ou “grau na qual um instrumento mede o que pretende medir” (LONG; JOHNSON, 2000, p. 31). A palavra tem raízes no latim, da palavra validus que significa, robusto e valere, ou ser forte. Assim, Aldridge e Aldridge (1996) propõem que validade de um trabalho qualitativo repousa em argumentos fortes e robustos. O poder de tal argumento é estabelecer as premissas nas quais o argumento é baseado, ou seja, mostrar que o trabalho é bem fundamentado, conduzir as premissas que estão sendo utilizadas, desenvolver um conjunto de interpretações e observações relevantes e fazer com que essas interpretações sejam dignas de crédito.Validade é um termo geral usado em pesquisa para estabelecer veracidade em um trabalho. Em projetos qualitativos a palavra validade representa credibilidade e autenticidade (KOCH, 1994). Na perspectiva de Hammersley (1992, p. 69) “um relato é válido ou verdadeiro se ele representa precisamente as características do fenômeno que tenciona descrever, explicar ou teorizar”, segundo ele validade é a verdade, interpretada como a extensão na qual um relato representa de forma precisa o fenômeno social em estudo. Alguns autores insistem no uso de termos alternativos à validade em pesquisa qualitativa como Guba e Lincoln (1989) que sugerem o termo credibilidade. Eles argumentam que validade refere-se à realidade ingênua do positivismo que tenta estabelecer isomorfismo entre os achados e a realidade objetiva. Validade é mais amplo que confiabilidade e de acordo com Andréani e Conchon (2005, p. 6) “um estudo qualitativo é confiável se a metodologia permite observar a realidade”, e argumentam que a confiabilidade é o primeiro passo em direção à validade. A questão é saber se o roteiro de entrevista não contém vieses e erros e se as informações são estáveis (serão obtidas as mesmas informações se o estudo for refeito). Então, é dependente dos entrevistados e dos métodos de coleta de dados. Segundo os mesmos autores a confiabilidade de pesquisa qualitativa no sentido de reprodução comparativa é sempre questionada, porém a flexibilidade é uma clara vantagem da pesquisa qualitativa e muito mais importante que confiabilidade no sentido de reprodução. Na perspectiva de Hammersley (1992, p. 67) confiabilidade “refere-se ao grau de consistência com a qual exemplos são designados à mesma categoria por observadores diferentes ou pelo mesmo observador em diferentes ocasiões”. Para Stenbacka (2001) a confiabilidade como a tradicionalmente usada, ou seja, a habilidade do método produzir os resultados da pesquisa de forma repetida, não é relevante na pesquisa qualitativa. Na validade, o poder de generalização e esmero têm significados distintos nesse contexto: O entendimento do fenômeno é válido se os informantes escolhidos são parte da área do problema e se a interação entre pesquisador e informantes proporciona ao último a oportunidade de falar livremente de acordo com suas próprias estruturas de conhecimento. Uma completa descrição de todo processo, possibilitando a “intersubjetiviadade condicional”, que indica boa qualidade no uso de método qualitativo. A generalização analítica é importante na pesquisa qualitativa, o que é possibilitado pela escolha estratégica de informantes relevante para o estudo e não por amostras estatísticas. A descrição sistemática e cuidadosa do todo o processo de interação com a realidade estudada é o que indica boa qualidade no método qualitativo (p. 555). Validade em pesquisa qualitativa está relacionada com descrição e explicação e se a explicação se ajusta à descrição. Pesquisadores da área qualitativa também convergem de que não há apenas uma forma de interpretar um evento e não há uma interpretação que seja “a correta” (JANESICK, 1999). A próxima seção analisa o conceito de triangulação. Muitos autores, entre eles, Jick (1979); Hall e Rist (1999), Kekale (2001); Whittemore, Chase e Mandle (2001); Andréani e Conchon (2005) sustentam que validação em pesquisa qualitativa é obtida por triangulação que é bastante citada na literatura. 3.4 Triangulação O potencial para conhecer mais a respeito de um fenômeno por meio de métodos de pesquisa em uma investigação empírica é frequentemente discutida sob a rubrica de “triangulação”. Nessas discussões os termos métodos de “integração”, “combinação” e “mistura” tendem a ser usados de forma intercambiável suprimindo o conceito de triangulação. Isso segundo Moran-Ellis(2006) é problemático, pois obscurece uma diferença essencial entre o resultado dos métodos combinados (reivindicados à triangulação) e o processo no qual diferentes métodos e base de dados se relacionam. Para Decrop (1999) triangulação implica que um ponto único é considerado a partir de três processos diferentes e independentes e é baseado na analogia do triângulo. Deriva da topografia e usado inicialmente nas ciências de navegação e militares sendo adaptado de forma produtiva nas investigações das ciências sociais. O medidor usa dois locais como ponto de referência para identificar o seu – a terceira posição (HALL; RIST, 1999). Campbel e Fiske (1959) introduziram o conceito como sinônimo de validade convergente na apresentação da matriz multimétodo/multitraço. Webb et al. (1966) e Jick (1979) refinaram o conceito definindo-a como a combinação de métodos quantitativos e qualitativos, defendendo que deveriam ser vistos como complementares e não como campos rivais. Mais tarde, o conceito de triangulação recebeu maior atenção em pesquisa qualitativa como forma de obter aceitação. Triangulação significa olhar para o mesmo fenômeno, ou questão de pesquisa, a partir de mais de uma fonte de dados. Informações advindas de diferentes ângulos podem ser usadas para corroborar, elaborar ou iluminar o problema de pesquisa. Limita os vieses pessoais e metodológicos e aumenta a generalização de um estudo (DECROP, 1999). Denzin (1978) identifica quatro tipos de triangulação: triangulação de dados, triangulação do investigador, triangulação da teoria, e triangulação metodológica. - Triangulação de dados significa coletar dados em diferentes períodos e de fontes diferentes. - Triangulação do investigador é o uso de pesquisadores diversos para estudar a mesma questão de pesquisa ou mesma estrutura, presumindo que pesquisadores diferentes irão trazer perspectivas, reflexões e análises diferentes. - Triangulação da teoria enfatiza que a pesquisa deve examinar o fenômeno a partir de diferentes pontos teóricos para ver qual seria o mais robusto para ajudar a clarificar e explicar o que está sendo estudado. - Triangulação metodológica refere-se ao uso de múltiplos métodos para obter os dados mais completos e detalhados possíveis sobre o fenômeno. Assim, pesquisadores podem melhorar a precisão de seus julgamentos coletando diferentes tipos de dados norteados pelo mesmo fenômeno (JICK, 1979), “aumentando a crença que os resultados são válidos e não um artefato metodológico” (BOUCHARD, 1976, p. 268). Estudos que usam apenas um método são mais vulneráveis a erros ligados a esse método específico do que estudos que usam múltiplos métodos na qual diferentes tipos de dados propiciam averiguar validade dos dados cruzados (PATTON,1990). A triangulação possibilita uma visão mais completa, geral, holística e diferentes ângulos e perspectivas do mesmo fenômeno melhorando a capacidade de análise e decisão do pesquisador. 3.5 Críticas à pesquisa qualitativa: A pesquisa qualitativa sempre sofreu críticas como ressaltam alguns autores que citam com maior freqüência: (i) falta de clareza; (ii) restrições metodológicas; (iii) mistura de método sem a clara justificativa e explicação do “porquê” e “como”(GOULDING, 1999); (iv) falta de rigor e validade (DECROP, 1999; SANTIAGO-DELEFOSSE, 2004); (v) falta de rigor amostral; (vi) pouca confiabilidade e constância dos dados; (vii) impossibilidade de reprodução (SANTIAGO- DELEFOSSE, 2004). Sharts-Hopko (2002) alegam que em função dos participantes de uma pesquisa qualitativa serem em menor número e recrutados por conveniência ou propositalmente em vez de aleatoriamente, o potencial para os valores e atitudes pessoais do investigador influenciarem o relatório de resultados é grande, sendo uma das principais críticas de projetos de cunho qualitativo. De acordo com Stern (1994) os métodos são pessoais; pessoas pensam diferentemente e têm suas próprias formas de investigação. Escolher um método consome tempo, é um processo pessoal e reflexivo. Requer uma auto avaliação em termos de convicções, crenças, e interesses. Significa ser honesto com o que se acredita, sobre o que se conhece e o que se imagina que se pode ser conhecido e requer comprometimento aos princípios de um paradigma uma vez que a decisão tenha sido tomada ou, em outras palavras, o estabelecimento do relacionamento entre paradigmas individuais, ontologia, epistemologia, e metodologia (GOULDING, 1999). Os métodos de pesquisa são simplesmente meios para uma finalidade. Os pesquisadores devem ter o cuidado de não se emaranhar em detalhes sobre métodos a ponto de perder controle do objetivo principal a ser atingido. É importante conhecer os procedimentos técnicos, porém a seleção e aplicação do método correto para o problema em foco depende basicamente da inteligência, imaginação, criatividade do pesquisador (LA SALLE, 1959). 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Indubitavelmente há muitos métodos e técnicas a serem desenvolvidos em pesquisa qualitativa, emprestados, ou não, de outras áreas – o que já vem sendo feito em relação à antropologia, sociologia, psicologia e áreas médicas. Não importa a técnica ou método a serem usados e sim a utilidade e conteúdo das informações que ajudarão a tomada de decisões ou que aumentará o conhecimento sobre determinado assunto. Muitos pesquisadores caem no erro de prestarem mais atenção na ferramenta do que na utilidade da informação, porque se perdem no emaranhado dos procedimentos. Denzin e Lincoln, (2000) lembram que o pesquisador de pesquisa qualitativa é, muitas vezes, chamado por bricoleur ou fazedor de “colcha de retalhos” porque empresta métodos e procedimentos de várias disciplinas, como numa filmagem onde junta-se as imagens em montagens. Como enfatizam Hussey e Hussey (1997, p. 58) “o paradigma fenomenológico visa capturar a essência do fenômeno e extrair dados que são ricos em explicações e análise. O objetivo do pesquisador é ter acesso total ao conhecimento e significado daqueles envolvidos no fenômeno”. Malhotra e Peterson (2001) acreditam que pesquisas orientadas mais para o lado humano, como a etnografia serão empregadas para entender melhor as questões sobre comportamento, não como substituto das técnicas quantitativas, mas como complemento. À luz do que foi discutido conclui-se que a pesquisa qualitativa envolve uma série de conceitos, métodos, técnicas e procedimentos, que são misturadas e tornam-se pouco claras para o pesquisador. Por outro lado oferece excelentes oportunidades para desenvolver pesquisas em administração, principalmente no que se refere a estudos comportamentais. Partington (2002, p. 114-115) aponta cinco principais aspectos para condução de pesquisa qualitativa no ambiente de administração: - Pesquisa qualitativa é designada a operar bem em áreas complexas; confusas; com causalidades ambíguas e; pouco conhecidas. - Pesquisa qualitativa é normalmente descritiva ou comparativa, mas pode ser também prescritiva. - A pesquisa qualitativa é conduzida a partir do ponto de vista do informante e a essência do sucesso é um alto grau de entrosamento com o mundo do informante. A maior parte das coletas de dados propicia informações abundantes e ricas. - Em conseqüência da riqueza das informações, há muitas interpretações advindas de diversos pontos de vista. - Coleta e análise de dados qualitativos contam com o desenvolvimento de habilidades para assistir, extrair e obter informações ricas e fazer revelações que estão encobertas nos dados. Pela natureza dos problemas em administração parece claro que a pesquisa qualitativa ainda é não é explorada em seu potencial, tanto na aplicação e uso comona discussão de sua abrangência. Dentre as principais limitações desse trabalho podem se citar: ser baseado apenas em trabalhos já publicados; e o caráter generalista do tema o que impede maior aprofundamento de aspectos específicos. Essas limitações podem ser reduzidas em estudos futuros entrevistando especialistas no assunto e na produção de estudos acadêmicos aprofundando-se em temas como triangulação; áreas da administração em que a pesquisa qualitativa é mais utilizada ou apropriada; e tendências da pesquisa qualitativa. 5 REFERÊNCIAS ALDRIDGE, David; ALDRIDGE, Gudrun. A personal construct methodology for validating subjectivity in qualitative research, The Arts in Psychotherapy, v. 23, n. 3, p. 225-236, 1996. ALVES, Rubens. Lições de Feitiçaria, São Paulo: Loyola, 2000. AMARATUNGA, Dilanthi; BALDRY, David; SARSHAR, Marjan; Rita, NEWTON. Quantitative and qualitative research in the built environment: application of “mixed” research approach. Work Study, v. 51, n 1, p 17-31, 2002. ANDRÉANI, Jean-Claude; CONCHON. Fiabilité et validité des enquetes qualitatives. Un état de lárt en marketing. Revue Française du Marketing, n. 201, p. 5-21, Paris: Mar. 2005. ATKINSON, Paul. 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