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Copyright	©	2018	by	Paco	Editorial
Direitos	desta	edição	reservados	à	Paco	Editorial.	Nenhuma	parte
desta	obra	pode	ser	apropriada	e	estocada	em	sistema	de	banco	de
dados	ou	processo	similar,	em	qualquer	forma	ou	meio,	seja
eletrônico,	de	fotocópia,	gravação,	etc.,	sem	a	permissão	da	editora
e/ou	autor.
Revisão:	Taíne	Barriveira
Capa:	Carlos	Henrique	Campello
Projeto	Gráfico:	Matheus	Alexandro
Edição	em	Versão	Impressa:	2018
Edição	em	Versão	Digital:	2018
Comitê	Editorial	para	Publicações	de	Direito:
Prof.	Dr.	Leonardo	Da	Rocha	De	Souza;	Prof.	Dr.	Luciano	Vaz
Ferreira;	Prof.	Dr.	Marcio	Rodrigo	Delfim;	Profa.	Dra.	Kelly	Cardoso
Da	Silva	e	Profa.	Dra.	Terezinha	Damian	Antônio
Dados	Internacionais	de	Catalogação	na	Publicação	(CIP)
Campello,	André	Barreto
Manual	jurídico	da	escravidão	:	Império	do	Brasil	/	André	Barreto	Campello.	-	1.	ed.	-	Jundiaí,
[SP]	:	Paco,	2018.
Recurso	digital
Formato:	ePub
Requisitos	do	sistema:	Multiplataforma
ISBN	978-85-4621-208-8
1.	Direito	-	História.	I.	Título.
CDD:	34(09)
Conselho	Editorial
Profa.	Dra.	Andrea	Domingues	(UNIVAS/MG)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Antonio	Cesar	Galhardi	(FATEC-SP)	(Lattes)
Profa.	Dra.	Benedita	Cássia	Sant’anna	(UNESP/ASSIS/SP)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Carlos	Bauer	(UNINOVE/SP)	(Lattes)
Profa.	Dra.	Cristianne	Famer	Rocha	(UFRGS/RS)	(Lattes)
Prof.	Dr.	José	Ricardo	Caetano	Costa	(FURG/RS)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Luiz	Fernando	Gomes	(UNISO/SP)	(Lattes)
Profa.	Dra.	Milena	Fernandes	Oliveira	(UNICAMP/SP)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Ricardo	André	Ferreira	Martins	(UNICENTRO-PR)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Romualdo	Dias	(UNESP/RIO	CLARO/SP)	(Lattes)
Profa.	Dra.	Thelma	Lessa	(UFSCAR/SP)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Victor	Hugo	Veppo	Burgardt	(UNIPAMPA/RS)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Eraldo	Leme	Batista	(UNIOESTE-PR)	(Lattes)
Prof.	Dr.	Antonio	Carlos	Giuliani	(UNIMEP-Piracicaba-SP)	(Lattes)
Paco	Editorial
Av.	Carlos	Salles	Bloch,	658
Ed.	Altos	do	Anhangabaú,	2º	Andar,	Salas	11,	12	e	21
Anhangabaú	-	Jundiaí-SP	-	13208-100
Telefones:	55	11	4521.6315
atendimento@editorialpaco.com.br
www.pacoeditorial.com.br
	
	
	
	
Aos	meus	amores,	fonte	da	minha	inspiração,
que	dão	brilho	ao	meu	passado	e
iluminam	o	meu	futuro,	Márcia,	Márcia	Stella	e	Lucas
Emmanuel.
Aos	meus	pais	Carlos	Francisco	e	Maria	Sinhá	que,	pela
educação	 e	 pelos	 ensinamentos,	 demonstraram	 que	 o
trabalho	é	a	força	transformadora	da	existência	humana.
Aos	 irmãos	 Carlos	 Henrique	 e	 Marcia	 Luiza,	 amigos
para	toda	a	minha	vida.
	
Sumário
	
	
Folha	de	rosto
Dedicatória
Prefácio
Prólogo
Introdução
Escravidão:	eliminando	equívocos
Justificativa	e	objetivos
Reanimando	um	direito	morto
Construindo	o	Manual	Jurídico	da	Escravidão
Capítulo	1.	A	Escravidão	como	herança
Origens	da	Escravidão	na	América	Portuguesa.	Compreendendo	a
dimensão	da	escravidão	na	sociedade	brasileira
Capítulo	 2.	 A	 Constituição	 de	 1824	 e	 a	 Escravidão:	 uma
Constituição	nascida	de	um	trauma
1.	A	Ascenção	da	Constituinte	de	1823
2.	A	queda	da	Assembleia	Constituinte
3.	O	nascimento	da	Constituição	de	1824
4.	A	implícita	referência	à	escravidão	na	Constituição	de	1824
5.	O	escravo	e	a	cidadania	brasileira
6.	A	liberdade	e	o	direito	à	alforria
Capítulo	 3.	 Tráfico	 e	 escravidão:	 dois	 aspectos	 de	 uma	 sombria
realidade
1.	A	evolução	dos	tratados	internacionais,	a	legislação	lusitana	e	a
questão	do	tráfico	de	escravos
2.	A	independência	do	Brasil	e	o	Tráfico	de	Escravos
3.	 Tráfico	 de	 escravos	 e	 os	 tratados	 internacionais	 firmados	 pelo
Império	do	Brasil
4.	Interlúdio:	a	Abdicação	de	D.	Pedro
5.	 A	 Lei	 de	 7	 de	 novembro	 de	 1831,	 a	 lei	 para	 inglês	 ver:	 a
ilegalidade	da	escravidão
6.	O	Bill	Aberdeen	e	o	impasse	Diplomático
7.	A	Lei	 Eusébio	 de	Queirós	 e	 o	 fim	 do	 tráfico	 internacional	 de
escravos
8.	O	Tráfico	interprovincial	de	escravos
Capítulo	4.	Estatuto	Civil	do	Escravo
1.	Natureza	Jurídica	do	escravo
2.	O	status	do	escravo	na	legislação	brasileira:	persona	e	res
3.	Escravo	e	Patrimônio
4.	A	Alforria	e	as	Cartas	de	Liberdade
5.	A	ingratidão:	precariedade	da	liberdade	concedida
6.	Lei	do	Ventre-Livre:	direito	à	alforria:indenização	assegurada	ao
senhor
7.	Ações	de	Liberdade
8.	O	escravo:	família	e	herança
9.	O	Escravo	como	agente	e	objeto	de	relações	do	direito	civil
Capítulo	5.	O	Escravo	e	o	Direito	penal	material	e	processual
1.	O	escravo	como	inimigo:	um	problema	de	segurança	pública
2.	O	Direito	Penal	do	Inimigo
3.	O	grande	medo:	o	espectro	da	revolta	escrava
4.	O	Direito	Penal	e	Processual	penal	aplicado	ao	escravo
4.1	A	Lei	Penal	e	o	escravo
4.2	Das	penas	aplicadas	aos	escravos
4.2.1	A	pena	de	açoitação
4.2.2	A	pena	de	morte
4.2.3	 O	 debate	 acerca	 da	 comutação	 da	 pena	 de	 morte	 ou	 de
açoitação	na	pena	de	galés
5.	A	pena	de	morte	e	a	Lei	nº	04,	de	10	de	junho	de	1855
Capítulo	6.	A	Administração	da	Opressão:	o	controle	de	escravos
no	Império	do	Brasil
1.	A	escravidão	e	a	descentralização	da	violência
2.	 Impossibilidade	 de	 se	 criar	 uma	 estrutura	 administrativa
centralizada	para	controlar	o	elemento	servil
3.	As	Personagens	da	Opressão
3.1	O	Capitão	do	Mato
3.2	O	Feitor
3.3	O	Carrasco
Capítulo	7.	O	caminho	para	a	Abolição
1.	A	Abolição	como	uma	conquista
2.	Os	Fundos	emancipatórios	e	o	sistema	de	matrícula	dos	escravos
3.	O	desmoronamento	do	sistema	escravista
4.	A	Lei	Áurea
Conclusão.	“Vós	que	aqui	entrais,	abandonai	toda	a	esperança.”
Referências
Página	final
PREFÁCIO
	
	
	
Gostaria	 de	 dizer	 que	 me	 senti	 extremamente	 honrado	 com	 o
convite	feito	pelo	colega	André	Campello	para	prefaciar	o	seu	livro.
Quero	deixar	claro	que	tinha	conhecimento	que	o	André	Campello
era	 um	 pesquisador	 meticuloso.	 Como	 exemplo,	 posso	 citar	 o	 seu
Manual	 do	 Contribuinte,	 publicado	 pelo	 Sindicato	 Nacional	 dos
Procuradores	da	Fazenda	Nacional	–	Sinprofaz,	já	em	segunda	edição,
o	qual	demandou	uma	pesquisa	acurada	e	uma	linguagem	clara,	pois	é
obra	 voltada	 não	 para	 o	 profissional	 do	 Direito,	 mas	 sim	 para	 o
contribuinte.
No	 que	 se	 refere	 especificamente	 ao	 Manual	 Jurídico	 da
Escravidão,	 posso	 afirmar	 com	 toda	 certeza	 que	 é	 obra	 na	 qual	 foi
realizada	 uma	 pesquisa	 profunda	 sobre	 o	 tema	 da	 escravidão,
procurando	 esclarecer	 pontos	 sempre	 e	 talvez	 propositalmente
obscuros	da	História	do	Brasil	sobre	o	tema.
Como	 exemplo	 de	 alguns	 pontos	 da	 história	 que	 foram
devidamente	 esclarecidas	 pelo	 autor,	 podemos	 citar	 a	 Lei	 de	 7	 de
novembro	 de	 1831,	 que	 teria	 finalizado	 o	 tráfico	 internacional	 de
escravos.	 Como	 o	 Manual	 deixa	 evidente,	 isso	 infelizmente	 não	 é
verdade.	Conhecido	esse	diploma	legal	como	a	“Lei	para	Inglês	Ver”,
eis	 que	 surgiu	 como	 resposta	 à	 exigência	 da	 Inglaterra	 de	 que	 se
encerrasse	 o	 tráfico	 negreiro.	 Todavia,	 o	 tráfico	 internacional	 ainda
perdurou	por	muito	tempo,	tendo	sido	contrabandeados	para	o	Brasil
entre	 os	 anos	 de	 1830	 e	 1852,	 um	 número	 estimado	 de	 646.315
africanos.
Dadas	 as	 explicações	 do	 Manual,	 vemos	 que,	 de	 fato,	 somente
com	o	advento	da	Lei	nº	581,	de	04	de	setembro	de	1850,	conhecida
como	Lei	Euzébio	de	Queiroz,	o	odioso	tráfico	teve	o	seu	fim.
Outra	 falácia	 desmentida	 no	Manual	 é	 de	 que	 a	 partir	 da	Lei	 do
Ventre-Livre	 não	 nasceriam	mais	 escravos	 no	Brasil:	 continuaram	 a
nascer	crianças	filhas	de	escravas,	que	permaneceram	como	escravos
por	toda	a	sua	existência.
Da	mesma	forma,	a	Lei	dos	Sexagenários	não	alforriou	de	forma
automática	 todos	 os	 escravos	 que	 alcançavam	 a	 idade	 de	 sessenta
anos.	O	parágrafo	10o,	do	art.	3o,	da	Lei	nº	3.270,	de	28	de	setembro
de	 1885,	 previa	 que	 como	 forma	 de	 indenização	 ao	 senhor	 de
escravos,	 o	 cativo	 deveria	 trabalhar	 por	 mais	 trêsanos	 antes	 de	 se
tornar	liberto.
O	livro	também	apresenta	um	minucioso	estudo	sobre	a	legislação
que	 amparou	 o	 regime	 escravagista,	 como	 as	 Ordenações	 e	 a
Constituição	de	1824.
Um	 ponto	 também	 abordado	 é	 sobre	 quem,	 na	 realidade,	 mais
lucrava	com	a	escravidão.	Muitos	responderiam	que	seria	o	senhor	de
escravos	 que	 afinal	 os	 utilizava	 na	 agricultura.	 Na	 verdade,	 a
escravidão	era	extremamente	 lucrativa	para	aquele	personagem	mais
abjeto	da	sua	cadeia	produtiva,	se	é	que	podemos	nos	expressar	desta
forma,	que	era	a	figura	do	traficante	de	escravos.
O	 sétimo	 capítulo	 nos	 traz	 uma	 análise	 sobre	 a	 atuação	 de
personagens	constantemente	citados	nos	romances	de	época	do	Brasil
quando	tratam	do	tema	da	escravidão:	o	capitão	do	mato,	o	feitor	e	o
carrasco.	 Vale	 ressaltar	 que	 ao	 contrário	 do	 que	 acontece	 nas
sociedades	 mais	 avançadas,	 no	 qual	 o	 monopólio	 da	 força	 ficava	 a
cargo	do	Estado,	na	sociedade	escravocrata,	tal	fato	não	ocorria.
O	Estado,	para	procurar	coibir	insurreições	dos	escravos,	permitia
que	 agentes	 públicos,	 semipúblicos	 ou	 privados	 exercessem	 a
violência.	 Tal	 arranjo	 não	 poderia	 nunca	 dar	 certo.	 O	 que	 existia
costumeiramente	 era	 o	 emprego	 excessivo	 da	 violência	 por	 parte
desses	agentes	paraestatais.
Por	último,	não	se	pode	deixar	de	citar	que	o	autor	demonstra	com
todas	 as	 letras	 o	 horror	 que	 era	 a	 escravidão	 no	Brasil.	Horror	 para
uma	 sociedade	 que	 não	 sabia	 viver	 sem	 a	 presença	 da	 servidão	 e,
principalmente,	um	 terror	 indescritível	para	aqueles	que	 sofreram	na
própria	 pele	 a	 privação	 da	 liberdade,	 pelo	 simples	 fato	 de	 serem
negros.
Infelizmente,	 a	 nódoa	 da	 escravidão	 que	 se	 espalhou	 sobre	 este
país	por	388	anos,	ainda	não	se	extinguiu.	Medidas	como	as	cotas	nas
universidades	 públicas	 são	 paliativos	 que	 ainda	 não	 conseguiram
resgatar	a	dívida	que	a	sociedade	brasileira	tem	para	com	os	milhões
de	indivíduos	escravizados	e	seus	descentes.
Conclui-se	que	o	Manual	Jurídico	da	Escravidão	é	uma	obra	séria,
escrita	 em	 linguagem	 fácil,	 que	 poderá	 ser	 utilizado	 tanto	 pelo
estudante,	quanto	pelo	pesquisador	da	escravidão	no	Brasil,	qualquer
que	 seja	 a	 sua	 perspectiva,	 independente	 da	 área	 acadêmica	 a	 qual
pertença.
	
Rio	de	Janeiro,	08	de	janeiro	de	2018
Sérgio	Luís	de	Souza	Carneiro
Procurador	da	Fazenda	Nacional
Mestre	em	Direito
Apaixonado	estudioso	da	História
PRÓLOGO
	
	
	
Há	 130	 anos,	 a	 então	 Regente	 do	 Império	 do	 Brasil,	 a	 princesa
Isabel,	 declarou	 extinta	 a	 escravidão	 no	 Brasil.	 Entretanto,	 essa
nebulosa	 mácula	 que	 aflige	 nossa	 história	 ainda	 está	 longe	 de	 ser
dissipada.	 Ao	 leitor	 apresenta-se,	 então,	 o	 Manual	 Jurídico	 da
Escravidão:	 uma	 obra	 que	 permite	 ter	 o	 primeiro	 contato	 com	 os
institutos	 que	 conferiam	 fundamento	 à	 estrutura	 de	 opressão	 dos
negros	durante	o	Império	do	Brasil.
A	 escravidão	 não	 era	 apenas	 uma	 relação	 de	 força	 de	 um
indivíduo	 (ou	 grupo	 social)	 sobre	 outro,	 mas	 um	 fenômeno	 social
legitimado,	 pois	 se	 amparava	no	ordenamento	 jurídico	brasileiro	 em
vigor	 durante	 o	 século	XIX.	 Ela	 representava	o	 verdadeiro	 alicerce
jurídico	 da	 sociedade	 brasileira,	 pois	 todas	 as	 relações	 sociais
estavam	contaminadas	pela	sua	nódoa.	Nesse	sentido,	o	Manual	busca
enfrentar	 questões,	 sob	 o	 ponto	 de	 vista	 jurídico,	 apresentando	 a
servidão	 negra	 como	 ela	 realmente	 era	 encarada	 pela	 sociedade
brasileira	do	século	XIX:
O	 escravo	 era	 uma	 coisa	 ou	 uma	 pessoa?	 Ele	 poderia	 ser
processado	criminalmente?	Seria	possível	o	cativo	adquirir	patrimônio
ou	constituir	uma	família?	E	a	sua	herança?
O	senhor	poderia,	 legalmente,	aplicar	castigos	aos	seus	escravos?
Poderia	 o	 proprietário	 aplicar	 uma	 penalidade	 de	morte?	 O	 escravo
poderia	processar	o	seu	senhor?
O	escravo	era	cidadão	do	Império?	Se	ele	não	era	um	cidadão,	o
Brasil	estaria	a	escravizar	estrangeiros?	Existia	no	Brasil	o	crime	de
redução	à	condição	análoga	de	escravos?
A	 sociedade	 brasileira	 tinha	 “medo”	 dos	 escravos?	 Os	 escravos
aceitavam	 passivamente	 o	 seu	 cativeiro?	Como	 era	 a	 legislação	 que
buscava	conter	o	medo	de	uma	insurreição	escrava	como	a	do	Haiti?
Afinal,	quando	se	 iniciou	a	escravidão	no	Brasil?	A	Constituição
do	 Império	 recepcionou	 a	 escravidão?	 Qual	 a	 legislação	 que
regulamentava	o	assunto?	Existia	um	Código	Negro	no	país?
Como	poderia	um	escravo	postular	judicialmente	a	sua	liberdade?
Qual	 a	 ação	 e	 como	 era	 o	 seu	 processamento?	 O	 escravo	 poderia
constituir	um	representante?	Um	escravo	depois	de	alforriado	poderia
ser	reescravizado?
O	que	foi	a	lei	para	inglês	ver?	Por	que	a	maioria	dos	escravos	do
Brasil,	 na	 década	 de	 1870,	 estavam	 sendo	mantidos	 ilegalmente	 nas
senzalas?	 Por	 que	 foi	 tão	 complicado	 acabar	 com	 o	 tráfico	 de
escravos?	Portugal	aboliu	a	escravidão	no	século	XVIII?
Como	se	organizavam	as	estruturas	administrativas	da	opressão?	O
Estado	interferia	em	tudo?	O	carrasco	era	um	cargo	público?	Feitores
poderiam	 ser	 escravos?	 Os	 capitães	 do	 mato	 poderiam	 ser	 agentes
públicos?
Como	foi	a	marcha	para	a	Abolição	da	escravidão?	A	Lei	Áurea
realmente	“libertou”	os	escravos?	Qual	o	efetivo	alcance	das	Leis	do
Ventre	Livre	e	do	Sexagenário?
Transcorrido	 mais	 de	 século	 desde	 o	 advento	 da	 Lei	 Áurea,	 a
sociedade	brasileira	ainda	busca	uma	forma	para	cicatrizar	as	feridas
deixadas	 por	 mais	 de	 trezentos	 anos	 de	 escravismo.	 O	 Manual
Jurídico	 da	Escravidão	 pretende	 trazer	 ao	 leitor	 a	 dinâmica	 jurídica
do	 sistema,	 permitindo	 compreender	 o	 que	 foi	 a	 escravidão	 no
Império	do	Brasil,	para	que	se	possa	também	entender	a	realidade	de
exclusão	que	nos	rodeia.
Dante	Alighieri,	o	poeta	de	Florença,	na	sua	tenebrosa	viagem	aos
confins	do	Inferno,	somente	de	lá	saiu	quando	alcançou	a	redenção	ao
conhecer	 a	 verdadeira	 natureza	 do	mal.	 O	 conhecimento	 o	 libertou.
Esse	é	o	propósito	do	Manual	Jurídico	da	Escravidão.	Portanto,	leitor,
estamos	 ingressando	 no	 coração	 das	 trevas	 e	 lhe	 convidamos	 a
trafegar	em	outro	mundo,	em	um	país	totalmente	diferente	do	nosso,
mas	 estranhamente	 familiar,	 no	 qual	 esse	 fruto	 da	maldade	 humana
era	elemento	constitutivo	da	paisagem.
INTRODUÇÃO
	
	
	
Muito	 já	 se	 escreveu,	 pesquisou,	 filmou	 e	 encenou	 sobre	 a
escravidão	negra	no	Brasil,	mas,	por	incrível	que	pareça,	o	tema	ainda
é	 conhecido	 muito	 superficialmente.	 Para	 suprir	 essa	 lacuna,
apresenta-se	ao	leitor	o	Manual	Jurídico	da	Escravidão:	uma	obra	que
propõe	 o	 primeiro	 contato	 com	 os	 institutos	 que	 conferiam
fundamento	à	estrutura	de	opressão	dos	negros	durante	o	Império	do
Brasil.	 Pretende-se	 revelar	 que	 o	 cativeiro	 não	 era	 apenas	 uma
relação	de	força	de	um	indivíduo	(ou	grupo	social)	sobre	outro,	mas
um	 fenômeno	 social	 legitimado,	 pois	 se	 amparava	 no	 ordenamento
jurídico	brasileiro	em	vigor	durante	o	século	XIX.
Se	o	contrato	de	trabalho,	previsto	na	atual	Consolidação	da	Lei	do
Trabalho1,	 pode	 ser	 compreendido	 como	 o	 fundamento	 jurídico	 das
relações	 econômicas	 da	 sociedade	 brasileira,	 moldando-a;	 a
escravidão	ganha	uma	dimensão	muito	maior2.
De	 fato,	 deve-se	 ter	 em	 mente	 que	 a	 escravidão	 representava	 o
verdadeiro	 alicerce	 jurídico	 da	 sociedade	 brasileira,	 pois	 todas	 as
relações	sociais	estavam	por	ela	contaminadas3.	Os	poderes	e	deveres
que	uma	das	partes	possuía	nesse	horrível	tipo	de	relação	eram	muito
mais	profundos,	alcançando	até	os	mais	básicos	aspectos	da	vida	dos
escravos,	submetidos	ao	exercício	do	poder	senhorial4.
Em	síntese,	o	que	se	apresenta	é	a	uma	obra	que	permite	estudar	a
escravidão	sob	a	perspectiva	do	direito	posto	e	vigente	no	século	XIX.
O	Manual	 Jurídico	 da	 Escravidão	 pretendepermitir	 a	 compreensão
do	 estranho,	 sombrio,	 sangrento	 e	 infame	 universo	 de	 um	 instituto
jurídico	que	estava	em	vigor	no	Brasil	até	13	de	maio	de	1888	e	cuja
sinistra	sombra	ainda	espreita	a	sociedade	brasileiro	no	século	XXI5.
Escravidão:	eliminando	equívocos
Estudar	o	instituto	jurídico6	da	escravidão	negra,	em	um	primeiro
momento,	pode	parecer	uma	atividade	estranha,	pois	ele	é	geralmente
retratado,	 pelos	meios	massivos	de	 comunicação,	 como	uma	 relação
de	 aplicação	 da	 força,	 com	 ou	 sem	 crueldade.	 Isto	 é,	 a	 escravidão,
para	muitos,	é	vista	como	um	fenômeno	de	pura	submissão	de	um	ser
humano	 ao	 poder	 senhorial	 –	 no	 caso	 da	 experiência	 brasileira	 no
século	XIX,	do	negro	africano7	–,	 transformado	em	uma	“coisa”,	em
um	“objeto”.
Nesse	 sentido,	 a	 escravidão	 é	 enxergada	 apenas	 como	 um
fenômeno	 fático	 (percebido	 apenas	 vagamente	 sob	 nuances
sociológicas	ou	econômicas),	que	existia	no	Brasil	do	século	XIX,	e
foi	simplesmente	extinto	por	meio	da	Lei	nº	3.353,	de	13	de	maio	de
1888,	 promulgada	 pela	 Princesa	 Isabel,	 conhecida	 como	 a
“Redentora”.	Trata-se	de	uma	visão	absolutamente	equivocada.	Não	é
possível	resumir	assim	a	questão,	pois	a	escravidão	era	amparada	por
uma	legislação	que	inclusive	a	constitucionalizava,	de	forma	oblíqua8.
Igualmente	 distorcida	 é	 a	 perspectiva	 de	 que	 a	 escravidão	 era
passivamente	 aceita	 pelos	 escravos9,	 urbanos	 ou	 rurais,	 e	 que	 tais
relações	 se	 assentavam	 em	 um	 ambiente	 de	 cordialidade	 entre
senhores	 e	 servos,	 sempre	 de	 forma	 paternalista	 ou	 de	 franca	 e
respeitosa	 camaradagem.	Longe	 disso,	 a	 escravidão	 era	 uma	 relação
social	 que,	 por	 meio	 de	 sua	 violência	 (potencial	 ou	 efetiva,	 mas
sempre	 presente),	 brutalizava	 toda	 a	 sociedade,	 tornando-a	 quase
insensível	 a	 um	 problema	 que	 atingia	 milhões	 de	 indivíduos	 que
viviam	no	cativeiro,	muitas	vezes	ilicitamente.
Por	fim,	 também	incorreta	é	a	visão	de	que	não	havia	um	direito
positivo	que	possibilitasse	a	construção	de	fundamentos	jurídicos	para
a	 relação	 de	 propriedade	 sobre	 outro	 ser	 humano.	Nunca	 houve,	 de
fato,	 um	 Código	 Negro	 no	 Brasil10,	 como	 em	 vigor	 em	 outras
localidades	da	América11,	isto	é,	um	diploma	jurídico	único	que	viesse
a	 regulamentar	 o	 sistema	 de	 trabalho	 escravo,	 o	 tráfico,	 os	 órgãos
administrativos,	 bem	 como	 os	 castigos,	 estabelecendo	 sanções	 e
multas	pelo	seu	descumprimento12.	Entretanto,	 isso	não	significa	que
não	 existia	 um	 arcabouço	 jurídico	 que	 viesse	 a	 regulamentar	 as
complexas	 situações	 decorrentes	 das	 relações	 humanas	 presentes	 na
exploração	da	mão	de	obra	escrava,	bem	como	seus	conflitos13.
Em	última	análise,	a	escravidão	era	uma	relação	de	poder	que,	para
se	 legitimar,	 encontrava	 seus	 alicerces	 no	 Direito	 positivo.	 Ao	 se
estudar	 as	 relações	 de	 trabalho	 que	 se	 baseavam	 no	 emprego	 do
elemento	 servil,	 nota-se	 que,	 para	 as	 autoridades	 públicas	 e	 para	 os
proprietários,	 havia	 um	 receio	 constante	 de	 que	 a	 classe	 oprimida
viesse	 a	 insurgir-se	 contra	 aqueles	 que	 possuíam	 os	 meios	 de
produção	e	contra	o	Poder	público14.	No	caso	da	escravidão,	o	receio
era	 intensificado	 porque	 a	 violência	 estava	 umbilicalmente	 ligada	 à
sua	 prática,	 logo,	 a	 questão	 da	 segurança	 pública	 e	 o	 temor	 de
rebeliões	sempre	acompanharam	a	sua	história.
Justificativa	e	objetivos
Quando	estudante,	nos	bancos	da	Faculdade	de	Direito	do	Recife,
um	 dos	 nossos	 professores	 nos	 falou	 que	 todo	 docente	 que,	 na	 sua
primeira	aula,	viesse	a	discorrer	sobre	a	justificativa	da	disciplina	que
iria	ministrar,	 na	 verdade,	 implicitamente	 dizia	 que	 o	 conteúdo	 não
possuía	 nenhuma	 importância.	 Evidente	 que	 se	 tratava	 de	 uma
brincadeira	 para	 chamar	 a	 atenção	 dos	 alunos,	 entretanto,	o	Manual
Jurídico	da	Escravidão	poderia	iniciar	da	mesma	forma,	pois	o	estudo
da	 Escravidão	 guarda	 consigo	 uma	 relevância	 manifesta,	 sendo
assunto	imprescindível	para	compreender	a	história	do	nosso	país15.
Não	 obstante	 o	 tema	 escolhido,	 essa	 obra,	 entretanto,	 tem	 uma
proposta	 um	 pouco	 diferente:	 não	 almeja	 falar	 apenas	 sobre	 a
escravidão.	 Com	 o	Manual,	 pretende-se	 estudar	 a	 escravidão	 sob	 a
perspectiva	 jurídica,	 apresentando	o	 tema	de	 forma	 sistematizada.	O
leitor	poderia,	então,	indagar:	qual	a	razão	para	estudar	um	complexo
de	normas	jurídicas	que	buscavam	regular	uma	odiosa	relação	humana
baseada	na	força	do	homem	sobre	o	homem?
Por	mais	estranho	que	possa	parecer,	a	escravidão	não	era	apenas
uma	 relação	 de	 força.	 O	 direito	 brasileiro	 legitimava	 e	 também
buscava	assegurar	que	o	sistema	escravista	continuasse	a	ser	a	relação
jurídica	base	do	sistema	produtivo	do	século	XIX.
Portanto,	 tal	 relação	 humana	 possuía	 seus	 alicerces	 em	 um
ordenamento	jurídico	que	permitia	que	milhões	de	homens	e	mulheres
fossem	privados	dos	 seus	mais	básicos	direitos:	 a	 própria	vida,	 bem
como	a	sua	dignidade	e	liberdade.
Tal	 pretensão,	 por	 si	 só	 já	 justificaria	 a	 elaboração	 de	 uma	 obra
acerca	 da	 escravidão	 no	 Brasil.	 Entretanto,	 como	 dito,	 o	 Manual
Jurídico	da	Escravidão	tem	uma	finalidade	diferente.	Para	se	escrever
sobre	a	escravidão,	de	forma	completa,	exigiria-se	a	elaboração	de	um
verdadeiro	 tratado	 sobre	 o	 assunto,	 com	 vários	 tomos,	 não	 apenas
pela	bibliografia	existente16,	mas	sobretudo	pelo	período	de	tempo	e	a
complexidade	 do	 assunto17.	 Entretanto,	 nosso	 objetivo	 é	 fornecer	 as
primeiras	 linhas	 para	 que	 o	 leitor	 possa	 compreender	 a	 escravidão
negra	sob	a	perspectiva	jurídica.
O	Manual	 Jurídico	 da	 Escravidão	 é	 uma	 obra	 de	 História	 do
Direito	que	apresenta	ao	leitor,	de	forma	simples	e	sistematizada,	mas
não	superficial,	a	estrutura	do	instituto	jurídico	da	Escravidão.	A	sua
preocupação	é	realizar	uma	exposição	compreensível,	a	ponto	de	que
o	 leitor	 possa	 visualizar	 não	 apenas	 as	 relações	 de	 poder	 entre	 o
escravo	e	o	senhor,	mas	também	como	o	direito	brasileiro,	durante	o
Império	do	Brasil,	regulamentava	tal	relação	jurídica.	Para	tanto,	serão
evidenciados,	 além	 dos	 mencionados	 alicerces	 jurídicos,	 a	 sua
dinâmica,	 a	 fim	 de	 que	 seja	 possível	 conhecer	 o	 regime	 jurídico	 da
escravidão,	bem	como	a	natureza	jurídica	do	escravo,	tanto	no	âmbito
civil	quanto	no	penal18.
Não	 se	 prescindirá	 de	 estudar	 os	 principais	 fatos	 históricos,	 que
muitas	 vezes	 servem	 de	 fonte	 do	 direito19,	 mas	 o	 foco	 será	 o
ordenamento	 jurídico	 brasileiro	 positivado	 durante	 o	 Império	 do
Brasil.	 Por	 essa	 razão,	 um	 estudo	 sistêmico	 do	Direito	 brasileiro	 do
período	não	se	fará	apenas	com	vagas	referência	às	normas:	elas	serão
transcritas	para	que	o	leitor	possa	tirar	suas	próprias	conclusões.
Similarmente,	serão	apresentadas,	quando	possível,	as	perspectivas
dadas	 pelos	 doutrinadores	 da	 época	 acerca	 dos	 institutos	 jurídicos
então	 vigentes,	 além	 de	 atos	 administrativos	 de	 interpretação	 oficial
da	 legislação	 imperial.	 Por	meio	 da	 presente	 obra,	 portanto,	 o	 leitor
contemporâneo	poderá	facilmente	compreender	não	apenas	como	era
a	 regulação	 jurídica	 da	 escravidão,	 mas	 também	 vislumbrar	 a
evolução	do	instituto.
Reanimando	um	direito	morto
Evidente	que	o	maior	risco	em	um	estudo	de	história	do	direito	é
incorrer	em	anacronismo20,	ou	seja,	observar	e	 interpretar	as	normas
jurídicas	 com	 uma	 mentalidade	 diferente	 daquela	 em	 que	 tais
institutos	 vigoraram.	 Por	 outro	 lado,	 o	 fascínio	 de	 se	 realizar	 um
estudo	sobre	história	do	direito	reside	no	fato	de	que	ao	se	retomar	a
legislação	 de	 um	 ordenamento	 jurídico	 que	 não	 mais	 vigora,	 em
verdade,	o	pesquisador	se	depara	com	a	alma	de	uma	sociedade	que
não	mais	existe.	Seu	trabalho	é	como	reanimar,	com	um	sopro,	um	ser
que	não	maisvive,	observando	como	ele	reage	e	se	movimenta,	quais
são	seus	objetivos,	suas	visões	de	mundo,	seus	traumas.
Com	o	estudo	das	formas	jurídicas,	busca-se	enxergar	o	cotidiano
e	 compreender	 como	uma	 sociedade	 tutela	 seus	 principais	 valores	 e
como	 pretende	 defender	 e	 efetivar	 os	 direitos	 assegurados,
cristalizados	 nas	 suas	 normas	 jurídicas.	 Sem	 dúvidas	 esse	 ato	 de
reconstrução	da	dinâmica	jurídica	é	uma	atividade	artificial,	já	que	os
integrantes	 daquela	 sociedade,	 sobre	 a	 qual	 incidiam	 aquele
ordenamento	estudado,	não	 se	encontram	presentes.	Portanto,	para	o
estudo	 desse	 direito	 deve-se	 buscar	 a	 doutrina,	 a	 opinio	 iuris,	 de
contemporâneos	 que	 pudessem	 nos	 explicar	 a	 dinâmica	 daquele
sistema.
De	 outro	modo,	 o	direito	 não	 pode	 ser	 compreendido	 como	 um
fenômeno	 isolado	no	 tempo	e	no	espaço.	Não	pode	 ser	vislumbrado
como	 um	 amontoado	 de	 normas	 que	 não	 estão	 relacionadas	 com	os
valores,	as	visões	de	mundo	e	as	expectativas	de	um	grupo	social	(que
o	 cria	 e	 é	 por	 ele	 governado),	 em	 determinado	 momento	 da	 sua
história21.	A	percepção	desse	fenômeno	fica	mais	evidente	quando	se
estuda	 o	 direito	 contemporâneo,	 pois,	 de	 certo	modo,	 vive-se	 sob	 a
égide	dessas	normas	e	se	consegue	compreender	os	institutos	e	o	seu
alcance,	 sendo	 possível	 vislumbrar	 como	 as	 normas	 se	 relacionam
para	construir	um	sistema	jurídico.
Os	indivíduos	que	integram	a	nossa	sociedade,	por	exemplo,	sejam
ou	não	operadores	do	Direito,	percebem	as	normas	jurídicas,	isto	é,	há
uma	 mínima	 compreensão	 dos	 principais	 limites	 impostos	 pelo
ordenamento	 a	 suas	 condutas,	 inferindo	 também	 os	 direitos	 que	 lhe
são	 assegurados.	Em	outras	 palavras,	 por	 se	 viver	 sob	 o	 império	 do
direito,	é	possível	senti-lo;	consegue-se	perceber	a	sua	dinâmica.
Para	o	operador	do	Direito,	ao	se	ler	as	grandes	obras	jurídicas,	ao
conversar	com	os	demais	colegas,	ao	trocar	informações	na	faculdade,
ao	se	defrontar	com	a	jurisprudência	dos	Tribunais	ou	ao	se	atualizar
com	as	informações	colhidas	na	internet,	fica	manifesta	a	vivacidade
do	ordenamento	jurídico	que	está	em	vigor.	Entretanto,	quanto	mais	se
recua	 no	 tempo,	 ao	 se	 estudar	 o	 direito	 do	 passado,	 algo	 começa	 a
desaparecer:	 a	 percepção	 de	 “vida”	 das	 normas	 começa	 a	 se	 esvair.
Não	se	detecta,	com	mais	facilidade	como	as	normas	se	organizavam,
como	era	construído	o	sistema	jurídico,	qual	era	o	seu	alcance	e	a	sua
aplicação.
Para	 exemplificar:	 por	 constar	 nos	 livros	 dos	 grandes	 autores
clássicos,	como	Aníbal	Bruno22,	compreende-se	como	era	aplicado	o
Código	Penal23,	quando	dos	primeiros	anos	da	sua	origem,	em	194024.
Ainda	 se	 é	 possível	 perceber	 a	 sua	 essência	 e	 a	 sua	 conexão	 com	o
direito	 penal	 atual25,	 pois,	 além	desse	 diploma	 legal	 ainda	 vigorar26,
houve	a	constante	aplicação,	sem	rupturas,	desde	a	sua	criação,	com	a
evolução	 da	 interpretação	 das	 suas	 normas,	 tomando	 por	 base	 as
inúmeras	 constituições	 vigentes,	 em	 cada	 um	 dos	 períodos
históricos27.
Em	outras	palavras,	um	 leitor	que	viesse	a	desejar	 fazer	a	 leitura
do	 Código	 Penal,	 na	 sua	 redação	 original,	 não	 estranharia	 o	 seu
conteúdo,	pois	 se	 trata	de	diploma	 legal	que	ainda	guarda	pontos	de
contato	 com	 o	 pensamento	 jurídico	 contemporâneo	 e	 com	 a	 própria
sociedade	brasileira,	em	alguns	de	seus	aspectos,	apesar	de	tal	Código
ser	datado	da	década	de	1940.
Voltando	mais	no	tempo,	ao	ingressar	no	turbulento	século	XIX,	o
leitor	 passa	 a	 enxergar	 um	 tumultuado	 período	 histórico,	 no	 qual	 o
Império	do	Brasil	se	envolveu	em	diversos	conflitos	externos	(guerra
da	 Cisplatina	 e	 Guerra	 do	 Paraguai),	 e	 passou	 por	 sérios	 riscos	 de
fragmentação,	 de	 norte	 a	 sul	 da	 Nação,	 com	 a	 Confederação	 do
Equador,	 a	 Balaiada	 no	Maranhão,	 a	 Cabanagem	 no	 Grão-Pará	 e	 a
Guerra	 dos	 Farrapos,	 apenas	 para	 citar	 alguns	 exemplos.	 É	 possível
que,	para	o	leitor,	as	leis	de	tal	período	até	se	assemelhem	à	legislação
de	 civilizações	 desaparecidas,	 como	 o	 Código	 de	 Hamurabi,	 da
Babilônia28,	 em	 face	 do	 seu	 exotismo	 (e	 da	 estranha	 forma	 de	 se
apresentar),	 não	 guardando,	 aparentemente,	 nenhum	 contato	 com	 o
nosso	direito	atual29.
De	fato,	ao	se	estudar	o	direito	brasileiro	desse	período	histórico,	o
leitor	 se	 defronta	 com	 obstáculos	 que	 devem	 ser	 transpostos.	 O
primeiro	 deles	 é	 que	 alguns	 dos	 parâmetros	 interpretativos
contemporâneos	não	se	conectam	às	estruturas	do	Brasil	imperial,	isto
é,	 a	 doutrina	 jurídica	 não	 cria	 pontos	 de	 enlace	 imediatos	 entre	 o
direito	brasileiro	atual	e	o	que	estava	em	vigor	no	século	XIX.
O	 segundo	 empecilho	 reside	 no	 fato	 de	 que	 estudar	 o	 direito
vigente	no	 Império	do	Brasil	é	 se	deparar	com	normas	 jurídicas	que
foram	 criadas	 para	 reger	 uma	 sociedade	 que	 possui	 significativas
diferenças	 econômicas	 e	 culturais	 em	 relação	 ao	 Brasil
contemporâneo.	 Portanto,	 as	 bases	 para	 compreensão	 não	 podem	 se
fundamentar	 em	 valores	 vigentes	 atualmente,	 pois	 as	 categorias
lógico-jurídicas	que	 regiam	o	direito	brasileiro	no	 Império	do	Brasil
são	 demasiadamente	 distintas	 das	 que	 vigoram	 –	 a	 começar	 pela
inexistência	de	um	Código	Civil,	pela	manutenção	do	odioso	instituto
jurídico	da	escravidão	como	alicerce	do	trabalho	produtivo	e	pelo	fato
de	que	o	Império	era	um	Estado	unitário	sui	generis30.
Adverte-se	 também	 que,	 assim	 como	 no	 estudo	 do	 direito
romano31,	 não	 se	 pode	 vislumbrar	 o	 Império	 do	 Brasil	 como	 um
conjunto	 monolítico	 de	 normas,	 inalteradas	 no	 tempo.	 Estudar	 o
direito	 do	 Império	 do	 Brasil	 desperta	 o	 interesse	 por	 conhecer	 a
evolução	das	perspectivas	da	sociedade	brasileira,	a	qual	tentava,	após
a	 independência,	 construir	 uma	 nação	 continental,	 sendo	 possível
perceber	o	nascer	de	algumas	das	estruturas	do	Brasil	contemporâneo.
Construindo	o	Manual	Jurídico	da	Escravidão
No	estudo	realizado,	tenta-se	sistematizar	o	conhecimento	à	luz	de
algumas	 das	 categorias	 lógicas	 contemporâneas	 para	 que	 o	 leitor
possa	compreender	o	direito	vigente	naquele	período32.	Assim	como
nas	obras	de	direito	 romano33,	 faz-se	uma	 tentativa	de	se	apresentar,
didaticamente,	 aos	 operadores	 jurídicos	 como	 era	 a	 estrutura	 e	 a
aplicação	 do	 direito	 em	 uma	 sociedade	 que	 existiu	 há	 quase	 dois
séculos.	Evidente	que	não	se	busca	cair	no	erro	do	anacronismo,	mas
apenas	utilizar	as	 ferramentas	dadas	pela	moderna	ciência	do	estudo
do	Direito	para	 entender	 a	 realidade	passada,	 segundo	os	valores	da
sociedade	brasileira	do	século	XIX.
Tal	método	 é	 necessário,	 pois,	 evidentemente,	 não	 seria	 possível
apenas	estudar	o	direito	do	passado	com	os	olhos	dos	homens	daquele
período,	afinal	tanto	o	leitor	dessa	obra	quanto	o	seu	autor,	integram	a
sociedade	 brasileira	 do	 início	 do	 século	 XXI,	 ou	 seja,	 pertencem	 a
outro	 contexto	 histórico34.	 Por	 essa	 razão,	 ao	 longo	 do	 Manual
Jurídico	 da	 Escravidão,	 buscou-se	 estudar	 o	 Direito	 imperial	 do
Brasil	 à	 luz	das	 interpretações	dos	doutrinadores	do	 século	XIX.	As
suas	 visões	 e	 os	 seus	 ensinamentos	 acerca	 do	 ordenamento	 jurídico
serviram	de	ponto	de	partida	para	nossas	reflexões.
Não	nos	furtamos	de	tentar	adequar	os	institutos	com	a	tecnologia
linguística	 do	 direto	 contemporâneo,	 sobretudo	 a	 fim	 de	 decifrar	 as
disposições	 legais	 estabelecidas,	 além	 de	 também	 adaptarmos	 a
linguagem	 utilizada	 naquele	 período	 histórico	 às	 regras	 ortográficas
atuais.	 Dito	 isso,	 a	 obra	 se	 inicia,	 no	 seu	 capítulo	 primeiro,	 com	 a
análise	e	o	estudo	da	recepção	da	escravidão	pela	legislação	imperial,
analisando	 as	 razões	 que	 justificaram	 a	 manutenção	 desse	 maligno
instituto	no	Brasil.
Passa-se,	a	seguir,	no	capítulo	segundo,	a	um	estudodo	traumático
nascimento	 da	 Constituição	 de	 1824,	 surgida	 das	 cinzas	 da
Assembleia	 Constituinte	 de	 1823,	 bem	 como	 das	 normas
constitucionais	 que	 conferiam	 fundamento	 para	 a	 existência	 da
escravidão	no	Brasil.
O	estudo	do	tráfico	de	escravos	está	no	âmago	do	Manual	Jurídico
da	 Escravidão,	 no	 terceiro	 capítulo.	 Nele,	 podemos	 vislumbrar	 a
tendência	 da	 legislação	 internacional	 de	 abolir	 o	 abjeto	 transporte
interoceânico	de	 seres	 humanos,	 e	 respectiva	 evolução	da	 legislação
brasileira,	 levando	 à	 promulgação	 da	 Lei	 Euzébio	 de	 Queirós,	 de
1850.	 É	 no	 quarto	 capítulo	 em	 que	 se	 analisa	 o	 estatuto	 civil	 do
escravo	e	a	possibilidade	da	prática	de	atos	da	vida	civil,	desde	antes
do	advento	da	Lei	do	Ventre	Livre,	em	1871.
A	 aplicação	 da	 lei	 penal	 sobre	 os	 cativos	 é	 estudada	 no	 capítulo
quinto,	 no	qual	 se	 busca	demonstrar	 que	o	 elemento	 servil	 era	 visto
como	 um	 problema	 de	 segurança	 pública,	 o	 que	 deu	 causa	 à
construção	 de	 uma	 legislação	 para	 oprimir	 tal	 inimigo.	 Por	 isso,	 no
capítulo	 sexto,	 foi	 elaborado	 um	 estudo	 acerca	 da	 administração	 da
opressão	 sobre	 os	 escravos,	 a	 fim	 de	 controlá-los	 e	manter	 o	 status
quo	 (o	 abominável	 sistema	 escravista)	 íntegro,	 analisando	 as	 figuras
do	capitão	do	mato,	do	feitor	e	do	carrasco.
O	 caminho	 para	 Abolição	 da	 escravidão	 foi	 narrado	 no	 capítulo
sétimo,	 com	a	 análise	 do	 nascimento	 do	movimento	 abolicionista,	 o
advento	das	Leis	do	Ventre	Livre	(1871)	e	do	Sexagenário	(1885),	dos
problemas	 que	 decorreram	 da	 aplicação	 desses	 diplomas,	 do
desmoronamento	 do	 sistema	 escravista	 e,	 por	 fim,	 do	 processo	 para
surgimento	da	Lei	Áurea.
Esse	é	o	plano	do	Manual	Jurídico	da	Escravidão,	que	nada	mais
é	 que	 um	ponto	 de	 partida	 para	 o	 leitor	 retirar	 o	 véu	 que	 encobre	 a
verdade	 sobre	 a	 sociedade	 brasileira	 do	 século	 XIX,	 e	 o	 permita
adentrar	 no	 inferno	 do	mundo	 escravocrata.	 Portanto,	 leitor,	 aqui	 se
ingressa	no	coração	das	trevas35:	uma	viagem	ao	sombrio	universo	da
escravidão	brasileira	é	um	convite	para	trafegar	em	outro	mundo,	em
um	país	totalmente	diferente	do	nosso,	mas	estranhamente	familiar,	no
qual	esse	fruto	da	maldade	humana	era	um	elemento	da	paisagem.
Bem-vindo	ao	Brasil	do	século	XIX.
Notas
1.	Decreto-Lei	nº	5.452,	de	1º	de	maio	de	1943.
2.	 “[...]	 ambiguidade	 singular	 em	 que	 vivia	 uma	 sociedade	 na	 qual	 os
trabalhadores	 eram	 também	 mercadorias”	 (Florentino,	 Manolo;	 Goes,	 José
Roberto.	 A	 paz	 das	 senzalas:	 famílias	 escravas	 e	 tráfico	 Atlântico,	 Rio	 de
Janeiro,	c.1790-c.1850.	São	Paulo:	Editora	Unesp,	2017,	p.	17).
3.	“[...]	A	propriedade	 escrava	 era	 altamente	 disseminada	 pelo	 tecido	 social,	 o
que	 significa	 que	 camadas	 variadas	 da	 população	 se	 encontravam
comprometidas	 com	 a	 escravidão,	 não	 importando	 a	 extensão	 de	 suas	 posses”
(Florentino,	Manolo;	Goes,	José	Roberto.	A	paz	das	senzalas:	famílias	escravas	e
tráfico	 Atlântico,	 Rio	 de	 Janeiro,	 c.1790-c.1850.	 São	 Paulo:	 Editora	 Unesp,
2017,	p.	45).
4.	 Silva	 Junior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História.	 Direito	 e	 Escravidão:	 a
legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São	 Paulo:
Annablume,	2013,	p.	40.
5.	“A	escravidão	teve,	entre	nós,	uma	duração	de	quase	quatro	séculos	–	quatro
vezes	 mais,	 portanto,	 do	 que	 a	 experiência	 do	 trabalho	 livre”	 (Florentino,
Manolo;	 Goes,	 José	 Roberto.	 A	 paz	 das	 senzalas:	 famílias	 escravas	 e	 tráfico
Atlântico,	 Rio	 de	 Janeiro,	 c.1790-c.1850.	 São	 Paulo:	 Editora	 Unesp,	 2017,	 p.
35).
6.	 “As	 normas	 objetivas	 contêm	 um	 mandamento,	 ou	 uma	 diretriz,	 visando
regular	determinadas	relações	de	fato.	Mas,	as	normas	não	são	criadas	ao	acaso,
nem	 vivem	 dispersas	 isoladamente,	 nem	 são	 tampouco,	 apenas	 justapostas	 ou
aglomeradas	em	quadros	artificiais;	ao	contrário,	um	nexo	as	une	e	coordena	em
direção	a	um	fim	comum,	transformando-as	em	um	todo	lógico.	Ora,	o	conjunto
de	 normas	 coordenadas	 em	 direção	 a	 um	 fim	 comum	 e	 as	 relações	 que	 elas
visam	regular,	constituem	o	instituto	jurídico”	(Ráo,	Vicente.	O	direito	e	a	vida
dos	direitos.	São	Paulo:	Editora	Revista	dos	Tribunais,	1999,	p.	228).
7.	A	escravidão	do	índio	já	havia	sido	proibida	no	Brasil	desde	o	advento	da	Lei
de	1º	de	abril	de	1680,	ratificada	pela	Lei	de	6	de	junho	de	1755,	para	o	Grão-
Pará	e	Maranhão,	sendo	ampliada	para	 todo	o	restante	da	América	 lusitana	em
1758	 (Freitas,	 Décio.	Escravidão	 de	 índios	 e	 negros	 no	 Brasil.	 Porto	 Alegre:
EST/ICP,	1980,	p.	15	e	17).
8.	Moraes,	Evaristo	de.	A	Campanha	Abolicionista:	1879-1888.	Brasília:	Editora
Universidade	de	Brasília,	1986,	p.	372.
9.	“Não	 se	 imagine	 que	 a	 categoria	 social	 abrangida	 sob	 o	 termo	 genérico	 de
‘escravos’	formasse	um	conjunto	homogêneo.	[...]	havia	o	violento	desprezo	dos
crioulos	 pelos	 nativos	 da	 África,	 havia	 o	 sentimento	 de	 superioridade	 dos
mulatos	que,	por	terem	sangue	branco,	se	isolavam	dos	demais	escravos,	e	havia
ainda	 a	 hostilidade	 por	 vezes	 insopitável	 entre	 escravos	 de	 diferentes	 nações
africana”	 (Freitas,	 Décio.	 Palmares:	 a	 guerra	 dos	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:
Edições	Graal,	1982,	p.	31-32).
10.	A	escravidão	do	índio	já	havia	sido	proibida	no	Brasil	desde	o	advento	da	Lei
de	1º	de	abril	de	1680,	ratificada	pela	Lei	de	6	de	junho	de	1755,	para	o	Grão-
Pará	e	Maranhão,	sendo	ampliada	para	 todo	o	restante	da	América	 lusitana	em
1758.
11.	 Como	 o	 Code	 Noir	 francês	 de	 1685:	 “uma	 coletânea	 de	 regulamentos,
compilados	até	o	presente,	concernentes	ao	governo,	à	administração	da	justiça,
à	 polícia,	 à	 disciplina	 e	 ao	 comércio	 de	 negros	 nas	 colônias	 francesas”	 (Silva
Júnior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História,	 Direito	 e	 Escravidão.	 São	 Paulo:
Annablume:	Fapesp,	2013,	p.	155).
12.	 As	 razões	 para	 tanto	 podem	 ser	 estudadas	 na	 excelente	 análise	 em	 Silva
Júnior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História,	 Direito	 e	 Escravidão.	 São	 Paulo:
Annablume:	Fapesp,	2013,	p.	153-160.
13.	Teixeira	de	Freitas	nas	suas	Consolidações	das	Leis	Civis	omite	as	normas
que	regiam	a	escravidão,	não	porque	elas	não	existissem	no	Brasil,	mas	porque
representavam	 uma	 indignidade	 para	 o	 país,	 ou	 seja,	 não	 queria	 ser	 o	 autor
indiretamente	 de	 um	 abominável	 Código	 Negro	 que	 viesse	 a	 consolidar	 tais
odiosas	regras:	“Cumpre	advertir	que	não	há	um	só	lugar	do	nosso	texto,	onde	se
trate	de	escravos.	Temos,	é	verdade,	a	escravidão	entre	nós;	mas	esse	mal	é	uma
exceção	 que	 lamentamos,	 condenada	 a	 extinguir-se	 em	 época	 mais	 ou	 menos
remota,	 façamos	 também	 uma	 exceção,	 um	 capítulo	 avulso	 na	 reforma	 das
nossas	 Leis	 civis;	 não	 as	 maculemos	 com	 disposições	 vergonhosas,	 que	 não
podem	 servir	 para	 a	 posteridade;	 fique	 o	 estado	 de	 liberdade	 sem	 o	 seu
correlativo	odioso.	As	leis	concernentes	à	escravidão	(que	não	são	muitas)	serão
pois	 classificadas	 à	parte	 e	 formarão	o	nosso	Código	negro”	 (Freitas,	Augusto
Teixeira	de.	Consolidação	das	Leis	Civis.	Brasília:	Senado,	2003,	p.	XXXVIII).
14.	Muito	similar	ao	que	ocorria	com	a	preocupação	dos	capitalistas	do	século
XIX	 em	 face	 do	 proletariado	 que	 trabalhava	 nas	 fábricas	 insalubres,	 por
exemplo,	em	Manchester,	na	Inglaterra	(Huberman,	Leo.	História	da	Riqueza	do
Homem.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Guanabara,	1986,	p.	185-194).
15.	Moura,	Clóvis.	Dicionário	 da	 escravidão	 negra	 no	Brasil.	 São	 Paulo:	 Ed.
USP,	2004,	p.	206.
16.	 Para	 observar	 a	 dimensão	 e	 o	 volume	 de	 obras	 e	 estudos	 acerca	 da
escravidão,	 com	 diferentes	 abordagens,	 sugere-se,	 como	 ponto	 de	 partida,	 a
leitura	 de	 Gaspar,	 Lúcia.	O	 negro	 no	 Brasil:	 uma	 contribuição	 bibliográfica.
Recife:	Fudaj/Editora	Massangana,	1994.
17.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	Aescravidão	no	Brasil,	v.	1.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	14.
18.	“[...]	a	relevância	do	estudo	do	direito	para	a	interpretação	histórica	de	uma
determinada	sociedade	pode	ser	ajuizada	pela	noção	de	que	ele	nomeia,	qualifica
e	hierarquiza	todo	divórcio	entre	a	ação	do	indivíduo	e	o	princípio	fundamental
dessa	 sociedade”	 (Silva	 Júnior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História,	 Direito	 e
Escravidão.	São	Paulo:	Annablume:	Fapesp,	2013,	p.	15).
19.	Para	Savigny:	“Fonte	substancial	do	direito,	pois,	é	a	consciência	comum	do
povo,	que	dá	origem	e	legitimidade	às	normas	lógicas	que,	dela,	a	razão	extrai”
(In:	Ráo,	Vicente.	O	direito	e	a	vida	dos	direitos.	São	Paulo:	Editora	Revista	dos
Tribunais,	 1999,	 p.	 249).	 Para	 uma	 crítica	 acerca	 da	 ambiguidade	 e	 outros
problemas	 decorrentes	 dessa	 expressão,	 ver	 Ferraz	 Junior,	 Tércio	 Sampaio.
Introdução	ao	Estudo	do	Direito:	técnica,	decisão,	dominação.	São	Paulo:	Atlas,
2008,	p.	192.	“Por	fontes	do	direito	havemos	de	compreender	os	focos	ejetores
de	 regras	 jurídicas,	 isto	 é,	 os	 órgãos	 habilitados	 pelo	 sistema	 para	 produzirem
normas,	 numa	 organização	 escalonada,	 bom	 como	 a	 própria	 atividade
desenvolvida	por	esses	entes,	tendo	em	vista	a	criação	de	normas.	[...]	não	basta
a	 existência	 do	 órgão,	 devidamente	 constituído,	 tornando-se	 necessária	 sua
atividade	 segundo	 as	 regras	 aqui	 previstas	 no	 ordenamento	 [devido	 processo
legislativo]”	(Carvalho,	Paulo	de	Barros.	Curso	de	Direito	Tributário.	São	Paulo:
Saraiva,	2012,	p.	79).
20.	Utilizar	a	perspectiva	ou	os	conceitos	de	uma	época,	para	analisar	os	eventos
de	um	outro	período	histórico.	Vocábulo	que	surgiu	na	língua	francesa,	no	século
XVI,	 anachronisme,	 o	 qual	 derivou	 do	 idioma	 grego,	 anakhronismós,	 de
anakhronizomai,	 “o	 ato	 de	 colocar	 algo	 fora	 do	 seu	 adequado	 tempo
correspondente”	 (Viaro,	 Mário	 Eduardo.	 Por	 trás	 das	 palavras:	 Manual	 de
etimologia	do	português.	São	Paulo:	Globo,	2004,	p.	244).
21.	Ferreira,	Luís	Pinto.	Teoria	Geral	do	Estado,	v.	1.	São	Paulo:	Saraiva,	1975,
p.	31.
22.	 Bruno,	 Aníbal.	Direito	 Penal,	 parte	 geral:	 introdução,	 norma	 penal,	 fato
punível.	5.	ed.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	2003,	t.	I,	p.	106.
23.	Decreto-Lei	nº	2.848,	de	7	de	dezembro	de	1940.
24.	 “Art.	 361	 –	 Este	 Código	 entrará	 em	 vigor	 no	 dia	 1º	 de	 janeiro	 de	 1942”
(Código	Penal	de	1940).
25.	 Apesar	 da	 reforma	 da	 sua	 parte	 geral	 e	 de	 inúmeros	 dispositivos	 da	 parte
especial.
26.	 Trata-se,	 de	 forma	 simplificada,	 da	 aptidão	 que	 uma	 determinada	 lei,	 ou
diploma	normativo,	tem	para	produzir	efeitos.	Ou	seja,	a	lei	existe	e	pode	viger,
isto	 é,	 já	 pode	 ser	 executada.	 (Silva,	 de	 Plácido	 e.	 Vocabulário	 Jurídico.
Atualizadores:	Nagib	Slaibi	 Filho	 e	Gláucia	Carvalho.	Rio	 de	 Janeiro:	Editora
Forense,	2006,	p.	1485).
27.	Constituições	de	1937,	de	1946,	de	1967/69	e	de	1988.
28.	 “Na	 Assíria,	 Pérsia	 e	 Babilônia	 houve	 um	 célebre	 rei	 Hamurabi	 que
promulgou	 notável	 Código,	 [...]	 considerado	 o	 mais	 antigo	 conhecido	 (XII
Século	antes	de	Cristo)	com	282	parágrafos	ou	Leis,	sendo	uma	compilação	do
Direito	 Público	 e	 Privado	 compreendendo	 matérias	 processual,	 penal,
administrativa,	 civil	 e	 comercial	 [...]”	 (Valladão,	 Haroldo.	História	 do	 direito
especialmente	do	direito	brasileiro.	Rio	de	Janeiro:	Freitas	Bastos,	1977,	p.	37).
29.	Em	verdade,	o	direito	colonial	brasileiro,	por	exemplo,	possuía	uma	estrutura
muita	diversa	da	nossa,	que,	para	o	nosso	olhar,	poderia	se	assimilar	ao	completo
caos,	 como	 fala	 Caio	 Prado	 Júnior:	 “um	 amontoado	 que	 nos	 parecerá
inteiramente	 desconexo,	 de	 determinações	 particulares	 e	 casuísticas,	 de	 regras
que	se	acrescentam	umas	às	outras	sem	obedecerem	a	plano	algum	de	conjunto”
(Silva	 Júnior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História,	 Direito	 e	 Escravidão.	 São
Paulo:	Annablume:	Fapesp,	2013,	p.	154).
Eis	 um	 exemplo:	 “[...]	 o	 regimento	 de	 17	 de	 dezembro	 de	 1548	 –	 base	 do
segundo	 sistema	 de	 administração	 colonial	 –	 vigorou	 por	mais	 de	 um	 século,
servindo	a	todos	os	sucessores	de	Thomé	de	Souza	até	1677.	Com	o	tempo	esse
regimento	 foi	 complementado	 por	 ordenações	 avulsas,	 como	 cartas	 régias,
alvarás	 e	 provisões.	 Elas	 cresceram	 a	 tal	 ponto	 que	 em	 1677	 foi	 preciso
consolidá-las	num	outro	regimento	que	foi	outorgado	a	Roque	da	Costa	Barreto
(23-1-1677)”	 (Valladão,	 Haroldo.	História	 do	 direito	 especialmente	 do	 direito
brasileiro.	Rio	de	Janeiro:	Freitas	Bastos,	1977,	p.	78).
30.	 Essa	 natureza	 unitária	 do	 Império	 é	 reafirmada	 por	 um	 dos	 grandes
constitucionalistas	de	época:	“A	divisão	do	Império	em	províncias,	qual	existia
ao	tempo	em	que	foi	promulgada	a	nossa	lei	fundamental,	assim	como	a	atual,
não	 é	 nem	 devia	 ser	 de	 ordem	 constitucional;	 não	 são	 Estados	 distintos,	 ou
federados,	sim	circunscrições	territoriais,	unidade	locais,	ou	parciais	de	uma	si	e
mesma	unidade	geral.	[...]	Por	isso	mesmo	que	o	Império	é	um	e	único,	que	ele
não	 é	 dividido	 em	 províncias	 senão	 no	 sentido	 a	 fim	 de	 distribuir
convenientemente	os	órgãos	da	administração,	de	modo	que	em	toda	a	extensão
do	 país	 haja	 centros	 adequados	 e	 próximos	 para	 o	 serviço	 e	 bem-ser	 dos
respectivos	 habitantes	 [...]”	 (Bueno,	 José	 Antônio	 Pimenta.	Marquês	 de	 São
Vicente.	 Organização	 e	 introdução	 de	 Eduardo	 Kugelmas.	 São	 Paulo:	 Ed.	 34,
2002,	p.	88).	O	Ato	Adicional	de	1834,	que	 reformou	a	Constituição	de	1824,
conferindo	 atribuições	 às	 Assembleias	 Provinciais,	 as	 quais	 foram	 revistas
posteriormente	 pela	 Lei	 nº	 105,	 de	 12	 de	 maio	 de	 1840	 (Bonavides,	 Paulo	 e
Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.	 Brasília:	 OAB	 Editora,
2008,	p.	123-126).
31.	Alves,	 José	Carlos	Moreira.	Direito	Romano,	 v.	 1.	 10.	 ed.	Rio	 de	 Janeiro:
Forense,	1995,	p.	67-74.
32.	“O	problema	basilar	da	historiografia	 jurídica	se	encontra	na	ordenação	do
material;	 isto	 é,	 na	 imposição	 de	 uma	 sequência	 inteligível,	 e	 de	 conexões
significantes,	 a	 uma	 série	 de	 informações	 e	 de	 fatos	 que	 são	 conhecidos	 ou
‘levantados’	 através	 de	 pesquisas”	 (Saldanha,	Nelson.	Historiografia	 jurídica	 e
concepção	histórica	do	direito.	Estudos	Universitários:	Revista	da	Universidade
Federal	de	Pernambuco,	Recife,	n.	1/2,	p.	60,	jan./jun.	1975).
33.	Cretella	Junior,	José.	Curso	de	direito	romano:	o	direito	romano	e	o	direito
civil	 brasileiro.	 18.	 ed.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Forense,	 1995,	 p.	 19-20.	 Este	 mesmo
método	 é	 utilizado	 pelos	 autores	 quando	 se	 busca	 a	 compreensão	 do	 direito
romano	(Correia,	Alexandre	e	Sciascia,	Gaetano.	Manual	de	direito	romano.	5.
ed.	Rio	de	Janeiro:	Sadegra/Livros	cadernos	Ltda,	1996,	p.	32).
34.	“Quando	o	estudioso	moderno	trata	de	normas	ou	de	textos	arcaicos,	situa-os
em	articulações	que	refletem	a	arquitetônica	do	direito	 tal	como	é	concebido	e
vivido	 em	 seu	 tempo:	 assim	os	 assiriólogos	 ao	 separar	 normas	 administrativas
das	normas	processuais	dentro	de	códigos	encontrados	em	 tabletas”	 (Saldanha,
Nelson.	 Historiografia	 jurídica	 e	 concepção	 histórica	 do	 direito.	 Estudos
Universitários:	Revista	da	Universidade	Federal	de	Pernambuco,	Recife,	n.	1/2,
p.	61,	jan./jun.	1975).
35.	Nas	palavras	de	Rui	Barbosa:	“Se	Dante	Alighieri	 tivesse	vivido	no	século
XVIII,	colocaria	o	vértice	dos	sofrimentos	inexprimíveis,	o	círculo	íntimo	do	seu
Inferno	no	porão	de	uma	embarcação	negreira,	num	desses	núcleos	de	suplícios
infindos	que	apenas	poderia	descrever	a	poesia	sinistra	da	loucura;	numa	dessas
gemônias	flutuantes,	ninhos	de	abutres	humanos	que	a	mão	da	mais	perversa	das
malfeitorias	espargiu	durante	trezentos	anos	no	Atlântico	[...]”	(Lima,	Manuel	de
Oliveira.	O	Movimento	da	Independência:	o	Império	brasileiro	(1821-1889).	São
Paulo:	Melhoramentos,	p.	405).
Capítulo	1
	
A	Escravidãocomo	herança
	
	
Origens	da	Escravidão	na	América	Portuguesa.
Compreendendo	a	dimensão	da	escravidão	na
sociedade	brasileira
Imagine-se	voltar	no	tempo	para	o	início	do	século	XIX,	na	zona
da	mata	da	conflagrada	Província	de	Pernambuco,	assolada36	por	duas
revoltas	 em	 menos	 de	 uma	 década37.	 Sob	 o	 sol	 inclemente	 dos
trópicos,	estaria	em	uma	viagem	no	 lombo	de	um	equino,	 saindo	da
capital	da	província,	a	Cidade	do	Recife38,	no	litoral,	pouco	depois	das
revoltas	de	1824,	para	a	Villa	de	Goyanna,	mais	ao	norte,	no	interior,
distando	 pouco	mais	 de	 60	 quilômetros,	 armado	 e	 acompanhado	 de
outros	indivíduos	(já	que	existia	risco	de	roubos)39.
Galopando	 pelas	 quentes	 e	 verdejantes	 paisagens	 bucólicas
tropicais	 das	 paragens	 brasileiras,	 nas	 grandes	 fazendas,	 estavam	 os
escravos40,	na	sua	miserável	labuta	diária41.	Talvez,	em	um	momento
de	 reflexão,	 você	 se	 perguntasse	 se	 isso	 sempre	 foi	 assim:	 a
escravidão	sempre	existiu	no	mundo?
Essa	pergunta	poderia	ser	respondida	pela	Bíblia	cristã.	Na	época
de	 Adão	 e	 Eva	 e	 dos	 seus	 primeiros	 descendentes,	 não	 havia
escravidão.	Entretanto,	com	base	nos	versículos	de	5	a	9,	do	capítulo
6,	da	Carta	de	São	Paulo	aos	Efésios42,	já	ouvira	o	padre	admoestar	os
fiéis	a	tratar	bem	seus	escravos,	bem	como	sabia	que	o	santo	católico
havia	 recomendado	aos	 escravos	que	 fossem	bons	para	 com	os	 seus
“donos”.
Após	tais	primeiros	pensamentos,	o	cidadão	do	Império	do	Brasil,
nosso	 personagem,	 iria	 reformular	 a	 sua	 pergunta:	 quando	 a
escravidão	 surgiu	 no	 Brasil?	 Possivelmente,	 ninguém	 saberia	 com
precisão43.	 Para	 oferecer	 a	 resposta	 adequada	 deveria	 existir	 alguém
que	conhecesse	bem	a	legislação	lusitana,	o	que	seria	 improvável	no
grupo	 de	 viajantes.	 Imaginando	 o	 espírito	 pouco	 letrado	 desses
homens,	 possivelmente,	 com	 pouca	 polidez,	 alguém	 responderia	 em
tom	 de	 brincadeira:	 “que	 ele	 deixasse	 de	 pensar	 besteira,	 pois	 isso
sempre	 existiu!44	 Ou	 será	 que	 ele	 queria	 ocupar	 o	 lugar	 desses
negros?”.
A	resposta,	apesar	de	bruta,	toca	no	ponto	correto:	ao	menos	para	a
América	 lusitana,	 à	 luz	 da	 legislação	 da	 Metrópole,	 a	 escravidão
sempre	 existiu45.	 E	 o	 Império	 do	 Brasil	 recebeu	 a	 escravidão	 como
algo	natural46.
O	 cativeiro	 de	 milhões	 de	 africanos	 era	 apenas	 mais	 um	 dos
elementos	 das	 vastas	 paisagens	 bucólicas	 que	 integravam	 o	 imenso
território	 da	Nação	 governada	 pelo	Defensor	 Perpétuo	 do	Brasil,	D.
Pedro	I47.	Naturalmente,	o	corpo	legal	da	escravidão	no	Novo	Mundo
adquiriu	características	distintas	daquelas	de	Portugal,	mas	se	não	se
desprezava	a	legislação	anterior48,	não	se	criou	um	código	específico
para	regulamentar	tal	relação49.
Apesar	 de	 a	 legislação	 de	 D.	 Alfonso	 X,	 o	 Sábio50,	 manter	 a
escravidão,	 recepcionando-a	 do	 Código	 de	 Justiniano	 (que	 a	 previa
como	 uma	 forma	 de	 evitar	 a	 morte	 dos	 indivíduos	 capturados	 em
guerras51),	declarava	a	não	naturalidade	dessa	relação,	assegurando	a
manumissão	 (o	 direito	 à	 alforria).	 As	 posteriores	 Ordenações
Afonsinas52	 e	 Manuelinas	 também	 tratavam	 o	 cativo	 de	 forma
similar53.
Todavia,	existia	uma	peculiaridade:	o	cativo	a	que	se	referiam	tais
legislações	eram	os	mouros	capturados	nas	guerras	de	Reconquista	e
na	 posterior	 expansão	 ultramarina,	 em	 terras	 controladas	 pelo	 Islã54,
ou	seja,	era	o	infiel	aprisionado,	que	poderia	aceitar	a	fé	cristã,	e	que
também	poderia	 ser	 alforriado55.	O	 tratamento	 dispensado	 ao	mouro
submetido	era	o	de	servo56,	a	transição	ocorreu	posteriormente.
As	 Ordenações	 Filipinas,	 de	 160357	 surgiram	 como	 o	 diploma
legislativo	 mais	 próximo	 das	 realidades	 do	 Novo	 Mundo	 e	 da
exploração	mercantilista	 das	 riquezas	 naturais	 das	 colônias58.	 O
vocábulo	 “servo”	 aparece	 totalmente	 substituído	 por	 “escravo”,
relacionado	 apenas	 aos	 africanos59:	 “[...]	 escravo,	 a	 partir	 da
colonização	 das	 terras	 ultramarinas,	 refere-se	 a	 uma	 realidade
objetivamente	 distinta	 da	 que	 recobre	 o	 mouro	 cativo,	 servo	 ou
“escravo”	metropolitano”60.
Nesse	 diploma	 legal,	 as	 normas	 sobre	 escravidão	 estavam
agrupadas	no	Livro	IV	(direito	civil	substantivo)	e	no	Livro	V	(direito
penal	e	processual	criminal)	das	Ordenações	Filipinas,	portanto:
[...]	 a	 legislação	 relacionada	 à	 escravidão,	 de
subordinada	 ao	 campo	 da	 religião,	 passaria	 a	 ser
integrada	aos	campos	relativos	ao	comércio	e	ao	direito
penal.	 [...]	 A	 transição	 do	 cativeiro	 mouro	 (de	 caráter
passageiro,	 pertencente	 à	 esfera	 eclesiástica	 e	 com
importância	diminuta	na	reprodução	da	base	material	da
sociedade	 portuguesa)	 para	 a	 escravidão	 negra	 (de
caráter	 durável,	 pertencente	 às	 esferas	 comercial	 e
penal,	 e	 basilar	 na	 sustentação	 da	 empresa	 colonial)
enquanto	 objetos	 legislativos	 fica	 muito	 bem
demonstrada.61
Dentro	dessa	visão	mercantil	da	escravidão,	o	Título	XVII,	Livro
IV,	das	Ordenações	Filipinas,	concedia	ao	escravo	africano	a	natureza
de	coisa	comercializável,	reduzindo-o	a	um	mero	bem,	que	poderia	ser
transferido	de	um	proprietário	para	outro,	mediante	o	negócio	jurídico
da	compra	e	venda62.	A	desumanização	do	escravo63	era	tamanha	que,
nos	 parágrafos	 desse	 Título	 havia	 a	 regulamentação	 de	 eventuais
vícios	redibitórios	no	contrato	de	compra	e	venda	do	escravo,	além	de
outros	que	pudessem	vir	a	contaminar	o	referido	negócio	jurídico:
Qualquer	pessoa,	que	comprar	algum	escravo	doente	de
tal	 enfermidade,	 que	 lhe	 tolha	 servir-se	 dele,	 o	 poderá
enjeitar	a	quem	lho	vendeu,	provando	que	já	era	doente
em	seu	poder	de	tal	enfermidade,	com	tanto	que	cite	ao
vendedor	dentro	de	seis	meses	o	dia,	que	o	escravo	lhe
for	entregue.	[...]
Se	 o	 escravo	 tiver	 cometido	 algum	 delito,	 pelo	 qual,
sendo-lhe	provado,	mereça	pena	de	morte,	e	ainda	não
for	livre	por	sentença,	e	o	vendedor	ao	tempo	da	venda
e	não	declarar,	poderá	o	comprador	enjeitá-lo	dentro	de
seis	meses,	contados	da	maneira,	que	acima	dissemos.	E
o	mesmo	será,	se	o	escravo	tivesse	tentado	matar-se	por
si	 mesmo	 com	 aborrecimento	 da	 vida,	 e	 sabendo-o	 o
vendedor,	o	não	declarasse.64
Como	 exposto,	 a	 exploração	 colonial	 transformou	 o	 mundo	 e
gerou	 uma	 nova	 forma	 de	 regulamentar	 a	 escravidão,	 a	 qual
passou	 a	 ser	 considerada	 pelas	Metrópoles	 europeias	 como	 um	 dos
elementos	 centrais	 para	 a	 colonização	 do	 Novo	Mundo65.	 Portanto,
seria	 estranho	 que,	 no	 ato	 da	 Independência,	 o	 Estado	 Imperial
Brasileiro	 não	 recepcionasse	 toda	 a	 legislação	 colonial,	 juntamente
com	a	 relação	 jurídica	que	servia	de	base	para	a	manutenção	do	seu
sistema	produtivo,	a	escravidão66.
Por	 essa	 razão,	 ao	 se	 declarar	 a	 independência	 do	 Brasil,	 Sua
Majestade	 Imperial	 recepcionou,	 também,	 toda	 a	 legislação	 colonial
que	 mantinha	 em	 cativeiro,	 naquela	 época,	 aproximadamente
1.140.000	 escravos,	 dentro	 de	 um	 universo	 de	 3.690.000	 de
indivíduos	 no	 território	 da	 nova	 Nação,	 ou	 seja,	 aproximadamente
31%	da	população	da	Nação67.
O	Império	não	herdou	apenas	a	estrutura	econômico-social	vigente
durante	a	colônia,	mas	também	a	legislação	metropolitana	portuguesa,
recepcionada	pela	Lei	de	20	de	outubro	de	182368:
Art.	 1.º	 As	 Ordenações,	 Leis,	 Regimentos,	 Avaras,
Decretos,	 e	 Resoluções	 promulgadas	 pelos	 Reis	 de
Portugal,	 e	pelas	quais	o	Brasil	 se	governava	até	o	dia
25	 de	 Abril	 de	 1821,	 em	 que	 Sua	 Majestade
Fidelíssima,	 atual	 Rei	 de	 Portugal,	 e	 Algarves,	 se
ausentou	desta	Corte;	e	todas	as	que	foram	promulgadas
daquela	 data	 em	 diante	 pelo	 Senhor	 D.	 Pedro	 de
Alcântara,	como	Regente	do	Brasil,	em	quanto	reino,	e
como	 Imperador	 Constitucional	 dele,	 desde	 que	 se
erigiu	 em	 Império,	 ficam	 em	 inteiro	 vigor	 na	 parte,
em	que	não	tiverem	sido	revogadas,	parapor	elas	se
regularem	 os	 negócios	 do	 interior	 deste	 Império,
enquanto	 se	 não	 organizar	 um	 novo	 Código,	 ou	 não
forem	especialmente	alteradas.
Na	falta	de	um	Código69,	os	atos	da	vida	civil	deveriam	ser	regidos
pelo	Livro	IV,	das	Ordenações	Filipinas,	que	tratava	especificamente
desse	 tema,	mas	que	não	possuía	 ponto	de	 contato	 com	a	 sociedade
brasileira	 do	 século	 XIX,	 pois	 esse	 diploma	 legislativo	 havia	 sido
criado	durante	a	União	Ibérica70.	A	recepção71	dessa	estrutura	jurídica
obsoleta	foi	objeto	de	comentários	pelo	Conselheiro	Joaquim	Ribas:
O	último	[trabalho	legislativo	português],	que	ainda	até
hoje	 se	 acha	 em	 vigor,	 foi	 começado	 no	 reinado	 de
Felipe	 II	 de	 Espanha	 e	 I	 de	 Portugal,	 e	 concluída	 no
seguinte,	sendo	sancionado	e	publicado	pelo	Alv.	de	11
de	 Janeiro	 de	 1603.	 Em	 consequência,	 porém,	 da
elevação	 da	 casa	 de	 Bragança	 ao	 trono	 de	 Portugal,
entende-se	necessário	revalidar	estas	Ordenações,	e	para
este	 fim	 expediu	D.	 João	 IV	 a	 lei	 de	 29	 de	 janeiro	 de
1643,	que	revogou	todas	as	legislações	anteriores	a	ela,
[salvo	 algumas	 exceções]	 [...].	 Dos	 cinco	 livros	 das
Ordenações	 Filipinas	 quase	 que	 só	 o	 4º	 é	 destinado	 à
teoria	do	direito	civil.	Mas	os	seus	preceitos,	além	de
minimamente	 deficientes,	 e	 formulados	 sem	ordem,
não	estão	ao	par	das	necessidades	da	sociedade	atual
e	dos	progressos	da	ciência	jurídica.72
A	nova	Nação	passou	a	 ser	 regida	por	um	documento	 legislativo
que,	 na	 data	 da	 sua	 independência,	 já	 possuía	mais	 de	 200	 anos	 de
existência73.	E	 o	 pior,	 tal	 diploma	 legal	 e	 a	 legislação	 superveniente
mantinham	 a	 escravidão.	 O	 processo	 de	 Independência	 não	 buscou
alterar	os	elementos	naquilo	que	era	fundamental:	a	escravidão	como
base	das	relações	econômicas74.
A	 escravidão	 sempre	 foi,	 ao	menos	 para	 a	América	 lusitana,	 um
elemento	natural	na	paisagem,	como	em	uma	pintura	de	Rugendas75:
ela	era	o	alicerce	sobre	o	qual	se	erigia	toda	a	construção	da	riqueza76
e	financiamento	para	a	manutenção	da	estrutura	burocrática	lusitana77.
Junto	 com	a	 imensidão	 do	 seu	 território,	a	 ignominiosa	 escravidão
serviu	para	a	edificação	da	nova	Nação.
Apresentado	 o	 cenário	 em	 que	 o	 Império	 do	 Brasil	 nasceu,	 é
necessário	que	seja	estudado	o	golpe	de	Estado	dado	por	D.	Pedro	I,
que	fragilizou	sua	figura	pública,	e	do	qual	nasceu	a	Constituição	de
1824.
Notas
36.	Além	da	Revolução	pernambucana	de	1817	e	da	Confederação	do	Equador
de	 1824,	 ainda	 houve	 em	 Recife,	 em	 1º	 de	 junho	 e	 em	 dezembro	 de	 1822,
levantes	populares,	com	participação	militar.	Em	fevereiro	de	1823,	aconteceu	a
“Pedrosada”,	que	tentou	instituir	“uma	ditadura	populista	efêmera”	na	Província.
Tais	 movimentos	 foram	 rapidamente	 debelados,	 mas	 demonstravam	 que	 as
insatisfações	 locais	 estavam	 em	 efervescência,	 prontas	 para	 explodir	 em	 1824
(Azevedo,	 Jorge	 Duarte	 de.	 Portugal	 e	 Brasil:	 dos	 Afonsinos	 aos	 Bragança.
Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	357-356).
37.	 Sugere-se	 a	 leitura	 da	 obra	 de	 Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 A	 outra
independência:	 o	 federalismo	 pernambucano	 de	 1817	 a	 1824.	 Rio	 de	 Janeiro:
Editora	34,	2004,	p.	235,	no	qual	fica	retratada	a	intranquilidade	da	região.
38.	A	antiga	Vila	de	Santo	Antônio	do	Recife.
39.	Goulart,	José	Alípio.	Da	fuga	ao	suicídio:	aspectos	da	rebeldia	dos	escravos
no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:	Conquista,	1972,	p.	77-108.
40.	 Cumpre,	 desde	 já,	 registrar	 que	 os	 escravos	 no	 Brasil	 não	 eram
compreendidos	 como	 uma	 massa	 uniforme.	 Além	 das	 diferenças	 existentes
decorrentes	 de	 cada	 uma	 das	 terras	 africanas	 de	 onde	 eles	 eram	 provenientes,
havia	uma	classificação	no	que	se	 refere	ao	nível	de	aculturamento.	O	escravo
nascido	na	África	era	denominado	de	ladino;	se	no	Brasil,	chamava-se	de	crioulo
(Luna,	Luís.	O	Negro	 na	Luta	 contra	 a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,
1976,	p.	47).
“Boçal	 significava,	 naquele	 tempo	 e	 em	 relação	 a	 escravos,	 que	 ele	 ainda	 não
sabia	 falar	 a	 língua	 portuguesa”	 (Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha
Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:	 Editora	 Universidade	 de	 Brasília,	 1986,	 p.
368).	 “Ladino”	 seria	 o	 negro	 africano	 catequizado	 e	 que	 já	 conhecia	 a	 língua
portuguesa,	 bem	 como	 as	 regras	 básicas	 da	 sociedade	 brasileira	 (Mamigonian,
Beatriz	 G.	Africanos	 livres:	 a	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil.	 São
Paulo:	Companhia	das	Letras,	2017,	p.	17).
41.	 Freitas	 dá	 uma	 interpretação	 um	 pouco	 diferente	 a	 esses	 termos:
“Chamavam-se	 ‘ladinos’	 os	 escravos	 dotados	 de	 aptidão	 para	 certos	 misteres
especializados.	[...]	Ordinariamente,	um	escravo	ladino	valia	por	quatro	boçais	e,
entre	 os	 ladinos,	 dava-se	 preferência	 aos	 já	 nascidos	 no	 Brasil,	 chamados	 de
‘crioulos’”	 (Freitas,	 Décio.	 Palmares:	 a	 guerra	 dos	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:
Edições	Graal,	1982,	p.	32).
Importante	fazer	breve	anotação	acerca	da	abolição	da	escravidão	indígena:	a	lei
de	1º	 de	 abril	 de	 1680,	 extremamente	 ineficaz,	 criou	uma	 falsa	 expectativa	de
liberdade	para	os	cativos	indígenas,	razão	pela	qual	houve	muita	pressão	política
para	a	sua	revogação.	Houve	regulamentações	que	retiraram	também	a	eficácia
desse	diploma	legal,	criando	regimes	de	trabalho	forçado	para	os	índios.	Pela	Lei
de	6	de	junho	de	1755,	que	alcançava	apenas	o	Estado	do	Grão-Pará	e	Maranhão
foi	abolida	a	escravidão	no	seu	território,	a	qual	foi	estendida	para	o	restante	da
América	lusitana	por	meio	de	Alvará	de	1758.	O	resgate	dos	indígenas	passou	a
ser	feito	também	às	custas	da	Fazenda	real	(Bandeira,	Alípio;	Miranda,	Manoel
da	 Costa.	A	 situação	 do	 Índio	 perante	 a	 Legislação	 Antiga	 e	 Moderna	 in	 A
Cidadania	no	Brasil:	 o	 índio	 e	 o	 escravo	 negro	 (Brasília,	 1988,	Ministério	 do
Interior,	p.	11-38).	No	que	se	refere	aos	índios,	devemos	registrar	que,	o	Império
do	Brasil	permaneceu	em	guerra	contra	algumas	tribos	até	1831,	na	atual	região
Sudeste:	“[...]	no	Império,	a	lei	de	27	de	outubro	de	1831	derrogou	a	Carta	Régia
de	13	de	maio	de	1808	que	mandava	fazer	guerra	aos	Botucudos	e	obrigava	os
índios	prisioneiros	de	S.	Paulo	e	Minas	Gerais	a	 servirem	durante	15	anos	aos
milicianos	 que	 os	 apreendessem.	 A	 mesma	 lei	 libertava	 todos	 os	 selvagens
escravos	e	mandava	aplicar-lhes	as	Ordenações	Filipinas,	L.1.º,	Tit.	88	ou	seja	o
Regimento	 dos	 Órfãos.	 Vieram	 depois	 o	 Decreto	 de	 3	 de	 junho	 de	 1833	 e	 o
Decreto	n.	143	de	15	de	março	de	1842,	art.	4.º,	n.	12,	entregando	aos	Juízes	de
Órfãos	 a	 administração	 dos	 bens	 dos	 índios”	 (Campello,	 Francisco	 Barreto
Rodrigues.	A	 legislação	 fóssil	do	brasil	 e	 a	menoridade	dos	 selvagens.	Revista
Praedicatio,	 v.	 2,	 p.	 1,	 2010).	 Para	 uma	 visão	 geral	 da	 escravidão	 indígena:
Sampaio,	 Aluysio	Mendonça.	 Senhores	 e	 Escravos:	 a	 escravidão	 indígena	 no
Brasil.	São	Paulo:	Carthago	e	Forte,	1994.
42.	“Escravos,	obedeçam,	com	medo	e	respeito	àqueles	que	são	seus	nos	aqui	na
terra.	 Façam	 isso	 com	 sinceridade,	 como	 se	 estivessem	 fazendo	 a	 Cristo.	 [...]
Donos	de	escravos,	tratem	os	seus	escravos	com	respeito	e	parem	de	ameaça-los
com	castigos.	Lembrem	que	vocês	e	seus	escravos	pertencem	ao	mesmo	Senhor,
que	está	no	céu,	o	qual	trata	a	todos	igualmente”.
43.	 O	 primeiro	 desembarque	 de	 negros	 escravos	 em	 Portugal,	 acredita-se	 que
tenha	 ocorrido	 em	1442,	 transportados	 por	 um	 indivíduo	 chamado	de	Antônio
Gonçalves.	 Eram	 40	 escravos	 transportados	 da	 África	 Ocidental.	 Para	 mais
detalhes,	 ver	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	Escravidão	 no	Brasil:
ensaio	 histórico-jurídico-social:	 africanos,	 v.	 III.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typographia
Nacional,	1867,	p.	2.
44.	“Em	quase	todas	as	regiões	do	Brasil	a	escravidão	negra	era	o	aspecto	mais
característico,	tanto	do	panorama	rural	quantodo	urbano.	Os	portugueses	tinham
sido	os	primeiros	pioneiros	da	agricultura	em	grande	escala	(fazendas)	no	Novo
Mundo	 e	 a	 escravidão	 era	 a	 pedra-de-toque	 da	 economia	 e	 da	 sociedade
agrícola”	(Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	 tráfico	de	 escravos	no	Brasil:	 a	Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;
São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	16).
45.	 Estrada,	 Osório	 Duque.	A	Abolição.	 Brasília:	 Edições	 do	 Senado	 Federal,
2005,	 p.	 27.	 Em	 1549,	 com	 Tomé	 de	 Sousa,	 vieram	 para	 a	 Bahia	 escravos
importados	 da	África,	mas	 há	 notícias	 que	 já	 em	1542	 já	 houve	 requisição	 de
importação	 de	 negros	 para	 a	 Capitania	 de	 Pernambuco,	 por	 Duarte	 Coelho
(Luna,	Luís.	O	Negro	 na	Luta	 contra	 a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,
1976,	p.	35).
46.	 Lima,	 Manuel	 de	 Oliveira.	 O	 Movimento	 da	 Independência:	 o	 Império
brasileiro	(1821-1889).	São	Paulo:	Melhoramentos,	p.	404.
47.	Título	 recebido	 e	 aceito	 por	D.	 Pedro	 I	 em	maio	 de	 1822	 (Vianna,	Hélio.
História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	64).
48.	 Silva	 Junior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História.	 Direito	 e	 Escravidão:	 a
legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São	 Paulo:
Annablume,	2013,	p.	45.
49.	 Silva	 Junior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História.	 Direito	 e	 Escravidão:	 a
legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São	 Paulo:
Annablume,	 2013,	 p.	 35.	 O	 direito	 francês	 produziu	 um	 diploma	 jurídico
específico	 para	 regulamentar	 a	 relação	 escravista,	 Le	 Code	 Noir,	 em	 duas
versões,	a	de	1685	e	a	de	1724.
50.	As	Siete	Partidas,	consolidação	de	legislação	organizada	entre	1263	a	1265,
por	 D.	 Afonso	 X,	 o	 Sábio	 (rei	 de	 Castela	 e	 Leão,	 entre	 1221-1284),	 assim
dispunha	sobre	“los	siervos”,	no	seu	título	21,	Lei	nº	1,	explicando	a	origem	da
servidão,	 a	 razão	 da	 sua	 existência	 e	 os	 seus	 tipos:	 “Ley	 1:	 Servidumbre,	 es
postura,	o	establecimiento	que	hicieron	antiguamente	las	gentes,	por	la	cual	los
hombres,	 que	 eran	 naturalmente	 libres,	 se	 hacían	 siervos	 y	 se	 sometían	 a
señorío	de	otro	contra	razón	de	naturaleza.	Y	siervo	 tomó	este	nombre	de	una
palabra	 que	 es	 llamada	 en	 latín	 servare,	 que	 quiere	 tanto	 decir	 en	 romance
como	 guardar:	 Y	 esta	 guarda	 fue	 establecida	 por	 los	 emperadores,	 pues
antiguamente	 a	 todos	 cuantos	 cautivaban,	 matábanlos,	 mas	 los	 emperadores
tuvieron	por	bien	y	mandaron	que	no	los	matasen,	mas	que	los	guardasen	y	se
sirvieren	de	 ellos.	Y	hay	 tres	maneras	de	 siervos:	 la	 primera	 es	 la	 de	 los	 que
cautivan	en	 tiempo	de	guerra	siendo	enemigos	de	 la	 fe;	 la	 segunda	es	de	 los
que	nacen	de	las	siervas;	la	tercera	es	cuando	alguno	que	es	libre	se	deja	vender
[...]”.
Por	sua	vez,	no	título	29,	nas	Leis	nº	01	e	03,	assim	dispunha	sobre	os	cativos
infiéis,	que	passavam	a	servidão	pelo	seu	estado	de	prisioneiros	de	guerra,	mas
que	 poderiam	 obter	 a	 sua	 liberdade:	 “Mas	 cautivos	 son	 llamados	 por	 derecho
aquellos	 que	 caen	 en	 prisión	 de	 hombres	 de	 otra	 creencia;	 y	 estos	 lo	 matan
después	que	los	tienen	presos	por	desprecio	que	tienen	a	su	ley,	o	los	atormentan
con	muy	 crudas	 penas,	 o	 se	 sirven	 de	 ellos	 como	 siervos	metiéndolos	 a	 tales
servicios	 que	 querrían	 antes	 la	 muerte	 que	 la	 vida;	 y	 sin	 todo	 esto	 no	 son
señores	de	lo	que	tienen	pagándolo	a	aquellos	que	les	hacen	todos	estos	males,	o
los	venden	cuando	quieren.	Por	lo	que	por	todas	estas	cuitas	y	por	otras	muchas
que	 sufren,	 son	 llamados	 con	derecho	 cautivos,	 porque	 esta	 es	 la	mayor	 pena
que	los	hombres	pueden	tener	en	este	mundo.	[...]	Ley	3:	Sacar	los	hombres	de
cautiverio	 es	 cosa	 que	 place	 mucho	 a	 Dios	 porque	 es	 obra	 de	 piedad	 y	 de
merced,	 y	 está	 bien	 en	 este	 mundo	 a	 los	 que	 lo	 hacen.	 [...]”	 (Disponível	 em:
<https://goo.gl/TR04c>.	Acesso	em:	6	dez.	2017).
Para	mais	detalhes,	ver	Drescher,	Seymour.	Abolição:	uma	história	da	escravidão
e	do	antiescravismo.	Tradução	de	Antônio	Penalves	Rocha.	São	Paulo:	Unesp,
2011,	p.	15-16.
51.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	1.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	191.
52.	 “Ordenações	 Afonsinas.	 O	 primeiro	 monumento	 legislativo	 foi	 o	 Código
Afonsino	ou	as	Ordenações	Afonsinas,	promulgadas	por	D.	Afonso,	em	1446,	a
primeira	grande	codificação	moderna	[...]”,	consolidando	a	legislação	anterior	e
sistematizando-a	 em	 livros,	 além	 de	 criar	 um	 “famigerado”	 livro	 de	 com
previsão	 de	 penas	 cruéis	 (Livro	V)	 para	 o	 caso	 de	 infrações	 penais	 (Valladão,
Haroldo.	História	do	direito	especialmente	do	direito	brasileiro.	Rio	de	Janeiro:
Freitas	Bastos,	1977,	p.	70).
53.	 Silva	 Junior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História.	 Direito	 e	 Escravidão:	 a
legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São	 Paulo:
Annablume,	 2013,	 p.	 37,	 53	 e	 54.	 As	 Ordenações	 Manuelinas	 foram	 “[...]
organizadas	 pelo	 célebre	 jurista	 português	 Antonio	 Gouvea,	 que	 estudou	 e
lecionou	 na	 França,	 Toulouse,	 Grenoble	 e	 Valença,	 mantinha	 o	 sistema	 das
Ordenações	 Afonsinas,	 mas	 apareceu	 mais	 condensado,	 e	 representou	 uma
primeira	 vitória	 do	 romanismo	 e,	 sobretudo,	 do	 fortalecimento	 do	 poder
absoluto,	 desaparecendo	 antigas	 liberdades.	 [...]	 As	 Ordenações	 Manuelinas
[1511-1603]	 vigoraram	 no	 Brasil	 logo	 após	 a	 descoberta”	 (Valladão,	 Haroldo.
História	do	direito	 especialmente	 do	direito	 brasileiro.	Rio	 de	 Janeiro:	 Freitas
Bastos,	1977,	p.	70-71).
54.	Registre-se	que	esse	aprisionamento	era	considerado	um	ato	de	misericórdia
para	com	os	capturados,	os	quais	poderiam	se	converter	também	ao	cristianismo
(Gerson,	Brasil.	A	escravidão	no	império.	Rio	de	Janeiro:	Pallas,	1975,	p.	1-2).
Nas	 palavras	 de	 Joaquim	Nabuco:	 “[...]	 os	 portugueses	 puderam	 fazer	 de	 seus
inimigos	 os	 seus	 primeiros	 cativos.	 Mas	 esse	 cativeiro	 foi	 sempre	 muito
temperado;	 havia	 uma	 necessidade	 a	 que	 ele	 tinha	 de	 ceder,	 a	 necessidade	 da
permuta	dos	cativos	mouros	de	Portugal	pelos	cativos	portugueses	do	Marrocos”
(Nabuco,	Joaquim.	A	escravidão.	Recife:	Fundaj/Editora	Massangana,	1988,	p.
111).
55.	Pretendia-se	 também	que	o	capturado	fosse	objeto	do	benefício	do	resgate,
seja	 por	meio	 de	 pagamento	 ou	 de	 troca	 de	 prisioneiros,	 o	 que	 os	 livraria	 da
morte	 certa	 (Malheiro,	Agostinho	Marques	 Perdigão.	A	Escravidão	 no	 Brasil:
ensaio	 histórico-jurídico-social:	 africanos,	 v.	 III.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typographia
Nacional,	1867,	p.	2).
56.	Ord.	Af.	L.	2.º	tit.	99	e	seguintes;	Ord.	Fil.	L.	4.º	tit.	11	§	4.º,	tit.	83	§	4.º,	tit.
85,	 tit.	88	§	16.	–	O	Alv.	do	1.º	de	 junho	de	1641,	porém,	proibiu	 ter	escravos
mouros;	o	que	prova	que	eles	existiam	e	eram	tolerados	até	essa	época.
57.	Valladão,	Haroldo.	História	 do	 direito	 especialmente	 do	 direito	 brasileiro.
Rio	de	Janeiro:	Freitas	Bastos,	1977,	p.	77.
58.	“Código	produzido	em	 fins	do	 século	XVI,	 em	Portugal,	 como	 reforma	às
Ordenações	 Manuelinas,	 ele	 já	 teria	 nascido,	 em	 1603,	 ultrapassado.	 [...]	 as
Ordenações	são	a	reunião,	em	um	corpo	legislativo,	de	dispositivos	manuelinos
subsequentes,	 sem	 a	 reformulação	 das	 normas.	Algumas,	 que	 já	 haviam	 caído
em	desuso,	permaneciam	no	código,	no	começo	do	século	XVII.	 Imaginem	só
esse	mesmo	 código	 sendo	 usado	 em	meados	 do	 século	XIX,	 numa	 sociedade
completamente	diferente!”	(Grinberg,	Keila.	Liberata:	a	 lei	da	ambiguidade:	as
ações	de	liberdade	da	Corte	de	Apelação	do	Rio	de	Janeiro	no	século	XIX.	Rio
de	Janeiro:	Relume-Dumará,	1994,	p.	87).
59.	 Silva	 Junior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História.	 Direito	 e	 Escravidão:	 a
legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São	 Paulo:
Annablume,	2013,	p.	54.
60.	Lara	Ribeiro	apud	Silva	Junior,	Waldomiro	Lourençoda.	História.	Direito	e
Escravidão:	 a	 legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São
Paulo:	Annablume,	2013,	p.	55.
“É	 digno	 de	 nota	 que	 essa	 compilação	 legislativa	 não	 se	 ocupava	 apenas	 de
escravos	 negros	 ou	mouros,	 porém,	 igualmente,	 de	 escravos	 brancos,	 situação
bastante	 familiar	 no	 Portugal	 do	 século	 XVI,	 sobretudo	 nos	 mosteiros	 e
conventos”	 (Freitas,	 Décio.	 Palmares:	 a	 guerra	 dos	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:
Edições	Graal,	1982,	p.	28-29).
61.	 Silva	 Junior,	 Waldomiro	 Lourenço	 da.	 História.	 Direito	 e	 Escravidão:	 a
legislação	 escravista	 no	 Antigo	 Regime	 Ibero-Americano.	 São	 Paulo:
Annablume,	2013,	p.	55.
62.	Segundo	a	doutrina	de	direito	 civil,	 os	negócios	 jurídicos	 são	os	 “[...]	 atos
jurídicos	 strictu	 sensu	 em	 que	 é	 elemento	 essencial	 a	 vontade	 [...]	 Quanto	 ao
negócios	jurídicos,	em	todos	eles	é	essencial	o	elemento	volitivo;	daí	ser	sempre
exigida	capacidade	e	a	ausência	de	vícios	de	vontade.	Nos	suportes	fáticos,	há,
necessariamente	 e	 em	 primeira	 plana,	 o	 elemento	 volitivo,	 porém	 há	 também
outros	 elementos”	 (Miranda,	 Pontes	 de.	 Tratado	 de	 Direito	 Privado,	 v.	 2.
Campinas:	 Bookseller,	 2000,	 p.	 468-469).	 Ou	 seja,	 são	 os	 atos	 jurídicos	 nos
quais	 a	 manifestação	 de	 vontade	 das	 partes	 pode	 delinear	 os	 seus	 principais
contornos,	 como	 em	 um	 contrato	 de	 compra	 e	 venda,	 no	 qual	 o	 preço,	 prazo,
objeto,	forma	de	pagamento	etc.	são	definidos	pelas	próprias	partes.
63.	 Nas	 palavras	 de	 Perdigão	 Malheiro:	 “Desde	 que	 o	 homem	 é	 reduzido	 à
condição	de	coisa,	sujeito	ao	poder	de	um	outro,	é	havido	por	morto,	privado	de
todos	 os	 direitos,	 e	 não	 tem	 representação	 alguma,	 como	 já	 havia	 decido	 o
Direito	 Romano”	 (Malheiro,	 Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A	 escravidão	 no
Brasil,	 v.	 1.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typografia	 Nacional,	 1867,	 p.	 16).	 Em	 sentido
contrário,	 ver	 Nabuco,	 Joaquim.	 A	 escravidão.	 Recife,	 Fundaj/Editora
Massangana,	1988.
64.	 Freitas,	 Décio.	 Escravidão	 de	 índios	 e	 negros	 no	 Brasil.	 Porto	 Alegre:
EST/ICP,	1980,	p.	26.
65.	Luna,	Luís.	O	Negro	na	Luta	contra	a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,
1976,	p.	89.
66.	“A	economia	do	Império,	como	antes	a	da	Colônia,	baseava-se	na	exploração
do	 trabalho	 escravo.	 [...]	 Tudo	 girava	 em	 torno	 do	 braço	 escravo,	 do	 sustento
barato,	 não	 exigindo	 outra	 conservação	 além	 de	 alguns	 côvados	 da	 fazenda
ordinária	e	parcas	 rações	de	carne	seca	e	 farinha	de	mandioca”	(Luna,	Luís.	O
Negro	na	Luta	contra	a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,	1976,	p.	89).
67.	Moura,	Clóvis.	Dicionário	 da	 escravidão	 negra	 no	Brasil.	 São	 Paulo:	 Ed.
USP,	 2004,	 p.	 318	 e	 Costa,	 Emília	 Viotti	 da.	A	Abolição.	 São	 Paulo:	 Global,
2001,	p.	25.
68.	Valladão,	Haroldo.	História	 do	 direito	 especialmente	 do	 direito	 brasileiro.
Rio	de	Janeiro:	Freitas	Bastos,	1977,	p.	108	e	Grinberg,	Keila.	Liberata:	a	lei	da
ambiguidade:	as	ações	de	liberdade	da	Corte	de	Apelação	do	Rio	de	Janeiro	no
século	XIX.	Rio	de	Janeiro:	Relume-Dumará,	1994,	p.	95.
69.	A	Constituição	de	1824,	no	seu	inciso	XVIII,	do	art.	179,	estabelecia	que	o
Estado	brasileiro	deveria	criar	um	código	civil	e	criminal	para	o	país,	baseados
na	justiça	e	equidade.	Entretanto,	o	Império	do	Brasil	nunca	chegou	a	codificar	o
seu	 direito	 civil,	 apesar	 de	 várias	 tentativas	 com	 base	 nos	 anteprojetos	 de
Nabuco	 de	 Araújo	 e	 Teixeira	 de	 Freitas.	 Esse	 último	 chegou	 a	 elaborar	 uma
Consolidação	 das	 Leis	 Civis,	 que	 serviria	 de	 ponto	 de	 partida	 para	 o	 futuro
código	civil,	a	qual	passou	a	ter	força	de	lei,	após	aprovação	do	Imperador,	por
meio	do	Aviso	de	24	de	dezembro	de	1858.	Por	sua	vez,	o	código	criminal	do
império	foi	promulgado	com	o	advento	da	Lei	de	16	de	dezembro	de	1830.	A	Lei
de	29	de	novembro	de	1832	instituiu	o	Código	Criminal	do	Império	(Valladão,
Haroldo.	História	do	direito	especialmente	do	direito	brasileiro.	Rio	de	Janeiro:
Freitas	Bastos,	 1977,	 p.	 128-130).	Nosso	Código	Comercial	 foi	 instituído	pela
Lei	 nº	 556,	 de	 25	 de	 junho	 de	 1850,	 e,	 em	 seguida,	 passou	 a	 vigorar	 o
Regulamento	 nº	 737,	 de	 25	 de	 novembro	 de	 1850,	 que	 fixava	 o	 processo
comercial.	 A	 Consolidação	 da	 lei	 processual	 elaborada	 por	 Antônio	 Joaquim
Ribas	tornou-se	obrigatória	pela	Resolução	de	28	de	dezembro	de	1876	(Paula,
Jônatas	Luiz	Moreira	de.	História	do	Direito	Processual	Brasileiro:	das	origens
lusas	à	escola	crítica	do	processo.	Barueri,	Manole,	p.	239).
70.	De	1580	a	1640.	Com	o	“desaparecimento”	do	impetuoso	e	jovem	El-Rei	D.
Sebastião	–	o	Desejado	(nascido	em	20	de	janeiro	de	1554,	no	dia	do	santo	que
lhe	daria	nome)	–,	com	24	anos	de	idade,	na	batalha	de	Alcácer	Quibir	(“grande
fortaleza”),	em	4	de	agosto	de	1578,	as	coroas	ibéricas	se	uniram	(após	a	Guerra
de	Sucessão	Portuguesa),	passando	o	Rei	Filipe	 II	da	Espanha	a	 ser	 também	o
soberano	 do	 império	 lusitano,	 inclusive	 das	 possessões	 ultramarinas	 (Godoy,
Marco	Honório	de.	Dom	Sebastião	no	Brasil:	fatos	da	cultura	e	da	comunicação
em	tempo/espaço.	São	Paulo:	Perspectiva:	Fapesp,	2005,	p.	24-56).
71.	O	fenômeno	da	recepção	das	leis	pode	ser	assim	conceituado:	“É	certo	que	o
poder	 constituinte	 originário	 dá	 início	 à	 ordem	 jurídica.	 Isso,	 porém,	 significa
que	todos	os	diplomas	infraconstitucionais	perdem	vigor	com	o	advento	de	uma
nova	 Constituição?	 Uma	 resposta	 positiva	 inviabilizaria	 a	 ordem	 jurídica.	 Por
isso	se	entende	que	aquelas	normas	anteriores	à	Constituição,	que	são	com	elas
compatíveis	no	seu	conteúdo,	continuam	em	vigor.	Diz-se	que,	nesse	caso,	opera
o	 fenômeno	 da	 recepção,	 que	 corresponde	 a	 uma	 revalidação	 das	 normas	 que
não	desafiam,	materialmente,	a	nova	Constituição”	(Mendes,	Gilmar	Ferreira	e
Branco,	 Paulo	 Gustavo	 Gonet.	 Curso	 de	 Direito	 Constitucional.	 São	 Paulo:
Saraiva,	2001,	p.	123).
Em	outras	palavras:	“[...]	Recepção.	Ou	princípio	da	continuidade	da	legislação
ordinária,	 segundo	 o	 qual	 a	 nova	 Constituição	 revoga	 a	 ordem	 constitucional
anterior,	mas	 aceita	 ou	 “recebe”	 as	 normas	 anteriores	 que	 com	 ela	 não	 sejam
incompatíveis	 quanto	 ao	 objeto	 ou	 conteúdo,	 ainda	 que	 a	 forma	 dos	 atos
legislativos	 anteriores	 sofra	 alteração	 no	 seu	 modo	 de	 elaboração”	 (Silva,	 de
Plácido	 e.	 Vocabulário	 Jurídico.	 Atualizadores:	 Nagib	 Slaibi	 Filho	 e	 Gláucia
Carvalho.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Forense,	2006,	p.	1161).
Evidentemente,	 não	 poderia	 o	 nascente	 Império	 do	 Brasil	 rejeitar	 toda	 a
legislação	 portuguesa	 anterior,	 a	 qual	 regia	 todos	 os	 aspectos	 da	 vida	 dos
indivíduos	até	a	data	da	independência.	Seria	implantado	um	caos	no	país,	uma
verdadeira	“terra	sem	lei”.	Por	essa	razão,	o	imperador,	por	meio	da	Lei	de	20	de
outubro	de	1823,	determinou	que	a	legislação	anterior	fosse	recepcionada.
72.	Ribas,	Conselheiro	Joaquim.	Direito	Civil	Brasileiro.	Rio	de	Janeiro:	Editora
Rio,	1982,	p.	76.
73.	O	direito	romano	era	aplicável,	mas	apenas	de	forma	excepcional,	de	forma
subsidiária,	por	força	de	“Lei	da	Boa	Razão”	(§	10º	da	Lei	de	18	de	agosto	de
1769),	 sem	 que	 pudesse	 alterar	 o	 “espírito”	 da	 lei	 nacional:	 “Do	 primeiro
período	deste	§	parece	deduzir-se	que	as	regras	de	interpretar	as	Leis,	extraídas
dos	Textos	de	Direito	Romano,	são	ineptas	para	a	interpretação	das	Leis	Pátrias.
Mas	não	 é	 isto	o	que	 a	Lei	 quis	 dizer:	 dos	Corpos	de	Direito	Romano	podem
extrair-se	 regras	 gerais	 da	 interpretação	 das	 Leis,	 dos	 contratos,	 e	 últimas
vontades,	 tão	 conformes	 à	 boa	 razão,	 como	 as	 que	 [Hugo]	Grócio,	 e	 os	mais
cultores	do	Direito	Natural	têm	ensinado	nos	tempos	modernos.	[...]	foi	por	isso
que	 a	 nossa	Lei	 repreendendo	 este	 erro,	 determinou	que	 as	Leis	Pátrias	 nunca
fossem	ampliadas,	ou	limitadas	pelas	Leis	Romanas;	só	se	estas	ampliações,	oulimitações	necessariamente	se	deduzissem	do	espirito	das	mesmas	Leis	Pátrias,
significado	ou	pelas	próprias	palavras	delas,	ou	pela	identidade	de	razão,	e	força
de	compreensão”	(Telles,	José	Homem	Côrrea.	Comentários	à	Lei	da	Boa	Razão
em	data	de	18	de	agosto	de	1769.	Lisboa:	Typographia	de	Maria	da	Madre	de
Deus,	1865,	p.	67-68).	Nesse	sentido:	“Visando	evitar	os	abusos	decorrentes	da
praxe,	 a	 Lei	 da	 Boa	 Razão	 determinou	 que	 as	 restrições	 se	 deduzissem	 do
espírito	das	mesmas	Leis	Pátrias,	ou	significado	pelas	próprias	palavras	delas,	ou
pela	identidade	de	razão,	e	força	de	compreensão	[...]”	(Pousada,	Estevan	Lo	Ré.
Preservação	 da	 Tradição	 Jurídica	 luso-brasileira:	 Teixeira	 de	 Freitas	 e	 a
Introdução	à	Consolidação	das	Leis	Civis.	São	Paulo,	2006,	p.	77).
74.	“[...]	em	quase	todas	as	regiões	do	Brasil,	a	escravidão	negra	era	o	aspecto
mais	característico,	 tanto	do	panorama	rural	quanto	do	urbano.	Os	portugueses
tinham	sido	os	primeiros	pioneiros	da	agricultura	em	grande	escala	(fazendas)	no
Novo	Mundo	e	a	escravidão	era	a	pedra-de-toque	da	economia	e	da	 sociedade
agrícola.	 [...]	 os	 escravos	 eram	 utilizados	 como	 empregados	 domésticos,	 e
negros	 de	 ganho	 –	 escravos	 alugados	 por	 seus	 donos	 –	 eram	 encontrados
trabalhando,	 por	 exemplo,	 como	 estivadores	 e	 carregadores	 nos	 portos,	 como
aguadeiros	 e	 mesmo	 como	 pedreiros	 e	 carpinteiros.	 A	 Igreja	 –	 mosteiros,
conventos	e	hospitais	–	possuía	escravos.	O	Estado	possuía	e	alugava	escravos
para	a	construção	e	manutenção	de	obras	públicas”	(Bethell,	Leslie.	A	abolição
do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico
de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	16-17).
75.	 Johann	 Moritz	 Rugendas,	 pintor	 austríaco	 que,	 juntamente	 com	 outros
viajantes	 estrangeiros	 no	Brasil,	 ajudou	 a	 construir	 a	memória	 iconográfica	 do
país	 desse	 período	 (Vianna,	 Hélio.	História	 do	 Brasil,	 v.	 2.	 6.	 ed.	 São	 Paulo:
Melhoramentos,	 1967,	 p.	 162).	Uma	 das	 pinturas	mais	 famosas	 do	 artista	 é	 o
“Navio	negreiro”,	no	qual	pode-se	ver	os	negros	aprisionados	 sob	 ferros	 e	um
deles,	ao	centro,	clamando	por	misericórdia,	para	que	seus	captores	fornecessem
água	(ou	esperança?).	As	pinturas	de	Rugendas	têm	o	poder	de	reconstruir	esse
monstruoso	universo	no	qual	populações	inteiras	eram	submetidas	ao	cativeiro.
76.	 Malheiro,	 Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A	 Escravidão	 no	 Brasil:	 ensaio
histórico-jurídico-social:	africanos,	v.	III.	Rio	de	Janeiro:	Typographia	Nacional,
1867,	p.	54.	O	tráfico	alimentava	a	lavoura,	que	usando	essa	mão	de	obra	barata,
colocava	 em	 movimento	 a	 “máquina”	 de	 produção	 de	 riquezas	 na	 América
lusitana.
77.	Luna,	Luís.	O	Negro	na	Luta	contra	a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,
1976,	p.	65-66.
Capítulo	2
	
A	Constituição	de	1824	e	a	Escravidão:
uma	Constituição	nascida	de	um	trauma
	
	
Uma	Constituição	 ao	mesmo	 tempo	que	 funda	 o	Estado78,	 busca
criar	as	normas	de	 regência	destinadas	a	 regular	as	 relações	entre	os
poderes	 constituídos	 em	 suas	 diversas	 relações,	 seja	 para	 com	 a
sociedade	 que	 será	 governada	 (atribuindo	 direitos	 e	 deveres	 para	 os
indivíduos)79,	 seja	 entre	 os	 poderes	 do	 Estado,	 estabelecendo	 como
eles	 deverão	 se	 harmonizar80.	 A	 Assembleia	 Nacional,	 no	 caso	 das
Constituições	 promulgadas,	 seria	 o	 órgão	 que	 teria	 a	 atribuição,
conferida	pelo	povo,	para	criar	tal	diploma	legislativo	constitucional81.
Quando	 se	 pretende	 estudar	 a	 Constituição	 de	 1824,	 a	 qual	 foi
outorgada82,	 nos	 deparamos	 com	 uma	 peculiaridade:	 esse	 diploma
fundante	 da	Nação	 brasileira,	 além	 de	 não	 conseguir	 romper	 com	 o
seu	 passado	 colonial83	 nem	 revolucionar	 a	 sociedade	 brasileira84,
ainda	 surge	 de	 um	 trauma,	 um	 agressivo	 golpe	 de	 estado85	 do
Imperador	contra	os	representantes	populares	reunidos	na	Assembleia
Constituinte86.
Logo,	 para	 se	 compreender	 a	 Constituição	 imperial	 é
imprescindível	 vislumbrar	 o	 seu	 conturbado	 nascimento	 e	 os
acontecimentos	da	quarta-feira,	12	de	novembro	de	1823.
1.	A	Ascenção	da	Constituinte	de	1823
A	 Carta	 Magna	 de	 182487	 já	 nasceu	 de	 um	 trauma	 histórico:	 a
dissolução,	 pelo	 imperador,	 da	 Assembleia	 Constituinte88	 de	 1823.
Entretanto,	 tudo	 começou	 bem	 diferente.	 O	 Imperador	 almejava	 a
convocação	 de	 uma	 Assembleia	 Nacional	 que	 promulgasse	 para	 a
nova	Nação	uma	boa	Constituição.	Por	meio	do	Decreto	de	3	de	junho
de	1922,	D.	Pedro	 II	 convocou	a	Assembleia	Constituinte,	que	 seria
eleita	 na	 forma	 das	 Instruções	 de	 19	 de	 junho	 de	 182289	 e	 que
regulamentou	 o	 processo	 eleitoral	 para	 a	 instauração	 da	Assembleia
de	182390,	cujos	aspectos	podem	ser	observados	abaixo:
1.	 O	 processo	 eleitoral	 era	 indireto	 para	 a	 escolha	 dos	 deputados,
tendo	os	votantes	das	freguesias	e	paroquias	o	direito	de	escolher	seus
Eleitores,	 que	 participariam	 do	 escrutínio	 que	 elegeria	 os	 deputados
provinciais.
2.	Poderiam	votar:	“Tem	direito	a	votar	nas	Eleições	Paroquiais	todo	o
Cidadão	casado	e	 todo	aquele	que	 tiver	de	20	anos	para	cima	sendo
solteiro,	e	não	for	filho-família.	Devem,	porém,	todos	os	votantes	ter
pelo	 menos	 um	 ano	 ele	 residência	 na	 Freguesia	 onde	 derem	 o	 seu
voto”91.
3.	 Não	 poderiam	 votar:	 “São	 igualmente	 excluídos	 de	 voto	 os
Religiosos	 Regulares,	 os	 Estrangeiros	 não	 naturalizados	 e	 os
criminosos”92;
4.	 A	 Assembleia	 Constituinte	 teria	 100	 membros93,	 com	 eleição	 de
deputados	inclusive	da	Província	da	Cisplatina	(2	deputados)94.
5.	Não	poderiam	ser	escolhidos	como	Eleitores,	pelos	votantes95:
[...]	 quem	 não	 tiver	 (além	 das	 qualidades	 requeridas
para	votar)	domicilio	certo	na	Província,	há	quatro	anos
inclusive	pelo	menos.	Além	disso	deverá	ter	25	anos	de
idade,	 ser	 homem	 probo	 e	 honrado,	 de	 bom
entendimento,	 sem	 nenhuma	 sombra	 de	 suspeita	 e
inimizade	à	Causa	do	Brasil,	 e	de	decente	 subsistência
por	emprego,	ou	indústria,	ou	bens.	O	eleito	não	poderia
rejeitar	a	nomeação.96
6.	 Durante	 o	 exercício	 do	 seu	 mandato	 como	 Eleitor,	 os	 cidadãos
teriam	 como	 “suspensos	 pelo	 espaço	 de	 30	 dias,	 contados	 da	 sua
nomeação,	 todos	 os	 processos	 civis	 em	 que	 eles	 forem	 autores	 ou
réus”97.
7.	 O	 §	 2º	 do	 Capítulo	 IV	 da	 Instrução	 de	 19	 de	 junho	 de	 1822,
apresentava	os	requisitos	para	ser	deputado	constituinte:
Para	 ser	 nomeado	 Deputado	 cumpre	 que	 tenha,	 além
das	 qualidades	 exigidas	 para	Eleitor	 [...],	 as	 seguintes:
Que	seja	natural	do	Brasil	ou	de	outra	qualquer	parte	da
Monarquia	Portuguesa,	 contanto	 que	 tenha	 12	 anos	 de
residência	 no	Brasil,	 e	 sendo	 estrangeiro	 que	 tenha	 12
anos	de	 estabelecimento	 com	 família,	 além	dos	da	 sua
naturalização;	 que	 reúna	 a	 maior	 instrução,
reconhecidas	 virtudes,	 verdadeiro	 patriotismo	 e
decidido	zelo	pela	causa	do	Brasil.
8.	 Os	 deputados	 seriam	 pagos,	 regra	 geral,	 pelos	 cofres	 das
Províncias98,	mas	se	estas	não	pudessem,	o	Tesouro	do	Brasil	arcaria
com	tal	despesa.	O	deslocamento	dos	deputados	seria	custeado	pelas
Províncias.	 A	 remuneração	 dos	 deputados	 era	 inacumulável	 com
outros	 rendimentos	 públicos,	 os	 quais	 teriam	 o	 seu	 pagamento
suspenso99.
9.	 A	 simples	 Ata	 da	 Eleição	 já	 constituía	 o	 deputado	 com	 as
prerrogativas	do	cargo,	que	eram	obrigatórias	para	os	escolhidos.	As
Câmaras	Provinciais	dariam	aos	deputados	recomendações	para	a	sua
atuação,	 listando	 os	 problemas	 da	 província	 que	 iria	 representar100.
Um	deputado	poderia	ser	eleito	por	mais	de	uma	província,	mas	teria
de	optar	por	aquela	onde	tem	domicílio.
As	 eleições	 dos	 representantes	 para	 Assembleia	 Constituinte	 de
1823,	pelo	que	consta,	transcorreram	em	relativa	tranquilidade101.	Em
17	de	abril	de	1823,	a	AssembleiaConstituinte	do	Império	do	Brasil
realizou	 a	 sua	 primeira	 sessão102,	 com	 eleição	 do	 seu	 presidente,	 o
bispo	do	Rio	de	Janeiro	(Dom	José	Caetano	da	Silva	Coutinho103).
No	 dia	 30	 de	 abril	 de	 1823,	 seu	 Regimento	 interno	 já	 estava
pronto,	 após	 o	 trabalho	da	 comissão	 criada	para	 este	 fim	 (em	18	de
abril	 de	 1823)104.	 A	 sessão	 de	 abertura	 se	 deu	 na	 noite	 do	 dia	 3	 de
maio	de	1823105,	quando	o	Imperador	apareceria	em	todo	esplendor106.
A	partir	daí	começaram	a	surgir	os	problemas	para	a	Assembleia.
2.	A	queda	da	Assembleia	Constituinte
Digamos	 que	 o	 Monarca,	 que	 tanto	 almejava	 uma	 Constituição
digna	 de	 si	 e	 do	 Brasil,	 não	 estava	 preparado	 para	 atuar	 como	 um
coadjuvante,	nem	mesmo	como	um	coprotagonista107.	Por	essa	razão,
na	 disputa	 entre	 os	 atores	 políticos,	 se	 alguém	 deveria	 agonizar,	 tal
“personagem”	seria	a	Assembleia	Constituinte.
O	 início	dos	 trabalhos	 foi	 empolgante108.	A	Assembleia	passou	a
funcionar	 como	 um	 verdadeiro	 parlamento109,	 não	 restringindo	 sua
atuação	 apenas	 à	 elaboração	 atuação	 da	 Carta	 constitucional,	 até
porque	 era	 uma	 Assembleia	 Constituinte	 e	 Legislativa110.	 Ademais,
como	natural	 em	qualquer	 órgão	 legislativo,	 havia	 representantes	 de
inúmeras	 correntes	 políticas111,	 que	 possuíam	 concepções	 bem
diversas112	acerca	do	futuro	da	Nação	que	estava	nascendo113.
Nas	 sessões	 preparatórias	 já	 era	 evidente,	 pelo	 menos	 nos
bastidores,	 que	 nem	 todos	 os	 deputados	 se	 dobrariam	 à	 Augusta
Presença	 de	 Sua	 Majestade	 Imperial114.	 Houve	 debates	 acerca	 de
como	 seria	 o	 juramento	 e	 também	 controvérsias	 referentes	 ao
cerimonial	que	envolveria	a	presença	do	Imperador	na	sessão	de	30	de
abril	 de	 1823.	 Muitos,	 também,	 não	 aceitaram	 que	 o	 trono	 do
Imperador	ficasse	acima	da	cadeira	do	Presidente	da	Assembleia115.	O
discurso	 de	 abertura	 do	 Imperador,	 após	 inúmeros	 trechos	 auto
elogiosos,	trazia	uma	estranha	passagem,	que	ressoava	como	ameaça:
[...]	 espero	 que	 a	 Constituição	 que	 façais	 mereça	 a
minha	 imperial	 aceitação,	 seja	 tão	 sábia	 e	 tão	 justa
quanto	 apropriada	 à	 localidade	 e	 civilização	 do	 povo
brasileiro	 [...]	 quererá	 que	 seu	 imperador	 seja
respeitado,	 não	 só	 por	 pela	 sua,	 como	 pelas	 demais
nações	[...].116
Em	 outras	 palavras,	 Sua	Majestade	 admitia	 a	 existência	 de	 uma
Assembleia	 Constituinte117,	 mas	 seus	 trabalhos	 estariam
condicionados	ao	seu	juízo	de	valor	sobre	o	resultado	da	obra	jurídica
produzida:	o	imperador	julgaria118	se	a	Constituição	elaborada	estaria
adequada	às	suas	expectativas119.
Para	um	leitor	contemporâneo,	tal	atitude	seria	ilógica	do	ponto	de
vista	 jurídico,	 até	 porque	 o	 Poder	 Constituinte,	 pela	 teoria
constitucional	 atual,	 e	 somente	 ele,	 é	 o	 poder	 fundante	 do	 Estado:
ilimitado	e	incondicionado120.	Para	D.	Pedro	I,	sua	Augusta	figura	de
Imperador	 dos	 Povos	 do	 Brasil	 era	 o	 verdadeiro	 e	 próprio	 poder
fundante	da	Nação	do	Brasil	enquanto	entidade	política	soberana121.
Apesar	 da	 ameaça	 que	 pairava,	 a	 Assembleia	 iniciou	 seus
trabalhos	 em	 5	 de	 maio	 de	 1823,	 funcionando	 também	 como
Parlamento:	 editando	 Leis	 e	 debatendo	 inúmeros	 problemas	 da
sociedade	 brasileira122.	 Entretanto,	 não	 foi	 possível	 a	 coexistência
pacífica	 entre	 o	 Imperador	 e	 o	 Parlamento	 constituinte.	 Era	 um
choque	entre	o	poder	constituído	e	uma	Assembleia	que	pretendia	ser
a	constituinte	de	uma	Nação123.
O	 choque	 entre	 a	 soberania	 da	 Assembleia	 Constituinte	 e	 as
vontades	 do	 Imperador	 deteriorou	 o	 ambiente	 político124,	 o	 que
culminou	 em	 atentados	 físicos	 à	 liberdade	 de	 imprensa	 após
problemas	 relacionados	 à	 integração	 de	 portugueses	 no	 Exército
nacional125.	O	deputado	e	padre	José	Martiniano	de	Alencar,	na	defesa
de	 um	 projeto	 de	 lei	 anistiando	 a	 todos	 que	 estivessem	 sofrendo
restrição	a	sua	liberdade	por	motivos	políticos,	registrou	com	clareza
o	espírito	da	época:
O	 governo	 tem	 tomado	 medidas	 violentas	 e
anticonstitucionais;	 tem-se	prendido	homens	sem	culpa
formada;	 tem-se	 deportado	 outros,	 abrindo-se	 uma
devassa	não	só	na	Corte,	mas	pelas	províncias,	que	nada
menos	 é	 que	 uma	 inquisição	 política;	 a	 liberdade	 de
imprensa	 está	 quase	 acabada,	 se	 não	 de	 direito,	 ao
menos	de	fato	[...].126
Como	sabido,	o	imperador	D.	Pedro	I	nunca	teve	uma	boa	relação
com	 a	 imprensa,	 sobretudo	 quando	 essa	 o	 hostilizava	 ou	 lhe	 fazia
oposição127.	Conviver	com	a	liberdade	de	expressão	era	um	problema
para	S.	Majestade128,	como	exemplifica	o	fato	de	o	monarca,	por	meio
de	 pseudônimos,	 escrever	 artigos	 para	 os	 periódicos	 da	 época,
reagindo	 ou	 atacando	 aqueles	 que	 subiam	 no	 palco	 da	 imprensa
brasileira	 para	 criticá-lo.	 Tal	 conflito129	 chegou	 ao	 ponto	 em	 que	 se
valeu	 da	 sua	 Fala	 do	 Trono130	 para	 tentar	 demonstrar	 à	 Nação
brasileira	ser	imprescindível	a	repressão	à	liberdade	de	expressão	pela
imprensa131,	 por	 meios	 legais,	 tendo	 em	 vista	 que,	 em	 todo	 o	 país,
abusos	eram	cometidos,	fundamentados	no	exercício	desse	direito132.
O	 palco	 da	 tragédia	 estava	 formado.	Após	 a	Noite	 da	 Agonia133,
enquanto	os	debates	se	acirravam	na	Assembleia134,	chegaram	notícias
que,	 pela	 manhã	 do	 dia	 seguinte,	 o	 congresso	 constituinte	 seria
encerrado	por	um	ato	de	D.	Pedro!135	Isso	fez	com	que,	no	fatídico	12
de	novembro	de	1823,	por	volta	das	dez	horas136,	o	ministro	do	Reino
(Vilela	 Barbosa),	 enquanto	 prestava	 esclarecimentos	 perante	 o
plenário	da	Assembleia,	ouvisse	deputados	exaltados	exigindo	que	o
Imperador	fosse	declarado	fora-da-lei137.
Esse	 protesto	 não	 foi	 uma	 boa	 ideia138.	 A	 notícia	 chegou	 aos
ouvidos	 de	 D.	 Pedro	 I	 e,	 antes	 que	 o	 ministro	 retornasse,	 Sua
Majestade	 já	 havia	 decretado	 e	 publicado	 a	 dissolução	 da
Assembleia139.	 O	 que	 era	 inevitável	 ocorreu:	 por	 volta	 das	 treze
horas140,	do	mesmo	dia	12	de	novembro	de	1823,	o	prédio	foi	cercado
por	 forças	militares.	Peças	de	artilharia	e	um	esquadrão	de	cavalaria
foram	colocadas	diante	do	prédio	e	outras	forças	militares,	por	ordem
de	 D.	 Pedro	 I,	 foram	 deslocadas	 para	 local	 próximo.	 Entrando	 no
recinto,	um	general	acompanhado	de	uma	brigada	militar141	reiterou	a
intimação142:	 a	 Assembleia	 Constituinte	 havia	 sido	 dissolvida143.
Vários	parlamentares	foram	presos,	inclusive	o	próprio	José	Bonifácio
de	Andrada,	o	patriarca	da	Independência144.
As	 versões	 de	 D.	 Pedro	 I	 acerca	 do	 golpe	 de	 estado,	 de	 12	 de
novembro	de	1823,	foram	expostas	pelo	monarca	nos	dias	12,	13	e	16
de	novembro	de	1823,	nos	dois	Decretos145	e	na	Proclamação	por	ele
publicados,	para	justificar	mais	uma	de	suas	intempestivas	ações146:
1.	 Segundo	 S.M.I.,	 a	 Assembleia	 havia	 perjurado	 o
juramento147	de	defender	a	 integridade	do	 império,	 sua
independência	e	a	dinastia	do	imperador;
2.	Acusou	o	congresso	de	defender	a	anarquia;
3.	 Proclamou	 que	 os	 desatinos	 dos	 congressistas,
tomados	pela	sua	soberba	e	ambição,	iriam	levar	o	país
para	um	abismo.
4.	Alegou	que	se	a	Assembleia	não	 fosse	dissolvida,	a
religião	 seria	 destruída,	 bem	 como	 o	 risco	 de	 uma
guerra	civil	mancharia	de	sangue	as	vestes	do	Povo;	e
5.	 Justificou	 as	 prisões	 afirmando	 que	 não	 foram
medidas	despóticas,	mas	ações	para	evitar	a	anarquia	e
poupar	a	própria	vida	dos	indivíduos	detidos,	bem	como
manter	 o	 sossego	 público.	 Assegurou	 que	 as	 famílias
dos	presos	serão	protegidas	pelo	governo148.
No	primeiro	Decreto,	D.	Pedro	I	resolveu	dissolver	a	Assembleia	e
convocar	outra,	para	trabalhar	sobre	um	anteprojeto	que	o	Imperador
forneceria	 para	 tais	 deputados.	 Tal	 promessa	 cristalizada	 em	 tal	 ato
normativo	nunca	foi	cumprida149.
Segundo	 ele,	 o	 projeto	 que	 ele	 apresentaria	 serialiberal	 em
dobro150	e	as	bases	do	 Império	seriam	mantidas:	a	 independência	do
Império,	 a	 sua	 integridade	 e	 o	 sistema	 constitucional.	 Em	 suma,	D.
Pedro	I	confessava	almejar	a	glória,	não	apenas	para	si,	mas	para	toda
Nação,	por	isso	praticou	todos	aqueles	atos151.
3.	O	nascimento	da	Constituição	de	1824
Pelo	Decreto	de	12	de	novembro	de	1823,	D.	Pedro	I	dissolveu	a
Assembleia	 Geral	 Constituinte	 e	 Legislativa152,	 que	 havia	 sido
convocada	 por	 ele	 próprio153.	 Segundo	 o	 Imperador,	 tal	 fato	 se	 deu
porque	 esse	 órgão	 teria	 violado	 o	 solene	 juramento	 de	 defender	 a
integridade	do	Império,	sua	independência	e	a	dinastia	de	D.	Pedro	I.
Além	 disso,	 tal	 ato	 extremo,	 segundo	 o	 soberano,	 deu-se	 para	 a
salvação	 da	 própria	 Nação,	 como	 consta	 no	 referido	 ato	 que
cristalizou	 suas	 decisões	 e	 respectivos	 fundamentos	 para	 dissolver	 a
Assembleia	constituinte154.
Pela	 Proclamação	 de	 13	 de	 novembro	 de	 1823,	 S.	 Majestade
Imperial	comunicou	ao	povo	brasileiro	que	a	Assembleia	Constituinte
fora	 dissolvida	 e,	 em	 seguida,	 pelo	 Manifesto	 de	 16	 de	 novembro,
explicitou	as	razões	de	tal	ato:	o	“fel	da	desconfiança”,	que	elaborava
planos	ocultos	para	semear	a	discórdia	no	Brasil,	ameaçava	o	futuro	e
a	própria	existência	da	Nação.
Em	17	de	novembro	do	mesmo	ano	(de	1823),	 também	por	meio
de	 Decreto,	 o	 Defensor	 Perpétuo	 do	 Brasil	 mandou	 proceder	 à
realização	 de	 eleições	 para	 composição	 de	 nova	 Assembleia	 Geral
Constituinte	 e	 Legislativa,	 que,	 como	 exposto,	 nunca	 veio	 a	 surgir,
nem	nunca	se	reuniu	para	elaborar	a	nossa	primeira	Constituição.
Ao	 contrário,	 coube	 ao	 Conselho	 de	 Estado155,	 sobretudo	 pelo
trabalho	 de	 José	 Joaquim	 Carneiro	 de	 Campos156,	 preparar	 um
anteprojeto	 de	 Constituição,	 sobre	 os	 escombros	 dos	 trabalhos	 da
Assembleia	Constituinte	de	1823157.	Esse	anteprojeto	foi	apresentado
à	 Câmara	Municipal	 do	 Rio	 de	 Janeiro,	 que,	 ao	 declarar	 que	 o	 seu
texto	 era	 “imelhorável”,	 apresentou	 sua	 proposta	 de	 juramento,	 para
coincidir	com	o	Dia	do	Fico	 158.	O	Imperador	 rejeitou	 tal	sugestão	e
fixou	para	25	de	março	daquele	ano	de	1824159	para	o	 juramento	da
Constituição.
Ao	povo	brasileiro,	por	meio	da	Carta	de	Lei	de	25	de	março	de
1824160,	o	 Imperador	do	Brasil	apresentou	o	 teor	da	Constituição	do
Império	 do	 Brasil,	 que	 deveria	 ser	 jurada	 por	 ele	 e	 pelos
representantes	das	Câmaras	(advindas	de	diversas	províncias)161.
O	 Imperador	 buscou	 legitimidade	 para	 a	 outorga	 da	 sua	 carta
política	 não	 em	 uma	 Assembleia	 Constituinte,	 mas	 nas	 Câmaras
municipais162,	a	começar	pela	Câmara	do	Rio	de	Janeiro	–	o	que	era
de	 se	 estranhar,	 já	 que	 tais	 órgãos	 não	 eram	 formados	 por
representantes	 do	 povo,	 mas	 do	 próprio	 Rei,	 tendo	 em	 vista	 a	 sua
natureza	jurídica	oriunda	da	legislação	metropolitana	portuguesa:
No	direito	português,	o	poder	das	Câmaras,	como	o	das
antigas	Cortes,	não	advinha	da	nação,	mas	do	Rei,	pois
uma	 e	 outras	 não	 são	 representantes	 dos	 povos;
representam	 sim	 pelos	 povos.	 A	 Câmara	 do	 Rio,	 [...],
tomava-se	 pelo	 Senado	 romano	 e	 decidia	 pelo	 Brasil,
como	havia	feito	em	1822	o	Conselho	de	Procuradores,
que	tampouco	tivera	competência	para	aclamar	d.	Pedro
fosse	Defensor	perpétuo,	fosse	Imperador.163
Portanto,	por	ato	do	Defensor	Perpétuo	do	Brasil,	foi	outorgada	a
Constituição	de	1824.	A	partir	 desse	momento,	 tenta-se	desvendar	o
mistério	 de	 como	 a	 Constituição	 de	 1824	 conseguiu	 conciliar	 a
contradição	 existente	 na	manutenção	 da	 escravidão	 e	 a	 sua	 natureza
liberal164,	que	inclusive	trazia	um	grande	rol	de	direitos	fundamentais.
4.	A	implícita	referência	à	escravidão	na	Constituição
de	1824
Como	 explanado,	 o	 fenômeno	 constitucionalista	 brasileiro	 não
adveio	 de	 uma	 revolução,	 pois	 a	 Independência	 não	 significou	 uma
ruptura	com	o	passado	colonial.	De	fato,	a	independência	do	Reino	do
Brasil165	também	não	significou	um	rompimento	das	estruturas	sociais
e	 econômicas	 vigentes	 no	 período	 histórico	 anterior,	 mas	 sua
manutenção,	 conferindo	 poderes	 políticos	 à	 aristocracia	 rural
brasileira.
Pela	 perspectiva	 de	 manutenção	 do	 status	 quo,	 não	 haveria
possibilidade	 de	 a	 Constituição	 do	 Império	 do	 Brasil	 eliminar
subitamente	 o	 instituto	 jurídico	 da	 escravidão,	 o	 qual	 servia	 de
fundamento	 para	 o	 sistema	 produtivo	 brasileiro.	 Apesar	 disso,	 na
Assembleia	Constituinte	de	1823,	foi	apresentada	por	José	Bonifácio
uma	representação	contra	a	escravatura:
[...]	 sem	 a	 abolição	 total	 do	 infame	 tráfico	 da
escravatura	 africana,	 e	 sem	 a	 emancipação	 sucessiva
dos	 atuais	 cativos,	 nunca	 o	 Brasil	 firmará	 a	 sua
independência	 nacional,	 e	 segurará	 e	 defenderá	 a	 sua
liberal	 Constituição;	 nunca	 aperfeiçoará	 as	 raças
existentes,	 e	 nunca	 formará,	 como	 imperiosamente	 o
deve,	 um	 exército	 brioso,	 e	 uma	 marinha	 florescente.
Sem	 liberdade	 individual	 não	 pode	 haver	 civilização
nem	 sólida	 riqueza;	 não	 pode	 haver	 moralidade,	 e
justiça;	 e	 sem	 estas	 filhas	 do	 céu,	 não	 há	 nem	 pode
haver	brio,	força,	e	poder	entre	as	nações.166
A	escravidão	não	estava	prevista,	expressamente,	em	nenhum	dos
dispositivos	 da	 Constituição	 Imperial	 de	 1824.	 Isso	 não	 poderia	 ser
diferente,	pois,	em	virtude	de	sua	 inspiração	 liberal,	 tal	diploma	não
poderia	 trair	 a	 sua	 própria	 finalidade,	 como	 preconizado	 pela	 teoria
constitucionalista,	a	qual	seria	o	resguardo	das	liberdades	individuais.
Dispor	sobre	a	escravidão	em	uma	Constituição	liberal	seria	uma
contradição,	entretanto,	o	legislador	constituinte	encontrou	uma	saída:
implicitamente,	fez	referência	aos	cidadãos	brasileiros	libertos,	isto	é,
aqueles	 que	 emergiram	 da	 capitis	 diminutio	 maxima167,	 passando	 a
gozar	 de	 seu	 status	 libertatis168,	 mas	 sem	 alcançar	 o	 mesmo	 status
civitatis	 dos	 cidadãos	 brasileiros	 ingênuos.	 Tal	 conclusão	 pode	 ser
ratificada	pela	leitura	da	Constituição	de	1824,	em	seu	art.	6º,	§	1º,	a
qual	 classificava	 os	 cidadãos	 brasileiros	 em	 duas	 categorias,	 os
ingênuos	e	os	libertos:
Art.	6.	São	Cidadãos	Brasileiros:
I.	 Os	 que	 no	 Brasil	 tiverem	 nascido,	 quer	 sejam
ingênuos,	ou	 libertos,	 ainda	que	o	pai	 seja	estrangeiro,
uma	vez	que	este	não	resida	por	serviço	de	sua	Nação.
Para	 perfeitamente	 definir	 esses	 termos	 jurídicos	 contidos	 na
Constituição	 imperial,	 é	 importantíssima	 a	 leitura	 das	 lições	 do
Conselheiro	Joaquim	Ribas:
Em	 relação	 ao	 direito	 de	 liberdade,	 dividem-se	 os
homens	em	–	livres	e	escravos,	e	aqueles	se	subdividem
em	–	ingênuos	e	libertos.
Chama-se	 ingênuo	 o	 que	 nasce	 livre;	 liberto	 o	 que
tendo	nascido	escravo,	veio	a	conseguir	a	liberdade.169
Pode-se	concluir	que,	se	a	própria	Constituição	imperial	atribuía	a
condição	de	cidadãos	apenas	àqueles	indivíduos	que	se	apresentavam
como	 ingênuos	 ou	 libertos,	 era	 porque	 esse	 diploma	 admitia,	 ao
menos	tacitamente,	a	possibilidade	de	que	no	território	do	Império170,
outros	indivíduos	não	pudessem	ser	cidadãos	por	não	possuírem	este
status	libertatis,	ou	seja,	porque	eram	escravos	171.
A	Constituição	 imperial	não	declarou	explicitamente	 a	 existência
da	 escravidão	 no	 território	 nacional,	 mas	 poderia	 se	 inferir	 que	 ela
fazia	parte	da	estrutura	jurídica	brasileira172.
5.	O	escravo	e	a	cidadania	brasileira
O	 escravo	 não	 integrava	 a	 comunidade	 política	 do	 Brasil.	 A
Constituição	 de	 1824,	 no	 seu	 art.	 1º,	 proclamava	 que	 o	 Império	 do
Brasil	 era	 o	 resultado	 da	 associação	 política	 dos	 seus	 cidadãos,	 os
quais,	por	essa	comunhão	política,	criavam	uma	Nação	livre:
O	IMPÉRIO	do	Brasil	é	a	associação	Política	de	todos
os	Cidadãos	Brasileiros.	Eles	formam	uma	Nação	livre,
e	 independente,	 que	 não	 admitecom	 qualquer	 outro
laço	algum	de	união,	ou	federação,	que	se	oponha	à	sua
Independência.
Entretanto,	 como	 ensina	Malheiro173,	 a	 principal	 força	motriz	 da
economia,	 milhões	 de	 escravos	 usados	 na	 geração	 das	 riquezas	 do
Império,	 não	 integrava	 tal	 comunidade	 política:	 “O	 nosso	 Pacto
Fundamental,	 nem	 lei	 alguma	 contempla	 o	 escravo	 no	 número	 dos
cidadãos,	ainda	quando	nascido	no	 Império,	para	qualquer	efeito	em
relação	à	vida	social,	política	ou	pública”.
Tal	contradição	do	regime	jurídico	dos	escravos	é	levada	ao	limite
pelos	brilhantes	argumentos	expostos	por	Joaquim	Nabuco	com	base
na	lógica	jurídica:
Era	 preciso	 que	 a	 Constituição	 não	 tivesse	 uma	 só
palavra	que	sancionasse	a	escravidão.
Qualquer	 expressão	 que	 o	 fizesse	 incluiria	 naquele
código	de	liberdade	a	seguinte	restrição:
Além	de	cidadãos	a	quem	são	garantidos	esses	direitos,
e	dos	estrangeiros	a	quem	serão	tornados	extensivos,	há
no	país	uma	classe	sem	direito	algum:	a	dos	escravos.174
Evidente	 que	 o	 escravo	 não	 poderia	 ser	 considerado	 “Cidadão
brasileiro”,	pois,	se	assim	o	fosse,	não	poderia,	no	solo	do	Império,	ser
reduzido	 à	 condição	 de	 cativo,	 sob	 pena	 de	 violação	 do	 art.	 179,
caput,	da	Constituição	de	1824175,	bem	como	do	disposto	no	Código
Criminal	 do	 Império	 de	 1830,	 no	 seu	 art.	 179,	 que	 estabelecia	 o
seguinte	crime:	“Art.	179.	Reduzir	à	escravidão	a	pessoa	livre,	que	se
achar	em	posse	da	sua	liberdade”.
Ou	 seja,	 a	 Constituição	 do	 Império	 excluía	 os	 escravos	 do	 rol
daqueles	cujos	direitos	naturais	estavam	assegurados176.	Na	prática,	o
Império	 estava	 reduzindo	 estrangeiros	 à	 condição	 análoga	 a	 de
escravos,	o	que	seria	uma	outra	contradição,	uma	vez	que	as	 leis	da
Nação	 brasileira	 não	 poderiam	 produzir	 efeitos	 extraterritoriais	 para
suprimir	 a	 liberdade	 de	 estrangeiros.	 Eis	 o	 que	 defendia	 Joaquim
Nabuco177:
A	 lei	 brasileira	 não	 tem	 moralmente	 poder	 para
autorizar	 a	 escravidão	 de	 africanos,	 que	 não	 são
súditos	 do	 Império.	 Se	 o	 pode	 fazer	 com	 africanos,
pode	fazê-lo	com	ingleses,	franceses,	alemães.	Se	não	o
faz	com	estes,	mas	somente	com	aqueles,	é	porque	eles
não	gozam	de	proteção	de	nenhum	Estado.	Mas,	quanto
à	 competência	 que	 tem	 o	 Brasil	 para	 suprimir	 a
liberdade	 pessoal	 de	 pessoas	 existentes	 dentro	 do	 seu
território,	essa	nunca	poderia	 ir	além	dos	seus	próprios
nacionais.
Daí	surgem	algumas	questões:	se	o	escravo	não	era	um	Cidadão	do
Império,	 seria	 ele	 um	 estrangeiro	 ou	 um	 apátrida?	 Qual	 o	 regime
jurídico	legal	aplicado	a	eles?	Qual	o	fundamento	jurídico	para	que	o
Império	 do	 Brasil	 tolerasse	 que	 tais	 indivíduos	 fossem	 reduzidos	 à
condição	de	cativo?
Em	síntese,	não	existia	nenhuma	lógica	jurídica	que	pudesse	criar
um	 alicerce	 para	 a	 manutenção	 da	 escravidão.	 Nas	 palavras	 de
Nabuco,	ao	responder	tais	questões,	o	Império	tolerava	uma	manifesta
ilegalidade:
Se	 os	 escravos	 fossem	 cidadãos	 brasileiros,	 a	 lei
particular	do	Brasil	poderia	talvez,	e	em	tese,	aplicar-se
a	eles;	de	fato	não	poderia,	porque,	pela	Constituição,	os
cidadãos	 brasileiros	 não	 podem	 ser	 reduzidos	 à
condição	de	escravos.
Mas	os	 escravos	 não	 são	 cidadãos	 brasileiros,	 desde
que	 a	 Constituição	 só	 proclama	 tais	 os	 ingênuos	 e	 os
libertos.
Não	sendo	cidadãos	brasileiros	eles	ou	são	estrangeiros
ou	não	têm	pátria,	e	a	lei	do	Brasil	não	pode	autorizar
a	 escravidão	 de	 uns	 nem	 de	 outros,	 que	 não	 estão
sujeitos	 a	 ela	 pelo	 direito	 internacional	 no	 que
respeita	à	liberdade	pessoal.
A	ilegalidade	da	escravidão	é	assim	insanável,	quer	se	a
considere	 no	 texto	 e	 nas	 disposições	 da	 lei,	 quer	 nas
forças	e	na	competência	da	mesma	lei.178	(grifos	nossos)
Tal	regime	jurídico	do	cativo	era	tão	contraditório	que	o	Conselho
de	Estado	do	Império	teve	de	se	manifestar	acerca	da	situação	jurídica
dos	 escravos	 da	 Nação	 que	 pegaram	 em	 armas	 para	 lutar	 contra	 o
Paraguai179.	 Ora,	 se	 o	 escravo	 não	 era	 Cidadão180,	 ele	 não	 poderia
pegar	 em	 armas	 para	 defender	 uma	 Nação	 da	 qual	 ele	 não	 era
membro:	 “Tal	 é	 a	 extensão	 dessa	 incapacidade	 [dos	 escravos],	 que,
entre	 nós,	 nem	 são	 os	 escravos	 admitidos	 a	 servir	 com	 praça	 no
exército	e	marinha”181.
Nos	termos	da	Circular	n.º	595,	de	27	de	dezembro	de	1860,	e	de
inúmeras	 outras	 decisões	 posteriores,	 os	 escravos	 recrutados	 ou
apresentados	 voluntariamente,	 quer	 para	 o	 exército,	 quer	 para	 a
marinha,	deveriam	ser	restituídos	aos	seus	senhores182.	Entretanto,	um
dos	requisitos	para	defender	o	território	da	Pátria,	integrando	as	forças
armadas,	 era	 poder	 fazer	 parte	 da	 comunidade	 jurídica	 da	 Nação
brasileira,	 razão	pela	qual	o	soldado	deveria	ser	necessariamente	um
Cidadão,	como	previsto	na	Constituição	de	1824:	“Art.	145.	Todos	os
Brasileiros	 são	 obrigados	 a	 pegar	 em	 armas,	 para	 sustentar	 a
Independência,	 e	 integridade	 do	 Império,	 e	 defende-lo	 dos	 seus
inimigos	externos,	ou	internos”183.
Surge	um	outro	problema:	com	a	utilização	dos	escravos	para	lutar
na	 Guerra	 do	 Paraguai184,	 deveriam	 eles	 retornar	 à	 condição	 servil,
cessado	o	conflito185?
O	Conselho	de	Estado	do	Império	conferiu	uma	interpretação	bem
diversa	 para	 os	 escravos	 que	 lutaram	 pela	Nação	 brasileira	 contra	 o
inimigo	 paraguaio	 (liderados	 pelo	 presidente	 Solano	 Lopez),
aplicando	o	Decreto	de	6	de	novembro	de	1866186:
Este	meio	seria	odioso	se	os	escravos	fossem	tais	depois
de	 soldados,	 se	 eles	 continuassem	 escravos	 como	 os
oito	mil	escravos	que	Roma	depois	da	batalha	de	Canas
comprou	e	armou.
Mas	não	é	assim,	os	escravos	comprados	são	libertos	e
por	consequência	cidadãos	antes	de	serem	soldados;	são
cidadãos-soldados.
É	a	Constituição	do	Império	que	faz	o	liberto	cidadão,	e
se	não	há	desonra	em	que	ele	concorde	com	o	seu	voto
para	 constituir	 os	 poderes	 políticos,	 porque	 haverá	 em
ser	ele	soldado,	em	defender	a	pátria	que	o	libertou	e	à
qual	ele	pertence?
Assim	 ao	mesmo	 tempo	 e	 pelo	mesmo	 ato	 se	 faz	 um
grande	 serviço	 à	 emancipação,	 que	 é	 a	 causa	 da
humanidade	 e	 outro	 grande	 serviço	 à	 guerra,	 que	 é	 a
causa	nacional	[...]187
Se	 empregamos	 os	 escravos	 na	 causa	 da	 nossa
Independência,	 por	 que	 não	 os	 empregaremos	 nesta
guerra188?
Portanto,	 para	 o	 Conselho	 de	 Estado,	 o	 exercício	 de	 um	 dos
deveres	básicos	relacionados	à	Cidadania,	que	é	o	de	defender	a	sua
Pátria,	servindo	em	forças	militares,	durante	as	guerras,	geraria	para	o
escravo	o	direito	à	alforria.
6.	A	liberdade	e	o	direito	à	alforria
O	direito	à	propriedade	era	um	dos	Direitos	Individuais189	previsto
na	 Carta	 de	 1824,	 inciso	 XXII,	 do	 seu	 art.	 179.	 Nas	 palavras	 de
Bueno,	 o	 Barão	 de	 São	 Vicente,	 um	 dos	 grandes	 doutrinadores	 do
Império,	mui	estimado	por	D.	Pedro	II:
Os	 direitos	 individuais,	 que	 se	 podem	 também
denominar	 naturais,	 primitivos,	 absolutos,	 primordiais
ou	 pessoais	 do	 homem,	 são,	 como	 já	 indicamos,	 as
faculdades,	 as	 prerrogativas	 e	 morais	 que	 a	 natureza
conferiu	 ao	homem	como	 ser	 inteligente;	 são	 atributos
essenciais	de	sua	individualidade,	são	propriedades	suas
inerentes	à	sua	personalidade,	são	partes	integrantes	da
entidade	humana.190
A	essência	de	tal	direito	era	assim	compreendida:
O	 direito	 de	 propriedade	 é	 a	 faculdade	 ampla	 e
exclusiva	que	cada	homem	tem	de	usar,	gozar	e	dispor
livremente	 do	 que	 licitamente	 adquiriu,	 do	 que	 é	 seu,
sem	 outros	 limites	 que	 não	 sejam	 os	 da	 moral	 ou
direitos	 alheios;	 é	 o	 jus	 utendi,	 et	 abutendi	 re	 sua;	 é
também	o	direito	de	defendê-la	e	reivindicá-la.191
Portanto:
A	plenitude	da	garantia	da	propriedade	não	só	justa,
como	reclamada	pelas	noções	econômicas,	e	pela	razão
política	 dos	 povoslivres;	 na	 colisão	 antes	 o	 mal	 de
alguma	 imprudência	 do	 proprietário	 do	 que	 a	 violação
do	seu	livre	domínio.	[...]
Pelo	 que	 toca	 a	 ordem	 política	 a	 propriedade	 é	 uma
das	bases	fundamentais	da	sociedade;	esse	princípio,
fecundo	 em	 suas	 consequências,	 é	 quem	 modera	 os
impostos,	 economiza	 as	 rendas	 públicas,	 não	 tolera
senão	 o	 governo	 representativo	 e	 não	 prescinde	 da
intervenção	do	povo	na	administração	central.192
Bueno	 tece	 uma	 belíssima	 descrição	 do	 Direito	 à	 Liberdade,
previsto	 no	 art.	 179,	 §	 1º	 da	Constituição	 de	 1824,	 em	 sua	 obra	 de
Comentários	à	Constituição	de	1824.
Observe-se	 que	 o	 direito	 à	 liberdade	 estava	 atrelado	 à	 própria
concepção	 da	 propriedade,	 pois	 o	 Cidadão	 do	 Império	 detinha	 uma
“propriedade	pessoal”	do	seu	estado	de	homem	livre:
A	liberdade	é	o	próprio	homem,	porque	é	a	sua	vida
moral,	é	a	sua	propriedade	pessoal	e	a	mais	preciosa,
o	 domínio	 de	 si	 próprio,	 a	 base	 de	 todo	 os	 eu
desenvolvimento	 e	 perfeição,	 a	 condição	 essencial	 do
gozo	de	sua	 inteligência	e	vontade,	o	meio	de	perfazer
seus	destinos.
É	 o	 primeiro	 dos	 direitos,	 e	 salvaguarda	 de	 todos	 os
outros	 direitos	 que	 constituem	 o	 ser,	 a	 igualdade,	 a
propriedade,	a	segurança	e	a	dignidade	humana.193
Segundo	o	autor,	somente	a	Lei	poderia	restringir	a	liberdade:	“[...]
e	não	o	arbítrio	ou	a	vontade	de	alguém,	que	deve	ser	impotente	desde
que	o	princípio	do	governo	não	é	o	da	escravidão,	sim	o	dos	direitos
do	homem”194.
Essa	 passagem,	 publicada	 originalmente	 em	 1857,	 explica
tecnicamente	 os	 princípios	 da	 Constituição	 de	 1824,	 mas	 não	 é
suficientemente	 válida	 para	 compreender	 a	 realidade	 brasileira	 no
século	XIX.	Na	verdade,	esse	grande	estudo	do	Direito	Constitucional
nacional	 simplesmente	 omitia	 que	 a	 escravidão	 era	 a	 relação
jurídica	fundamental	da	nossa	estrutura	produtiva195.
Constituía-se,	 então,	 em	 um	 infame	 liame	 jurídico	 que
contaminava	 a	 própria	 sociedade,	 invertendo	 a	 primazia	 dos	 valores
jurídicos	existentes,	afinal,	a	obtenção	da	 liberdade	pelos	escravos196
somente	poderia	surgir	com	o	respeito	à	propriedade	dos	senhores:
A	 nossa	 Constituição	 art.	 179,	 §	 22	 garante	 a
propriedade	em	toda	a	sua	plenitude,	salvos	os	casos	de
desapropriação	 por	 necessidade	 ou	 utilidade	 pública
definidos	 nas	 Leis;	 ora	 nenhuma	 lei,	 dizem,	 tem
ampliado	 ou	 aplicado	 a	 bem	 da	 liberdade	 semelhante
desapropriação,	 a	 título	 de	 humanidade	 e	 utilidade
social.197
Em	uma	ponderação	de	valores	constitucionais,	portanto,	deve-se
concluir	que,	no	que	se	refere	aos	escravos,	a	supremacia	do	direito
à	propriedade	é	evidente.
Para	 muitos	 dos	 intérpretes	 da	 Constituição	 de	 1824,	 não	 seria
possível	admitir	uma	abolição	da	escravidão,	por	meio	de	lei,	sem	que
fosse	assegurada	a	justa	indenização,	pois,	do	contrário,	tal	legislação
estaria	 a	violar	o	 sagrado	direito	 à	propriedade	previsto	no	§	22,	do
art.	179,	da	Carta	constitucional.
Apesar	da	supremacia	do	direito	de	propriedade	sobre	a	liberdade,
Malheiro198	 entendia	 que	 não	 haveria	 inconstitucionalidade	 em	 uma
lei	que	viesse	a	emancipar	todos	os	escravos:
E,	 generalizando,	 perguntaremos	 —	 se	 uma	 lei
declarasse	 livres	 os	 escravos,	 ou	 as	 escravas,	 ou	 um
certo	 grupo,	 abolisse	 enfim	 a	 escravidão,	 mediante
indenização	 ou	 mesmo	 sem	 ela	 segundo	 os	 casos	 e
circunstâncias,	como	dispunham	os	Judeus,	e	o	fizeram
nos	 tempos	modernos	 as	Nações	 da	 Europa	 sobretudo
Portugal,	a	França,	Inglaterra,	Holanda,	e	outros	países
do	mundo,	 e	 ainda	 ultimamente	 os	 Estados	Unidos	 da
Norte	 América,	 estaria	 porventura	 fora	 da	 órbita	 das
atribuições	 constitucionais	 do	 Poder	 Legislativo?
Certamente	que	não;	se	a	escravidão	deve	sua	existência
e	conservação	exclusivamente	à	lei	positiva,	é	evidente
que	ela	a	pode	extinguir.
Entende	 o	 autor	 que	 nem	 mesmo	 o	 direito	 à	 indenização	 seria
absoluto	se	uma	lei	geral	de	natureza	emancipatória	fosse	promulgada,
em	face	da	anormalidade	que	era	a	existência	da	própria	escravidão:
A	 obrigação	 de	 indenizar	 não	 é	 de	 rigor,	 segundo	 o
Direito	absoluto	ou	Natural;	e	apenas	de	equidade	como
conseqüência	da	própria	 lei	 positiva,	 que	 aquiesceu	 ao
fato	 e	 lhe	 deu	 vigor	 como	 se	 fora	 uma	 verdadeira	 e
legítima	 propriedade;	 essa	 propriedade	 fictícia	 é	 antes
uma	tolerância	da	lei	por	motivos	especiais	e	de	ordem
pública,	do	que	reconhecimento	de	um	direito	que	tenha
base	 e	 fundamento	 nas	 leis	 eternas,	 das	 quais	 a
escravidão	 é,	 ao	 contrário,	 uma	 revoltante,	 odiosa,	 e
violentíssima	 infração,	 como	 as	 próprias	 leis	 positivas
hão	reconhecido.199
Ou	 seja,	 segundo	 os	 argumentos	 de	 Malheiro,	 a	 escravidão
buscava	seus	alicerces	no	ordenamento	e	apenas	nele,	razão	pela
qual	 poderia	 existir	 uma	 lei	 emancipatória	 geral	 e	 explícita,	 que
estabelecesse	uma	abolição	sem	indenização:
Essa	 manutenção	 está,	 pois,	 subordinada	 à	 cláusula
implícita	e	 subentendida	 na	 lei	 positiva	—	enquanto	 o
contrário	não	 for	ordenado	—;	é	um	direito	 resolúvel,
logo	 que	 esta	 cláusula	 se	 verifique,	 isto	 é,	 logo	 que	 o
legislador	o	declare	extinto.200
Somente	 após	 a	Guerra	do	Paraguai,	 no	Brasil,	 quando	há	muito
fora	extinto	o	 tráfico	de	escravos201,	 surgiu	a	primeira	 transformação
desse	cenário	com	a	Lei	do	Ventre	Livre202,	a	qual	buscava	respeitar
o	 direito	 à	 “justa	 indenização”	 pela	 perda	 do	 patrimônio
escravo203.	Não	é	possível	se	falar	da	escravidão	sem	que	se	faça	uma
análise	 do	 tráfico	 de	 escravo,	 uma	 das	 razões	 de	 ser	 da	 sua	 própria
manutenção	no	território	do	Império	do	Brasil.
Notas
78.	“Assim	fundou-se	o	Império	do	Brasil,	ou	por	uma	frase,	a	nação	brasileira,
que	é	a	associação	de	todos	os	brasileiros;	que	é	a	sociedade	civil	e	política	de
um	 povo	 americano	 livre	 e	 independente”	 (Bueno,	 José	 Antônio	 Pimenta.
Marquês	de	São	Vicente.	Organização	e	 introdução	de	Eduardo	Kugelmas.	São
Paulo:	Ed.	34,	2002,	p.	78).
79.	“Para	que	um	governo	mereça	o	nome	de	constitucional	não	basta	que	ele
seja	 instituído	 pelo	 consentimento	 nacional;	 é	 de	 mister	 além	 disso	 que	 a
natureza	 e	 extensão	 dos	 poderes	 políticos	 e	 suas	 atribuições	 sejam
expressamente	 fixadas	 e	 limitadas	 por	 disposições	 que	 estabeleçam	 o
fundamento,	a	norma	invariável,	a	regra	fixa	e	suprema,	assim	do	governo,	como
dos	direitos	e	obrigações	dos	cidadãos”	(Bueno,	José	Antônio	Pimenta.	Marquês
de	São	Vicente.	Organização	e	introdução	de	Eduardo	Kugelmas.	São	Paulo:	Ed.
34,	2002,	p.	88).
80.	“A	divisão	e	harmonia	dos	poderes	políticos	é	o	princípio	conservador	dos
direitos	dos	cidadãos,	é	o	mais	seguro	meio	de	fazer	efetivas	as	garantias	que	a
Constituição	oferece”	(Bueno,	José	Antônio	Pimenta.	Marquês	de	São	Vicente.
Organização	 e	 introdução	 de	 Eduardo	Kugelmas.	 São	 Paulo:	 Ed.	 34,	 2002,	 p.
91).
81.	 “[...]	 Aquelas	 resultam	 da	 vontade	 popular,	 expressa	 por	 uma	Assembleia
Constituinte,	 eleita	 para	 elaboração	 da	 Constituição,	 no	 exercício	 do	 poder
constituinte”	 (Carvalho,	 Kildare	 Gonçalves.	 Direito	 Constitucional.	 Belo
Horizonte:	Del	Rey,	2006,	p.	250).
82.	 “Já	 as	 constituições	 outorgadas	 são	 aquelas	 que	 o	 governo	 concede	 uma
constituição	ao	povo	como	uma	pura	dádiva,	limitando	o	seu	poder	em	benefício
da	 liberdade,	 como	 ocorreu	 com	 a	 constituição	 imperial	 brasileira	 de	 25	 de
março	de	1824”	(Ferreira,	Luís	Pinto.	Teoria	Geral	do	Estado,	v.	1.	São	Paulo:
Saraiva,	1975,	p.	403).
83.	“A	constituição	é	assim	a	miniatura	das	condições	econômicas	e	culturais	de
um	 povo.[...]	 Todas	 as	 constituições	 são	 assim	 compromissos	 e	 refrações	 das
tendências	 existentes	 na	 sociedade,	 cada	 uma	 delas	 com	 sua	 concepção	 de
mundo	 e	 interessescontraditórios	 se	 digladiando	 na	 arena	 política”	 (Ferreira,
Luís	Pinto.	Teoria	Geral	do	Estado,	v.	1.	São	Paulo:	Saraiva,	1975,	p.	396).
84.	“[A	dissolução	da	Assembleia	Constituinte	de	1823]	assenta	na	contradição
com	 que	 se	 fez	 a	 Independência:	 sem	 a	 ruptura	 revolucionária	 que	 em	 outras
colônias	 da	América	 assinalou	 tal	 processo	 [...]”	 (Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,
Paes	de.	História	Constitucional	do	Brasil.	Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	54).
85.	“O	golpe	de	Estado	de	12	de	novembro	de	1823	resultou	na	dissolução	da
primeira	 Constituinte”	 (Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	 História
Constitucional	do	Brasil.	Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	54).
86.	“[...]	Teria	faltado	por	vezes	maior	prudência	e	tato	a	alguns	deputados,	mas
o	certo	é	que	o	imperador	deixou	testemunhada	a	contradição	entre	as	suas	ideias
e	 o	 seu	 temperamento.	 Esse	 liberal	 sincero	 não	 dominava	 um	 fundo	 de
irredutível	 autoritarismo.	 Todas	 ou	 quase	 todas	 as	 crises	 do	 Primeiro	 Reinado
estariam	vinculadas	àquela	contradição”	(Sousa,	Octavio	Tarquinio	de.	História
dos	 Fundadores	 do	 Império	 do	 Brasil:	 três	 golpes	 de	 Estado,	 v.	 VIII.	 Rio	 de
Janeiro:	Livraria	Jose	Olympio,	1957,	p.	93).
87.	 Expressão	 que	 pode	 ser	 compreendida	 como	 sinônimo	 de	 Constituição,
referência	 ao	 primeiro	 dos	 textos	 que	 forma	 a	 Constituição	 costumeira	 dos
ingleses,	 a	Magna	 Charta,	 de	 1215	 (redigida	 em	 latim),	 a	 qual	 impôs	 uma
limitação	aos	poderes	do	 rei	 João	Sem	Terra:	 “[...]	o	Rei	 teve	de	 resignar-se	a
firmar	 um	 documento	 em	 que	 se	 comprometia	 a	 respeitar	 os	 privilégios	 ou
liberdades	 dos	 três	 estados	 do	 reino.	 A	 liberdade	 da	 Igreja,	 as	 prerrogativas
municipais,	 a	moderação	da	 tributação	dos	mercadores,	 o	 direito	 que	 cada	um
tem	a	não	ser	condenado	senão	após	julgamento	pelos	seus	pares	ou	segundo	o
Direito	do	seus	país,	o	direito	de	 todo	homem	a	que	 lhe	seja	 feita	 justiça	 [...]”
(Caetano,	Marcelo.	Direito	 Constitucional,	 v.	 I.	 Prefácio	 do	Ministro	 Aliomar
Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1977,	p.	68).
Tal	diploma	jurídico	foi	confirmado	posteriormente	pelos	sucessores	do	rei.	Para
mais	detalhes	acerca	da	Magna	Charta	ver	Saldanha,	Nelson	N.	A	Cidadania	na
Inglaterra.	Brasília:	Fundação	Projeto	Rondon,	1988,	p.	19-25.
88.	São	as	assembleias	 legislativas	que	“se	reúnem	para	elaborar	a	 lei	orgânica
do	país	[a	Constituição],	adotando	a	forma	de	governo	escolhida	pelo	povo	[...]”
(Silva,	de	Plácido	e.	Vocabulário	Jurídico.	Atualizadores:	Nagib	Slaibi	Filho	 e
Gláucia	Carvalho.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Forense,	2006,	p.	148).
89.	Caetano,	Marcelo.	Direito	Constitucional,	v.	I.	Prefácio	do	Ministro	Aliomar
Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Forense,	1977,	p.	492.
90.	“Instruções,	a	que	se	refere	o	Real	Decreto	de	3	de	junho	do	corrente	ano	que
manda	convocar	uma	Assembleia	Geral	Constituinte	e	Legislativa	para	o	Reino
do	Brasil”.
91.	§	7º	do	capítulo	I,	da	Instrução	de	19	de	junho	de	1822.
92.	§§	8º	e	9º	do	Capítulo	I	da	Instrução	de	19	de	junho	de	1822.
93.	 A	 fixação	 do	 número	 de	 representantes	 por	 Província	 (apesar	 de	 as
autoridades	 não	 conhecerem	 a	 população	 de	 dada	 uma	 delas),	 também	 estava
prevista	nesse	diploma.
94.	§	1º	do	capítulo	IV	da	Instrução	de	19	de	junho	de	1822.
95.	§	6º	do	capítulo	II,	da	Instrução	de	19	de	junho	de	1822.
96.	§	7º	do	capítulo	II,	da	Instrução	de	19	de	junho	de	1822.
97.	 §	 8º	 do	 capítulo	 III	 da	 Instrução	 de	 19	 de	 junho	 de	 1822.	 Tais	 eleitores
deveriam	se	dirigir	aos	locais	onde	deveriam	escolher	os	deputados.
98.	6.000	cruzados	por	ano.
99.	 “Ficarão	 suspensos	 todos	 e	 quaisquer	 outros	 vencimentos,	 que	 tiverem	 os
Deputados,	 percebidos	 pelo	 Tesouro	 Público,	 provenientes	 de	 empregos,
pensões,	 etc.”	 (§§	 4º,	 5º	 e	 6º	 do	 Capítulo	 IV	 da	 Instrução	 de	 19	 de	 junho	 de
1822).
100.	§§	8º,	9º	e	10º	do	Capítulo	IV	da	Instrução	de	19	de	junho	de	1822.
101.	 Com	 exceção	 de	 Olinda	 e	 de	 Cuiabá,	 onde	 surgiram	 contestações	 do
resultado	 da	 eleição,	 que	 foram	 solucionadas	 pela	 própria	 Assembleia
Constituinte	em	18	de	abril,	na	sua	segunda	sessão	preparatória,	os	eleitos	foram
reconhecidos.
102.	 Caetano,	 Marcelo.	 Direito	 Constitucional,	 v.	 I.	 Prefácio	 do	 Ministro
Aliomar	Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1977,	p.	494.
103.	Português,	nascido	em	Caldas	da	Rainha	em	1768,	 casou	D.	Pedro	 I.	Foi
sagrado	Bispo	 do	 rio	 de	 Janeiro	 pelo	Papa	 em	15	 de	março	 de	 1807.	Homem
culto	 e	 apaixonado	 pela	Matemática	 e	 de	 absoluta	 confiança	 do	 Imperador	D.
Pedro	I.	Disponível	em:	<https://goo.gl/T4SM8h>.	Acesso	em:	6	jun.	2015.
104.	 Deiró,	 Pedro	 Eunápio	 da	 Silva.	 Fragmentos	 de	 Estudos	 da	 História	 da
Assembleia	Constituinte	do	Brasil.	Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	61-65.
105.	 Caetano,	 Marcelo.	 Direito	 Constitucional,	 v.	 I.	 Prefácio	 do	 Ministro
Aliomar	Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1977,	p.	494.
106.	Segundo	a	expressão	utilizada	pelos	parlamentares	da	época.
107.	 Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	55-58.
108.	Houve	tentativas	de	apresentar	propostas	que	viessem	a	abolir	a	escravidão,
inclusive	 uma	 que	 seria	 apresentada	 por	 José	 Bonifácio,	 a	 Representação	 à
Assembleia	 Geral	 Constituinte	 e	 Legislativa	 do	 Império	 do	 Brasil	 sobre	 a
escravatura:	“É	tempo	pois	que	esses	senhores	bárbaros,	que	por	desgraça	nossa
ainda	pululam	no	Brasil,	ouçam	os	brados	da	consciência	e	da	humanidade,	ou
pelo	 menos	 o	 seu	 próprio	 interesse,	 senão,	 mais	 cedo	 do	 que	 pensam,	 serão
punidos,	serão	punidos	das	suas	injustiças,	e	da	sua	incorrigível	barbaridade.	Eu
vou,	 finalmente,	 senhores,	 apresentar-vos	 os	 artigos	 que	 podem	 ser	 objeto	 de
nova	 lei	 que	 requeiro:	 discuti-os,	 emendai-os,	 ampliai-os	 segundo	 a	 vossa
sabedoria	e	 justiça”	(Caldeira,	Jorge	(org.).	José	Bonifácio	de	Andrada	e	Silva.
São	 Paulo:	 Ed.	 34,	 2002).	 Entretanto,	 com	 o	 desfecho	 da	 Assembleia,	 sequer
houve	 debates	 sobre	 o	 tema	 (Chalhoub,	 Sidney.	 A	 força	 da	 escravidão:
ilegalidade	e	costume	no	Brasil	oitocentista.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,
2012,	p.	40-41).	Para	pronunciamentos	sobre	os	males	da	escravidão,	ver	Deiró,
Pedro	 Eunápio	 da	 Silva.	 Fragmentos	 de	 Estudos	 da	 História	 da	 Assembleia
Constituinte	do	Brasil.	Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	295-296.
109.	 “Outro	 aspecto	 por	 onde	 se	 manifestava	 a	 vulnerabilidade	 do	 corpo
constituinte	 era	 o	 atraso	 da	 cultura	 política	 da	 sociedade	 nascente,	 o	 estado
embrionário	da	cidadania,	a	precariedade	da	consciência	cívica,	as	 incertezas	e
os	equívocos	que	rodeavam	o	processo	de	emancipação:	mais	à	semelhança	de
um	 pacto	 de	 que	 uma	 ruptura	 com	 a	 metrópole,	 alimentando-se,	 até	 mesmo
depois	de	proclamada	formalmente	a	independência,	o	sonho	de	uma	união,	a	ser
conservada	 por	 via	 consensual	 e,	 enfim,	 as	 condições	 sociais	 extremamente
adversas	 oriundas	 dos	 vícios	 e	 taras	 da	 sujeição	 colonial	 de	 trezentos	 anos”
(Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	 História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	46).	No	mesmo	sentido	Porto,	Costa.	O	marquês
de	Olinda	e	o	seu	tempo.	Recife:	UFPE/Editora	Universitária,	1976,	p.	66-67.
A	 Assembleia	 funcionou	 no	 prédio	 da	 Cadeia	 Velha,	 no	 Rio	 de	 Janeiro,
preparado	para	 servir	de	Casa	do	Parlamento.	Sua	decoração	era	 simples,	 com
galerias	e	 tribunas.	Tal	edificação	demolida	no	ano	de	1922	para	ceder	 lugar	à
construção	 de	 uma	 nova	 sede	 para	 a	 Câmara	 dos	 Deputados:	 o	 Palácio
Tiradentes,	na	rua	D.	Manuel,	no	centro	da	capital	carioca	(Deiró,	Pedro	Eunápio
da	 Silva.	 Fragmentos	 de	 Estudos	 da	 História	 da	 Assembleia	 Constituinte	 do
Brasil.	Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	61-65).
110.	“A	Constituinte	 brasileiranascera	 com	 um	vício	 congênito.	O	 decreto	 de
convocação	denominava-a	também	legislativa:	ela	entendeu,	desde	logo,	que	não
só	devia	ocupar	de	fazer	a	constituição,	mas	igualmente	de	fazer	leis	ordinárias.
Estas	 tiveram	preferência	e	encheram	o	 tempo	das	 sessões	celebradas	antes	da
apresentação	 do	 projeto	 principal,	 para	 o	 qual	 não	 se	 tinha	 previamente
preparado	bases	[...]”	(Monteiro,	Tobias	apud	Bonavides,	Paulo;	Andrade,	Paes
de.	História	Constitucional	do	Brasil.	Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	45).
111.	O	que	não	foi	bem	aceito	pelo	monarca,	que	fora	educado	para	ser	El-Rei
absoluto	de	Portugal	e	de	seu	império	marítimo.
112.	 Caetano,	 Marcelo.	 Direito	 Constitucional,	 v.	 I.	 Prefácio	 do	 Ministro
Aliomar	Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Forense,	1977,	p.	495.
113.	Na	Constituinte	de	1823	já	havia	debates	acerca	da	exclusão	de	indivíduos
da	condição	de	eleitores	de	acordo	com	o	seu	status	social,	negando	o	direito	ao
voto	a	jornaleiros,	caixeiros	de	casas	comerciais,	enfim,	todos	com	renda	líquida
inferior	a	150	alqueires	de	farinha	de	mandioca.	Evidente	que	os	escravos	sequer
eram	 considerados	 como	 cidadãos,	 não	 tendo,	 portanto,	 direito	 ao	 sufrágio
(Moura,	Clóvis.	Rebeliões	da	Senzala:	quilombos,	 insurreições,	guerrilhas.	Rio
de	Janeiro:	Conquista,	1972,	p.	58-59).
114.	 Sousa.	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	506.
115.	Art.	 19	do	 seu	Regimento	 Interno:	 “No	 topo	da	 sala	 das	 sessões	 estará	 o
trono	imperial,	e	no	primeiro	degrau	à	direita	estará	a	cadeira	do	presidente	da
assembleia	 quando	 o	 imperador	 vier	 assistir”.	 Tal	 dispositivo	 gerou	 muita
controvérsia	 por	 suscitar	 uma	 situação	 simbólica	 de	 possível	 subordinação	 do
Parlamento	ao	monarca.
116.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	512.	Tal	frase,	também	foi	objeto	de	juramento
em	 1º	 de	 dezembro	 de	 1822:	 “Juro	 defender	 a	 Constituição	 que	 está	 para	 ser
feita,	 se	 for	 digna	 do	 Brasil	 e	 de	 mim”.	 Em	 suma:	 “[D.	 Pedro	 I]	 não	 se
conformaria	 com	 qualquer	 restrição	 ao	 “que	 realmente	 lhe	 pertencia”	 (Sousa,
Octavio	Tarquinio	de.	A	Vida	de	D.	Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	Alegre:	Livraria	 Jose
Olympio,	1954,	p.	515).
117.	 Já	que	a	convocação	da	Assembleia	derivou	não	de	uma	pressão	popular,
mas	 de	 um	 ato	 de	 vontade	 seu,	 algo	 que	 desejava	 desde	 quando	 ainda	 era
príncipe	 Regente	 do	 Reino	 do	 Brasil	 (Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.
História	Constitucional	do	Brasil.	Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	55).
118.	 Um	 dos	 parlamentares,	 o	 padre	 Dias,	 por	 Minas	 Gerais,	 assim	 se
manifestou:	 “[...]	 que	 o	 julgar	 a	 Constituição	 que	 se	 fizer,	 digna	 do	 Brasil	 só
compete	 a	 nós	 como	 representantes	 do	 povo.	 Demais,	 se	 nós	 confiamos	 tudo
dele,	porque	não	confia	ele	também	tudo	de	nós?	[...]”	(Deiró,	Pedro	Eunápio	da
Silva.	Fragmentos	de	Estudos	da	História	da	Assembleia	Constituinte	do	Brasil.
Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	116).
119.	 Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	48-49.
120.	 Deiró,	 Pedro	 Eunápio	 da	 Silva.	 Fragmentos	 de	 Estudos	 da	 História	 da
Assembleia	Constituinte	do	Brasil.	Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	357-361	e
Mendes,	 Gilmar	 Ferreira;	 Branco,	 Paulo	 Gustavo	 Gonet.	 Curso	 de	 Direito
Constitucional.	São	Paulo:	Saraiva,	2001,	p.	118.
121.	 Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	 2008,	 p.	 49-51.	 Evidente	 que	 tal	 Fala	 do	 Trono	 gerou
sérios	 debates	 na	Assembleia,	 com	 a	 turma	 do	 “deixa	 disso”	 tentando	 colocar
panos	quentes	na	ferida	provocada	pelo	Imperador.
122.	 “Ainda	 em	 1823,	 nas	 sessões	 de	 27	 e	 de	 30	 de	 setembro,	 os	 deputados
constituintes	 discutiram	 o	 §	 6º	 do	 art.	 5º	 do	 projeto	 de	 Constituição,	 que
declarava	 brasileiros	 ‘os	 escravos	 que	 obtiverem	 carta	 de	 alforria’	 [...]	 Vários
deputados	propuseram	emendas	para	restringir	a	cidadania	a	libertos	nascidos	no
Brasil,	 ou	 exigir	 dos	 africanos	 o	 cumprimento	 de	 condições	 como	 casamento
com	 mulher	 brasileira	 e	 dar	 prova	 de	 ocupação	 respeitável	 [...]	 Na	 votação,
venceu	 a	 proposta	 contida	 no	 projeto	 elaborado	 pela	 comissão	 de	 constituição
[...]	 a	 maioria	 dos	 deputados	 favoreceu	 considerar	 cidadãos	 brasileiros	 ‘os
libertos	 que	 adquiriram	 sua	 liberdade	 por	 qualquer	 título	 legítimo’,	 incluindo
portanto	os	 africanos.	 [...]	 na	 carta	 outorgada	 em	1824,	 só	 foram	considerados
merecedores	da	cidadania	brasileira	os	libertos	nascidos	no	Brasil,	que	ficaram,
no	entanto,	excluídos	da	cidadania	política”	(Mamigonian,	Beatriz	G.	Africanos
livre:	 a	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil.	 São	 Paulo:	 Companhia	 das
Letras,	2017,	p.	53-57).
123.	“D.	Pedro	não	era	um	imbecil;	viu	que	a	Assembleia	não	só	o	contrariava,
como	lhe	criava	perigos.	Estava	compenetrado	da	urgência	de	desembaraçar-se
de	semelhante	trambolho.	De	que,	em	verdade,	lhe	servia	a	Assembleia?	Ela	não
fez	 a	 Independência,	 nem	 proclamou	 o	 Império;	 achou	 a	 obra	 feita”	 (Deiró,
Pedro	 Eunápio	 da	 Silva.	 Fragmentos	 de	 Estudos	 da	 História	 da	 Assembleia
Constituinte	do	Brasil.	Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	260).
124.	“No	fundo	o	problema	findaria	este:	a	quem	iria	caber	o	poder	supremo,	–	à
Assembleia	 ou	 ao	 Imperador?”	 (Porto,	 Costa.	O	 marquês	 de	 Olinda	 e	 o	 seu
tempo.	Recife:	UFPE/Editora	Universitária,	1976,	p.	65).
125.	A	crise	da	reincorporação	no	exército	brasileiro	de	portugueses	que	lutaram
contra	a	independência,	pois	o	Brasil	ainda	continuava	em	guerra	contra	Portugal
naquele	 momento	 (Portaria	 de	 2	 de	 agosto	 do	 governo	 provisório	 da	 Bahia),
azedou	a	situação,	apesar	de	algumas	manifestações	esporádicas	de	boa	vontade
do	Imperador	e	de	ministros.	Entretanto,	em	6	de	novembro	de	1823,	o	atentado
contra	o	brasileiro	David	Pamplona	Corte	Real	(que	nenhuma	relação	havia	com
a	 edição	 do	 jornal	 Sentinela	 da	 Liberdade,	 do	 autor	 anônimo	 “Brasileiro
Resoluto”),	perpetrado	por	militares,	e	cuja	defesa	foi	tomada	pelo	Parlamento,
deflagrou	uma	crise	política,	militar	e	ministerial,	baseada	em	questionamentos
acerca	da	liberdade	de	imprensa,	cujas	proporções	resultaram	no	golpe	de	12	de
novembro	 de	 1823	 (Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	 História
Constitucional	do	Brasil.	Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	54-68;	e	Deiró,	Pedro
Eunápio	 da	 Silva.	 Fragmentos	 de	 Estudos	 da	 História	 da	 Assembleia
Constituinte	do	Brasil.	Brasília:	Senado	Federal,	2006,	p.	321-327).	Tais	crises
precipitaram	a	queda	do	Gabinete	Andrada	e	de	José	Bonifácio,	em	16	de	julho
de	1823	(Lustosa,	Isabel.	D.	Pedro	I:	um	herói	sem	nenhum	caráter.	São	Paulo:
Cia	das	Letras,	2006,	p.	165-166).
126.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	519.
127.	D.	Pedro	chegaria	até	a	escrever,	sob	pseudônimos,	agredindo	ensaístas	de
jornais	que	lhe	criticavam,	bem	como	adversários	políticos	(Lustosa,	Isabel.	D.
Pedro	I:	um	herói	sem	nenhum	caráter.	São	Paulo:	Cia	das	Letras,	2006,	p.	125).
128.	Lustosa,	Isabel.	D.	Pedro	I:	um	herói	sem	nenhum	caráter.	São	Paulo:	Cia
das	Letras,	2006,	p.	147-149	e	163-164.
129.	Anos	depois,	já	em	1830.
130.	As	Falas	 do	Trono	 seriam:	 “Os	 discursos	 da	Coroa,	 onde	 veem	 inseridos
todos	os	esclarecimentos	mais	notáveis	sobre	o	estado	do	país	e	onde	se	sugerem
as	providencias	 reclamadas	pelo	bem	público,	 os	 respectivos	Votos	de	Graças,
que	 quase	 sempre	 revelam	 o	 acordo	 entre	 a	 maioria	 da	 Gamara	 e	 a	 direção
política	do	ministério	[...]”	(Brasil.	Falas	do	Trono:	do	ano	de	1823	até	o	ano	de
1889.	Org.	Barão	de	Javari.	Rio	de	Janeiro:Imprensa	Nacional,	1889,	p.	V).
131.	“Vigilante,	e	empenhado	em	manter	a	boa	ordem	é	do	meu	mais	 rigoroso
dever	 lembrar-vos	 a	 necessidade	 de	 reprimir	 por	 meios	 legais	 o	 abuso,	 que
continua	 a	 fazer-se,	 da	 liberdade	 da	 imprensa	 em	 todo	 o	 Império.	 Semelhante
abuso	ameaça	grandes	males;	à	assembleia	cumpre	evitá-los”	(Brasil.	Falas	do
Trono:	do	ano	de	1823	até	o	ano	de	1889.	Org.	Barão	de	Javari.	Rio	de	Janeiro:
Imprensa	Nacional,	1889,	p.	177).
132.	 Vianna,	 Hélio.	 História	 do	 Brasil,	 v.	 II.	 Melhoramentos,	 1967,	 p.	 100.
Ademais,	 deve-se	 registrar	 o	 atentado	 à	 integridade	 física	 perpetrado	 contra	 o
editor	 do	 periódico	 Malagueta,	 em	 6	 de	 junho	 de	 1823,	 cujo	 mandante
possivelmente	foi	o	próprio	D.	Pedro	I.
133.	Como	passou	a	 ser	conhecida	a	noite	e	a	madrugada	que	antecederam	ao
fatídico	dia	12	de	novembro	de	1823,	no	qual,	por	um	golpe	de	estado,	D.	Pedro
I	 simplesmente	 dissolveu	 o	 órgão	 que	 iria	 elaborar	 a	 Carta	 Constitucional	 do
Brasil:	 “Sem	 abandonar	 o	 edifício	 da	 Assembleia,	 em	 sessão	 permanente,
preparavam-se	para	o	pior.	A	noite	de	11	para	12,	com	as	 inquietações,	sustos,
debates	 íntimos,	 sofrimentos	 e	 fadigas	 de	 tantos	 homens	 diversos	 pela	 idade,
índole	 e	 reações	 pessoais,	 ficaria	 conhecida	 como	 ‘noite	 da	 agonia’”	 (Sousa,
Octávio	Tarquínio	de.	A	vida	de	D.	Pedro	I.	Rio	de	Janeiro:	Livraria	J.	Olympio,
1972,	t.	II,	p.	571).
134.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	571	e	Sousa,	Octavio	Tarquínio	de.	História	dos
Fundadores	do	Império	do	Brasil:	três	golpes	de	Estado,	v.	VIII.	Rio	de	Janeiro:
J.	Olympio,	1957,	p.	88-89.
135.	 “À	 Assembleia	 chegavam	 notícias	 do	 que	 se	 passava	 fora,	 mas	 com	 a
deformação	e	o	aumento	característicos	de	tais	ocasiões.	A	dissolução	já	estava
resolvida	e	os	deputados	seriam	dispersados	pela	 tropa,	seriam	presos”	(Sousa,
Octavio	Tarquinio	de.	A	Vida	de	D.	Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	Alegre:	Livraria	 Jose
Olympio,	1954,	p.	571).
136.	Foi	expedido,	por	volta	das	cinco	horas	da	manhã	desse	fatídico	dia	12	de
novembro,	 pela	 Assembleia,	 após	 muitas	 confusões,	 um	 ofício	 para	 que	 o
Ministro	do	Império,	uma	espécie	de	Chefe	da	Casa	Civil,	comparecesse	às	10
horas	 para	 prestar	 esclarecimentos	 (Sousa,	Octavio	 Tarquínio	 de.	História	 dos
Fundadores	do	Império	do	Brasil:	três	golpes	de	Estado,	v.	VIII.	Rio	de	Janeiro:
J.	Olympio,	1957,	p.	90).
137.	Sousa,	Octávio	Tarquínio	de.	A	vida	de	D.	Pedro	I.	Rio	de	Janeiro:	Livraria
J.	Olympio,	1972,	 t.	 II,	p.	572	e	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	 ed.
São	Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	82.
138.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquínio	 de.	 História	 dos	 Fundadores	 do	 Império	 do
Brasil:	três	golpes	de	Estado,	v.	VIII.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1957,	p.	91-92.
139.	Lustosa,	Isabel.	D.	Pedro	I:	um	herói	sem	nenhum	caráter.	São	Paulo:	Cia
das	Letras,	2006,	p.	169.
140.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquínio	 de.	 História	 dos	 Fundadores	 do	 Império	 do
Brasil:	três	golpes	de	Estado,	v.	VIII.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1957,	p.	93.
141.	Porto,	Costa.	O	marquês	de	Olinda	e	o	 seu	 tempo.	Recife:	UFPE/Editora
Universitária,	1976,	p.	68.
142.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquinio	 de.	 História	 dos	 Fundadores	 do	 Império	 do
Brasil:	 três	 golpes	 de	 Estado,	 v.	 VIII.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Livraria	 Jose	Olympio,
1957,	p.	92.
143.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	574.
144.	 Sousa.	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	578.
145.	O	 segundo	 decreto,	 no	 dia	 seguinte	 ao	 golpe	 de	 Estado	 é	 um	 verdadeiro
esclarecimento	do	primeiro	instrumento:	“Tendo	chegado	ao	meu	conhecimento
que,	 por	 desvio	 do	 genuíno	 sentido	 das	 expressões	 com	 que	 se	 qualificara	 de
perjura	 a	Assembleia	Legislativa	 do	Brasil	 no	 decreto	 da	 data	 de	 ontem	 [...]”.
Ver	Caetano,	Marcelo.	Direito	Constitucional,	v.	I.	Prefácio	do	Ministro	Aliomar
Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1977,	p.	497.
146.	Uma	 característica	 da	 personalidade	 do	 soberano,	 que	marcou	 toda	 a	 sua
vida	 (Sousa,	Octavio	Tarquinio	 de.	A	Vida	 de	D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	550).
147.	Eis	o	juramento	prestado	pelos	congressistas:	“Juro	cumprir	fiel	e	lealmente
as	 obrigações	 de	 deputado	 na	 Assembleia	 Geral	 Constituinte	 e	 Legislativa
brasiliense,	convocada	para	fazer	a	Constituição	política	do	império	do	Brasil,	e
as	 reformas	 indispensáveis	 e	 urgentes,	 mantida	 a	 religião	 católica,	 apostólica,
romana,	 e	 a	 integridade	 e	 independência	 do	 império,	 sem	 admitir	 com	 outra
alguma	nação	qualquer	outro	laço	de	união	ou	federação,	que	se	oponha	a	dita
integridade	 e	 independência,	 mantido	 outrossim	 o	 império	 constitucional,	 e	 a
dinastia	 do	 senhor	 d.	 Pedro	 ,	 nosso	 primeiro	 imperador,	 e	 sua	 descendência”
(Caneca,	 Frei	 Joaquim	 do	 Amor	 Divino.	 Thyphis	 Pernambucano,	 de	 25	 de
dezembro	de	1823.	São	Paulo:	Ed.	34,	2001,	p.	 308).	Para	 estudo	dos	debates
acerca	 da	 fórmula	 sobre	 o	 juramento	 prestado	 pelos	 parlamentares,	 consultar:
<https://goo.gl/mkFeB4>.	Acesso	em:	23	dez.	2017.
148.	 Tais	 supostas	 justificativas	 apresentadas	 pelo	 Imperador	 são	 objeto	 de
crítica	 por	 Frei	 Caneca,	 na	 edição	 de	 25	 de	 dezembro	 de	 1823,	 do	 periódico
Typhis	Pernambucano,	que	tenta	demonstrar	as	falsidades	alegadas	(Caneca,	Frei
Joaquim	do	Amor	Divino.	Thyphis	Pernambucano,	de	25	de	dezembro	de	1823.
São	Paulo:	Ed.	34,	2001,	p.	303-310).
149.	 Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	83.
150.	 Sousa,	 Octavio	 Tarquinio	 de.	A	 Vida	 de	 D.	 Pedro	 I,	 v.	 II.	 Porto	 Alegre:
Livraria	Jose	Olympio,	1954,	p.	577.
151.	Caneca,	Frei	Joaquim	do	Amor	Divino.	Thyphis	Pernambucano,	de	25	de
dezembro	de	1823.	São	Paulo:	Ed.	34,	2001,	p.	303-307.
152.	“A	partir	da	dissolução,	nunca	mais	pôde	D.	Pedro	 tampouco	 recompor	a
sua	 imagem	 liberal,	 destroçada	 com	 o	 golpe	 militar	 de	 que	 ele	 foi	 autor”
(Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	 História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	84).
153.	Por	meio	do	Decreto	de	03	de	junho	de	1822.
154.	 Observe-se	 que	 Frei	 Caneca,	 na	 edição	 natalina	 do	 periódico	 Typhis
Pernambucano,	de	25	de	dezembro	de	1823,	demonstra	que	as	decisões	políticas
cristalizadas	nos	arts.	1,	2	e	3,	da	abortada	Constituição	de	1823,	não	agrediam	o
juramento	 feito	 pelos	 constituintes	 de	 defender	 a	 integridade	 do	 Império,	 sua
independência	e	a	dinastia	de	D.	Pedro	I	(Caneca,	Frei	Joaquim	do	Amor	Divino.
Thyphis	Pernambucano,	de	25	de	dezembro	de	1823.	São	Paulo:	Ed.	34,	2001,	p.
309).
155.	Em	síntese,	tratava-se	órgão	superior	consultivo	do	Imperador,	previsto	no
art.	 137	 da	 Constituição	 de	 1824,	 que	 opinava	 sobre	 as	 altas	 questões	 que
mereciam	a	análise	de	Sua	Majestade	imperial.	Sofreu	inúmeras	modificações	ao
longo	do	século	XIX,	chegando	até	a	ser	extinto,	pelo	art.	32,	da	Lei	nº	16	de	12
de	 agosto	 de	 1834	 (Ato	 Adicional).	 Foi	 recriado	 pela	 Lei	 nº	 234,	 de	 23	 de
novembro	de	1841,	tendo	as	seguintes	atribuições:	“Art.	7º	Incumbe	ao	Conselho
de	Estado	consultar	em	todos	os	negócios,	em	que	o	Imperador	Houver	por	bem
ouvi-lo,	para	resolvê-los”	(Lei	nº	234,	de	1841).	Nesse	período,	o	Conselho	de
Estado	era	integrado	por	12	membros	ordinários,	além	dos	ministros	de	Estado
(art.	1º	da	Lei	nº	234,	de	1841).	Para	mais	detalhes	ver	Lopes,	José	Reinaldo	de
Lima.	O	Oráculo	 de	 Delfos:	 o	 Conselho	 de	 Estado	 no	 Brasil	 –	 Império.	 São
Paulo:	 Saraiva,	 p.	 189-195.	Nas	 palavras	 de	Bueno:	 “O	Conselho	 de	Estado	 é
uma	 importante	 instituição	 que	 tem	 por	 destino	 auxiliar	 ogoverno	 e	 a
administração	nacional	cm	suas	 luzes,	experiência	e	opiniões	ou	pareceres;	é	o
conselheiro	o	coadjuvador	de	suas	tarefas;	e	também	o	fiscal	das	competências
administrativas,	e	o	seu	tribunal	em	matéria	contenciosa	de	sua	alçada”	(Bueno,
José	Antônio	 Pimenta.	Marquês	 de	 São	 Vicente.	 Organização	 e	 introdução	 de
Eduardo	Kugelmas.	São	Paulo:	Ed.	34,	2002,	p.	365).
156.	O	Marquês	de	Caravelas,	integrante	da	regência	trina	provisória,	constituída
em	07	de	 abril	 de	1831,	 foi	muito	 influenciado	pelo	pensamento	de	Benjamin
Constant.
157.	 Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	87.
158.	Sugeriu	que	tal	juramento	viesse	a	ocorrer	em	9	de	janeiro	de	1824.
159.	 Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 A	 outra	 independência:	 o	 federalismo
pernambucano	de	1817	a	1824.	Rio	de	Janeiro:	Editora	34,	2004,	p.	169.
160.	 “Carta	 de	 Lei,	 pela	 qual	 VOSSA	 MAJESTADE	 IMPERIAL	 Manda
cumprir,	e	guardar	inteiramente	a	Constituição	Política	do	Império	do	Brasil,	que
VOSSA	 MAJESTADE	 IMPERIAL	 Jurou,	 anuindo	 às	 Representações	 dos
Povos”.
161.	Em	local	e	data	já	designados	no	próprio	ato	normativo.
162.	 Bonavides,	 Paulo;	 Andrade,	 Paes	 de.	História	 Constitucional	 do	 Brasil.
Brasília:	OAB	Editora,	2008,	p.	87.
163.	 Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 A	 outra	 independência:	 o	 federalismo
pernambucano	de	1817	a	1824.	Rio	de	Janeiro:	Editora	34,	2004,	p.	170.
164.	 “Nesse	 Brasil	 do	 século	 XIX,	 aonde	 chegou	 o	 liberalismo,	 lá	 chegou
também	a	escravidão”	(Parron,	Tâmis.	A	política	da	escravidão	no	 Império	do
Brasil:	1826-1865.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Civilização	Brasileira,	2011,	p.	25).
165.	Unido	a	Portugal	e	Algarves	desde	a	chegada	da	família	real	portuguesa	e	a
transferência	da	Corte	para	o	Rio	de	Janeiro	(Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,
v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	13).
166.	Dolhnikoff,	Miriam.	O	Pacto	 Imperial:	 origens	 do	 federalismo	no	Brasil.
Rio	de	Janeiro:	Globo,	2005,	p.	51.
167.	 “Caracterizava-se	 [...]	 pela	 perda	 da	 liberdade.	 O	 cidadão	 tornava-se
escravo	e	servus	nullum	caput.	O	 caso	mais	 comum	ocorria	 quando	o	 cidadão
romano	fosse	capturado	pelo	inimigo”	(Nóbrega,	Vandick	Londres	da.	História	e
Sistema	 do	 Direito	 Privado	 Romano.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Freitas	 Bastos,	 1955,	 p.
168).
168.	“No	direito	romano,	os	homens	ou	são	livres,	ou	escravos.	A	liberdade	é	a
regra;	a	escravidão	é	a	exceção.	[...]	Eram	duas	[as	causas	de	escravidão	prevista
no	ius	gentium]:	a	captura	e	o	nascimento.	Quanto	à	captura,	podia	ela	ocorrer
em	tempo	de	paz	ou	de	guerra.	Na	paz,	quando	entre	Roma	e	o	outro	Estado	não
havia	 tratado	 de	 amizade;	 na	 guerra,	 o	 vencedor	 escravizava	 o	 vencido.	 [...]
Quanto	ao	nascimento,	era	a	condição	da	mãe	que	determinava	a	do	filho:	quem
nascia	de	escrava,	ainda	que	o	pai	fosse	livre,	seria	escravo”	(Alves,	José	Carlos
Moreira.	Direito	Romano,	v.	I.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1995,	p.	98-99).
169.	 Ribas,	 Conselheiro	 Joaquim.	 Direito	 Civil	 Brasileiro.	 Rio	 de	 Janeiro:
Editora	Rio,	1982,	p.	280.
170.	 “Art.	 2.	 O	 seu	 território	 é	 dividido	 em	 Províncias	 na	 forma	 em	 que
atualmente	 se	 acha,	 as	 quais	 poderão	 ser	 subdivididas,	 como	 pedir	 o	 bem	 do
Estado”.
171.	 “O	 nosso	 Pacto	 Fundamental,	 nem	 lei	 alguma	 contempla	 o	 escravo	 no
número	dos	cidadãos,	ainda	quando	nascido	no	Império,	para	qualquer	efeito	em
relação	à	vida	 social,	 política	ou	pública.	Apenas	os	 libertos,	quando	cidadãos
brasileiros,	 gozam	 de	 certos	 direitos	 políticos	 e	 podem	 exercer	 alguns	 cargos
públicos	[...]”	(Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,
v.	I.	Rio	de	Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	16).
172.	Gerson,	Brasil.	A	escravidão	no	Império.	Rio	de	Janeiro,	1975,	p.	33.
173.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	16.
174.	Continua	o	autor:	“O	escravo	será	obrigado	a	fazer,	ou	a	não	fazer,	o	que
lhe	for	ordenado	pelo	seu	senhor,	seja	em	virtude	da	lei,	seja	contra	lei,	que	não
lhe	dá	o	direito	de	desobedecer.	O	escravo	não	 terá	um	único	asilo	 inviolável,
nem	nos	braços	da	mãe,	nem	à	sombra	da	cruz,	nem	no	leito	de	morte;	no	Brasil
não	 há	 cidades	 de	 refúgio.	 Ele	 será	 objeto	 de	 todos	 os	 privilégios,	 revogados
para	os	outros;	a	lei	não	será	igual	para	ele	porque	está	fora	da	lei,	e	o	seu	bem-
estar	 material	 e	 moral	 será	 tão	 regulado	 por	 ela	 como	 o	 é	 o	 tratamento	 dos
animais;	 para	 ele	 continuará	 de	 fato	 a	 existir	 a	 pena,	 abolida,	 de	 açoites	 e	 a
tortura,	 exercida	 senão	 com	 os	 mesmos	 instrumentos	 medievais,	 com	 maior
constância	ainda	em	arrancar	a	confissão,	e	a	devassa	diária	de	tudo	o	que	há	de
mais	íntimo	nos	segredos	humanos.	Nessa	classe	a	pena	da	escravidão,	a	pior	de
todas	as	penas,	 transmite-se,	com	a	 infâmia	que	a	caracteriza,	de	mãe	a	 filhos,
sejam	esses	filhos	do	próprio	senhor”	(Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São
Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	88-89).
175.	“A	inviolabilidade	dos	Direitos	Civis,	e	Políticos	dos	Cidadãos	Brasileiros,
que	tem	por	base	a	liberdade	[...]”	(Constituição	de	1824).
176.	O	escravo	sequer	poderia	figurar	como	testemunha	consoante	o	Decreto	nº
737,	 de	 25	 de	 novembro	 de	 1850:	 “Art.	 177.	 Não	 podem	 ser	 testemunhas	 o
ascendente,	 descendente,	 marido,	 mulher,	 parente	 consanguíneo,	 ou	 afim	 por
Direito	Canônico	até	o	2º	grau,	o	escravo,	e	o	menor	de	14	anos”.
177.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	Brasília:	Vozes,	1977,	p.	122.
178.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	Brasília:	Vozes,	1977,	p.	123.
179.	 Conflito	 no	 qual	 mais	 de	 sessenta	 mil	 negros	 incorporados	 às	 forças
militares	brasileiras	perderam	suas	vidas.	Para	mais	detalhes,	ver	Moura,	Clóvis.
Dicionário	da	escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Ed.	USP,	2004,	p.	183.
180.	“Art.	6.	São	Cidadãos	Brasileiros:	I.	Os	que	no	Brasil	tiverem	nascido,	quer
sejam	ingênuos,	ou	libertos,	ainda	que	o	pai	seja	estrangeiro,	uma	vez	que	este
não	resida	por	serviço	de	sua	Nação”	(Constituição	do	Império).
181.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	17.
182.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	161.
183.	O	§	4º,	do	art.	5º,	da	Lei	nº	1.101,	de	20	de	setembro	de	1865,	admitiu	a
possibilidade	 de	 substituição	 do	 convocado	 ou	 recruta,	 por	 outras	 pessoas
(inclusive	 escravos),	 desde	 que	 mediante	 o	 pagamento	 de	 indenização	 ao
governo	imperial.
184.	 Sobre	 a	 participação	 escrava	 no	 conflito,	 devido	 à	 dificuldade	 de
recrutamento	 de	 cidadãos,	 sugere-se	 a	 leitura	 de	Doratioto,	 Francisco.	Maldita
Guerra:	 nueva	 historia	 de	 la	 Guerra	 del	 Paraguay.	 Buenos	 Aires,	 Emecé
Editores,	2008,	p.	259-265.
185.	 “O	 Chefe	 de	 Polícia	 de	 São	 Paulo	 expedia	 [em	 1870]	 uma	 circular	 nos
seguintes	 termos:	 ‘Não	devendo	voltar	 à	 escravidão	os	 indivíduos	de	condição
servil	 que	 fizeram	 parte	 de	 nosso	 Exército	 na	Guerra	 do	 Paraguai,	 embora	 se
alistassem	ocultando	sua	verdadeira	condição.	É	dever	providenciar	no	 sentido
de	 serem	 restituídos	 à	 liberdade,	 pondo	 a	 salvo	 de	 seus	 senhores	 o	 direito	 de
reclamar	do	Governo	imperial	a	indenização	com	a	prova	de	domínio,	a	fim	de
que	 não	 se	 repita	 o	 fato	 de	 Paraíba	 do	 Sul,	 de	 ser	 um	 voluntário	 da	 Pátria
violentamente	preso	e	conduzido	para	o	poder	de	um	particular	que	se	dizia	seu
senhor	e	que	só	fora	afinal	posto	em	liberdade	pela	intervenção	da	autoridade’”
(Costa,	Emilia	Viotti	da.	A	Abolição.	São	Paulo:	Global,	2001,	p.	43-44).
186.	 “[...]	 concedeu	 gratuitamente	 liberdade	 aos	 escravos	 da	 nação	 que
pudessem	servir	ao	Exército,	e	estendeu	o	mesmo	benefício	sendo	eles	casados
às	suas	mulheres”.
187.	 Posteriormenteo	 Aviso	 nº	 158,	 de	 15	 de	 junho	 de	 1870,	 declarou	 a
presunção	de	 liberdade	em	favor	do	escravo	que	 tivesse	atuado	como	praça	na
Armada	brasileira,	tendo	o	suposto	senhor	o	ônus	de	provar	algum	impedimento
para	se	obter	essa	liberdade	(Freitas,	Augusto	Teixeira	de.	Consolidação	das	Leis
Civis.	Brasília:	Senado,	p.	2003,	p.	38).
188.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	Brasília:	Vozes,	1977,	p.	93.
189.	Também	denominados	de	Naturais,	como	ensinava	a	doutrina.
190.	 Bueno,	 José	 Antônio	 Pimenta.	 Direito	 Público	 Brasileiro	 e	 Análise	 da
Constituição	 do	 Império.	 Brasília:	 Senado	 Federal,	 1978,	 p.	 382.	 O	 referido
autor	tece	uma	belíssima	descrição	do	Direito	à	Liberdade,	previsto	no	art.	179,
§	1º	da	Constituição	de	1824,	em	sua	obra	Comentários	à	Constituição	de	1824.
191.	Ibidem,	p.	420.
192.	Ibidem,	p.	421-422.
193.	 Bueno,	 José	 Antônio	 Pimenta.	 Direito	 Público	 Brasileiro	 e	 Análise	 da
Constituição	do	Império.	Brasília:	Senado	Federal,	1978,	p.	421-422.
194.	Ibidem,
195.	 Drescher,	 Seymour.	 Abolição:	 uma	 história	 da	 escravidão	 e	 do
antiescravismo.	Tradução	de	Antônio	Penalves	Rocha.	São	Paulo:	Unesp,	2011,
p.	498.
196.	Que	representava	a	maior	parte	da	mão	de	obra	produtiva	daquele	período.
197.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	99.
198.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	99.
199.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	100.
200.	Ibidem,	p.	100.
201.	Pela	Lei	nº	581,	de	4	de	setembro	de	1850.
202.	Lei	nº	2.048,	de	28	de	setembro	de	1871.
203.	 “[...]	 O	 Estado	 não	 intervinha	 nas	 alforrias	 e,	 apenas	 em	 circunstâncias
especiais	[regra	geral,	questões	envolvendo	a	segurança	pública],	a	sua	ação	era
sentida”	(Moura,	Clóvis.	Dicionário	da	escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:
Ed.	USP,	2004,	p.	24).
Capítulo	3
	
Tráfico	e	escravidão:	dois	aspectos	de	uma
sombria	realidade
	
	
Estudar	 o	 tráfico	 de	 escravo	 é	 essencial	 para	 compreender	 a
própria	 escravidão.	 Impossível	 separar	 um	 do	 outro204,	 sobretudo
porque	a	economia	brasileira	estava	 inserida	dentro	de	um	comércio
do	 global,	 do	 qual	 participava	 o	 império	marítimo	 português205.	 Em
alguns	aspectos	é	possível	até	afirmar	que,	no	século	XIX,	o	sistema
produtivo	com	utilização	de	mão	de	obra	escrava	existia	para	financiar
o	próprio	tráfico,	que	era	a	grande	atividade	lucrativa	desse	período206.
Em	 verdade,	 chegou-se	 a	 um	 ponto	 no	 qual	 o	 tráfico	 estava	 a
devorar	 a	 própria	 atividade	 produtiva,	 uma	 vez	 que	 os	 proprietários
importadores	 passaram	 a	 contrair	 grandes	 dívidas,	 hipotecando	 suas
terras	e,	em	seguida,	perdendo-as	para	os	próprios	traficantes,	por	não
conseguir	honrar	os	seus	compromissos207.
Por	outro	 lado,	os	 traficantes208,	 agora	 senhores	das	propriedades
rurais,	 passaram	 a	 drenar	 as	 riquezas	 decorrentes	 da	 atividade
produtiva	 para	 financiar	 o	 próprio	 tráfico:	 um	 ciclo	 tenebroso	 que
tenderia	ao	infinito,	com	a	manutenção	perpétua	do	sistema	escravista.
Como	bem	observou	Eusébio	de	Queirós:
[...]	 a	 princípio,	 acreditando	 que	 na	 compra	 do	 maior
número	 de	 escravos	 consistia	 o	 aumento	 dos	 seus
lucros,	 os	 nossos	 agricultores,	 sem	 advertirem	 no
gravíssimo	 perigo	 ameaçava	 o	 país,	 só	 tratavam	 da
aquisição	 de	 novos	 braços	 comprando-os	 a	 crédito,	 a
pagamento	de	três	a	quatro	anos,	vencendo	no	intervalo
juros	mordentes[...]	Assim	os	 escravos	morriam,	mas
as	 dívidas	 ficavam,	 e	 com	 elas	 os	 terrenos
hipotecados	 aos	 especuladores,	 que	 compravam	 os
africanos	 aos	 traficantes	 para	 revender	 aos
lavradores[...]	Assim	a	nossa	propriedade	 territorial	 ia
passando	 da	 mão	 dos	 agricultores	 para	 os
especuladores	e	traficantes.209	(grifos	nossos)
Ou	 seja,	 tráfico	 e	 escravidão	 compunham	 um	 só	 sistema
econômico	como	aspectos	gêmeos	de	uma	grande	relação,	a	ponto
de	o	fluxo	sombrio	de	escravos	africanos	entre	o	litoral	sul	da	África	e
o	 Brasil	 ser	 compreendido	 como	 uma	 unidade210	 cuja	 dinâmica
beirava	 a	 obscenidade	 do	 mal.	 Nas	 palavras	 do	 explorador	 inglês
Livingston,	 em	 1866,	 na	 ilha	 de	 Zanzibar	 (um	 notório	 mercado	 de
escravos	na	Costa	 leste	da	África),	 ter	visto	 tal	espetáculo	 tenebroso
foi	algo	que	inquietou	a	sua	alma	por	toda	a	sua	vida.	Uma	memória
que	apenas	ficava	adormecida,	mas	que	nunca	desaparecia211.
Apesar	 do	 alerta	 de	 indizível	 violência,	 faz-se	 necessário,	 ao
menos,	 ter	 em	 mente	 como	 se	 iniciava	 a	 condução	 dos	 cativos
africanos	até	os	portos	dos	quais	seriam	exportados	para	o	ponto	final
do	seu	cativeiro	no	Novo	Mundo:
Os	escravos	eram	colhidos	no	interior,	amarrados	juntos
uns	dos	outros	 em	colunas,	 suportando	pesadas	pedras
de	20	ou	25	quilos	para	evitar	tentativas	de	fuga;	então
marchavam	uma	longa	 jornada	até	o	mar,	que	algumas
vezes,	 ficava	 a	 centenas	de	quilômetros	 e,	 esgotados	 e
doentes,	 caíam	 para	 não	 mais	 se	 erguer	 na	 selva
africana.	 Alguns	 eram	 levados	 até	 a	 costa	 em	 canoas,
deitados	no	fundo	dos	barcos	por	dias	sem	fim,	com	as
mãos	 acorrentadas,	 as	 faces	 expostas	 ao	 sol	 e	 à	 chuva
tropical	e	com	as	costas	na	água	que	nunca	retirada	do
fundo	 dos	 botes.	 Nos	 portos	 de	 escravos	 eles
permaneciam	 amontoados	 em	 um	 cercado	 para	 a
inspeção	 dos	 compradores.212	 Dia	 e	 noite,	milhares	 de
seres	humanos	eram	apinhados	em	minúsculas	galerias
nos	 “depósitos	 de	 putrefação,	 onde	 nenhum	 europeu
conseguiria	 permanecer	 por	 mais	 de	 quinze	 minutos
sem	 desmaiar.	 Os	 africanos	 desmaiavam	 e	 se
recuperavam	 ou,	 então,	 desmaiavam	 e	 morriam:	 a
mortalidade	 naqueles	 “depósitos”	 era	 maior	 do	 que
vinte	 por	 cento.	 Do	 lado	 de	 fora,	 no	 porto,	 esperando
para	 esvaziar	 os	 “depósitos”	 assim	 que	 eles	 enchiam,
ficava	o	capitão	do	navio	negreiro	[...].213
A	 escravidão	 no	 continente	 africano	 não	 foi	 uma	 criação
europeia214	 e	 já	 existia	 anteriormente	 uma	 cultura	 de	 reinos
guerreiros215	 que	 combatiam	 entre	 si	 e	 lutavam	 para	 aprisionar
indivíduos	 ou	 grupos216.	 Parte	 dos	 cativos	 eram	 destinados	 a
sacrifícios	 religiosos217.	 Entretanto,	 a	 demanda	 insaciável	 dos
europeus	pelas	presas	escravas	desses	reinos218	gerou	uma	verdadeira
desestabilização	de	grande	parte	da	África219,	nascendo	um	estado	de
guerra	endêmica	entre	os	reinos220,	que	lutavam	entre	si	em	busca	de
mais	 presas221	 ou	 para	 se	 defender	 da	 ofensiva	 das	 outras	 nações
escravistas222.
Esse	é	apenas	um	tênue	retrato	da	abominação	que	era	o	tráfico223,
e	 do	 mal	 indizível	 que	 ele	 gerou	 em	 solo	 africano,	 e	 que,
curiosamente,	 teve	 o	 reino	 de	 Portugal,	 como	 a	 primeira	 nação
europeia	a	aboli-lo.
1.	A	evolução	dos	tratados	internacionais,	a	legislação
lusitana	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos
Em	 1761,	 em	 uma	 atitude	 pioneira,	 a	 escravidão	 foi	 abolida224
pelos	portugueses.	Entretanto,	tal	medida	apenas	se	aplicava	ao	tráfico
de	escravos	para	a	Metrópole,	declarando	libertos	e	forros	os	escravos
que	 entrassem	 em	 Portugal,	 ou	 seja,	 não	 chegava	 aos	 territórios
ultramarinos225.
Por	 meio	 do	 Alvará	 de	 19	 de	 setembro	 de	 1761,	 o	 rei	 lusitano
determinou	 que	 os	 “pretos”	 trazidos	 da	 América,	 África	 e	 Ásia
passariam	a	ser	considerados	livres	logo	que	chegassem	aos	portos	do
Reino	(isto	é,	Portugal),	sem	qualquer	outra	formalidade,	a	não	ser	o
registro,	nas	respectivas	alfândegas,	por	meio	de	certidão:
Do	dia	da	publicação	desta	Lei	nos	portos	da	América,
África,	e	Ásia;	e	depois	de	haverem	passados	seis	meses
a	 respeito	 dos	 primeiros,	 e	 segundos	 dos	 referidos
portos,	e	um	ano	a	respeito	dos	terceiros,se	não	possam
em	algum	deles	carregar,	nem	descarregar	nestes	Reinos
de	 Portugal,	 e	 dos	 Algarves,	 Preto,	 ou	 Preta	 alguma:
Ordenando,	 que	 todos	os	 que	 chegarem	aos	 sobreditos
Reinos,	 depois	 de	 haverem	 passados	 os	 referidos
Termos,	 contados	 do	 dia	 da	 publicação	 desta,	 fiquem
por	 benefício	 dela	 libertos,	 e	 forros,	 sem	 necessitarem
de	outra	alguma	Carta	de	manumissão,	ou	alforria,	nem
de	 outro	 algum	 despacho,	 além	 das	 Certidões	 dos
administradores,	 e	 oficiais	 das	 alfândegas	 dos	 lugares
onde	aportarem	[...].
Em	 verdade,	 tal	 ato	 legislativo	 apenas	 proibiu	 o	 transporte	 de
negros	escravos	para	o	 território	português,	mas	nada	se	fez,	nem	se
podia	 fazer,	 para	 emancipar	 os	 escravos	 nos	 territórios	 ultramarinos
portugueses	ou	para	abolir	o	tráfico	de	escravos	para	o	Brasil,	onde	tal
atividade	era	massiva	e	onde	 residia,	de	 fato,	o	 foco	dessa	atividade
comercial226.
Nessa	mesma	série	de	atos	legislativos	da	era	pombalina227,	adveio
o	Alvará	de	16	de	janeiro	de	1773,	o	qual	fixou	que	os	cativos	em
terras	 portuguesas	 estariam	 livres	 (inclusive	 nas	 ilhas	 da	Madeira	 e
dos	Açores,	suas	colônias228),	mesmo	que	lá	se	encontrassem	antes	da
publicação	desse	ato,	em	qualquer	momento	de	sua	vida229.
No	 que	 se	 refere	 aos	 indivíduos	 nascidos	 após	 a	 publicação	 do
Alvará,	 todos	 seriam	“inteiramente	 livres,	 posto	 que	 as	mães	 e	 avós
hajam	 sido	 escravas”230.	 Os	 libertos	 por	 meio	 desse	 Alvará	 foram
também	 agraciados	 com	 medidas	 que	 favoreceram	 sua	 integração
social,	retirando	deles	qualquer	estigma	“infamante”:
E	 que	 todos	 os	 sobreditos	 por	 efeito	 desta	 minha
paternal	e	pia	providência	libertados	fiquem	hábeis	para
todos	 os	 ofícios,	 honras,	 e	 dignidades,	 sem	 a	 nota
distintiva	 de	 libertos,	 que	 a	 superstição	 dos	 romanos
estabeleceu	nos	seus	costumes	e	que	a	união	cristã	e	a
sociedade	civil	faz	hoje	intolerável	no	meu	Reino,	como
o	tem	sido	em	todos	os	outros	da	Europa.
Por	tal	ato,	buscou-se	ampliar	as	restrições	à	escravidão	praticada
em	Portugal,	incentivando	o	tráfico	no	ultramar:
[...]	Semelhantemente	às	considerações	referidas	acima,
têm-se	 as	 de	 Charles	 Boxer,	 para	 quem	 os	 termos	 do
alvará	 de	 1761	 “mostram	 claramente	 que	 essa	 decisão
foi	tomada	por	motivos	utilitaristas	e	econômicos,	e	não
por	razões	humanitárias”.	Stuart	Schwartz,	ao	discorrer
sobre	esse	mesmo	alvará,	afirma	que	Pombal	adotou	tal
medida	 “para	 assegurar	 suprimentos	 adequados	 de
escravos	para	as	colônias”.231
Até	 porque	 a	 escravidão	 e	 o	 regular	 tráfico	 negreiro,	 ao	 menos
para	Espanha	e	Portugal,	constituíam	o	meio	regular	para	colonização
de	suas	possessões,	sobretudo	onde	existiam	as	plantations232.
Joaquim	 Nabuco233,	 comentando	 o	 Alvará	 de	 1773,	 compara-o
com	a	Lei	do	Ventre	Livre,	e	demonstra	que	aquele	ato	do	El-Rei	de
Portugal	 era	 muito	 mais	 avançado	 que	 a	 tímida	 legislação
emancipatória	do	Brasil	imperial,	promulgada	quase	100	anos	depois:
[...]	Que	apesar	de	ser	lei	no	século	passado,	e	anterior	à
Revolução	 Francesa,	 semelhante	 alvará	 é	 mais
generoso,	compreensivo	e	 liberal	do	que	a	nossa	lei	de
28	de	setembro	[de	1871,	a	Lei	do	Ventre	Livre]:
(a)	 porque	 liberta	 inteiramente	 desde	 a	 sua	 data	 os
nascituros,	e	esta	os	liberta	depois	de	vinte	e	um	anos	de
idade;
(b)	 porque	 declara	 livres	 e	 desembargados	 os	 bisnetos
de	 escravas,	 e	 a	 lei	 de	 28	 de	 setembro	 não	 levou	 em
conta	aos	escravos	sequer	as	gerações	do	cativeiro;
(c)	 porque	 isentou	 os	 escravos	 que	 declarou	 livre	 da
nota	 distintiva	 de	 libertos	 –	 “superstição	 dos	 romanos
que	 a	 união	 cristão	 e	 a	 sociedade	 civil”	 fazia	 já	 nesse
tempo	(“faz	hoje”)	“intolerável	no	reino”,	ao	passo	que
a	nossa	lei	de	1871	não	se	lembrou	de	apagar	tal	nódoa,
e	 sujeitou	 os	 libertos	 de	 qualquer	 dos	 seus	 parágrafos
por	cinco	anos	à	inspeção	do	governo	e	à	obrigação	de
exibir	 contrato	 de	 serviço	 sob	 pena	 de	 trabalhar	 nos
estabelecimentos	públicos234.
[...]
A	 ser	 assim,	 isso	 mostra	 somente	 a	 diferença	 entre	 a
compreensão	 das	 exigências	 da	 união	 cristã	 (a
Constituição	foi	feita	em	nome	da	Santíssima	Trindade)
e	 da	 sociedade	 civil	 que	 tinha	 o	 imperador
constitucional	 em	 1824	 e	 que	 tinha	 o	 rei	 absoluto	 em
1773.
Entretanto,	 apesar	 do	 receio	 provocado	 nas	 colônias	 portuguesas
de	que	a	abolição	e	o	fim	do	tráfico	negreiro	fossem	ampliados	para
ultramar,	 isso	não	veio	a	ocorrer,	pois	o	 fluxo	de	 riquezas	derivadas
dessa	 atividade	 comercial	 era	 demasiadamente	 alto	 para	 ser
interrompido.
Apenas	 com	 a	 Revolução	 Francesa,	 deflagrada	 vinte	 e	 seis	 anos
depois,	foi	que	o	quadro	político	e	econômico	da	Europa	mudaria.	Os
ideais	 da	Revolução	 se	 somariam	 às	 novas	 ideias	 do	Velho	Mundo,
dentre	 elas	 a	 causa	 abolicionista235,	 culminando	no	Abolition	Act	de
25	 de	 março	 de	 1807236,	 com	 o	 fim	 do	 tráfico	 de	 Escravos	 na
Inglaterra	e	em	suas	possessões:
Seja,	 portanto,	 promulgada	 por	 S.	 Excelência	 e
Majestade	o	Rei,	por	e	com	o	conselho	e	consentimento
do	Lordes	e	Comuns,	neste	atual	Parlamento	montado,	e
pela	 Autoridade	 da	 mesma,	 de	 que	 a	 partir	 e	 após	 o
primeiro	 dia	 de	 maio	 do	 ano	 de	 um	mil,	 oitocentos	 e
sete,	o	comércio	de	escravos	Africanos,	e	todos	e	todas
as	 formas	 de	 lidar	 e	 de	 negociação	 na	 compra,	 venda,
permuta,	ou	Transferência	de	Escravos,	ou	para	pessoas
que	 se	destinam	a	 ser	vendidos,	 transferidos,	 usado	ou
tratado	 como	 escravos,	 praticado	 ou	 exercida,	 em,	 no
interior,	para	ou	a	partir	de	qualquer	parte	do	litoral	ou
países	 de	 África,	 deve	 ser,	 e	 o	 mesmo	 é	 instituído
totalmente	 abolida,	 proibida,	 e	 declarou	 ser	 ilegal;	 e
também	 que	 tudo	 e	 todos	 os	 tipos	 de	 tráfico,	 seja	 por
meio	 de	 compra,	 venda,	 permuta	 ou	 transferência,	 ou
através	de	qualquer	outro	 contrato	ou	acordo	que	 seja,
ligadas	a	eventuais	Escravos,	ou	para	quaisquer	pessoas
destinadas	a	serem	utilizadas	ou	tratadas	como	escravos,
para	 o	 propósito	 de	 tais	 escravos	 ou	 pessoas	 sendo
removido	 ou	 transportado	 imediatamente	 ou	 pelo
transbordo	 no	 mar	 ou	 de	 outra	 forma,	 direta	 ou
indiretamente,	da	África	[...].237
Nesse	ínterim,	no	grande	tabuleiro	geopolítico	europeu,	um	evento
anunciava	 o	 ingresso	 de	 um	 novo	 grande	 jogador	 na	 partida:	 a
ascensão	de	Napoleão	Bonaparte	ao	trono	Francês	trazendo	consigo	o
Grande	 Exército238.	 O	 cônsul	 e,	 posteriormente,	 imperador	 da
França239,	 no	 inevitável	 confronto	 com	 a	 tradicional	 rival	 da	 sua
pátria,	 a	 Inglaterra,	 determinou	o	bloqueio	 continental	 contra	 a	Grã-
Bretanha240	 por	meio	 do	Decreto	 de	Berlim,	 de	 21	 de	 novembro	 de
1806,	a	fim	de	estrangular	sua	economia241.
Tal	 ato	 colocou	 Portugal	 em	 uma	 encruzilhada	 diplomática,
sobretudo	 porque	 não	 seria	 possível	 trair	 sua	 tradicional	 aliada	 (a
Inglaterra)	 sem	 sofrer	 consequências,	 com	 a	 possível	 perda	 do	 seu
império	ultramarino242.
A	decisão	do	Príncipe	Regente	João,	ao	abandonar	a	Metrópole243
e	se	refugiar,	no	Vice-Reino	do	Brasil244,	permitiu	que	a	coroa	lusitana
não	perdesse	o	seu	poder	político	no	teatro	europeu	(pois	forças	luso-
inglesas,	 lideradas	 pelo	 Duque	 de	 Wellington245,	 combateriam	 o
invasor	 francês),	 nem	 viesse	 a	 assistir	 ao	 desmoronar	 das	 suas
possessões	na	África	e	na	América246.
No	ato	da	partida	para	o	Brasil,	foi	firmada	a	Convenção	de	22	de
outubro	 de	 1807,	 entre	 o	 Príncipe	 regente	 português	 e	 o	 monarca
inglês,	 a	 qual	 estabelecia	 no	 seu	 art.	 VII:	 “Quando	 o	 Governo
português	estiver	estabelecido	no	Brasil	proceder-se-á	à	negociação	de
um	 tratado	de	 auxílio	 e	 de	 comércio	 entre	 o	Governo	português	 e	 a
Grã-Bretanha”.
Com	 isso	 foi	 assegurada,	 também,	 a	 manutençãodo	 tráfico
negreiro.	 Pouco	 tempo	 depois,	 o	 Tratado	 de	 Aliança	 e	 Amizade,
firmado	 em	 19	 de	 fevereiro	 de	 1810,	 entre	 Portugal	 e	 Inglaterra,
proibia,	definitivamente,	o	tráfico	de	escravos	para	além	do	império
lusitano247,	 já	 se	 prevendo	 que	 a	 coroa	 portuguesa	 tomaria	medidas
para	uma	gradual	abolição	da	escravidão:
[...]	o	segundo	era	um	tratado	de	aliança	e	amizade,	cujo
artigo	10	 se	 referia	 ao	 tráfico	de	 escravos:	 convencido
da	“injustiça	e	inutilidade”	do	tráfico	e,	principalmente,
das	 desvantagens	 decorrentes	 de	 “introduzir	 e	 renovar
continuamente	 uma	população	 estranha	 e	 artificial”	 no
Brasil,	o	príncipe	regente	concordava	em	cooperar	com
a	 Grã-Bretanha,	 “adotando	 as	 medidas	 mais	 eficazes
para	propiciar	a	abolição	gradual	do	tráfico	de	escravos
em	 todos	 os	 seus	 domínios”,	 e,	 entrementes,	 resolvia
que	esse	tráfico	não	seria	permitido	“em	nenhuma	parte
da	 costa	da	África	não	pertencente	 ao	domínio	de	Sua
Alteza	Real	e	onde	esse	tráfico	tem	sido	descontinuado
e	 abandonado	 pelos	 Estados	 e	 Nações	 da	 Europa	 que
antigamente	nele	comerciavam.248
Entretanto,	 tal	 convenção	 internacional	 ainda	 não	 pôs	 fim	 ao
lucrativo	 negócio	 dos	 escravos,	 pois	 os	 súditos	 portugueses
conservavam	o	direito	de	traficar	com	escravos	“dentro	dos	domínios
africanos	 da	 coroa	 de	 Portugal”249.	 O	 tráfico	 era	 uma	 realidade
imprescindível	para	 a	própria	manutenção	do	poder	 lusitano	 sobre	o
Brasil,	 bem	 como	 para	 manter	 a	 exploração	 em	 grande	 escala	 das
riquezas	coloniais.
Entretanto,	 por	 pressões	 internacionais,	 era	 necessário
“humanizar”	 o	 transporte	 de	 escravos	 para	 o	 Brasil.	 Por	 meio	 do
Alvará	 de	 24	 de	 novembro	 de	 1813,	 a	 coroa	 portuguesa	 buscou
regulamentar	 a	 “arqueação	 dos	 navios	 empregados	 na	 condução	 dos
negros	que,	dos	portos	da	África,	 se	exportam	para	os	do	Brasil”250.
Nas	 suas	 considerações	 iniciais,	 o	 Príncipe	 Regente	 apresenta
“fundamentos	lógicos”	para	a	subsistência	do	tráfico	negreiro:
[...]	 o	 número	 de	 seus	 habitantes	 não	 é	 ainda
proporcionado	 a	 vasta	 extensão	 dos	 meus	 domínios
nesta	 parte	 do	 mundo,	 e	 que	 é,	 portanto,	 insuficiente
para	 suprir	 e	 efetuar,	 com	 a	 prontidão	 que	 tenho
recomendado,	 os	 importantes	 trabalhos	 que	 em	muitas
partes	se	tem	já	realizado.251
O	Príncipe	Regente,	a	fim	de	que	suas	medidas	pudessem	produzir
“os	 seus	 saudáveis	 efeitos”	 em	 tempo	 hábil,	 viu	 ser	 necessário
regulamentar	 o	 tráfico	 de	 escravos	 africanos,	 de	 modo	 que	 tal
suprimento	 de	 “operários”	 não	 se	 extinga	 por	 enfermidades	 ou
morte.	Com	o	Alvará	de	1813,	pretendia-se	compelir	que,	no	tráfico
de	 escravos,	 fossem	 banidos	 os	 extremos	 de	 crueldade,	 os	 quais
segundo	o	Príncipe	Regente	eram	provocados	nada	mais,	nada	menos,
pela:
[...]	 barbaridade	 e	 sórdida	 avareza	 de	 muitos	 dos
Mestres	 das	 embarcações	 que	 os	 conduzem,	 que
seduzidos	 pela	 fatal	 ambição	 de	 adquirir	 fretes,	 e	 de
fazer	 maiores	 ganhos,	 sobrecarregam	 os	 navios,
admitindo	neles	muito	maior	número	de	negros	do	que
podem	 convenientemente	 conter;	 faltando-lhes	 com
alimentos	necessários	para	a	 subsistência	deles,	não	 só
na	 quantidade,	 mas	 até	 na	 qualidade,	 por	 lhes
fornecerem	 gêneros	 avariados	 e	 corruptos,	 que	 podem
haver	mais	em	conta;	resultando	de	um	tão	abominável
tráfico,	 que	 se	 não	 pode	 encarar	 sem	 horror	 e
indignação,	 manifestarem-se	 enfermidades,	 que,	 por
falta	de	curativo	e	conveniente	tratamento,	não	tardam	e
fazerem-se	 epidêmicas	 e	 mortais,	 como	 a	 experiência
infelizmente	tem	mostrado.
Portanto,	 por	 um	 ato	 de	 piedade	 e	 de	 humanidade,	 o	 Príncipe
Regente	 D.	 João	 VI	 repudiava	 o	 sofrimento	 dos	 africanos	 nesse
transporte	 transoceânico,	mas	não	promovia	a	abolição	do	 tráfico	de
escravos:
[...]	 não	 podendo	 os	 meus	 constantes	 e	 naturais
sentimentos	 de	 humanidade	 e	 beneficência	 tolerar	 a
continuação	de	tais	atos	de	barbaridade,	cometidos	com
manifesta	 transgressão	 dos	 direitos	 divino	 e	 natural,	 e
régias	 disposições	 dos	 Senhores	 Reis	 meus	 Augustos
Progenitores,	transcritas	nos	Alvarás	de	18	de	março	de
1864	 e	 na	 Carta	 de	 Lei	 do	 1º	 de	 julho	 de	 11730,	 que
mando	 observar	 em	 todas	 aquelas	 partes	 que	 por	 este
meu	 alvará	 não	 forem	 derrogadas	 ou	 substituídas	 por
outras	 disposições	 mais	 conformes	 ao	 presente	 estado
das	 cousas,	 e	 ao	 adiantamento	 e	 perfeição	 a	 que	 tem
chegado	 os	 conhecimentos	 físicos	 e	 novas	 descobertas
químicas,	 maiormente	 na	 parte	 que	 respeita	 ao
importante	 objeto	 da	 saúde	 pública:	 sou	 servido
determinar	 e	 prescrever	 as	 seguintes	 providencias,	 que
inviolavelmente	se	deverão	observar	e	cumprir.
Pelo	 Alvará	 de	 1813,	 ficava	 assegurado	 aos	 negros,	 durante	 “a
passagem”	para	o	Reino	do	Brasil,	em	prol	da	sua	saúde:
	
(a)	 lugar	 suficiente	 em	 que	 possam	 se	 recostar	 e	 descansar,	 com
espaço	 suficiente,	 sem	 se	 submeter	 aos	 caprichos	 e	 arbítrios	 dos
mestres	das	embarcações,	que	deverão	observar	a	seguinte	proporção
de	 carga:	 “cinco	negros	por	 cada	duas	 toneladas	 [da	 embarcação];	 e
esta	proporção	só	terá	lugar	até	a	quantia	de	201	toneladas”;
(b)	para	evitar	fraudes,	cada	embarcação	deveria	ter	um	livro	de	carga,
distribuído	da	mesma	forma	dos	que	servem	para	as	fazendas:	que	na
margem	 esquerda	 desse	 livro	 seja	 discriminado	 o	 número	 dos
africanos	que	embarcaram,	com	a	distinção	do	sexo,	declarando	se	são
adultos	ou	crianças;
(c)	proibia-se	que	a	marcação	dos	negros	escravos	fosse	realizada	por
ferro	 quente,	 já	 que	 afronta	 “altamente	 aos	 sentimentos	 de
humanidade252,	sob	risco	de	aplicação	de	pena	pecuniária253;
(d)	foi	determinado	também	que	em	todas	“as	embarcações	destinadas
para	 a	 condução	 dos	 negros,	 levem	 um	Cirurgião	 perito:	 e	 faltando
este,	se	lhes	não	permitirá	a	saída”;
(e)	criou-se	uma	premiação	a	 fim	de	 incentivar	o	 trabalho	para	zelar
pela	saúde	dos	cativos	transportados:
E	 convindo	 premiar	 aqueles	 que	 pela	 sua	 perícia,	 e
humanidade	contribuírem	para	a	conservação	da	saúde,
e	para	o	curativo	e	restabelecimento	dos	negros	que	se
conduzirem	 para	 estes	 portos	 do	 Brasil:	 sou	 servido
determinar,	 que	 sucedendo	 não	 exceder	 de	 dois	 por
cento	 o	 número	 dos	 que	 morrerem	 na	 passagem	 dos
portos	de	África	para	os	do	Brasil,	haja	de	se	premiar	o
Mestre	da	embarcação	com	a	gratificação	de	240$000,	e
de	120$000	o	cirurgião;	e	não	excedendo	o	número	de
mortos	de	três	por	cento,	se	concederá	assim	ao	Mestre
como	 ao	 Cirurgião	 metade	 da	 gratificação	 que	 acima
dica	indicada,	a	qual	será	paga	pelo	Cofre	da	Saúde	[...]
(f)	 se	 as	 mortes	 excedessem	 o	 razoável254,	 o	 ouvidor-do-Crime
instalaria	 procedimento	 de	 devassa	 para	 apurar	 a	 falta	 de	 zelos	 e
cuidados	com	o	traslado	dos	africanos	cativos;
(g)	cada	embarcação	deveria	possuir	uma	enfermaria,	a	fim	de	isolar
os	enfermos	do	restante	dos	cativos	transportados;
(h)	a	fim	de	zelar	pela	saúde	dos	cativos,	era	vedado	o	embarque	de
pessoa	que	viesse	a	padecer	de	moléstia	contagiosa,	“para	cujo	efeito
se	 deverão	 fazer	 os	 competentes	 exames”	 pela	 autoridade	 sanitária
“que	se	achar	no	porto	de	embarque,	e	pelo	Cirurgião	do	navio”;
(i)	os	alimentos	embarcados	deveriam	ser	fiscalizados,	não	apenas	na
sua	 quantidade,	mas	 na	 sua	 qualidade,	 devendo	 ser	 aprovados	 pelas
autoridades	 sanitárias255.	 O	 principal	 alimento	 a	 ser	 fornecido	 aos
cativos	seria	o	feijão,	misturado	com	milho	ou	amendoim,	bem	como
prover	a	dieta	com	carne	seca	e	peixe;
(j)	 no	 que	 se	 refere	 ao	 consumo	 da	 água	 (cuja	 qualidade	 era
regulamentada	 também),	 a	 desumanidade	 do	 tráfico	 de	 escravos	 era
tamanha	a	ponto	de	 se	definir	 o	mínimo	de	 água	 a	 ser	 fornecido	no
transcursoe	 proibindo	 atos	 de	 violência	 contra	 os	 que	 estavam
sedentos256;	e
(l)	por	 fim,	havia	minuciosa	 regulamentação	para	prover	a	adequada
ventilação	dos	cativos	transportados,	bem	como	regras	adicionais	para
a	 não	 propagação	 de	 doenças	 a	 bordo	 e	 entre	 regiões,	 para	 evitar
epidemias	e	importação	de	doentes.
	
Para	que	tal	Alvará	viesse	a	ser	editado	pelo	Príncipe	Regente,
o	nível	de	desumanidade	do	 tráfico	de	 escravos,	 em	 si	 já	abjeto,
deveria	 chegar	 ao	 inimaginável	 para	 uma	 mente	 moderna.	 É
importante	 trazer	 um	 retrato	 mais	 vívido	 de	 como	 se	 realizava,	 na
prática,	o	transporte	de	escravos	por	meio	dos	tumbeiros257:
Nos	navios	negreiros,	os	escravos	eram	espremidos	nos
porões	uns	 sobre	outros	dentro	de	galerias.	A	cada	um
deles	era	dado	de	um	metro	a	um	metro	e	meio	apenas
de	comprimento	e	de	meio	metro	a	um	metro	de	altura,
de	 tal	 maneira	 que	 não	 podiam	 nem	 se	 deitar	 de
comprido	 e	 nem	 se	 sentar	 com	 a	 postura	 reta.	 [...]	 as
revoltas	 nos	 portos	 de	 embarcação	 e	 a	 bordo	 eram
constantes258.	 Por	 isso	 os	 escravos	 tinham	 de	 ser
acorrentados:	 a	 mão	 direita	 à	 perna	 direita,	 a	 mão
esquerda	 à	 perna	 esquerda,	 e	 atrelados	 em	 colunas	 a
longa	barras	de	ferro.	Nessa	posição	eles	permaneciam
durante	 a	 viagem,	 sendo	 levados	 ao	 tombadilho	 uma
vez	 por	 dia	 para	 se	 exercitar	 e	 para	 permitir	 que	 os
marinheiros	 “limpassem	 os	 baldes”.	 Mas	 quando	 a
carga	 era	 rebelde	 ou	 o	 tempo	 estava	 ruim,	 eles
permaneciam	no	porão	por	semanas259.
Deve-se	 deixar	 bem	 claro	 que	 o	 investimento	 nesses	 tumbeiros,
que	serviam	para	o	 transporte	dessa	“mercadoria”,	era	extremamente
baixo,	como	já	havia	observado	Joaquim	Nabuco	260:
Esses	navios	chamados	túmulos	flutuantes,	e	que	o	eram
em	mais	 de	 um	 sentido,	 custavam	 relativamente	 nada.
Uma	 embarcação	 de	 cem	 toneladas,	 no	 valor	 de	 sete
contos,	servia	para	o	transporte	de	mais	de	350	escravos
[...].	 O	 custo	 total	 do	 transporte	 desse	 número	 de
escravos	 (navios,	 salários	 da	 equipagem,	mantimentos,
comandantes,	etc.)	não	excedia	de	dez	contos	de	réis,	ou
em	 números	 redondos,	 trinta	 mil	 réis	 por	 cabeça.	 [...]
Um	 brigue	 de	 167	 toneladas	 capturado	 tinha	 a	 bordo
852	 escravos,	 outro	 de	 59	 [toneladas],	 400	 [escravos].
Muitos	 desses	 navios	 foram	 destruídos	 depois	 de
apressados	como	impróprios	para	a	navegação.
Posteriormente,	pelo	tratado	firmado	com	a	Inglaterra	em	22	de
janeiro	de	1815261,	o	tráfico	de	escravos	por	portugueses	ao	norte	do
equador	 ficou	 proibido,	 após	 substancial	 ajuda	 financeira	 da	 coroa
britânica:
[...]	os	portugueses	acabaram	concordando	em	terminar
com	 o	 tráfico	 ao	 norte	 do	 equador,	 a	 troco	 de	 uma
substancial	 indenização	financeira.	Por	uma	convenção
assinada	a	21	de	janeiro	de	1815,	a	Grã-Bretanha	anuía
em	 pagar	 a	 soma	 de	 300	 mil	 libras	 desobrigando-se
assim	de	todas	as	reclamações	quanto	à	detenção	ilegal
e	 captura	 de	 navios	 portugueses	 por	 vasos	 de	 guerra
ingleses	 e	 sua	 condenação	 pelos	 tribunais	 do	 Vice-
Almirantado	 britânico,	 antes	 de	 1º	 de	 junho	 de	 1814.
Por	 um	 outro	 tratado,	 assinado	 no	 dia	 seguinte,	 22	 de
janeiro	 de	 1815,	 a	 Inglaterra	 perdoava	 os	 restantes
pagamentos	 de	 um	 empréstimo	 de	 600	mil	 libras,	 que
fora	negociado	em	1809	(faltava	pagar	cerca	da	metade)
e	D.	João	se	comprometia	a	declarar	ilegal	o	tráfico	de
escravos	ao	norte	do	equador	e	a	adotar	as	medidas	que
fossem	 necessárias	 para	 abolir	 parcialmente	 o	 tráfico
em	geral.262
Entretanto,	algo	inovador	veio	com	esse	tratado:	a	possibilidade	de
a	marinha	de	guerra	inglesa	ter	o	direito	de	visita,	em	tempos	de	paz,
nos	barcos	portugueses:
A	pressão	britânica	para	 a	 assinatura	de	um	 tratado	de
direito	de	busca	fez-se	primeiro	sobre	Portugal,	de	todas
as	 remanescentes	nações	negreiras	a	maios	dependente
da	 Inglaterra	 e	 já	 obrigada,	 pelo	 artigo	 segundo	 do
tratado	 de	 22	 de	 janeiro	 de	 1815,	 a	 adotar	 as	medidas
necessárias	para	a	supressão	do	tráfico	ilegal	[...].263
A	 Convenção	 adicional	 ao	 tratado	 de	 1815,	 firmada	 entre	 a
Inglaterra	 e	 Portugal	 em	 28	 de	 julho	 de	 1817264,	 que	 ratificava	 o
direito	de	visita	pelas	belonaves	inglesas	aos	navios	portugueses265	no
intuito	de	coibir	o	tráfico	de	escravos	ilícito	ao	norte	do	equador,	foi
comemorada	como	uma	vitória	da	diplomacia	inglesa:
Outras	 cláusulas	 contém	 a	 convenção,	 mas	 as	 que	 aí
ficam	 são	 as	 principais.	 E	 entre	 todas	 avulta	 a	 que
estabelece	 o	 direito	 de	 detenção	 e	 busca	marítima,	 em
tempo	 de	 paz.	 [...]	 Gabou-se	 Lord	 Castlereagh,	 dando
comunicação	 do	 tratado	 ao	 Parlamento,	 de	 ter
conseguido	tão	assinalada	inovação,	pois	era	a	primeira
vez	 que,	 na	 história	 diplomática,	 aparecia	 concessão
recíproca	desse	direito	de	visita.266
Entretanto,	tal	disposição,	ainda	que	conferisse	direito	“recíproco”
para	visita	de	navios	ingleses,	causou	estranheza:
O	fundamento	do	direito	de	visita	é	o	estado	de	guerra
declarada	 [...]	 Em	 estado	 de	 paz,	 só	 a	 muito	 fundada
suspeita	do	exercício	da	pirataria	pode	sancionar	a	visita
e	a	busca	em	um	navio	estrangeiro267.
A	Inglaterra	vinha	pressionando	Portugal	para	aceitar	a	sua	política
moralizadora	dos	mares,	isto	é:
[os	 navios	 de	 guerra	 ingleses]	 sem	 cerimônias,	 desde
que	 desconfiava	 haver	 um	 navio	 português	 apanhando
escravos	 em	 costa	 africana	 não-portuguesa,	 dava-lhe
caça,	 visitava-o,	 apreendia	 a	 carga,	 tomava	 conta	 da
embarcação.268
A	 proibição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 ao	 norte	 do	 equador	 foi
ratificada	 pelo	 Alvará	 de	 26	 de	 janeiro	 de	 1818,	 que	 impunha
penalidades	 àqueles	 que	 promovessem	 tal	 transporte	 em
desconformidade	com	tal	diploma:
§	1°	todas	as	pessoas	de	qualquer	qualidade	e	condição
que	sejam,	que	fizerem	armar	e	preparar	navios	para	o
resgate	 e	 compra	 de	 escravos,	 em	qualquer	 dos	 portos
da	 Costa	 d’África	 situados	 ao	 norte	 do	 Equador,
incorrerão	na	pena	de	perdimento	dos	escravos,	os	quais
imediatamente	 ficarão	 libertos,	 para	 terem	 o	 destino
abaixo	 declarado;	 e	 lhes	 serão	 confiscados	 os	 navios
empregados	nesse	tráfico	com	todos	os	seus	aparelhos	e
pertences,	e	juntamente	a	carga,	qualquer	que	seja,	que
a	seu	bordo	estiver	por	conta	dos	donos	e	fretadores	dos
mesmos	navios,	ou	dos	carregadores	de	escravos.
A	 pena	 alcançava	 navios	 de	 quaisquer	 bandeiras	 que
transportassem	escravos	para	o	Brasil:
§	2º	Na	mesma	pena	de	perdimento	dos	escravos,	para
ficarem	 libertos	 e	 terem	 o	 destino	 abaixo	 declarado,
incorrerão	 todas	 as	 pessoas	 de	 qualquer	 qualidade	 e
condição,	que	os	conduzirem	a	qualquer	dos	portos	do
Brasil	em	navios	com	bandeira	que	não	seja	portuguesa.
Nesse	 Alvará	 de	 1818,	 também	 era	 previsto	 o	 procedimento
criminal	adequado	para	a	correta	aplicação	do	Tratado	de	1817,	com	a
instalação	 das	 Comissões	 Mistas	 para	 julgamento	 das	 apreensões
realizadas	por	navios	de	guerra269.
2.	A	independência	do	Brasil	e	o	Tráfico	de	Escravos
O	ciclo	joanino	estava	se	encerrando	no	Brasil.	Com	a	derrota	de
Napoleão	e	a	expulsão	das	forças	francesas	de	Portugal	(em	1815)270,
a	 reação	 política	 daqueles	 que	 enfrentaram	 os	 invasores	 foi	 a	 de
criticar	 severamente	 El-Rei	 D.	 João	 VI,	 que,	 aos	 olhos	 dos	 que
ficaram,	havia	fugido	da	sua	terra	na	hora	mais	dramática271.
A	 abertura	 dos	 portos	 brasileiros	 às	 nações	 amigas272,	 com	 a
quebra	 do	 monopólio	 da	 metrópole	 sobre	 o	 comércio	 da	 sua	 mais
importante	colônia,	gerou	uma	verdadeira	crise	na	economia	lusitana,
já	 combalida	 após	 a	 invasão273	 e	 a	 luta	 para	 expulsar	 o	 exército
francês274.	Além	disso,	havia	outras	fontes	de	instabilidade	na	própria
metrópole.
Em	Lisboa,	em	1817,	foi	duramente	debelada	por	forçasmilitares
inglesas,	uma	revolta	organizada	pela	cúpula	da	maçonaria	 local	que
almejava	 a	 independência	 da	 pátria	 portuguesa	 para	 implantar	 o
liberalismo.	Doze	acusados	foram	enforcados,	dentre	eles	importantes
autoridades	 públicas	militares275.	O	 clima	 de	 revolta	 continuava,	 até
porque	grande	parte	do	Exército	português,	que	também	se	associava
à	 maçonaria,	 almejava	 restaurar	 o	 seu	 status	 de	 força	 militar,
afastando	a	ocupação	inglesa276.
Tal	 clima	 de	 insatisfação,	 alimentado	 pelas	 ideias	 liberais
divulgadas	pelas	lojas	maçônicas,	culminou	na	eclosão	da	Revolução
Liberal	 do	Porto,	 em	24	de	 agosto	de	1820,	 com	a	 criação	da	 Junta
Provisional	 do	Governo	Supremo	 do	Reino.	Esse	movimento,	 como
uma	fagulha	em	um	barril	de	pólvora,	incendiou	todo	Portugal277.
Em	 15	 de	 setembro	 de	 1820,	 após	 uma	 insurreição	 de	 oficiais
subalternos,	o	Regente	foi	deposto	em	Lisboa,	com	a	constituição	de
um	governo	interino.	Em	28	de	setembro,	os	governos	de	Porto	e	de
Lisboa	se	uniram	em	uma	Junta	Provisional	do	Supremo	Governo	do
Reino,	 com	 o	 objetivo	 de	 realizar	 eleições	 para	 uma	 Corte
Constituinte278.
Tal	 movimento	 político,	 baseado	 no	 documento	 “Manifesto	 aos
Portugueses”,	 originado	 na	 Revolução	 do	 Porto,	 pretendia,	 além	 da
criação	de	uma	Constituição	e	do	retorno	da	Corte	real	para	Portugal,
a	restauração	dos	privilégios	comerciais	portugueses279,	com	o	fim	da
liberdade	comercial	instituída	em	1808280.
Um	imenso	erro	político	começou	a	ser	construído281.	Com	a	volta
da	família	real282,	à	exceção	do	então	príncipe	Regente	D.	Pedro283,	e
a	 intransigência	 das	Cortes	Gerais	 e	Extraordinárias	Portuguesas	 em
“recolonizar”	o	Brasil284,	a	elite	da	América	lusitana	foi	compelida	a
lutar	pela	independência	desse	imenso,	heterogêneo	e	rico	território285:
De	 todo	 o	 exame	 que	 temos	 feito,	 da	 preparação	 da
Independência,	 resulta	 a	 conclusão	de	 ter	 sido	este	um
movimento	 essencialmente	 coletivo,	 em	 que	 a	 atitude
das	Cortes	de	Lisboa	provocou	a	reação	dos	brasileiros,
a	princípio,	 da	manutenção	da	 autonomia	do	Reino	do
Brasil,	e,	depois,	da	própria	separação	de	Portugal.286
D.	Pedro287	serviu	de	elemento	unificador	das	diversas	aspirações
de	 independência	 política	 do	 Brasil,	 fossem	 brasileiros	 ou
portugueses,	 que	 possuíam	 interesse	 na	 autonomia	 política	 e
econômica288.
Concretizada	 a	 Independência,	 em	 1822,	 o	 tráfico	 de	 escravos,
realizado	preponderantemente	por	 embarcações	de	bandeira	 lusitana,
ficou	 evidentemente	 à	 margem	 da	 lei,	 por	 força	 dos	 tratados
internacionais	dos	quais	Portugal	era	signatário.	A	razão	era	simples:
se	o	Brasil	não	mais	 integrava	o	 império	português,	não	poderia
haver	 exportação	 de	 escravos	 de	 colônias	 portuguesas	 para	 a
recém-criada	 Nação	 brasileira289.	 Tal	 fato	 foi	 ressaltado	 pelo
Secretário	de	Exterior	inglês:
[...]	a	única	desculpa	dos	portugueses	para	não	cumprir
os	compromissos	constantes	nos	tratados	de	1810,	1815
e	 1817	 (abolir,	 numa	 data	 futura,	 todo	 o	 tráfico	 de
escravos)	 ficava	 agora	 “absolutamente	 e	 ipso	 facto
anulada	por	um	acontecimento	que	elimina	inteiramente
caráter	 colonial	 do	 Brasil”.	 Além	 do	 mais,	 Canning
pode	 argumentar,	 com	 justiça,	 que	 todo	 o	 tráfico
português	 de	 escravos	 através	 do	 Atlântico	 se
tornara	de	facto	ilegal	a	partir	do	momento	em	que	o
Brasil	 e	 Portugal	 se	 haviam	 separado:	 transportar
escravos	para	 fora	do	 império	português	 tinha	 sido
proibido	 já	 em	1761;	 pelo	 artigo	quatro	do	 tratado
de	 1815,	 D.	 João	 tinha	 se	 comprometido
especificamente	 a	 não	 permitir	 que	 a	 bandeira
portuguesa	 fosse	 empregada	 no	 tráfico	 negreiro,
exceto	 para	 suprir	 mão-de-obra	 “as	 possessões
transatlânticas	 pertencentes	 à	 coroa	 de	 Portugal”;	 e	 o
artigo	primeiro	da	Convenção	Adicional	de	1817	 tinha
definido	 como	 ilícito	 o	 tráfico	 de	 exercido	 por	 navios
portugueses	 para	 portos	 situados	 fora	 dos	 domínios	 da
coroa	portuguesa.290	(grifos	nossos)
Portanto,	 poderia	 se	 crer	 que	 o	 tenebroso	 tráfico	 de	 escravos
estaria	 próximo	 do	 seu	 aguardado	 final,	 com	 a	 independência	 do
Brasil.	Isso	não	ocorreu,	ao	contrário,	houve	a	sua	intensificação	nas
primeiras	duas	décadas	após	a	independência	política	brasileira.
3.	Tráfico	de	escravos	e	os	tratados	internacionais
firmados	pelo	Império	do	Brasil
A	 classe	 política	 brasileira	 era	 amplamente	 favorável	 à
manutenção	da	escravidão	e	do	 tráfico	negreiro	que	a	 alimentava291,
afinal,	na	opinião	deles,	haveria	um	desastre	econômico	se	a	abolição
fosse	decretada292.	Apesar	desse	posicionamento	e	de	muitas	críticas,
D.	Pedro	I	firmou	com	a	Inglaterra	293	o	Tratado	de	23	de	novembro
de	1826294,	que	equiparava	o	tráfico	de	escravos	ao	ato	de	pirataria295,
transformando-o	em	conduta	ilícita296,	como	previsto	no	seu	artigo	1º:
Art.	 1º	 –	 Acabados	 três	 anos	 depois	 da	 troca	 das
ratificações	 do	 presente	 tratado,	 não	 será	 lícito	 aos
súditos	 do	 império	 do	 Brasil	 fazer	 o	 comércio	 de
escravos	 na	 costa	 d’África	 debaixo	 de	 qualquer
pretexto,	ou	maneira	qualquer	que	seja.	E	a	continuação
desse	comércio,	feito	depois	da	dita	época	por	qualquer
pessoa	 súdita	 de	 sua	 majestade	 imperial,	 será
considerado	e	tratado	de	pirataria.297
Tal	 disposição	 entraria	 em	 vigor	 três	 anos	 após	 a	 ratificação	 do
referido	 tratado.	As	 disposições	 dos	 tratados	 de	 1815	 e	 1817	 foram
recepcionadas	em	todos	os	seus	termos298.
No	 que	 se	 refere	 à	 competência	 para	 firmar	 tratados
internacionais,	merece	ser	feita	pequena	consideração:	nos	termos	do
art.	 102,	 VII	 e	 VIII,	 da	 Constituição	 de	 1824,	 competia	 ao	 Poder
Executivo	 entabular	 negociações	 com	 outros	 Estados,	 no	 plano
internacional,	e	com	eles	celebrar	tratados	(de	aliança	militar	ofensiva
ou	 defensiva,	 de	 subsídios	 ou	 de	 comércio).	 Tais	 tratados	 firmados
pelo	 Poder	 Executivo	 deveriam	 ser	 levados	 ao	 conhecimento	 da
Assembleia	Geral,	 se	 não	 houvesse	 risco	 à	 segurança	 e	 ao	 interesse
público	(art.	102,	VIII,	da	Constituição	de	1824)299.
É	 fácil	 deduzir	 que	 os	 parlamentares	 brasileiros	 estavam
indignados	 com	 a	 postura	 de	 Sua	 Majestade,	 que	 havia	 ignorado
completamente	 o	 direito	 de	 a	 Câmara	 ser	 consultada	 sobre	 tratados
firmados300.	 O	 parlamento	 teve	 de	 engoli-lo	 contra	 sua	 vontade301,
pois	 a	 elite	 brasileira	 era	 majoritariamente	 opositora	 de	 medidas
tendentes	 a	 extinguir	 o	 fim	 do	 tráfico:	 “[...]	 o	 fato	 de	 o	 governo
brasileiro	ter	[...]	abolido	o	tráfico	não	por	ser	do	interesse	do	Brasil,
mas	por	que	uma	poderosa	nação	 estrangeira	 achara	 ser	 interessante
para	ela”302.
Na	 perspectiva	 de	 Cunha	 Matos,	 a	 própria	 soberania	 brasileira
havia	sido	violada:
[foram]	 forçados	 por	 ameaças	 de	 hostilidades303	 em
caso	 de	 oposição	 do	 nosso	 lado...	 forçados	 obrigados,
submetidos	 e	 compelidos	 pelo	 governo	 britânico	 a
assinar	 uma	 convenção	 onerosa	 e	 degradante	 sobre
assuntos	internos,	domésticos	e	puramente	nacionais,	da
competência	exclusiva	do	livre	e	soberano	legislativo	e
do	augusto	chefe	da	nação	brasileira304.
Ademais,	 as	 teses	 humanitárias	 apregoadas	 pela	 Inglaterra	 como
fundamento	para	abolição	do	tráfico	de	escravos	não	eram	acatadas	no
Brasil,	pois	suspeitava-se	que	os	verdadeiros	interesses	britânicos	para
o	 fim	 dessa	 atividade	 comercial	 estavam	 relacionados	 ao	 cálculo
econômico	daquela	potência	europeia:
Poucos	 brasileiros	 aceitavam	 a	 base	 humanitária	 da
campanha	 antitráfico	 de	 escravos	 feita	 pela	 Inglaterra;
seu	 propósito,	 acreditavam,	 era,	 em	 primeiro	 lugar,
arruinar	a	agricultura	brasileira	em	favor	dos	interesses
das	Índias	Ocidentais	Britânicas	e,	em,	segundo,	romper
os	elos	que	ligavam	o	Brasil	àÁfrica,	a	fim	de	facilitar
a	 expansão	 britânica	 e	 o	 subsequente	 desenvolvimento
do	 continente	 africano	 como	 rival	 econômico	 do
Brasil.305
Poucos	 anos	 depois,	 o	 Brasil	 foi	 sacudido	 por	 um	 terremoto
político:	a	abdicação	de	D.	Pedro	I.
4.	Interlúdio:	a	Abdicação	de	D.	Pedro
O	Imperador,	 em	um	ato	 impulsivo306,	 abdicou	na	madrugada	do
dia	 7	 de	 abril	 de	 1831307.	 Em	 uma	 curta	 mensagem	 escrevera	 D.
Pedro308:
Usando	 do	 Direito	 que	 a	 Constituição	 me	 concede,
declaro	 que	 hei	 mui	 voluntariamente	 abdicado	 na
pessoa	 do	meu	muito	 amado	 e	 prezado	 filho	 o	 Sr.	 D.
Pedro	 de	 Alcântara.	 Boa	 Vista,	 7	 de	 abril	 de	 1831,
décimo	da	Independência	e	do	Império.309
Ironicamente,	 o	 reinado	 do	 Defensor	 Perpétuo310	 do	 Brasil	 D.
Pedro	 I	 se	 encerrou	 com	 a	 sua	 abdicação311	 em	 favor	 de	 seu	 filho
menor	 de	 idade.	 Já	 pela	manhã	dessa	 tumultuada	quinta-feira,	 às	 10
horas,	 no	 Senado	 brasileiro,	 onde	 se	 encontravam	 presentes	 poucos
parlamentares312,	 os	membros	da	Assembleia	Geral	 tomaram	ciência
do	seu	ato313.
Além	 de	 ter	 ocorrido	 durante	 as	 férias	 parlamentares314,	 a
abdicação	 trazia	 um	 problema	 em	 si:	 não	 existia	 previsão	 de	 a
Assembleia	 Geral	 eleger	 um	 Regente	 para	 essa	 situação315,	 pois	 a
Constituição	 de	 1824	 apenas	 elencava	 tal	 possibilidade	 em	 caso	 de
falecimento	 do	 soberano,	 se	 não	 fosse	 possível	 a	 coroação	 do	 seu
sucessor316.	O	filho	do	Imperador,	Pedro	de	Alcântara,	contava	apenas
com	 cinco	 anos	 e	 quatro	 meses	 de	 idade,	 não	 podendo,	 portanto,
assumir	 a	 chefia	 do	 Poder	 Moderador317.	 Sobre	 a	 menoridade	 do
sucessor,	a	Constituição	de	1824	assim	dispunha:
Art.	 121.	O	 Imperador	 é	menor	 até	 à	 idade	de	dezoito
anos	completos.
Art.	 122.	 Durante	 a	 sua	 menoridade,	 o	 Império	 será
governado	 por	 uma	 Regência,	 a	 qual	 pertencerá	 na
Parente	mais	 chegado	 do	 Imperador,	 segundo	 a	 ordem
da	Sucessão,	e	que	seja	maior	de	vinte	e	cinco	anos.
Ou	seja,	a	sucessão	deveria	se	dar	apenas	na	forma	do	art.	117	da
Constituição	 imperial,	 o	 que	 se	 apresentava	 como	 outro	 problema,
uma	 vez	 que	 a	 regra	 sucessória	 prevista	 não	 solucionava	 o	 vácuo
político	 criado	 pela	 abdicação.	 Eis	 o	 que	 dispunha	 o	 mencionado
dispositivo:
Art.	117.	Sua	Descendência	legítima	sucederá	no	Trono,
Segundo	 a	 ordem	 regular	 da	 primogenitura,	 e
representação,	 preferindo	 sempre	 a	 linha	 anterior	 ás
posteriores;	 na	 mesma	 linha,	 o	 grau	 mais	 próximo	 ao
mais	 remoto;	 no	 mesmo	 grau,	 o	 sexo	 masculino	 ao
feminino;	no	mesmo	sexo,	a	pessoa	mais	velha	á	mais
moça.
O	Regente	deveria	 ser	 o	parente	mais	próximo	do	 soberano	 com
mais	 de	 25	 anos	 e,	 se	 não	 houvesse,	 deveria	 ser	 instituída	 uma
Regência	provisória	composta	por	dois	Ministros	(Estado	e	Justiça)	e
dois	 dos	 mais	 antigos	 membros	 do	 Conselho	 de	 Estado,	 sob	 a
presidência	da	Imperatriz	viúva	(e,	na	sua	ausência,	pelo	mais	antigo
membro	do	Conselho	de	Estado).	A	Regência	provisória	se	manteria
até	 a	 escolha	 da	 Regência	 permanente	 pela	 Assembleia	 Geral,	 na
forma	do	art.	123	da	Constituição	de	1824:
Art.	123.	Se	o	 Imperador	não	 tiver	parente	algum,	que
reúna	 estas	 qualidades,	 será	 o	 Império	 governado	 por
uma	 Regência	 permanente,	 nomeada	 pela	 Assembleia
Geral,	 composta	 de	 três	 Membros,	 dos	 quais	 o	 mais
velho	em	idade	será	o	Presidente.
Entretanto,	os	fatos	do	turbulento	07	de	abril	de	1831	atropelaram
as	disposições	constitucionais	pois:
	
(a)	a	Imperatriz	havia	falecido	em	11	de	dezembro	de	1826318;
(b)	não	existiam	outros	herdeiros	maiores	de	25	anos319;	e
(c)	o	Imperador,	que	deveria	 ter	sido	o	Defensor	Perpétuo	do	Brasil,
havia	subitamente	abdicado:
A	 regulamentação	 constitucional,	 como	 se	 vê,
pressupunha	 situações	 normais,	 enquanto	 o	 que
acontecera	 naquele	 tumultuado	 7	 de	 abril	 fora
anormalíssimo,	 excepcional,	 reclamando,	 desta	 sorte,
tratamento	diferente.320
Foi,	 então,	 constituída	 provisoriamente	 uma	 Regência	 Trina,
composta	pelos	 seguintes	membros:	Brigadeiro	Francisco	de	Lima	e
Silva,	José	Joaquim	Carneiro	de	Campos	(o	Marques	de	Caravelas)	e
pelo	Senador	Nicolau	Pereira	do	Santos	Vergueiro321.	As	derradeiras
palavras	 de	 D.	 Pedro	 de	 Alcântara	 à	 Assembleia	 Geral	 (assinando
apenas	 como	 Pedro),	 em	 mensagem	 de	 08	 de	 abril	 de	 1831,
manifestavam	 sua	 intenção	 de	 nomear	 como	 tutor	 do	 seu	 filho	 José
Bonifácio	de	Andrade	e	Silva322.
Iniciava-se	o	período	regencial	no	Brasil	e,	com	ele,	aguçaram-se
os	 debates	 sobre	 o	 problema	 do	 tráfico	 de	 escravos,	 afinal,	 desde
1830,	pelo	tratado	ratificado	em	13	de	março	de	1827,	tal	atividade	já
deveria	ter	sido	considerada	ilícita	e	os	que	a	exerciam,	seriam	então
considerados	piratas323.
5.	A	Lei	de	7	de	novembro	de	1831,	a	lei	para	inglês
ver:	a	ilegalidade	da	escravidão
Não	 obstante	 o	 debate	 acerca	 da	 legitimidade	 da	 escravidão,
sobretudo	por	aspectos	humanitários,	uma	forte	tese	começou	a	surgir
no	Brasil	imperial:	a	escravidão	era	uma	conduta	ilegal	e,	em	verdade,
os	 senhores	 dos	 escravos	 estavam	 realizando	 alguma	conduta	 típica:
contrabando	(art.	177	do	Código	Criminal)	ou	 reduzir	pessoa	 livre	à
escravidão	(art.	179	do	Código	Criminal).	A	ideia	era	simples,	mas	é
necessário	vislumbrar	a	evolução	legislativa	brasileira.
Como	 exposto,	 o	 Império	 do	 Brasil	 firmou	 com	 o	 Reino	 da
Inglaterra	um	tratado	internacional	em	26	de	novembro	de	1826.	Por
esse	 instrumento:	 “[...]	 o	Brasil	 proibia	o	 tráfico	dentro	de	 três	 anos
improrrogáveis.	Seriam	então	punidos	como	piratas	quantos	neles	se
envolvessem.	Conferiu-se	à	Inglaterra	o	tão	cobiçado	direito	de	visita
e	busca”324.
Ora,	 tal	 tratado	 foi	 ratificado	 em	 1827,	 devendo	 a	 proibição	 ao
tráfico	passar	a	vigorar	a	partir	de	1830325.	A	Portaria	de	21	de	maio
de	 1831,	 expedida	 pelo	 Ministro	 da	 Justiça	 Manoel	 José	 de	 Souza
Franco,	durante	a	Regência,	expressamente	proibiu	o	contrabando	de
escravos:
Constando	 ao	 Governo	 de	 S.	 M.	 Imperial	 que	 alguns
negociantes,	 assim	 nacionais	 como	 estrangeiros,
especulam	 com	 desonra	 da	 humanidade	 o	 vergonhoso
contrabando	de	 introduzir	 escravos	da	Costa	 da	África
nos	 portos	 do	 Brasil,	 em	 despeito	 da	 extinção	 de
semelhante	comércio,	manda	a	Regência	Provisória,	em
nome	 do	 Imperador,	 pela	 Secretaria	 de	 Estado	 dos
Negócios	 da	 Justiça,	 que	 a	 Câmara	 Municipal	 desta
cidade	 faça	 expedir	 uma	 circular	 a	 todos	 os	 juízes	 de
paz	das	freguesias	do	seu	território,	recomendando-lhes
toda	a	vigilâncias	policial	ao	dito	respeito;	e	que	no	caso
de	serem	introduzidos	por	contrabando	alguns	escravos
novos	 no	 território	 de	 cada	 uma	 das	 ditas	 freguesias,
procedam	imediatamente	ao	respectivo	corpo	de	delito	e
constando	 por	 este	 que	 tal	 ou	 tal	 escravo	 boçal	 foi
introduzido	aí	por	contrabando,	façam	dele	sequestro,	e
o	 remetam	 com	 o	 mesmo	 corpo	 de	 delito	 ao	 juiz
criminal	 do	 território	 para	 ele	 proceder	 nos	 termos	 de
direito,	em	ordem	a	lhe	ser	restituída	a	sua	liberdade,	e
punidos	 os	 usurpadores	 dela,	 segundo	 o	 art.	 179	 do
Código,	 dando	 de	 tudo	 conta	 imediatamente	 à	 mesma
Secretaria.326
Tal	 portaria	 teve	 pouca	 repercussão	 e	 quase	 nula	 efetividade327.
Cumpre	ressaltar	que	as	portarias	eram	consideradas	fontes	do	direito
que	buscavam	regular	os	casos	nela	tratados,	sem	prejudicar	terceiros,
nem	revogar	ou	alterar	a	legislação	vigente328.
Em	 face	 da	 insuficiente	 eficácia	 dessa	 portaria	 e	 da	 pressão
inglesa,	houve	a	promulgação,	pela	autoridade	Regencial,	da	Lei	de	7
de	novembro	de	1831329.	O	Art.	1º	de	tal	diploma,	de	forma	simples,
prescrevia:	“Todos	os	escravos	que	entrarem	no	território	ou	portos	do
Brasil	vindos	de	fora	ficam	livres”330.Diante	disso,	uma	das	duas	alternativas	abaixo	deveria	prevalecer:
	
(a)	se	fosse	considerado	o	argumento	de	que	eventual	ato	de	 traficar
escravos	 da	 Costa	 da	 África	 era	 importação	 de	 mercadoria	 –
compreendendo	 o	 escravo	 como	 uma	mercadoria,	 tendo	 em	 vista	 a
sua	 possível	 natureza	 de	 res	 –	 sua	 importação	 seria	 proibida	 e,
portanto,	o	importador	cometeria	o	crime	de	contrabando:
Art.	177.	Importar,	ou	exportar	gêneros,	ou	mercadorias
proibidas;	 ou	 não	 pagar	 os	 direitos	 dos	 que	 são
permitidos,	na	sua	importação,	ou	exportação.
Penas	–	perda	das	mercadorias	ou	gêneros,	 e	de	multa
igual	à	metade	do	valor	deles.
No	 caso	 concreto,	 o	 senhor	 que	 viesse	 a	 importar	 tais	 escravos
poderia	 figurar,	no	mínimo,	como	cúmplice,	na	forma	do	art.	6º,	1.º,
do	Código	Criminal	do	Império:
Os	 que	 receberem,	 ocultarem	 ou	 comprarem	 coisas
obtidas	por	meios	criminosos,	sabendo	que	o	foram,	ou
devendo	 sabe-lo	 em	 razão	 da	 qualidade,	 ou	 condição
das	pessoas,	de	quem	receberam,	ou	compraram.
(b)	 entretanto,	 é	 manifesto	 que	 o	 legislador,	 pela	 Lei	 de	 7	 de
novembro	 de	 1831,	 assegurou	 que	 escravos	 introduzidos	 após	 a
vigência	 desse	 dispositivo	 seriam	 considerados	 homens	 livres.	 Em
tese,	 não	 poderiam	 mais	 existir	 escravos	 que	 houvessem	 sido
importados	para	o	Brasil,	a	partir	da	publicação	desse	diploma	legal.
Essa	 é	 a	 única	 conclusão	 a	 que	 se	 pode	 chegar.	Qualquer	 indivíduo
que	reduzisse	esses	homens	à	condição	de	escravo	estaria	cometendo
o	 crime	 particular	 contra	 a	 liberdade	 individual	 de	 “reduzir	 à
escravidão	pessoa	livre”:
Art.	 179.	 Reduzir	 à	 escravidão	 pessoa	 livre,	 que	 se
achar	em	posse	da	sua	liberdade.
Pena	 –	 de	 prisão	 por	 três	 a	 nove	 anos,	 e	 de	 multa
correspondente	à	 terça	parte	do	 tempo;	nunca	porém	o
tempo	de	prisão	será	menor,	que	o	do	cativeiro	injusto,	e
mais	uma	terça	parte.
Portanto,	ou	se	estaria	cometendo	o	crime	de	contrabando,	ou
de	 redução	 à	 condição	 análoga	 à	 de	 escravo.	De	 qualquer	 forma,
em	qualquer	uma	das	duas	hipóteses,	o	escravo	importado	a	partir	da
publicação	da	Lei	de	7	de	novembro	de	1831,	estaria	automaticamente
livre,	por	força	do	disposto	no	seu	artigo	1º.
Registre-se	 que	 a	 pretensão331	 ao	 direito	 à	 liberdade	 era
imprescritível,	 nos	 termos	 do	 Decreto	 de	 12	 de	 abril	 de	 1832,	 que
passou	a	regulamentar	a	Lei	de	1831332:
Art.	10.	Em	qualquer	tempo,	em	que	o	preto	requerer	a
qualquer	Juiz	de	Paz	ou	Criminal,	que	veio	para	o	Brasil
depois	da	extinção	do	tráfico,	o	Juiz	o	interrogará	sobre
todas	as	circunstâncias,	que	possam	esclarecer	o	fato,	e
oficialmente	 procederá	 a	 todas	 as	 diligências
necessárias	para	certificar-se	dele:	obrigando	o	senhor	a
desfazer	 as	 dúvidas,	 que	 suscitarem-se	 a	 tal	 respeito.
Havendo	 presunções	 veementes	 de	 ser	 o	 preto	 livre,	 o
mandará	depositar,	e	procederá	nos	mais	termos	da	Lei.	
Comentando	o	tema,	manifestou-se	Joaquim	Nabuco:
Com	efeito,	a	grande	maioria	desses	homens,	sobretudo
no	Sul,	ou	são	africanos,	importados	depois	de	1831,	ou
descendentes	destes.
Ora,	em	1831	a	 lei	de	7	de	novembro	declarou	no	seu
artigo	1.º:	“Todos	os	escravos	que	entrarem	no	território
ou	portos	do	Brasil	vindos	de	fora	ficam	livres.”.
Como	 se	 sabe,	 essa	 lei	 nunca	 foi	 posta	 em	 execução,
porque	 o	 Governo	 brasileiro	 não	 podia	 lutar	 com	 os
traficantes;	mas	nem	por	isso	deixa	ela	de	ser	a	carta	de
liberdade	de	todos	os	importados	de	pois	de	sua	data.
Que	 antes	 de	 1831,	 pela	 facilidade	 de	 aquisição	 de
africanos,	 a	 mortalidade	 dos	 nossos	 escravos,	 ou	 da
Costa	 ou	 crioulos,	 era	 enorme,	 é	 um	 fato	 notório.	 “É
sabido	–	dizia	Eusébio	de	Queirós	em	1852	na	Câmara
dos	Deputados	–	que	a	maior	parte	desses	infelizes	[os
escravos	 importados]	 são	 ceifados	 logo	 nos	 primeiros
anos,	 pelo	 estado	desgraçado	que	os	 reduzem	os	maus
tratos	da	viagem,	pela	mudança	de	clima,	de	alimentos	e
todos	 os	 hábitos	 que	 constituem	 a	 vida”.	 Desses
africanos,	porém,	–	quase	todos	eram	capturados	na
mocidade	–	introduzidos	antes	de	1831,	bem	poucos
restarão	 hoje,	 isto	 é,	 depois	 de	 cinqüenta	 anos	 de
escravidão	na	América	a	juntar	aos	anos	que	vieram
da	África;	 e,	mesmo	 sem	a	 terrível	mortalidade,	de
que	 deu	 testemunho	 Eusébio	 entre	 os	 recém-
chegados,	 pode-se	 afirmar	 que	 quase	 todos	 os
africanos	 vivos	 foram	 introduzidos	 criminosamente
no	país.333
(grifos	nossos)
Ora,	 se	 a	 partir	 de	 1831	 qualquer	 escravo,	 que	 após	 o	 advento
dessa	 lei,	 fosse	 importado	 e	 desembarcado	 no	Brasil,	 passasse	 a	 ser
considerado	 como	 homem	 livre,	 pode-se	 concluir	 que	 somente
seriam	 considerados	 cativos,	 em	 território	 brasileiro,	 os	 filhos	 de
mãe	e	pais	escravos	que	já	houvessem	chegado	ao	território	nacional
anteriormente	ao	diploma	legislativo	de	1831:
[...]	a	lei	de	1831	foi	recuperada	por	abolicionistas	como
Luís	Gama	para	argumentar	em	ações	de	liberdade	que,
como	a	lei	nunca	foi	revogada,	já	em	fins	da	década	de
1860	 boa	 parte	 dos	 indivíduos	 tidos	 como	 escravos
estariam	sendo	mantidos	ilegalmente	em	cativeiros.334
Nas	palavras	do	advogado	Busch	Varela,	em	discurso	proferido	no
dia	9	de	março	de	1884	em	conferência	realizada	no	Rio	de	Janeiro:
Como	 já	 observei,	 a	 lei	 de	 1831	 não	 criava	 uma
disposição	transitória;	não	se	limitava	a	abolir	o	tráfico;
foi	além	–	declarou	livres	todos	os	escravos,	importados
de	 então	 em	diante.	 Tal	 disposição	 é,	 de	 sua	 natureza,
irrevogável;	a	liberdade,	uma	vez	adquirida,	nunca	mais
se	pode	perder.
Os	 importados	 depois	 de	 1831	 adquiriram-na,	 por
disposição	 expressa	 de	 lei,	 nunca	 foram	 escravos	 no
Brasil;	 foram	 vítimas	 de	 atroz	 e	 condenada	 pirataria;
ninguém	 dirá	 que	 o	 roubo	 é	 meio	 de	 adquirir
propriedade	e	de	transmiti-la	legitimamente.335
A	conclusão	a	que	chega	Evaristo	de	Moraes	é	peremptória:
Uma	e	única:	muitos	 senhores	de	escravos,	orgulhosos
latifundiários	 brasileiros,	 se	 não	 eram	 ladrões,	 eram,
pelo	 menos,	 receptadores	 de	 grande	 número	 de
liberdades	humanas;	boa	porção	das	suas	fortunas	tinha
raízes	 na	 prática	 do	 crime	 previsto	 no	 art.	 179	 do
Código	 Criminal	 do	 Império,	 pois	 resultava	 da
escravidão	 direta	 dos	 africanos	 contrabandeados	 e	 da
indireta	dos	africanos	livres,	misturados	no	eito	com	os
outros.336
As	 sanções	 previstas	 na	 Lei	 de	 7	 de	 novembro	 de	 1831	 para	 o
cometimento	da	conduta	de	importação	de	escravos	eram	graves:
Art.	 2º	 Os	 importadores	 de	 escravos	 no	 Brasil
incorrerão	na	pena	corporal	do	artigo	cento	e	setenta	e
nove	do	Código	Criminal337,	imposta	aos	que	reduzem	à
escravidão	pessoas	livres338,	e	na	multa	de	duzentos	mil
réis	 por	 cabeça	 de	 cada	 um	 dos	 escravos	 importados,
além	 de	 pagarem	 as	 despesas	 da	 reexportação	 para
qualquer	 parte	 da	 África339;	 reexportação,	 que	 o
Governo	 fará	 efetiva	 com	 a	maior	 possível	 brevidade,
contrastando	 com	 as	 autoridades	 africanas	 para	 lhes
darem	um	asilo.	Os	infratores	responderão	cada	um	por
si,	e	por	todos.
E	havia	também	a	definição	de	quem	figuraria	como	importador	de
escravo:
Art.	3º	São	importadores:
1º	O	Comandante,	mestre	ou	contramestre.
2º	 O	 que	 cientemente	 deu,	 ou	 recebeu	 o	 frete,	 ou	 por
qualquer	 outro	 título	 a	 embarcação	 destinada	 para	 o
comércio	 de	 escravos.	 3º	 Todos	 os	 interessados	 na
negociação,	 e	 todos	 os	 que	 cientemente	 forneceram
fundos,	 ou	 por	 qualquer	motivo	 deram	 ajuda,	 a	 favor,
auxiliando	 o	 desembarque,	 ou	 consentindo-o	 nas	 suas
terras.
4º	Os	 que	 cientemente	 comprarem,	 como	 escravos,	 os
que	 são	 declarados	 livres	 no	 art.	 1º;	 estes	 porém	 só
ficam	 obrigados	 subsidiariamente	 ás	 despesas	 da
reexportação,	sujeitos,	com	tudo,	ás	outras	penas.Havia	 previsão	 de	 incentivos	 financeiros	 para	 a	 denúncia	 do
tráfico340	 e	 também	 para	 as	 tripulações	 de	 embarcações	 militares
nacionais	que	efetivamente	apreendessem	navios	negreiros341.	Tal	 lei
proibia	também	a	imigração	de	libertos	para	o	Brasil342:
Art.	 7º	Não	 será	 permitido	 a	 qualquer	 homem	 liberto,
que	não	for	brasileiro,	desembarcar	nos	portos	do	Brasil
debaixo	 de	 qualquer	 motivo	 que	 seja.	 O	 que
desembarcar	será	imediatamente	reexportado.
Essa	foi	a	chamada	Lei	para	Inglês	Ver343:	um	diploma	legislativo
construído	 com	 a	 finalidade	 de	 não	 ter	 nenhuma	 eficácia344,	 de
natureza	apenas	simbólica,	para	dar	uma	resposta	à	grande	potência	da
época,	 a	 Inglaterra,	 que	 exigia	 o	 cumprimento	 dos	 tratados
anteriormente	firmados345.
Por	 que	 será	 que	 tal	 diploma	 legal	 “não	 pegou”?	 A	 resposta	 é
simples:
[...]	os	 interesses	econômicos	de	uma	grande	parte	dos
habitantes	 do	Brasil,	 nacionais	 e	 estrangeiros,	 estavam
ligados	 à	 mantença	 do	 tráfico	 africano.	 A
“sentimentalidade”	 da	 maioria	 dos	 recentes	 cidadãos
brasileiros,	sob	pressão	desses	interesses,	ainda	não	fora
alterada	 quanto	 ao	 tráfico,	 tendo	 sido	 indiferentes	 ao
odioso	 da	 instituição	 os	 mais	 esforçados	 e	 adiantados
fatores	da	nossa	independência346.
[Ademais]	não	pomos	em	dúvida	que	certas	autoridades
subalternas,	 subordinadas	 por	 interesse	 pecuniário	 ou
dominadas	 por	 ligações	 políticas	 e	 familiares,	 se
portassem	 com	 frouxidão	 e	 indolência347,	 no
cumprimento	 dos	 seus	 deveres,	 favorecendo,	 direta	 ou
indiretamente,	os	contrabandistas	negreiros348.
Ademais,	esclarece	Gurgel:
[...]	 apesar	 de	 sua	 aparente	 severidade,	 ela
desconsiderou	 o	 acordo	 assinado	 entre	 o	 Brasil	 e	 a
Inglaterra	 em	 1826,	 segundo	 o	 qual	 o	 tráfico	 era
entendido	 como	 um	 ato	 de	 pirataria,	 o	 que	 permitia	 a
ingerência	 da	 marinha	 britânica	 no	 aprisionamento	 e
julgamento	 dos	 traficantes.	 Essa	 atitude	 veio,	 na
verdade,	 favorecer	 aqueles	 importadores	 que
continuaram	 trabalhando	 na	 clandestinidade,	 porque,	 a
partir	 de	 então,	 eles	 passaram	 a	 ser	 subordinado
exclusivamente	às	autoridades	nacionais.349
Por	 fim,	 as	melhores	 explicações	 para	 a	 não	 aplicação	 dessa	 lei
estão	contidas	no	célebre	discurso	proferido	por	Euzébio	de	Queirós,
em	16	de	junho	de	1852,	na	Câmara	dos	Deputados:
Sabe	 a	 Câmara	 que	 nós	 havíamos	 contratado	 com	 a
Grã-Bretanha	 em	 1926,	 que	 em	 1830	 seria	 o	 tráfico
extinto	entre	nós.
Desde	 logo	 os	 homens	 que	 se	 entregaram	 ao	 tráfico,
então	 lícito,	 mandaram	 vir	 grande	 abundância	 de
escravos	para	abastecer	todos	os	mercados	do	Brasil350,
e	 assim	 provida	 a	 agricultura	 de	 braços
superabundantes,	 por	 algum	 tempo	 a	 supressão	 do
tráfico	não	encontrou	inconveniente	algum.
Fez-se	 a	 Lei	 de	 7	 de	 novembro	 de	 1831,	 lei	 muito
malconcebida,	 incapaz	 de	 fazer	 efetiva	 a	 repressão	 do
tráfico,	mas	que,	entretanto,	revela	o	sentimento	sincero
da	parte	de	seus	autores	de	o	reprimir.	[...]
Em	 um	 país	 tão	 fértil	 como	 o	 nosso,	 é	 sabido	 que	 o
número	de	braços	necessários	 para	 o	 plantio	 exige	um
número	 sempre	maior	 para	 a	 colheita;	 daí	 resultar	 que
qualquer	que	seja	o	número	de	braços	de	que	disponha	o
fazendeiro	 para	 plantar,	 a	 sua	 colheita	 sempre	 exige
maior	número	de	braços.
Aconteceu,	 pois,	 que,	 dentro	 de	 pouco	 tempo,	 esse
grande	 abastecimento	 de	 braços,	 que	 nos	 últimos
tempos	tinha	sido	introduzido,	já	era	insuficiente	para	as
necessidades	 da	 colheita;	 então	 o	 tráfico,	 na	 falta	 de
braços	 livres,	 achou	 grande	 incentivo;	 os	 nossos
lavradores	 procuraram,	 com	 avidez,	 a	 compra	 de
escravos,	 e,	 por	 consequência,	 os	 especuladores	 eram
levados	pelo	desejo	de	grandes	lucros,	para	o	comércio
ilícito.351
Argumentava-se	 também	 que	 o	 interesse	 da	 Inglaterra	 era	 o	 de
apreender	a	carga	de	escravos	nos	navios	negreiros	e	realocá-los	nas
suas	colônias	caribenhas352.	Entretanto,	 Joaquim	Nabuco	 ironizava	o
fato	de	que,	apesar	de	a	lei	não	ter	sido	aplicada,	ela	também	não
foi	revogada353,	defendendo	uma	verdadeira	proibição	do	retrocesso,
no	que	se	refere	à	legislação	que	concede	liberdades	aos	indivíduos:
Fato	curioso,	a	 lei	de	7	de	novembro	de	1831	que	não
pôde	ser	executada,	senão	muito	excepcionalmente,	não
pôde	também	ser	abolida.
No	nosso	direito	não	se	revogam	cartas	de	liberdade,	e
qualquer	 governo,	 que	 ousasse	 propor	 às	 Câmaras	 a
legalização	 do	 cativeiro	 dos	 africanos	 importados
depois	 de	 1831,	 teria	 a	 prova	de	que	 a	 nação	não	 está
inclinada	a	fazer	o	que	não	consente	que	outros	façam.
O	escândalo	continua,	mas	pela	indiferença	dos	poderes
públicos	 e	 impotência	 da	 magistratura,	 composta
também,	 em	parte	 de	 proprietários	 de	 africanos;	 e	 não
porque	se	pretendia	seriamente	que	a	lei	de	1831	fosse
jamais	revogada.354
Incrivelmente,	 o	 próprio	 Conselho	 de	 Estado	 se	 manifestou
contrário	 à	 automática	 liberdade	 dos	 africanos355,	 pelos	 seguintes
fundamentos:
A	 intenção	 desta	 lei	 não	 podia	 ir	 além	 do	 pensamento
dos	tratados	de	que	dimana	[tratado	firmado	entre	Brasil
e	 Inglaterra	 em	 1815]	 [...]	 Em	 todo	 caso	 é	 fora	 de
dúvida	que	não	pode	ter	apoio	na	Lei	de	1831	o	direito
que	 se	 quer	 atribuir	 ao	 africano	 importado	 como
escravo,	depois	daquela	data,	de	ser	equiparado	à	pessoa
que	nasceu	livre	no	Brasil	para	gozo	de	plena	liberdade
civil.356
A	falta	de	lógica	de	tal	argumento	agride	a	própria	Constituição	de
1824:	o	Poder	 legislativo	brasileiro357	 não	estava	 limitado	ao	 tratado
de	 1815,	 um	 ato	 firmado	 entre	 a	 Coroa	 portuguesa	 e	 o	 Reino	 da
Inglaterra.
Quando	houve	a	decisão	política	de	se	criar	uma	lei	concedendo	a
liberdade	 a	 qualquer	 escravo	 importado	 pelo	 tráfico,	 a	 partir	 da
vigência	de	 tal	diploma	 legal	deu-se	origem	a	uma	decisão	soberana
do	 Império	 do	Brasil,	 tomada	 pelo	 seu	 órgão	 competente	 para	 criar
leis:	 a	Assembleia	Geral358.	 Em	 síntese,	 apesar	 da	 existência	 de	 um
arcabouço	 jurídico	 positivado,	 o	 tráfico	 de	 escravos	 se	 intensificou
muito	a	partir	da	década	de	1830359.
Somente	entre	os	anos	de	1842	e	1852,	mais	de	300.000	escravos
foram	importados,	segundo	Eusébio	de	Queirós:
Demais	a	proceder	a	opinião	dos	nobres	deputados,	pois
que	o	feto,	segundo	o	direito	romano	transplantado	para
o	nosso,	segue	a	condição	do	ventre,	serão	livres	não	só
os	escravos	importados	depois	daquela	data,	como	toda
a	 sua	 descendência.	 Coloquemos	 a	 questão	 no	 seu
verdadeiro	 terreno.	 Se,	 como	 demonstrei,	 somente	 no
período	de	dez	anos,	de	1842	a	1852,	como	consta	dos
documentos	 oficiais,	 foram	 importados	 326.317
africanos,	 e	 não	 sabendo	 nós	 quantos	 teriam	 sido
importados	no	período	anterior	de	11	anos	depois	da	lei
de	 1831,	 pergunto:	 quantos	 dos	 atuais	 escravos
poderiam	 rigorosamente	 ser	 considerados	 como	 tais,	 a
prevalecer	a	opinião	que	combato?360
Entretanto,	os	ingleses	não	ficaram	satisfeitos	com	a	permanência
do	tráfico	de	escravos	e	a	situação	diplomática	se	agravou.
6.	O	Bill	Aberdeen	e	o	impasse	Diplomático
O	tratado	de	1826,	firmado	pela	Inglaterra	e	o	nascente	Império	do
Brasil361,	 estabelecia	 que	 o	 direito	 de	 visita	 iria	 expirar	 em	 13	 de
março	 de	 1845362.	 No	 dia	 12	 de	 março	 de	 1845,	 o	 ministro	 de
Negócios	Estrangeiros	notificou	o	Governo	inglês	que	tal	direito	 iria
caducar363.
Em	face	da	pressão	do	Secretário	de	Estado	Conde	de	Aberdeen,
foi	decretado,	em	8	de	agosto	de	1845,	o	Bill	Aberdeen364,	que	nada
mais	 era	 que	 uma	 “lei	 para	 pôr	 em	 execução	 uma	 convenção	 entre
S.M.	o	Imperador	do	Brasil	para	regulamentação	e	a	final	abolição	do
tráfico	africano	de	escravos”365.	O	Bill	Aberdeen	 sujeitava	 os	 navios
brasileiros,que	 fizessem	 tráfico	 de	 escravos,	 ao	 Alto	 Tribunal	 do
Almirantado	 e	 a	 qualquer	 tribunal	 do	 Vice-Almirantado	 dentro	 dos
domínios	de	S.	M.	o	Rei	 Jorge	 IV.	Na	prática,	 as	 tripulações	 seriam
julgadas	em	tribunais	britânicos	da	Serra	Leoa366:
4º)	 E	 decreta-se	 que	 será	 lícito	 ao	 alto	 tribunal	 do
almirantado	 e	 a	 qual	 quer	 tribunal	 de	vice-almirantado
de	S.	M.	dentro	de	seus	domínios	tomar	conhecimento	e
julgar	 qualquer	 navio	 que	 faça	 o	 tráfico	 de	 escravos
africanos	em	contravenção	da	dita	convenção	de	23	de
novembro	 de	 1826,	 e	 que	 for	 detido	 e	 capturado	 por
aquele	 motivo	 depois	 do	 dito	 dia	 13	 de	 março	 por
qualquer	pessoa	ou	pessoas	a	serviço	de	S.	M.
Curiosamente,	 esse	 diploma	 legal	 tinha	 por	 objetivo	 ratificar	 a
vigência	de	um	tratado	de	direito	internacional	cuja	validade	já	havia
expirado.	 Unilateralmente,	 a	 Inglaterra	 pretendia	 manter	 viva	 uma
norma	que	não	mais	existia.	A	própria	imprensa	britânica	enxergou	tal
lei	como	quase	que	um	ato	de	beligerância,	pois	pretendia	aprofundar
os	abusos	que	já	vinham	sendo	cometidos367:
[...]	o	direito	de	visita	exercido	violentamente,	a	alcance
das	baterias	brasileiras	nas	águas	territoriais	do	Império,
por	 vezes	 mesmo	 no	 interior	 de	 seus	 portos;
desembarques	 com	 força	 armada	 em	 diferentes	 pontos
da	 costa,	 em	 presença	 das	 autoridades	 locais,	 e	 com
menosprezo	 de	 suas	 representações;	 numerosas
apreensões	arbitrárias,	gratuitas;	e	todas	essas	ofensas	e
atentados	 à	 nacionalidade	 brasileira,	 desfrutando	 uma
impunidade	 revoltante,	 devida	 em	 grande	 parte	 à
anarquia	 a	 que	 se	 achavam	 reduzidas	 as	 comissões
mistas	 pelas	 razões	 já	 acima	 alegadas	 pelo	 abaixo-
assinado.368
O	 Governo	 brasileiro,	 por	 meio	 de	 nota	 diplomática,	 em	 22	 de
outubro	 de	 1845,	 assinada	 pelo	 então	 ministro	 dos	 Negócios
Estrangeiros,	repudiou	o	Bill	Aberdeen	sem	obter	resposta369:
Absurdo	fora	reconhecer	no	Governo	britânico	o	direito
de	punir	súditos	brasileiros,	nas	suas	pessoas	ou	na	sua
propriedade,	 por	 crimes	 cometidos	 no	 território	 do
Império,	sem	muito	expressa,	clara	e	positiva	delegação
deste	direito370,	feita	pelo	soberano	do	Brasil	ao	da	Grã-
Bretanha.371
Não	 é	 concebível	 como	 possa	 ser	 considerado	 hoje
pirataria,	 segundo	o	direito	das	gentes,	quando,	não	há
muitos	anos,	ainda	a	mesma	Inglaterra	não	se	reputava
infamada	em	negociar	em	escravos	africanos,	e	quando
outras	 nações	 cultas	 ainda	 há	 bem	 pouco	 tempo
proscreveram	tal	tráfico372.
Com	o	Bill	Aberdeen,	 a	 repressão	 inglesa	 ao	 tráfico	 de	 escravos
aumentou,	fazendo	com	que	 tal	negócio	se	 tornasse	mais	arriscado	e
oneroso:
A	Inglaterra	esperou	até	1845	que	o	Brasil	entrasse	em
acordo	com	ela;	foi	somente	em	1845,	quando	em	falta
de	um	 tratado	conosco	ela	 ia	perder	o	 fruto	de	vinte	 e
oito	anos	de	sacrifícios,	que	lorde	Aberdeen	apresentou
o	seu	bill.
O	 bill	 Aberdeen,	 pode-se	 dizer,	 foi	 uma	 afronta	 ao
encontro	 da	 qual	 a	 escravidão	 forçou	 o	 governo
brasileiro	a	ir.
A	luta	estava	travada	entre	a	Inglaterra	e	o	tráfico,	e	não
podia,	 nem	 devia	 acabar	 por	 honra	 da	 humanidade
recuando	ela.
Foi	isso	que	os	nossos	estadistas	não	pensaram.
A	cerração	que	os	cercava	não	lhes	permitia	ver	que	em
1845	o	 sol	 do	 nosso	 século	 já	 estava	 alto	 demais	 para
alumiar	ainda	tal	pirataria	neste	hemisfério.373
Entretanto,	apesar	de	tal	rigorosa	medida,	o	tráfico	se	intensificou,
como	se	pode	observar	no	quadro	abaixo374:
	
Ano Número	de	escravos	importados
1842 17.435
1843 19.095
1844 22.849
1845 19.453
1846 50.000
1847 56.000
1848 60.000
1849 54.000
1850* 23.000
1851 3.287
1852 700
Quadro	1.	Registro	do	número	de	escravos	importados	por	ano
*.	“A	queda	súbita	que	se	assinala	neste	último	ano	resulta,	aliás,	não	só	da
aprovação	da	lei	Eusébio	de	Queirós,	que	é	de	4	de	setembro,	como	da
intensificação	das	atividades	britânicas	de	repressão	ao	tráfico”	(Holanda,	Sérgio
Buarque	de.	Raízes	do	Brasil.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1978,	p.	44).
Entre	 1830	 e	 1852,	 estima-se	 que	 cerca	 de	 646.315	 africanos
tenham	sido	contrabandeados	como	escravos	para	o	Brasil375:
Não	 obstante	 a	 proibição	 legal,	 e	 após	 decréscimo
temporário	nas	entradas	de	africanos	durante	a	primeira
metade	da	década	de	1830,	o	comércio	negreiro,	então
clandestino,	 assumiu	 proporções	 aterradoras	 nos	 anos
seguintes,	 impulsionado	 pela	 demanda	 por
trabalhadores	para	as	fazendas	de	café,	useiro	e	vezeiro
no	 logro	 aos	 cruzeiros	 britânicos	 auxiliado	 pela
conveniência	e	corrupção	de	autoridades	públicas	e	com
o	apoio	de	setores	diversos	da	população.376
Como	 veremos,	 somente	 com	 o	 advento	 da	 Lei	 Eusébio	 de
Queirós,	efetivamente,	o	tráfico	passou	a	entrar	em	decadência,	vindo
a	desaparecer377.
7.	A	Lei	Eusébio	de	Queirós	e	o	fim	do	tráfico
internacional	de	escravos
Um	escravo	alcançava	altos	preços	no	mercado,	não	se	tratava	de
uma	“coisa”	cujo	valor	de	mercado	fosse	irrisório	dentro	do	comércio
jurídico	do	Brasil	 imperial.	Ao	 contrário,	 por	 seu	potencial	 de	 gerar
riquezas	para	os	 seus	proprietários378	 e	 a	 dificuldade	que	 envolvia	o
tráfico,	fazia	com	que	seu	preço	fosse	altíssimo,	sendo	sua	aquisição
algo	que	envolvia	grande	investimento	de	capital379.
Segundo	 Joaquim	 Nabuco,	 o	 tráfico	 de	 escravos	 acabou	 pelo
“interesse	dos	agricultores,	cujas	propriedades	estavam	passando	para
as	mãos	dos	especuladores	e	dos	traficantes380,	por	causa	das	dívidas
contraídas	 pelo	 fornecimento	 de	 escravos”381.	 Eis	 o	 discurso	 de
Eusébio	de	Queirós,	em	1852,	denunciando	tal	realidade:
A	isto	(o	desequilíbrio	entre	as	duas	classes	de	livres	e
escravos	 produzidos	 “pela	 progressão	 ascendente	 do
tráfico”	 que	 nos	 anos	 de	 1846,	 1847	 e	 1848	 havia
triplicado)	 veio	 juntar-se	 o	 interesse	 dos	 nossos
lavradores:	 a	 princípio,	 acreditando	 que	 na	 compra	 do
maior	número	de	escravos	consistia	o	aumento	dos	seus
lucros382,	 os	 nossos	 agricultores,	 sem	 advertirem	 no
gravíssimo	 perigo	 ameaçava	 o	 país,	 só	 tratavam	 da
aquisição	 de	 novos	 braços	 comprando-os	 a	 crédito,	 a
pagamento	de	três	a	quatro	anos,	vencendo	no	intervalo
juros	mordentes.
[...]	 Assim	 os	 escravos	 morriam,	 mas	 as	 dívidas
ficavam,	 e	 com	 elas	 os	 terrenos	 hipotecados	 aos
especuladores383,	 que	 compravam	 os	 africanos	 aos
traficantes	para	revender	aos	lavradores	[...]384.
Assim	a	 nossa	 propriedade	 territorial	 ia	 passando	 da
mão	 dos	 agricultores	 para	 os	 especuladores	 e
traficantes385.	[...]	Esta	experiência	despertou	os	nossos
lavradores,	e	faz-lhes	conhecer	que	achavam	sua	ruína,
onde	procuravam	a	riqueza,	e	ficou	o	tráfico	desde	esse
momento	definitivamente	condenado386.
Joaquim	Nabuco	 também	tecia	 forte	crítica	ao	 total	desrespeito	à
legislação	que	impunha	um	fim	ao	tráfico	de	escravos:
Pela	 Convenção	 de	 1826,	 o	 comércio	 de	 africanos
devia,	no	fim	de	três	anos,	ser	equiparado	à	pirataria,	e	a
lei	 que	 os	 equiparou	 tem	 a	 data	 de	 4	 de	 setembro	 de
1850.	 A	 liberdade	 imediata	 dos	 africanos	 legalmente
capturados	 foi	 garantida	 pela	 mesma	 convenção,
quando	 ratificou	 a	 de	 1817	 entre	 Portugal	 e	 a	 Grã-
Bretanha,	e	o	decreto	que	emancipou	os	africanos	livres
foi	 de	 24	 setembro	 de	 1864.	 Por	 último,	 a	 lei	 de	 7	 de
novembro	 de	 1831	 está	 até	 hoje	 sem	 execução,	 e	 os
mesmos	 que	 ela	 declarou	 livres	 acham-se	 ainda	 em
cativeiro.	 Nessa	 questão	 do	 tráfico	 bebemos	 as	 fezes
todas	do	cálice.387
Euzébio	 de	 Queirós	 lidava	 com	 o	 que	 poderia	 ser	 executado.
Alterou	um	anteprojeto	de	Lei	de	1837	que	pretendia	reformar	a	Lei
de	 7	 de	 novembro	 de	 1831	 e	 que	 se	 encontrava	 arquivado,	 desde
1848,	na	Câmara	dos	Deputados388.	A	Lei	de	7	de	novembro	de	1831
foi	aproveitadano	que	se	refere	aos	efeitos	penais	e	civis	previstos389.
Porém,	 no	que	 se	 refere	 aos	 demais	 temas,	 se	 comparamos	 a	Lei	 nº
581,	de	1850,	com	a	sua	precedente,	houve	significativas	alterações.
Importante	observar	que	a	referida	Lei	buscava	alcançar	fatos	ex	nunc,
ou	seja,	para	o	futuro,	visando	corrigir	as	falhas	da	Lei	de	1831
Art.	 1º	 As	 embarcações	 brasileiras	 encontradas	 em
qualquer	parte,	e	as	estrangeiras	encontradas	nos	portos,
enseadas,	ancoradouros,	ou	mares	territoriais	do	Brasil,
tendo	a	seu	bordo	escravos,	cuja	importação	é	proibida
pela	Lei	de	sete	de	novembro	de	mil	oitocentos	e	trinta
e	um,	ou	havendo-os	desembarcado,	 serão	apreendidas
pelas	 Autoridades,	 ou	 pelos	 Navios	 de	 guerra
brasileiros,	e	consideradas	importadoras	de	escravos.
Aquelas	 que	 não	 tiverem	 escravos	 a	 bordo,	 nem	 os
houverem	 proximamente	 desembarcado,	 porém	 que	 se
encontrarem	com	os	sinais	de	se	empregarem	no	tráfico
de	 escravos,	 serão	 igualmente	 apreendidas,	 e
consideradas	em	tentativa	de	importação	de	escravos.
Note-se	que,	em	última	análise,	esse	diploma	legal	apenas	ratificou
a	proibição	de	importação	de	cativos	africanos	já	estabelecida	pela	Lei
de	7	de	novembro	de	1831.	Caberia	ao	poder	executivo	regulamentar
as	 presunções	 legais390	 que	 permitiriam	 inferir	 que	 uma	 embarcação
estava	operando	como	navio	negreiro.	A	 lei	 equiparava	à	pirataria	o
ato	de	importar	escravos	no	território	do	Império391:
Art.	 4º	 A	 importação	 de	 escravos392	 no	 território	 do
Império	 fica	 nele	 considerada	 como	 pirataria,	 e	 será
punida	pelos	seus	Tribunais	com	as	penas	declaradas	no
Artigo	 segundo	 da	 Lei	 de	 sete	 de	 novembro	 de	 mil
oitocentos	 e	 trinta	 e	 um.	A	 tentativa	 e	 a	 cumplicidade
serão	 punidas	 segundo	 as	 regras	 dos	 artigos	 trinta	 e
quatro	e	trinta	e	cinco	do	Código	Criminal.
Note-se	 que	 se	 tratava	 do	 crime	 previsto	 no	 art.	 82	 do	 Código
Criminal	 do	 Império;	 não	 a	 pirataria	 do	 direito	 internacional,	 que
permitia	a	visita	da	embarcação	por	navios	de	guerra	estrangeiros:
Art.	 82.	 Exercitar	 pirataria;	 e	 este	 crime	 julgar-se-á
cometido:
1º	Praticando	no	mar	qualquer	ato	de	depredação,	ou	de
violência,	ou	contra	brasileiros,	ou	contra	 estrangeiros,
com	quem	o	Brasil	não	esteja	em	guerra.
2º	 Abusando	 da	 Carta	 de	 Corso,	 legitimamente
concedida,	 para	 praticar	 hostilidades,	 ou	 contra	 navios
brasileiros,	 ou	 de	 outras	 nações,	 que	 não	 fosse
autorizado	para	hostilizar.
3º	Apossando-se	 alguém	 do	 navio,	 de	 cuja	 equipagem
fizer	 parte,	 por	 meio	 de	 fraude,	 ou	 violência	 contra	 o
Comandante.
4º	 Entregando	 alguém	 aos	 piratas,	 ou	 ao	 inimigo,	 um
navio,	a	cuja	equipagem	pertencer.
5º	Opondo-se	alguém	por	ameaças,	ou	por	violência,	a
que	 o	 Comandante,	 ou	 tripulação	 defenda	 o	 navio	 em
ocasião	de	ser	atacado	por	piratas,	ou	pelo	inimigo.
Penas	–	de	galés	perpétuas	no	grau	máximo;	de	prisão
com	 trabalho	 por	 vinte	 anos	 no	 médio;	 e	 por	 dez	 no
mínimo.	 6º	Aceitando	Carta	 de	Corso	 de	 um	Governo
estrangeiro	sem	competente	autorização.
Penas	–	de	prisão	com	trabalho	por	dois	a	oito	anos.
Em	síntese,	o	tráfico	de	escravos	foi	equiparado	à	pirataria	prevista
no	Código	Criminal	do	Império393.	Os	escravos	apreendidos394	seriam
“reexportados”	para	o	porto	de	origem	ou	para	qualquer	local	fora	do
Império,	por	ato	discricionário	do	poder	público395.	Enquanto	esse	ato
de	 “reexportação”	 não	 era	 concretizado,	 eles	 eram	 “empregados	 em
trabalho	 debaixo	 da	 tutela	 do	 Governo,	 não	 sendo	 em	 caso	 algum
concedidos	os	seus	serviços	a	particulares”396.
Ademais,	 a	 competência	 para	 realizar	 a	 fiscalização	 e	 julgar	 os
ilícitos	 era	 das	 autoridades	 brasileiras397.	 Tal	 atribuição	 para
julgamento	dos	 apresamentos	 seria	 da	Auditoria	 da	Marinha398,	bem
como	a	determinação	de	liberdade	dos	escravos	importados,	conferida
pelo	art.	8º	da	Lei	nº	581,	de	1850,	se	os	atos	 fossem	praticados	em
“alto	 mar,	 ou	 na	 costa	 antes	 do	 desembarque,	 no	 ato	 dele,	 ou
imediatamente	 depois	 em	 armazéns,	 e	 depósitos	 sitos	 nas	 costas	 e
portos”.
A	 Regulamentação	 do	 procedimento	 seria	 fixada	 pelo	 Poder
Executivo399,	 com	 a	 possibilidade	 de	 designação	 de	 Auditores	 de
Marinha	nos	portos	onde	 julgasse	conveniente,	que	 seriam	os	 Juízes
de	Direito	 das	 respectivas	Comarcas400.	 Para	 julgamento	 dos	 crimes
previstos	no	art.	 3º	da	Lei	nº	581,	de	1850,	 seriam	competentes	 tais
Auditores	 da	 Marinha,	 com	 recurso	 para	 o	 respectivo	 Tribunal	 da
Relação:
Art.	 9º	 Os	 Auditores	 de	 Marinha	 serão	 igualmente
competentes	 para	 processar	 e	 julgar	 os	 réus
mencionados	 no	 Artigo	 terceiro401.	 De	 suas	 decisões
haverá	 para	 as	 Relações	 os	 mesmos	 recursos	 e
apelações	que	nos	processos	de	responsabilidade.
A	Lei	Eusébio	de	Queirós	alcançou	seu	objetivo402	e,	já	em	1852,	o
tráfico	de	escravos	pelo	Atlântico	havia	sido	efetivamente	extinto403,
em	resultado	da	aplicação	rápida	desse	diploma	legislativo.
8.	O	Tráfico	interprovincial	de	escravos404
A	severa	aplicação	da	Lei	nº	581,	de	04	de	setembro	de	1850405,
entretanto,	 incentivou406	 o	 tráfico	 de	 escravos	 dentro	 do	 território
nacional,	 pois	 a	 demanda	 pela	 mão	 de	 obra	 servil	 não	 cessou407,
fazendo	 com	 que	 houvesse	 a	 transferência	 maciça	 de	 cativos	 das
regiões	do	Norte	do	 Império408	 para	 os	 centros	 cafeicultores	 do	Sul,
que	utilizavam	de	forma	intensiva	tal	tipo	de	trabalho409:
[...]	 é	 somente	 a	 partir	 de	 1850,	 com	 a	 abolição	 do
tráfico	 africano,	 que	 ele	 toma	 vulto	 inusitado,	 de	 vez
que	passara	 a	 constituir,	 com	o	crescimento	vegetativo
da	 escravaria	 sulista,	 as	 únicas	 fontes	 de	 mão-de-obra
para	a	lavoura	cafeeira.410
Em	verdade,	houve	um	grande	desnível	de	produtividade	entre	as
províncias	 do	 Império411,	 o	 que	 justificou	 a	 exportação	 desse
excedente	 de	 mão	 de	 obra	 escrava	 (entre	 100	 e	 200	 mil	 cativos
exportados)	para	os	centros	cafeicultores412:	“O	tráfico	interprovincial
foi	 a	 última	 tentativa	 de	 remanejamento	 da	 mão-de-obra	 escrava
dentro	do	território	nacional”413.
O	tráfico	interno	se	iniciava	com	a	compra	e	venda	de	escravos414,
quando	 o	 proprietário	 do	 escravo	 o	 ofertava	 em	 uma	 casa	 de
comissões415.	 Efetuava-se	 a	 compra	 (com	 emissão	 do	 recibo	 de
pagamento),	sem	a	lavratura	da	escritura,	mas	de	uma	procuração416,
para	que	o	comerciante	(intermediário)	pudesse	apresentar	tal	escravo
em	outras	praças.
Esse	mesmo	escravo	era	oferecido	a	outro	comerciante	exportador,
que	 recebia	 um	 substabelecimento417	 da	 procuração	 original,
fornecendo	ao	escravo	um	passaporte418	e	enviando-o	para	a	província
do	 Rio	 de	 Janeiro419,	 por	 exemplo.	 Ao	 desembarcar,	 o	 escravo	 era
submetido	 à	 autoridade	 policial,	 remetido	 a	 um	grande	 comerciante,
que	 repassava	 para	 outros	 intermediários,	 em	 casas	 de	 comissões,
onde	seria	revendido	na	praça,	aos	destinatários	finais420.
Esse	 tráfico	 interprovincial	 foi	 excelente	 para	 as	 finanças
públicas421,	 pois	 pesados	 tributos	 passaram	 a	 incidir	 sobre	 tal
atividade	econômica,	por	sua	vez,	com	o	tempo,	esta	excessiva	carga
tributária	tornou	proibitivo	o	comércio	interprovincial	de	escravos	em
virtude	 dos	 impostos	 pagos	 tanto	 na	 operação	 de	 exportação	 do
escravo	quanto	na	de	importação422:
As	 restrições	 ao	 interprovincial	 multiplicavam-se.	 [...]
Na	Bahia,	já	em	1862,	taxava-se	em	200	mil-réis	a	saída
dos	escravos,	o	mesmo	sucedia	em	outras	províncias	do
Norte423.	Em	São	Paulo	Em	São	Paulo,	no	ano	de	1871,
a	Assembleia	Provincial	tributou	com	o	imposto	de	200
mil-réis	o	escravo	importado.	O	objetivo	era	embaraçar
a	entrada	de	escravos	na	província,	pois	começava-se	a
pensar	que,	enquanto	houvesse	escravidão,	não	haveria
emigração.	 [...]	 EmSão	 Paulo,	 voltou-se	 a	 insistir	 na
questão	 em	1880-1881,	 taxando-se	 finalmente	 em	dois
contos	a	transferência	de	escravos	procedentes	de	outras
províncias	 (Lei	 Provincial	 nº	 1,	 de	 2	 de	 janeiro	 de
1881)424.
Já	no	ano	de	1881,	devido	aos	impostos	incidindo	sobre	a	compra
e	 venda	 interprovincial	 de	 escravos,	 o	 tráfico	 interno	 estava
praticamente	 extinto	 425.	 A	 sua	 vedação	 somente	 veio	 a	 se
efetivamente	instituída	pelo	§	19,	do	art.	3º,	da	Lei	nº	3.270,	de	28	de
setembro	 de	 1885,	 com	 a	 proibição	 da	 alteração	 do	 domicílio	 do
escravo	que	importasse	em	transferência	para	outra	Província426.
Notas
204.	Malheiro,	 Agostinho	Marques	 Perdigão.	 A	 Escravidão	 no	 Brasil:	 ensaio
histórico-jurídico-social:	africanos,	v.	III.	Rio	de	Janeiro:	Typographia	Nacional,
1867,	p.	54.
205.	Boxer,	Charles	R.	O	 império	marítimo	português:	 1415-1825.	 São	Paulo:
Companhia	das	Letras,	2002,	p.	110-119.
206.	 Moura,	 Clóvis.	 Dicionário	 da	 Escravidão	 negra	 no	 Brasil.	 São	 Paulo:
Editora	da	USP,	2004,	p.	392.	Importantes	as	observações	de	Bethell,	Leslie.	A
abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão
do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,
p.	15.
207.	“O	 tráfico	não	 serviu	 senão	de	enriquecer	por	 esse	meio	a	 alguns	poucos
indivíduos,	com	grande	prejuízo	do	bem	geral,	e	também	da	fortuna	e	interesses
de	 particulares,	 dos	 quais	 muitos	 se	 arruinaram,	 quer	 dos	 que	 igualmente
empreenderam	tão	abominável	e	arriscada	especulação,	quer	os	consumidores	de
tão	 horripilante	 mercadoria,	 e	 com	 especialidade	 os	 fazendeiros	 e	 lavradores”
(Malheiro,	 Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A	 Escravidão	 no	 Brasil:	 ensaio
histórico-jurídico-social:	africanos.	Rio	de	Janeiro:	Typographia	Nacional,	1867,
p.	62).
208.	“[...]	os	traficantes	daqui	ou	da	costa	africana	foram	sempre	homens	ricos	e
poderosos,	capazes	de	improvisar	novos	meios	de	burlar	a	vigilância	inglesa	e	de
inventar	recursos	legais	como	esse	de	compra	de	navios	americanos,	ou	ilegais,
já	 que	 o	 tráfico	 foi	 um	 dos	 maiores	 negócios	 do	 Brasil	 durante	 os	 primeiros
cinquenta	anos	do	século	XIX”	(Moura,	Clóvis.	Dicionário	da	Escravidão	negra
no	Brasil.	São	Paulo:	Editora	da	USP,	2004,	p.	392).
209.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionista.	Rio	de	Janeiro:	Vozes,	1977,	p.	112-113.
210.	Alencastro,	 Luiz	 Felipe	 de.	O	Trato	 dos	Viventes:	 formação	 do	Brasil	 no
Atlântico	Sul.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2000,	p.	247ss	e	p.	353-354.
211.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionista.	Rio	de	Janeiro:	Vozes,	1977,	p.	108-109
e	Dugard,	Martin.	No	coração	da	África.	Rio	de	Janeiro:	Record,	2004,	p.	12.
212.	 “Para	 evitar	 confusões,	 os	mercadores	 da	 Costa	 dos	 Escravos	marcavam
seus	‘fardos’	com	ferro	quente,	como	se	faz	hoje	com	gado.	[...]	Cada	mercador
de	 escravo	 utiliza	 a	 sua	 própria	 marca;	 assim,	 quando	 o	 barco	 chega	 ao	 seu
destino,	é	possível	determinar	a	quem	pertencem	os	que	estão	mortos”	(Narloch,
Leandro.	 Achados	 e	 perdidos	 da	 história:	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Estação
Brasil,	2017,	p.	83-84).
213.	James,	Cyrill	Lionel	Robert.	Os	jacobinos	negros:	Toussaint	L’Ouverture	e
a	 revolução	de	São	Domingos.	Tradução	de	Afonso	Teixeira	Filho.	São	Paulo:
Bomtempo,	2010,	p.	22-23.
214.	 Luna,	 Luís.	 O	 Negro	 na	 Luta	 contra	 a	 Escravidão.	 Brasília:	 Editora
Cátedra,	 1976,	 p.	 25.	 Acerca	 da	 existência	 da	 escravidão	 nas	 sociedades
africanas	 e	 as	 suas	 diferenças	 em	 relação	 ao	 sistema	 de	 produção	 escravista
implantado	 no	 Novo	Mundo	 v.	 D’Amorim,	 Eduardo.	 África:	 essa	 mãe	 quase
desconhecida.	Recife,	Editora	Liber,	1996,	p.	52-55.
215.	 Um	 exemplo:	 “[...]	 o	 reino	 do	 Daomé	 tinha	 uma	 tradição	 escravista
centenária.	[...]	Ajudá	se	tornou	um	dos	mais	movimentados	portos	de	embarque
de	escravos	da	África.	Saíram	dali	pelo	menos	430	mil	prisioneiros,	o	que	 fez
daquele	porto	o	 terceiro	com	mais	embarques	em	toda	a	história	da	escravidão
africana,	 ficando	 atrás	 de	 Luanda,	 em	 Angola	 (1,4	 milhão	 de	 escravos
embarcados)	 e	 da	 Costa	 da	 Mina	 (648	 mil)”	 (Narloch,	 Leandro.	 Achados	 e
perdidos	da	história:	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Estação	Brasil,	2017,	p.	86).
216.	 Exemplo	 era	 o	 reino	 de	 Iorubá	 que,	 na	 atual	 Nigéria,	 havia	 montado
esquadrões	de	cavalarias	para	invadir	pequenas	vilas	de	inimigos	e	transformar
os	 derrotados	 em	 escravos	 (Narloch,	 Leandro.	Achado	 e	 perdidos	 da	 história:
escravos.	Rio	de	Janeiro:	Estação	Brasil,	2017,	p.	58).
217.	Ibidem,	p.	87.
218.	Ibidem,	p.	46.
219.	 “Ao	 norte	 do	 Benim,	 Oyó,	 reino	 dos	 Iorubás,	 atacava	 os	 vizinhos	 com
guerreiros	 a	 cavalo.	 Já	 o	Daomé	 era	 um	Estado	militarizado	 por	 excelência	 –
contava	até	com	tropas	de	mulheres	para	assaltar	povos	vizinhos,	escraviza-los
ou	 usá-los	 em	 rituais	 de	 sacrifício	 humano.	 [...]	 os	 reinos	 africanos
intensificaram	a	caça	de	escravos	entre	os	povos	vizinhos”	Ibidem,	p.	74-75).
220.	 “As	 caçadas	 de	 escravos	 garantiam	 o	 sustento	 dos	 guerreiros,	 senhores
locais,	nobres	e	do	rei.	Muitos	escravos	eram	trocados	por	dinheiro,	espingardas
e	pólvora	que	serviam	para	avançar	sobre	mais	territórios	e	caçar	mais	escravos”
Ibidem,	p.	87).
221.	 É	 o	 caso	 dos	 Jagas,	 que	 eram	 “[...]	 hordas	 de	 negros	 que,	 na	 África
caçavam	escravos,	agrupando-os	em	quilombos	[...]	Ali	aguardavam	a	chegada
de	agentes	comerciais	portugueses,	os	pombeiros,	para	vender	as	levas	conforme
o	 preço	 alcançado	 por	 cada	 uma”	 (Moura,	 Clóvis.	Dicionário	 da	 Escravidão
negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Editora	da	USP,	2004,	p.	224).
222.	“[...]	E	um	círculo	vicioso	se	formou,	cada	povo	se	fortificando	mais,	para
não	 perecer	 como	 escravo	 nas	 mão	 do	 Estado	 mais	 forte.	 [...]”	 (D’Amorim,
Eduardo.	África:	 essa	mãe	quase	desconhecida.	Recife:	Editora	Liber,	1996,	p.
49).
223.	Sobre	 as	 origens	 do	 tráfico,	 ver	Taunay,	Afonso	D’Escragnole.	 Subsídios
para	 a	 hisória	 do	 tráfico	 africano	 no	 Brasil	 colonial.	 In:	 Estudos	 sobre	 a
Escravidão	 Negra,	 v.	 1.	 Apresentação	 e	 organização	 Leonardo	 Dantas	 Silva.
Recife:	Ediutora	Massangana:	Fundaj,	1988,	p.	88-92.
224.	 O	 vocábulo	 abolição	 pode	 ser	 empregado	 tanto	 para	 indicar	 o	 fim	 da
existência	de	escravos	em	um	determinado	 território	quanto	para	 indicar	o	 fim
do	 tráfico	de	escravos.	Para	Macedo	Soares,	autor	do	Dicionário	Brasileiro	da
Língua	Portuguesa,	escrito	na	segunda	metade	do	século	XIX,	acerca	do	termo
abolição:	 “[...]	 termos	 novos,	 criados	 modernamente	 para	 exprimir	 ideias
relativas	 a	 medidas	 tendentes	 à	 extinção	 da	 escravidão.	 ‘Partido	 dos	 Estados
Unidos’	–	dizem	Littré	e	diversos.	Podiam	acrescentar	–	e	do	Brasil,	e	de	todos
os	 países	 onde	 se	 mantém,	 como	 instituição	 social,	 o	 abuso	 da	 escravatura,
sustentado	 pelo	 homem	 ladrão,	 locupletando-se	 com	 o	 suor	 da	 força,	 tolerada
pelos	governos	covardes,	em	benefício	de	sociedades	que	não	têm	noção	clara	de
justiça”	(Moraes,	Evaristo	de.	A	Campanha	Abolicionista:	1879-1888.	Brasília:
Editora	Universidade	de	Brasília,	1986,	p.	367).	No	Brasil,	no	século	XIX,	como
sinônimo	para	abolição	da	escravatura,	empregava-se	o	vocábulo	emancipação.
225.	“Em	 1761,	 a	 escravidão	 foi	 abolida	 no	 território	 português	 (e	 proibido	 o
transporte	 de	 negros	 para	 território	 fora	 do	 império	 português),	mas	 nada	 fez,
nem	 podia	 ser	 feito,	 para	 emancipar	 os	 escravos	 nos	 territórios	 ultramarinos
portugueses	ou	para	abolir	o	tráfico	de	escravos	pata	o	Brasil”	(Bethell,	Leslie.	A
abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão
do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,
p.	19.).
226.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	e	Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,p.	19.
227.	Entre	1750	e	1777,	quando	Sebastião	José	de	Carvalho	e	Melo,	o	marquês
de	 Pombal,	 foi	 nomeado	 ministro	 pelo	 monarca	 D.	 José	 I,	 então	 El-Rei	 de
Portugal	 (Azevedo,	 Jorge	 Duarte	 de.	 Portugal	 e	 Brasil:	 dos	 Afonsinos	 aos
Bragança.	Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	299-307).
228.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	23	e	Bandeira,	Visconde	de	Sá	da.	Escravatura	e
o	bill	de	lord	Palmerston.	Lisboa:	Typ.	De	José	Baptista	Morando,	1840,	p.	3.
229.	 A	 justificativa	 para	 a	 existência	 de	 tal	 diploma	 era	 simples:	 apesar	 da
abolição	 da	 escravidão	 e	 da	 proibição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 para	 as	 terras	 da
metrópole,	 em	 1761,	 a	 prática	 de	 manter-se	 negros	 escravos,	 bem	 como	 de
reputar	como	cativos	os	filhos	de	escravas	concubinas	perdurou.
230.	“Ao	ler	as	condições	para	que	a	emancipação	se	concretizasse,	entende-se
que	 esta	medida	 previa	 o	 fim	 gradual	 da	 escravidão	 em	Portugal,	 pois	 seriam
agraciados	automaticamente	apenas	os	escravos	de	quarta	geração.	Somente	no
futuro	esta	medida	tornar-se-ia	efetiva,	atingindo,	então,	todos	os	que	nascessem.
Note-se,	entretanto,	que	para	a	época	esta	medida	constituiu	algo	inusitado,	pois
a	 liberdade	 do	 ventre	 seria	 medida	 comum	 apenas	 ao	 longo	 do	 século	 XIX”
(Lima,	 Priscila	 de.	 De	 libertos	 a	 habilitados:	 interpretações	 populares	 dos
alvarás	 anti-escravistas	 na	América	portuguesa	 (1761-1810).	Curitiba,	 2011,	 p.
74).
231.	Lima,	 Priscila	 de.	De	 libertos	 a	 habilitados:	 interpretações	 populares	 dos
alvarás	 anti-escravistas	 na	América	portuguesa	 (1761-1810).	Curitiba,	 2011,	 p.
75.
232.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	15.
233.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	38-39.
234.	“O	visconde	do	Rio	Branco	disse	mesmo	no	Conselho	de	Estado,	antes	de
ler	 esse	 alvará,	 cujas	 palavras	 qualificou	 de	memoráveis,	 que	 a	 lei	 portuguesa
‘estendeu	esse	favor	(o	de	declará-los	livres	e	ingênuos)	aos	infantes	que	fossem
libertados	no	ato	de	batismo,	e	aos	libertos	que	se	achassem	em	certa	classe’,	e
acrescentou	–	‘o	que	não	se	poderia	fazer	entre	nós	sem	ferir	a	Constituição
do	Império’”	(Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,
p.	38-39,	grifo	nosso).
235.	“Nos	últimos	anos	do	século	XVIII	parecia	que	o	antiescravismo	chegara	a
seu	 limite	 na	 Inglaterra.	 [...]	 Na	Grã-Bretanha	 acontecera	 uma	 campanha	 sem
precedentes	contra	o	 tráfico	negreiro,	mas	ainda	em	1790	o	comércio	britânico
de	escravos	atingira	proporções	extraordinárias”	(Blackburn,	Robin.	A	queda	do
Escravismo	Colonial:	1776-1848.	Tradução	de	Maria	Beatriz	de	Medina.	Rio	de
Janeiro:	Record,	2002,	p.	174).
236.	“O	projeto	foi	aprovado	na	segunda	leitura	na	Câmara	dos	Lordes	por	cem
votos	 contra	 36	 [...]	 O	 projeto	 foi	 aprovado	 na	 Câmara	 dos	 Comuns	 por	 283
votos	 a	 16.	 Esta	 provação	 fez	 com	 que	 se	 tornasse	 ilegal	 que	 qualquer	 navio
britânico	participasse	do	comércio	atlântico	de	escravos	a	partir	de	1º	de	janeiro
de	 1808”	 (Blackburn,	 Robin.	 A	 queda	 do	 Escravismo	 Colonial:	 1776-1848.
Tradução	 de	Maria	Beatriz	 de	Medina.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Record,	 2002,	 p.	 335-
336).	 “A	 abolição	 da	 escravidão	 no	 império	 inglês	 [somente]	 foi	 aprovada	 no
Parlamento	britânico	em	1833.	A	lei,	que	entraria	em	vigor	a	partir	de	agosto	de
1834	 estipulava	 uma	 fase	 de	 transição	 do	 regime	 escravista	 para	 o	 livre,
chamada	de	aprendizagem,	em	que	os	trabalhadores,	ex-escravos,	se	submetiam
a	estrita	vigilância.	Prevista	para	durar	até	7	anos,	a	aprendizagem	foi	abolida	em
1838,	antes	do	prazo	final”	(Alencar,	José	de.	Cartas	a	favor	da	escravidão.	In:
Parron,	Tâmis	(org.).	São	Paulo:	Hedra,	2008,	p.	79).
237.	A	severa	Lei	penal	de	4	de	maio	de	1811	estabelecia	as	respectivas	sanções
(Moraes,	 Evaristo.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à	 extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	36).
238.	 “Pelos	 próximos	 doze	 anos,	 a	 Europa	 teria	 o	 cheiro	 acre	 de	 pólvora.	 As
guerras	 acabariam	 influenciando	 a	 maioria	 dos	 atos	 futuros	 de	 Napoleão,	 e
imporiam	 um	 selo	militar	 em	 seu	 governo”	 (Cronin,	 Vincent.	Napoleão:	 uma
vida.	Tradução	de	Anna	Lim	e	Lana	Lim.	Barueri:	Amarilys,	2013,	p.	239).
Para	 uma	 descrição	 do	 exército	 multinacional	 que	 invadiria	 a	 Rússia	 sob	 a
liderança	 de	Napoleão	 ver	Cronin,	Vincent.	Napoleão:	 uma	 vida.	 Tradução	 de
Anna	Lim	e	Lana	Lim.	Barueri:	Amarilys,	2013,	p.	312-314.
239.	Ibidem.
240.	“No	mar,	 entretanto,	 os	 franceses	 estavam	por	 essa	 época	 completamente
derrotados.	Após	a	batalha	de	Trafalgar	(1805),	qualquer	chance	não	apenas	de
invadir	a	Grã-Bretanha	pelo	Canal	da	Mancha,	como	também	de	manter	contatos
ultramarinos,	desapareceu.	O	único	modo	que	parecia	haver	para	derrotar	a	Grã-
Bretanha	era	a	pressão	econômica,	 e	 isto	Napoleão	 tentou	exercer	 eficazmente
através	 do	 Sistema	 Continental	 (1806)”	 (Hobsbawm,	 Eric	 J.	 A	 era	 das
revoluções:	 1789-1848.	 Tradução	 de	 Maria	 Tereza	 Lopes	 Teixeira	 e	 Marcos
Penchel.	Rio	de	Janeiro:	Paz	e	Terra,	1977,	p.	128).
241.	 “Artigo	 1º.	 As	 Ilhas	 Britânicas	 são	 declaradas	 em	 estado	 de	 bloqueio.
Artigo	 2º.	 Todo	 o	 comércio	 e	 correspondência	 com	 as	 ilhas	 britânicas	 são
proibidos.	Como	resultado,	cartas	ou	pacotes	endereçados	ou	Inglaterra,	ou	um
inglês,	 ou	 escritos	 em	 Inglês	 não	 terá	 aulas	 para	 cargos	 e	 serão	 apreendidos.
Artigo	 3º.	 Qualquer	 sujeito	 individual	 da	 Inglaterra,	 em	 qualquer	 estado	 ou
condição	 que	 possa	 ser,	 que	 será	 encontrado	 nos	 países	 ocupados	 por	 nossas
tropas,	 ou	os	 de	 nossos	 aliados,	 serão	 feitos	 prisioneiros	 de	 guerra.	Artigo	 4º.
Qualquer	loja	de	quaisquer	bens,	qualquer	propriedade	de	qualquer	tipo	que	seja,
pertencente	a	um	sujeito	da	 Inglaterra,	 será	declarado	prêmio	 legal.	Artigo	 5º.
Comércio	 de	mercadorias	 inglesas	 é	 proibida;	 e	 quaisquer	 bens	 pertencentes	 a
Inglaterra,	ou	a	partir	de	suas	fábricas	e	suas	colônias,	é	declarado	prêmio	legal.
Artigo	 6º.	 Metade	 dos	 recursos	 obtidos	 com	 a	 confiscação	 de	 bens	 e
propriedades	declaradas	jogo	justo	pelos	artigos	anteriores,	serão	utilizados	para
compensar	as	perdas	que	os	comerciantes	(que	experimentaram	tomando	navios
mercantes	foram	removidos	por	Inglês	cruzeiro.	Artigo	7º.	Nenhum	navio	vindo
diretamente	de	Inglaterra	ou	as	colônias	inglesas,	ou	ter	sido,	desde	a	publicação
do	 presente	 decreto,	 serão	 recebidos	 em	 qualquer	 porta.	Artigo	 8º.	Um	navio
que,	 por	 meio	 de	 uma	 declaração	 falsa,	 que	 violem	 o	 disposto	 no	 número
anterior	serão	apreendidas;	e	o	navio	de	carga	serão	confiscados	como	se	fossem
propriedade	Inglês	[...]”.
242.	 Bethell,	 Leslie.	 A	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil:	 a	 Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;
São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	20	e	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.
ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	7.
243.	 Juntamente	 com	 a	 elite	 da	Corte	 portuguesa,	 após	 a	 invasão	 de	 Portugal,
pelo	 exército	 francês,	 em	 18	 de	 outubro	 de	 1807,	 sob	 liderança	 do	 general
Andoche	Junot.	Zarpando	em	29	de	novembro	de	1807	da	embocadura	do	Tejo,
em	 Lisboa,	 uma	 esquadra	 com	 catorze	 embarcações,	 sob	 comando	 do	 vice-
almirante	Manuel	da	Cunha	Souto	Maior,	partiu,	levando	consigo	a	família	real	e
figuras	proeminentes	da	sociedade	lusitana	(Azevedo,	Jorge	Duarte	de.	Portugal
e	Brasil:	 dos	Afonsinos	 aos	Bragança.	Brasília:	Senado	Federal,	 2008,	p.	 325-
327).
244.	O	vice-reino	do	Brasil	foi	elevado	posteriormente,	por	ato	de	D.	João	VI,	à
Reino	Unido	ao	de	Portugal	e	Algarves,	em	16	de	dezembro	de	1815.	(Vianna,
Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	43).
“Embora	 não	 seja	 conhecido	 acto	 normativo	 que	 eleve	 o	 Brasil	 a	 Vice-reino,
normalmente	 este	 estatuto	 da	 colónia	 surge	 associado	 ao	 espaço	 de	 tempo	 em
que	 foi	 dado	 o	 título	 de	 Vice-rei	 ao	 representante	 máximo	 da	 Coroa	 naquele
território”	(Marcelino,	Maria	da	Graça	dos	Santos.	O	esclarecido	vice-reinado	de
D.	 Luís	 de	 Almeida	 Portugal,	 2º	Marquês	 do	 Lavradio:	 Rio	 de	 Janeiro	 1769-
1779.	Lisboa,	2009,	p.	29).
245.	 O	 mesmo	 comandante	 das	 forças	 britânicas	 em	 Waterloo,	 que	 derrotou
Napoleão	e	o	exército	francês	(Cronin,	Vicent.	Napoleão:	uma	vida.	Tradução	de
Anna	Lim	e	Lana	Lim.	Barueri:	Amarilys,	2013,	p.	265).
246.	 Bethell,	 Leslie.	 A	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil:	 a	 Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;
São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	21.
247.	 Bandeira,	 Visconde	 de	 Sá	 da.	 Escravatura	 e	 o	 bill	 de	 lord	 Palmerston.
Lisboa:	Typ.	de	José	Baptista	Morando,	1840,	p.	9-10.
248.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	 e	 Cultura;	 São	 Paulo:	 Editora	 da	 USP,	 1976,	 p.	 21-22	 e	 Moraes,
Evaristo.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à	 extinção.	 Brasília:
Editora	UnB,	1988,	p.	27.
249.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	e	Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,	p.	22.
250.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	 Editora	 UnB,	 1988,	 p.	 28.	 Muito	 antes	 houve	 outra	 inútil	 tentativa
legislativa	para	humanizar	o	tráfico	de	escravos,	pelo	Alvará	de	18	de	março	de
1684	 (Moura,	 Clóvis.	Dicionário	 da	 Escravidão	 negra	 no	 Brasil.	 São	 Paulo:
Editora	da	USP,	2004,	p.	287).
251.	 Tais	 importantes	 trabalhos	 estariam	 relacionados	 à	 abertura	 de
comunicações	interiores,	seja	por	terra,	como	pelos	rios,	entre	essa	Capital	e	as
diferentes	 Capitanias	 do	 Império;	 ao	 desenvolvimento	 da	 agricultura;	 a
ampliação	das	plantações	de	cânhamos,	de	especiarias	e	de	outros	gêneros	“de
grande	 importância	 e	 de	 conhecida	 utilidade,	 assim	 para	 o	 consumo	 interno,
como	 para	 exportação”;	 o	 estabelecimento	 de	 fábricas	 autorizadas	 por	 lei;	 a
exploração	e	extração	dos	preciosos	produtos	dos	reinos	mineral	e	vegetal.
252.	 Determinando	 “que	 tão	 bárbaro	 invento	 mais	 se	 não	 pratique,	 devendo
substituir-se	por	uma	manilha	ou	coleira,	em	que	se	grave	a	marca	que	haja	de
servir	de	distintivo”.
253.	Por	aplicação	da	pena	prevista	na	Ordenação	do	Liv.	5º,	tit.	36,	§	1º.
254.	 Entre	 5%	 a	 10%	 da	 carga	 (Narloch,	 Leandro.	 Achado	 e	 perdidos	 da
história:	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Estação	 Brasil,	 2017,	 p.	 65).	 Para	 mais
detalhes	sobre	variações	acerca	dessa	mortalidade	em	Ribeiro,	Alexandre	Vieira.
Perdas	 em	 trânsito:	 mortalidade	 escrava	 na	 travessia	 Atlântica.	 In:	 XXVI
Simpósio	 Nacional	 de	 História	 –	 ANPUH.	 Anais.	 São	 Paulo,	 julho	 2011,
disponível	em:	<https://goo.gl/vVE4E6>.	Acesso	em:	23	dez.	2017.	Entretanto,
segundo	Moura:	“Na	travessia,	era	enorme	a	mortalidade,	de	tal	modo	que	não
se	pode	fazer	um	cálculo	exato	do	seu	montante”	(Moura,	Clóvis.	Dicionário	da
Escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Editora	da	USP,	2004,	p.	287).
255.	Aprovados	 e	 examinados	 em	 terra	 na	 presença	 do	Delegado	 do	 Physico-
Mor	do	Reino	ou	pelos	responsáveis	sanitários	do	navio.
256.	 “Sendo	 a	 falta	 de	 uma	 suficiente	 porção	 de	 agua	 a	 que	 mais	 custa	 a
suportar,	 principalmente	 a	 bordo	 dos	 navios	 sobrecarregados	 de	 passageiros,	 e
enquanto	 se	não	afastam	das	adustas	Costas	de	África;	 e	 tendo-se	 reconhecido
que	 de	 uma	 tal	 falta	 resultam	 ordinariamente	 as	 moléstias	 e	 a	 morte	 de	 um
grande	 número	 de	 negros,	 vítimas	 da	 inumanidade	 e	 avidez	 dos	 Mestres	 das
embarcações;	 determino	 que	 a	 aguada	 haja	 de	 regular-se	 na	 razão	 de	 duas
canadas	 por	 cabeça	 em	 cada	 um	 dia,	 assim	 para	 beber	 como	 para	 a	 cozinha,
regulando-se	as	viagens	dos	portos	de	Angola,	Benguela	e	Cabinda,	para	este	do
Rio	de	Janeiro	a	50	dias	,	daqueles	mesmos	portos	para	a	Bahia	e	Pernambuco	de
35	 a	 40	 dias	 ,	 e	 de	 três	 meses	 quando	 o	 navio	 venha	 de	Moçambique;	 e	 da
sobredita	porção	de	agua	se	deverá	fornecer	a	cada	indivíduo	impreterivelmente
uma	canada	por	dia	para	beber;	a	saber,	meia	canada	ao	jantar	e	meia	canada	a
ceia;	e	querendo	que	mais	se	não	pratique	a	barbaridade	com	que	se	procedia	na
distribuição	da	agua,	chegando	a	inumanidade	ao	ponto	de	espancar	aqueles	que,
mais	 aflitos	 pela	 sede,	 vinham	 mui	 apressadamente	 saciar-se;	 determino	 que,
conservando-se	 a	 pratica	 estabelecida	 para	 a	 comida	 dos	 negros,	 dividindo-se
estes	em	ranchos	de	10	cada	um,	 se	 forneça	 semelhantemente	a	cada	 rancho	a
porção	 da	 agua	 que	 lhe	 toca,	 a	 razão	 de	 meia	 canada	 por	 cabeça,	 assim	 de
madeira	ou	cassengos,	que	contenha	cinco	canadas	de	agua”.
257.	 “Embarcação	 construída	 especialmente	 para	 o	 transporte	 dos	 africanos
escravos	 da	 África	 para	 o	 Brasil.	 O	 nome	 originou-se,	 evidentemente,	 do
vocábulo	 ‘tumba’	 (sepultura),	 devido	 ao	 avultado	 número	 de	mortes	 durante	 a
travessia.	 Daí	 também	 a	 denominação	 de	 túmulos	 flutuantes”	 (Moura,	 Clóvis.
Dicionário	da	Escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Editora	da	USP,	2004,	p.
404).
258.	 Em	 1823,	 houve	 um	 levante	 de	 escravos	 em	 um	 tumbeiro,	 que	 estava
carregando	negros	Macuas	 (etnia	majoritária	 de	Moçambique).	A	grande	parte
da	tripulação	branca	foi	jogada	ao	mar	ou	foram	mortos,	após	luta	corporal,	na
qual	 os	 negros	 utilizaram	 o	 que	 encontraram	 na	 embarcação	 para	 lutar.	 A
embarcação	 atracou	 na	Bahia.	A	 razão	 dessa	 sangrenta	 rebelião	 era	 de	 que	 os
negros	transportados	tinham	um	imenso	pavor	de	que	os	brancos	praticassem	o
canibalismo,	 devorando-os,	 logo	que	desembarcassem	no	Brasil	 (Goulart,	 José
Alípio.	Da	fuga	ao	suicídio:	aspectos	da	rebeldia	dos	escravos	no	Brasil.	Rio	de
Janeiro:	 Conquista,	 1972,	 p.	 149-150).	 “Boatos	 de	 canibalismo	 nos	 navios
negreiros	se	difundiam	tanto	na	África	quanto	na	América.	Chefes	africanos	se
aproveitavam	do	temor	dos	escravos	para	ameaça-los:	se	não	se	comportassem,
seriam	 vendidos	 para	 os	 ‘europeus	 canibais’.	 [...]	 A	 suspeita	 de	 canibalismo
motivava	suicídios,	revoltas	e	greves	de	fome	[...]”	(Narloch,	Leandro.	Achado	e
perdidos	da	história:	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Estação	Brasil,	2017,	p.	99-100).
259.	James,	Cyrill	Lionel	Robert.	Os	jacobinos	negros:	Toussaint	L’Ouverture	e
a	 revolução	de	São	Domingos.	Tradução	de	Afonso	Teixeira	Filho.	São	Paulo:
Bomtempo,	2010,	p.	22-23.
260.	 Nabuco,	 Joaquim.	O	Abolicionista.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Vozes,	 1977,	 p.	 109.
“Os	 navios	 negreiros	 variavam	 muito	 de	 modelo	 e	 capacidade.	 Alguns
carregavam	 até	 mais	 de	 seiscentos	 escravos,	 outros,	 menos	 de	 sessenta”
(Narloch,	 Leandro.	 Achado	 e	 perdidos	 da	 história:	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:
Estação	Brasil,	2017,	p.	98).	Segundo	Pinsky,	a	viagem	normal	entre	Angola	e
Recife	demorava	por	volta	de	35	dias.	Para	o	Rio	de	Janeiro,	aproximadamente
50	dias.	Se	houvesse	calmarias	poderia	a	demorar	até	6	meses.	Havia	tumbeiros
que	chegavam	a	transportar	700	escravos	(Pinsky,	Jaime.	Escravidão	no	Brasil.
São	Paulo:	Global,	1981,	p.	27).
261.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à
extinção.	 Brasília:	 Editora	 UnB,	 1988,	 p.	 30	 e	 Freitas,	 Décio.	 Escravidão	 de
índios	e	negros	no	Brasil.	Porto	Alegre:	EST/ICP,	1980,	p.	30-35.
262.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	e	Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,	p.	26.
263.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:Expressão	e	Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,	p.	30-31.
264.	“A	28	 de	 julho	 de	 1817,	 após	 um	grande	 receio	 e	 hesitação,	 o	Conde	 de
Palmella,	à	época	embaixador	de	Portugal	em	Londres,	foi	forçado	a	assinar	uma
Convenção	Adicional	ao	tratado	de	1815.	Definia	mais	precisamente	a	parte	do
tráfico	português	de	escravos	que	permaneceria	legal,	ou	seja,	o	tráfico	feito	em
barcos	 lusos	 entre	 portos	 dentro	 dos	 domínios	 da	 coroa	 portuguesa	 ao	 sul	 do
equador	 e	 território	 português	 no	 litoral	 africano,	 ao	 sul	 da	 linha”	 (Bethell,
Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:	Expressão	e
Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,	p.	30-31).	Para	a	íntegra	do	referido
diploma,	 ver	 Freitas,	 Décio.	 Escravidão	 de	 índios	 e	 negros	 no	 Brasil.	 Porto
Alegre:	EST/ICP,	1980,	p.	36-43.
265.	Nos	 termos	do	art.	2º	desse	Tratado:	“Não	poderia	ser	visitado	ou	detido,
debaixo	de	qualquer	pretexto	ou	motivo,	navio	 algum	mercante	ou	 empregado
no	 comércio	 de	 negros,	 enquanto	 estivesse	 dentro	 de	 um	 porto	 ou	 enseada
pertencente	 a	 uma	 das	 duas	 altas	 partes	 contratantes,	 ou	 ao	 alcance	 de	 tiro	 de
peças	 das	 baterias	 [canhões]	 de	 terra...”	 (Moraes,	 Evaristo.	 A	 escravidão
africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	38).
Entretanto,	 não	 raro,	 a	 Inglaterra	 não	 respeitava	 tais	 limites	 para	 exercício	 do
direito	de	visita,	o	que	acarretou	vários	incidentes	diplomáticos	entre	os	países.
266.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à
extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	30.
267.	Ibidem.	p.	30.
268.	Ibidem,	1988,	p.	28.
269.	“Como,	 porém,	 não	 demorou	 a	 ficar	 claro,	 o	 fato	 de	 os	 navios	 negreiros
ficarem	 livres	 de	 qualquer	 interferência	 até	 o	 momento	 em	 que	 embarcassem
escravos,	constituía	a	maior	fraqueza	dos	tratados	do	direito	de	busca”	(Bethell,
Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o	Brasil	e	a
questão	 do	 tráfico	 de	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Expressão;	 São	 Paulo:	 Ed.	 da
USP,	1976,	p.	35).
270.	“Menos	de	um	ano	após	a	 família	 real	deixar	Lisboa	a	 cidade	 libertou-se
das	mãos	dos	franceses	e	em	meados	de	1812	tornara-se	politicamente	viável	o
retorno	da	Corte	portuguesa”	(Azevedo,	Jorge	Duarte	de.	Portugal	e	Brasil:	dos
Afonsinos	aos	Bragança.	Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	328).
271.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	p.	42-43.
272.	 Bethell,	 Leslie.	 A	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil:	 a	 Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;
São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	39.
273.	Azevedo,	Jorge	Duarte	de.	Portugal	e	Brasil:	dos	Afonsinos	aos	Bragança.
Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	348.
274.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	p.	43.
275.	Ibidem,	p.	43.
276.	Azevedo,	Jorge	Duarte	de.	Portugal	e	Brasil:	dos	Afonsinos	aos	Bragança.
Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	366-367.
277.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	p.	43.
278.	Ibidem.
279.	 “A	 independência	 do	 Brasil	 foi	 essencialmente	 o	 resultado	 da	 tentativa
desesperada,	por	parte	de	Portugal	e	durante	os	anos	de	1821-1822,	logo	a	seguir
ao	retorno	de	D.	João	a	Lisboa,	após	uma	ausência	de	treze	anos,	de	retroceder	o
tempo	 e	 reduzir	 o	 Brasil,	 política	 e	 economicamente,	 à	 sua	 antiga	 condição
colonial”	 (Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	 tráfico	de	 escravos	no	Brasil:	 a	Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;
São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	38).
280.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	 p.	 43	 e	Godoy,	Arnaldo	 Sampaio	 de	Moraes.	História	 da	 tributação	 no
período	joanino	(Brasil	–	1808	–	1821).	Brasília:	Esaf,	2008,	p.	20-21.
281.	 “Afinal	 chegaram	 as	 Cortes	 e	 a	 Regência	 do	 Brasil	 a	 uma	 situação	 de
verdadeiro	 rompimento.	 Um	 projeto,	 longamente	 discutido,	 declarava	 nula	 a
convocação	 de	 uma	 Assembleia	 Constituinte	 e	 Legislativa	 para	 o	 Brasil,
decretada	 pelo	 Príncipe	 a	 3	 de	 junho;	 responsáveis	 por	 isso	 seriam	 os	 seus
ministros;	 sendo	 ilegal	 o	 seu	 governo,	 não	 lhe	 deveriam	 obedecer,	 nem	 os
militares,	 nem	 os	 funcionários	 públicos;	 enfim,	 deveria	 D.	 Pedro	 regressar	 a
Portugal	 dentro	 de	 quatro	 meses,	 sob	 pena	 de	 incidir	 nos	 dispositivos
constitucionais”	 (Vianna,	 Hélio.	 História	 do	 Brasil,	 v.	 2.	 6.	 ed.	 São	 Paulo:
Melhoramentos,	1967,	p.	51).
282.	 Em	 26	 de	 abril	 de	 1821	 (Lima,	Manoel	 de	 Oliveira.	Pernambuco	 e	 seu
desenvolvimento	histórico.	Recife:	Fundaj/Editora	Massangana,	1997,	p.	273).
283.	 Caetano,	 Marcelo.	 Direito	 Constitucional,	 v.	 I.	 Prefácio	 do	 Ministro
Aliomar	 Baleeiro.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Forense,	 1977,	 p.	 483	 e	 Lima,	 Manoel	 de
Oliveira.	Pernambuco	 e	 seu	 desenvolvimento	 histórico.	 Recife:	 Fundaj/Editora
Massangana,	1997,	p.	266.
284.	 Caetano,	 Marcelo.	 Direito	 Constitucional,	 v.	 I.	 Prefácio	 do	 Ministro
Aliomar	Baleeiro.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1977,	p.	485-489.
285.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	p.	46-51.
286.	Ibidem,	p.	60.
287.	“Deixado	no	Rio	de	Janeiro	como	príncipe	regente,	o	filho	mais	velho	de	D.
João,	 D.	 Pedro,	 então	 com	 24	 anos,	 preferiu	 liderar	 a	 ser	 esmagado	 pelo
crescente	movimento	pró-independência”	(Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico
de	 escravos	 no	 Brasil:	 a	 Grã-Bretanha,	 o	 Brasil	 e	 a	 questão	 do	 tráfico	 de
escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	39).
288.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	p.	60.
289.	 Já	 que	 não	 mais	 existia	 fundamento	 para	 que	 a	 Coroa	 portuguesa
mantivesse	 o	 tráfico,	 que,	 segundo	o	 discurso	 oficial,	 apenas	 se	 realizava	para
permitir	o	desenvolvimento	da	sua	principal	colônia,	o	Brasil	(Bethell,	Leslie.	A
abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão
do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,
p.	39-40).
290.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	e	Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,	p.	40,	grifo	nosso.
291.	“A	importação	anual	de	escravos	para	o	Brasil	aumentava	de	15	a	20	mil,
no	 início	 do	 século,	 para	 30	 mil,	 no	 princípio	 da	 década	 de	 1820”	 (Bethell,
Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o	Brasil	e	a
questão	 do	 tráfico	 de	 escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Expressão;	 São	 Paulo:	 Ed.	 da
USP,	1976,	p.	52).
292.	Ibidem,	p.	73.
293.	“Em	troca	do	reconhecimento	da	independência	do	Brasil,	a	Grã-Bretanha
obtinha	 a	 consolidação	 de	 uma	 posição	 econômica	 altamente	 privilegiada,	 no
Brasil,	juntamente	com	o	compromisso,	do	governo	brasileiro,	de	abolir	o	tráfico
de	escravos	em	1830”.	Ibidem,	p.	70).	Tal	tratado	fora	assinado	quando	D.	Pedro
estava	a	bordo	de	um	navio	de	guerra	que	zarpava	do	Rio	de	Janeiro	com	destino
ao	Rio	Grande	do	Sul.	Ibidem,	p.	69).
294.	 Ratificado	 em	 13	 de	 março	 de	 1827,	 previa	 que	 o	 tráfico	 de	 escravos
africanos	 na	 costa	 brasileira	 deveria	 ser	 extinto	 em	 até	 três	 anos,	 ou	 seja,	 em
1830	 (Moura,	 Clóvis.	 Dicionário	 da	 Escravidão	 negra	 no	 Brasil.	 São	 Paulo:
Editora	da	USP,	2004,	p.	241).
295.	 “É	 preciso	 enfatizar	 a	 diferença	 entre	 o	 corsário	 e	 o	 pirata	 comum,	 o
filibusteiro	 ou	 bucaneiro,	 como	 eram	 chamados	 no	 Caribe.	 O	 pirata	 era	 um
criminoso	 também	 em	 sua	 própria	 Nação,	 perseguido	 pela	 Marinha,	 o	 que
resultava	 muitas	 vezes	 de	 não	 poderem	 mais	 habitar	 sua	 terra	 natal.	 [...]	 Por
outro	 lado,	 o	 corsárioera	 considerado	 um	 vassalo	 fiel	 do	 reino	 a	 que	 servia.
Vivia	em	sua	própria	pátria,	possuindo	propriedades	e,	não	raro,	era	elevado	ao
status	de	fidalgo	ou	cavaleiro	[...]”,	pois	os	corsários	eram	“piratas	reconhecidos
por	 um	Estado	 e	 autorizados	 a	 pilhar	 navios	 das	Nações	 rivais.	Nesse	 caso,	 o
butim,	 o	 resultado	 do	 assalto	 aos	 navios,	 seria	 dividido	 entre	 o	 corsário	 e	 o
Estado	contratante”	(Silva,	Kalina	Vanderlei;	Silva,	Maciel	Henrique.	Dicionário
de	Conceitos	Históricos.	São	Paulo:	Contexto,	2010,	p.	329).
296.	“Ao	direito	de	visita,	e	busca,	em	tempo	de	paz,	nas	embarcações	suspeitas
do	trafego,	anexou-se	ainda	a	exorbitante	concessão,	de	que	falamos;	como	se	o
trafego	de	escravos	pudesse	ser	equiparado	ao	roubo	no	mar,	como	e	esse	tráfego
ameaçasse,	porventura,	o	comércio	marítimo	de	todos	os	povos,	da	mesma	forma
que	 a	 pirataria!”	 (Pinto,	 Antônio	 Pereira.	 Apontamentos	 para	 o	 Direito
Internacional.	Rio	de	Janeiro:	F.	L.	Pinto	&	Cia	Livreiro	e	Editores,	1864,	t.	I,	p.
348).
297.	 Bethell,	 Leslie.	 A	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil:	 a	 Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	p.	69.	“O	artigo	primeiro
do	tratado	de	1826	[...]	obrigava	as	autoridades	brasileiras,	e	apenas	elas,	a	tratar
os	 negreiros	 brasileiros	 como	 piratas;	 não	 conferia	 à	 Grã-Bretanha	 quaisquer
direitos	 sobre	 súditos	 brasileiros	 ou	 seus	 navios:	 ‘a	 intervenção	 do	 governo
britânico...	 é	 limitada	 ao	 direito	 de	 exigir	 do	 governo	 imperial	 uma	 exata	 e
pontual	observância	do	tratado	e	nada	mais’”	Ibidem,	p.	257).
298.	“Art.	 2º:	Sua	Majestade,	 o	 imperador	do	Brasil,	 e	 sua	majestade	o	 rei	 do
Reino	 Unido	 da	 Grã-Bretanha	 e	 Irlanda,	 julgando	 necessário	 declararem	 as
obrigações	 pelas	 quais	 se	 acham	 ligados	 para	 regular	 o	 dito	 comércio	 até	 o
tempo	 da	 sua	 abolição	 final,	 concordam	 por	 isso	mutuamente	 em	 adotarem,	 e
renovarem	tão	eficazmente,	como	se	fossem	inseridos	palavra	por	palavra	nesta
convenção,	 todos	 os	 artigos	 e	 disposições	 dos	 tratados	 concluídos	 entre	 sua
majestade	britânica	e	El-Rei	de	Portugal	sobre	este	assunto	em	22	de	janeiro	de
1815,	e	28	de	julho	de	1817,	e	os	vários	artigos	explicativos	que	lhes	têm	sido
adicionados.
Art.	3º:	As	altas	partes	contratantes	concordam	mais	em	que	todas	as	matérias	e
cousas	 nos	 ditos	 tratados	 conteúdos	 assim	 como	 as	 instruções	 e	 regulações,	 e
formas	 de	 instrumentos	 anexos	 ao	 tratado	 de	 28	 de	 julho	 de	 1817,	 sejam
aplicadas	mutatis	mutandis	às	ditas	altas	partes	contratantes,	e	seus	súditos,	 tão
eficazmente,	como	se	fossem	aqui	repetidas	palavra	por	palavra,	confirmando	e
aprovando	 por	 este	 ato	 tudo	 o	 que	 foi	 feito	 pelos	 seus	 respectivos	 súditos	 em
conformidade	dos	ditos	tratados,	e	em	observância	deles”	(Brasil.	A	Abolição	no
parlamento.	Brasília:	Senado,	2012,	p.	55).
299.	 Essa	 convenção	 foi	 questionada	 perante	 o	 parlamento	 brasileiro	 sob	 a
alegação	de	que	somente	ao	Poder	Legislativo	competia	estabelecer	penalidades
(art.	15,	VIII	 c/c	 art.	 179,	XI,	da	Constituição	de	1824),	não	 tendo	atribuições
para	 tanto	 o	 Poder	 Executivo	 (Estrada,	 Osório	 Duque.	 A	 Abolição.	 Brasília:
Edições	do	Senado	Federal,	2005,	p.	31).	São	Vicente	fundamenta	as	razões	para
apreciação	 dos	 tratados	 pelo	 Poder	 Legislativo:	 “Se	 um	 tratado	 de	 aliança	 se
estipularem	 cláusulas	 que	 estabeleçam	 prestações	 do	 Tesouro	 Nacional,	 estas
não	 produzirão	 direitos	 e	 obrigações	 senão	 depois	 de	 aprovadas	 pelo	 poder
legislativo,	 porquanto	 pela	 Constituição	 e	 só	 a	 este	 compete	 exclusivamente
autorizar	 despesas	 públicas,	 e	 porque	 as	 atribuições	 do	 poder	 executivo	 não
derrogam	as	do	legislativo,	antes	sim	entendem-se	em	harmonia.	[...]	Se	a	título
de	celebrar	tratados	fosse	permitido	tal	abuso,	então	o	poder	executivo	se	erigiria
em	 supremo	 ditador:	 poderia	 por	 este	 meio	 alterar	 toda	 a	 Constituição	 e	 leis
nacionais,	pactuar	por	exemplo	a	 intolerância	religiosa,	suprimir	a	 liberdade	de
imprensa,	alterar	o	sistema	de	impostos,	de	heranças,	enfim	anular	as	instituições
e	os	outros	poderes	políticos”	 (Bueno,	 José	Antônio	Pimenta.	Marquês	de	São
Vicente.	 Organização	 e	 introdução	 de	 Eduardo	 Kugelmas.	 São	 Paulo:	 Ed.	 34,
2002,	p.	326-327).
300.	Muitos	 parlamentares,	 quando	 da	 rejeição	 de	 tal	 tratado	 na	 Assembleia,
alegaram	 que	 somente	 competia	 ao	 Poder	 Legislativo	 estabelecer	 penalidades.
(Estrada,	Osório	Duque.	A	Abolição.	Brasília:	Edições	do	Senado	Federal,	2005,
p.	 33).	O	 Imperador,	mesmo	 após	 a	Constituição	 de	 1824,	 passou	 a	 introduzir
diretamente,	 no	 ordenamento	 jurídico	 brasileiro,	 os	 tratados	 internacionais
firmados	por	ele	ou	pelos	 representantes	 imperiais,	por	meio	de	Cartas	de	Lei,
que	eram	espécies	legislativas	por	ele	editadas	e	que	prescindiam	da	deliberação
da	Assembleia	Geral.
301.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	 e	Cultura;	 São	 Paulo:	 Editora	 da	USP,	 1976,	 p.	 74.	As	 ratificações
foram	trocadas,	em	Londres,	aos	13	de	março	de	1827.
302.	Ibidem,	p.	73.
303.	“Em	mais	de	uma	ocasião,	a	revolta	suscitada	pela	violência	dos	cruzeiros
ingleses	 de	 repressão,	 que	 chegavam	 a	 apresar	 navios	 brasileiros	 dentro	 dos
nossos	portos,	pôde	fortalecer	de	algum	modo	a	corrente	de	opinião	favorável	ao
prosseguimento	do	 tráfico,	 fazendo	apelo	aos	sentimentos	patrióticos	do	povo”
(Holanda,	 Sérgio	 Buarque	 de.	 Raízes	 do	 Brasil.	 Rio	 de	 Janeiro:	 J.	 Olympio,
1978,	p.	43).
304.	Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil.	Rio	de	Janeiro:
Expressão	e	Cultura;	São	Paulo:	Editora	da	USP,	1976,	p.	73-74.
305.	Ibidem,	p.	73.
306.	Acerca	 da	 impulsiva	 personalidade	 de	D.	 Pedro	 I	 ver	 Lustosa,	 Isabel.	D.
Pedro	I:	um	herói	sem	nenhum	caráter.	São	Paulo:	Cia	das	Letras,	2006,	p.	20-
21.
307.	Sobre	as	causas	que	deflagraram	esse	episódio	político	ver	Azevedo,	Jorge
Duarte	 de.	 Portugal	 e	 Brasil:	 dos	 Afonsinos	 aos	 Bragança.	 Brasília:	 Senado
Federal,	2008,	p.	435-438.
308.	Sousa.	Octávio	Tarquínio	de.	A	vida	de	D.	Pedro	I.	Rio	de	Janeiro:	Livraria
J.	Olympio,	1972,	t.	III,	p.	114.
309.	Sousa.	Octávio	Tarquínio	de.	A	vida	de	D.	Pedro	I.	Rio	de	Janeiro:	Livraria
J.	Olympio,	1972,	t.	III,	p.	928.
310.	Nas	palavras	de	D.	Pedro	I:	“A	todo	custo,	até	arriscando	a	vida,	se	preciso
for,	desempenharei	o	título,	com	que	os	povos	deste	vasto	e	rico	continente	em
13	 de	 maio	 do	 ano	 pretérito,	 me	 honraram	 de	Defensor	 Perpetuo	 do	 Brasil”
(Brasil.	Falas	do	Trono:	do	ano	de	1823	até	o	ano	de	1889.	Org.	Barão	de	Javari.
Rio	de	Janeiro:	Imprensa	Nacional,	1889,	p.	14).
311.	 “Muito	 mais	 do	 que	 o	 produto	 de	 um	 simples	 arranjo	 das	 leites,	 a
sintomaticamente	 chamada	 Revolução	 do	 7	 de	 abril	 foi	 resultado	 não	 só	 das
tramas	 urdidas	 na	 imprensa,	 no	 Parlamento,	 nas	 sociedades	 secretas	 e	 nos
quartéis,	mas	também	da	forte	pressão	popular;	participação	essa	manifesta	nos
frequentes	movimentos	de	protesto	envolvendo	até	centenas	de	pessoas	,	que	se
multiplicavam	 pelas	 ruas	 da	 corte	 no	mês	 de	março	 e	 na	 primeira	 semana	 de
abril,	e	que	culminaram	na	grande	mobilização	do	dia	6,	 reunindo	nada	menos
do	que	cerca	de	quatro	mil	pessoas”	(Basile,	Marcelo.	O	laboratório	da	nação:	a
era	regencial	(1831-1840).	In:	Grinberg,	Keila;	Salles,	Ricardo	(orgs.).	O	Brasil
Imperial,	v.	II	–	1831-1840.	Rio	de	Janeiro:	Civilização	Brasileira,	2011,	p.	59).
312.	Havia	 apenas	 26	 senadores	 e	 36	 deputados	 na	Casa,	 no	 dia	 da	 abdicação
(Porto,	 Costa.	 O	 marquês	 de	 Olinda	 e	 o	 seu	 tempo.	 Recife:	 UFPE/Editora
Universitária,	1976,	p.	104).
313.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil,	v.	2.	6.	ed.	São	Paulo:	Melhoramentos,
1967,	p.	104.
314.	“Art.	18.	A	Sessão	 Imperial	de	abertura	será	 todos	os	anosno	dia	 três	de
maio”	(Constituição	de	1824).
315.	Art.	15,	II,	da	Constituição	de	1824.
316.	Art.	47,	IV	c/c	arts.	121	e	122,	da	Constituição	de	1824.	(Porto,	Costa.	O
marquês	de	Olinda	e	o	seu	tempo.	Recife:	UFPE/Editora	Universitária,	1976,	p.
104).
317.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil:	monarquia	e	 república,	v.	 II.	6.	ed.	São
Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	104.
318.	Lustosa,	Isabel.	D.	Pedro	I:	um	herói	sem	nenhum	caráter.	São	Paulo:	Cia
das	Letras,	2006,	p.	219.
319.	Porto,	Costa.	O	marquês	de	Olinda	e	o	 seu	 tempo.	Recife:	UFPE/Editora
Universitária,	1976,	p.	104.	A	princesa	D.	Januária	tinha	9	anos	de	idade.	(Porto,
Costa.	O	marquês	de	Olinda	e	o	seu	tempo.	Recife:	UFPE/Editora	Universitária,
1976,	p.	104).
320.	Porto,	Costa.	Os	tempos	da	Praieira.	Recife:	Fundação	de	Cultura	Cidade
do	Recife,	1981,	p.	10.
321.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil:	monarquia	e	 república,	v.	 II.	6.	ed.	São
Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	104-105.
322.	“Augustos	e	Digníssimos	Senhores	Representantes	da	Nação.	Participo-vos,
Senhores,	que	no	dia	sete	do	corrente	abril,	usando	do	direito	que	a	Constituição
me	concede,	no	capítulo	V,	art.	130,	nomeei	tutor	de	mus	amados	filhos	ao	muito
probo,	honrado	e	patriótico	cidadão,	o	meu	verdadeiro	amigo	José	Bonifácio	de
Andrada	 e	 Silva.	 Não	 vos	 hei,	 Senhores,	 feito	 esta	 participação,	 logo	 que	 a
Augusta	Assembleia	 Geral	 principiou	 seus	 importantíssimos	 trabalhos,	 porque
era	mister	que	o	meu	amigo	fosse	primeiramente	consultado,	e	que	respondesse
favoravelmente,	como	acaba	de	fazer,	dando-me	deste	modo	mais	uma	prova	de
sua	amizade:	resta-me	agora	como	pai,	como	amigo	de	minha	pátria	adotiva	e	de
todos	 os	 brasileiros,	 por	 cujo	 amor	 abdiquei	 duas	 coroas	 para	 sempre,	 uma
oferecida	 e	 outra	 herdada,	 pedir	 à	 Augusta	 Assembleia	 Geral	 que	 se	 digne
confirmar	esta	minha	nomeação.	Eu	assim	o	espero,	confiando	nos	serviços,	que
de	todo	o	meu	coração	fiz	ao	Brasil,	e	em	que	a	Augusta	Assembleia	Geral	não
deixará	 de	 querer	 aliviar-me	 desta	 maneira	 um	 pouco	 as	 saudades,	 que	 me
atormentam,	 motivadas	 pela	 separação	 de	 meus	 caros	 filhos	 e	 da	 Pátria,	 que
adoro.	Bordo	na	nau	 inglesa	 ‘Warspite’,	 surta	neste	porto,	 aos	oito	de	 abril	 de
1831,	 décimo	 da	 independência	 e	 do	 Império.	 Pedro”	 (Castro,	 Therezinha	 de.
História	 Documental	 do	 Brasil.	 São	 Paulo:	 Record,	 1968,	 p.	 157-158).
Posteriormente	surgiu	a	tese	na	Assembleia	Geral	que	fora	nula	a	nomeação	de
José	Bonifácio	como	tutor,	já	que	tal	ato	deveria	ter	sido	feito	por	D.	Pedro	I	por
meio	 de	 testamento,	 não	 por	 uma	 carta	 particular,	 na	 forma	 do	 art.	 130	 da
Constituição	de	1824	(“[...]	será	seu	Tutor,	quem	seu	Pai	lhe	tiver	nomeado	em
Testamento	[...]”).	Entretanto,	houve	um	acordo	e	o	Patriarca	da	Independência
prosseguiu	 na	 sua	 função	 (Porto,	 Costa.	 Os	 tempos	 da	 Praieira.	 Recife:
Fundação	de	Cultura	Cidade	do	Recife,	1981,	p.	16).
323.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:
Editora	Universidade	de	Brasília,	1986,	p.	154.
324.	Taunay,	Affonso	 de	E.	Subsídios	 para	 a	História	 do	Tráfico	Africano	 no
Brasil.	São	Paulo:	Imprensa	Oficial	do	Estado,	1941,	p.	264.
325.	Vianna,	Hélio.	História	do	Brasil:	monarquia	e	 república,	v.	 II.	6.	ed.	São
Paulo:	Melhoramentos,	1967,	p.	148.	O	próprio	D.	Pedro	I,	na	Fala	do	Trono	de
1830	chegou	a	anunciar	que	o	tráfico	de	escravos	havia	cessado	totalmente:	“O
tráfico	 de	 escravatura	 cessou,	 e	 o	 governo	 está	 decidido	 a	 empregar	 todas	 as
medidas	 que	 a	 boa	 fé	 e	 a	 humanidade	 reclamam,	 para	 evitar	 sua	 continuação
debaixo	de	qualquer	 forma,	ou	pretexto	que	seja	 [...]”	 (Brasil.	Falas	do	Trono:
do	 ano	 de	 1823	 até	 o	 ano	 de	 1889.	 Org.	 Barão	 de	 Javari,	 Rio	 de	 Janeiro:
Imprensa	 Nacional,	 1889,	 p.	 179).	 Ver	 também	 Freitas,	 Décio.	Escravidão	 de
índios	e	negros	no	Brasil.	Porto	Alegre:	EST/ICP,	1980,	p.	19.
326.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:
Editora	 Universidade	 de	 Brasília,	 1986,	 p.	 366.	 “O	 decreto	 de	 12	 de	 abril	 de
1832,	que	deu	regulamento	à	lei,	pormenorizou	as	atribuições	das	autoridades	e
os	 critérios	 que	 deveriam	 seguir	 na	 inspeção	 das	 embarcações	 suspeitas	 de
contrabando	de	africanos”	(Chalhoub,	Sidney.	A	força	da	escravidão:	ilegalidade
e	costume	no	Brasil	oitocentista.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2012,	p.	46).
327.	Nas	palavras	do	desesperançado	Diogo	Antônio	Feijó:	“[...]	o	vergonhoso	e
infame	 tráfico	 dos	 pretos	 continua	 por	 toda	 parte”	 (Sousa,	 Tarquínio.	História
dos	fundadores	do	Império	do	Brasil,	v.	VII.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1942,
p.	194).
328.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:
Editora	Universidade	de	Brasília,	1986,	p.	154.
329.	 Ribas,	 Conselheiro	 Joaquim.	 Direito	 Civil	 Brasileiro.	 Rio	 de	 Janeiro:
Editora	Rio,	 1982,	 p.	 83	 e	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:
das	origens	à	extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	34.	Tal	lei	também	ficou
conhecida	também	como	a	Lei	Feijó,	fazendo	referência	ao	então	futuro	Regente
Diogo	 Antônio	 Feijó,	 então	 ministro	 da	 justiça,	 durante	 o	 turbulento	 período
compreendido	entre	julho	de	1831	e	agosto	de	1832	(Sousa,	Tarquínio.	História
dos	fundadores	do	Império	do	Brasil,	v.	VII.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1942,
p.	207).
330.	 As	 exceções	 estavam	 previstas	 nos	 parágrafos	 do	 art.	 1º	 dessa	 Lei:
“Excetuam-se:	 1º	 Os	 escravos	 matriculados	 no	 serviço	 de	 embarcações
pertencentes	 ao	 país	 onde	 a	 escravidão	 é	 permitida,	 enquanto	 empregados	 no
serviço	 das	 mesmas	 embarcações.	 2º	 Os	 que	 fugirem	 do	 território,	 ou
embarcação	 estrangeira,	 os	 quais	 serão	 entregues	 aos	 senhores	 que	 os
reclamarem,	e	reexportados	para	fora	do	Brasil.	Para	os	casos	da	exceção	nº	1º,
na	 visita	 da	 entrada	 se	 lavrará	 termo	 do	 número	 dos	 escravos,	 com	 as
declarações	necessárias	para	verificar	a	identidade	dos	mesmos,	e	fiscalizar-se	na
visita	da	saída	se	a	embarcação	leva	aqueles,	com	que	entrou.	Os	escravos,	que
forem	achados	depois	da	saída	da	embarcação,	serão	apreendidos,	e	retidos	até
serem	reexportados”.
331.	“Pretensão	é	o	poder	do	titular	do	direito	subjetivo	de	exigir	uma	ação	ou
omissão	de	quem	deve	praticá-la	ou	de	quem	deve	abster-se.	A	exigência	pode
ser	 feita	 extrajudicialmente	 ou	 por	 via	 judicial,	 esta	 através	 de	ação”	(Gomes,
Orlando.	Introdução	ao	Direito	Civil.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1995,	p.	109).
332.	Decreto	de	12	de	abril	de	1832	sobre	exames	de	embarcações	suspeitas	de
importação	e	reexportação	de	escravos.
333.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	 4.	 ed.	 Introdução	de	Gilberto	Freyre.
Petrópolis:	Vozes,	1977,	p.	115-116.
334.	 Grineberg,	 Keila.	 Escravidão,	 alforria	 e	 direito	 no	 Brasil	 oitocentista:
reflexões	 sobre	 a	 lei	 de	 1831	 e	 o	 “princípio	 da	 liberdade”	 na	 fronteira	 sul	 do
Império	brasileiro.	 In:	Carvalho,	 José	Murilo	de	 (org.).	Nação	e	Cidadania	no
Imperio:	novos	horizontes.	Rio	de	Janeiro:	Civilização	brasileira,	2007,	p.	270.
335.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:
Editora	Universidade	de	Brasília,	1986,	p.	159-160.
336.	Ibidem,	p.	165.
337.	“Penas	–	de	prisão	por	três	a	nove	anos,	e	de	multa	correspondente	á	terça
parte	do	tempo;	nunca	porém	o	tempo	de	prisão	será	menor,	que	o	do	cativeiro
injusto,	e	mais	uma	terça	parte”.
338.	“Da	 tipificação	 da	 conduta	 de	 reduzir	 pessoa	 livre	 à	 escravidão	 enquanto
crime	particular,	contra	a	liberdade	individual,	resulta	que	os	responsáveis	por	tal
ação	estariam	protegidos	das	severas	punições	aplicadas	ao	crime	de	pirataria”
(Sá,	 Gabriela	 Barretto	 de.	 A	 cor	 da	 escravização	 ilegal	 de	 pessoas	 livres	 no
Brasil	 oitocentista:	 por	 uma	 tentativa	 de	 genealogia	 do	 artigo	 179	 do	 Código
Criminal	 doImpério.	 Revista	 Brasileira	 de	 Ciências	 Criminais,	 São	 Paulo:
Revista	dos	Tribunais,	ano	25,	v.	135,	p.	178,	2017)
339.	 “Tendo	 já	 em	 depósito	 centenas	 de	 africanos	 livres,	 mas	 não	 tendo
conseguido	cobrar	todas	as	quantias	para	sua	reexportação,	nem	obter	lugar,	na
África,	para	onde	os	remetesse,	o	governo	pediu	ao	Parlamento,	em	data	de	9	de
agosto	de	1834,	providenciasse	no	 sentido	de	 lhe	 fornecer	meios	de	cumprir	 a
lei”	 (Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:
Editora	 Universidade	 de	 Brasília,	 1986,	 p.	 161).	 Entretanto,	 como	 não	 houve
destinação	de	verbas	orçamentárias	para	 tanto,	nem	possibilidade	de	mantê-los
em	depósito,	na	Casa	de	Correção,	os	africanos	livres	passaram	a	ser	alugados	a
indivíduos	(Aviso	de	19	de	novembro	de	1835).	Africanos	livres	seriam	aqueles
negros	 africanos	 ilicitamente	 importados	 na	 condição	 de	 escravos	 que,	 após
desembarcarem	no	 Império	do	Brasil,	 estariam	 livres	por	 força	da	Lei	de	7	de
novembro	 de	 1831.	 Eles	 deveriam,	 por	 catorze	 anos,	 prestar	 serviços	 em
estabelecimentos	públicos	ou	a	particulares,	que	arrendariam	sua	mão	de	obra,
nos	termos	do	previsto	no	Decreto	de	19	de	novembro	de	1835.	Registre-se	que
estes	 africanos	 livres	não	 adquiriam	a	 cidadania	brasileira,	 sendo	 considerados
estrangeiros	 (Moura,	 Clóvis.	Dicionário	 da	 Escravidão	 negra	 no	 Brasil.	 São
Paulo,	 Editora	 da	 USP,	 2004,	 p.18-20).	 Para	 detalhes	 acerca	 da	 prestação	 de
serviços	 dos	 Africanos	 livres	 no	 Brasil	 v.	 Mamigonian,	 Beatriz	 G.	 Africanos
livre:	 a	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no	 Brasil.	 São	 Paulo,	 Companhia	 das
Letras,	2017,	p.	129-164.	Por	meio	do	Decreto	nº	1.303,	de	28	de	dezembro	de
1853,	foram	declarados	alforriados	os	africanos	 livres	que	houvessem	prestado
serviço	a	particulares	por	14	anos,	sendo	emancipados	de	acordo	com	o	Aviso	de
26	de	janeiro	de	1818	(Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	Escravidão	no
Brasil:	 ensaio	 histórico-jurídico-social:	 africanos	 Vol.	 III.	 Rio	 de	 Janeiro,
Typographia	 Nacional,	 1867,	 pp.64-66	 e	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha
Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília,	 Editora	 Universidade	 de	 Brasília,	 1986,
p.162).
340.	Trinta	mil	réis	por	escravo	apreendido.
341.	 Art.	 5º	 Todo	 aquele,	 que	 der	 noticia,	 fornecer	 os	 meios	 de	 se	 apreender
qualquer	 número	 de	 pessoas	 importadas	 como	 escravos,	 ou	 sem	 ter	 precedido
denuncia	ou	mandado	 judicial,	 fizer	qualquer	apreensão	desta	natureza,	ou	que
perante	o	Juiz	de	Paz,	ou	qualquer	autoridade	local,	der	notícia	do	desembarque
de	 pessoas	 livres,	 como	 escravos,	 por	 tal	 maneira	 que	 sejam	 apreendidos,
receberá	da	Fazenda	Pública	a	quantia	de	trinta	mil	réis	por	pessoa	apreendida.	
342.	 E	 estipulava	 sanção	 pecuniária	 para	 os	 “Comandante,	 mestre,	 e
contramestre,	 que	 trouxerem	 as	 pessoas	mencionadas	 no	 artigo	 antecedente	 [o
liberto]”	(art.	8º	da	Lei	de	7	de	novembro	de	1831).
343.	Rodrigues,	Jaime.	O	fim	do	tráfico	transatlântico	de	escravos	para	o	Brasil:
paradigmas	 em	 questão.	 In:	 O	 Brasil	 Imperial,	 v.	 II:	 1831	 –	 1870.	 Rio	 de
Janeiro:	Civilização	brasileira,	2011,	p.	324-325.
344.	 “[...]	 jamais	 houvera	 a	 expectativa	 de	 cumprimento	 da	 lei”	 (Chalhoub,
Sidney.	A	força	da	escravidão:	ilegalidade	e	costume	no	Brasil	oitocentista.	São
Paulo:	Companhia	das	Letras,	2012,	p.	48).
345.	 Acerca	 do	 manifesto	 descumprimento	 de	 tal	 diploma	 legislativo	 ver
Moraes,	 Evaristo	 de.	A	Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:	 Editora
Universidade	 de	 Brasília,	 1986,	 p.	 154,	 155	 e	 366:	 “Era	 a	 infração	 da	 lei	 tão
escandalosa	e	frequente	que	o	velho	Rebouças	(Antônio	Pereira),	pai	de	André
Rebouças	 [abolicionista	 brasileiro,	 1838-1898],	mais	 de	 uma	 vez	mostrou,	 em
discurso	 na	 Câmara	 dos	 Deputados,	 ter	 ela	 servido	 apenas	 para	 o	 mal,	 sem
nenhuma	 vantagem	 do	 Estado,	 que	 perdera	 os	 impostos	 antes	 auferidos	 pela
entrada	de	escravos”.	Houve	uma	significativa	queda	de	arrecadação,	apesar	de
haver	 o	 aumento	 do	 tráfico:	 “Os	 efeitos	 dessa	 ‘renúncia	 fiscal’	 involuntária	 se
fizeram	 sentir	 de	 forma	 imediata:	 segundo	 dados	 do	Ministério	 da	 Fazenda,	 a
participação	dos	impostos	sobre	escravos	no	total	da	arrecadação,	caiu	de	cerca
de	 14%	 em	 1828	 para	 aproximadamente	 2%	 em	 1833”	 (Costa,	Wilma	 Peres.
Estratégias	ladinas:	o	imposto	sobre	o	comércio	de	escravos	e	a	‘legalização’	do
tráfico	(1831-1850).	Novos	Estudos	CEBRAP,	São	Paulo,	n.	67,	p.	57-75,	nov.
2003).	A	razão	era	simples,	como	o	 tráfico	de	escravos	 interoceânico	passou	a
ser	considerado	atividade	ilícita,	não	poderia	o	Império	tributá-lo.
346.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	35.
347.	Holanda,	Sérgio	Buarque	de.	Raízes	do	Brasil.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,
1978,	p.	43-44.
348.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	 Editora	 UnB,	 1988,	 p.	 36.	 “A	 15	 de	 março,	 o	 ministro	 da	 Justiça
informava	aos	presidentes	das	províncias	marítimas	que	os	 tribunais	ordinários
do	Brasil	seriam	doravante,	competentes	para	julgar	navios	negreiros,	capturados
pelas	forças	navais	e	militares	brasileiras”	(Circular	de	15	de	março	de	1845,	do
Ministro	 da	 Justiça)	 (Bethell,	 Leslie.	 A	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 no
Brasil:	 a	 Grã-Bretanha,	 o	 Brasil	 e	 a	 questão	 do	 tráfico	 de	 escravos.	 Rio	 de
Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	238).
349.	Gurgel,	Argemiro	Eloy.	Uma	Lei	Para	Inglês	Ver:	A	Trajetória	da	Lei	de	7
de	Novembro	de	1831.	Disponível	em:	<https://goo.gl/RuPHv7>.	Acesso	em:	27
jul.	2015.
350.	Estrada,	Osório	Duque.	A	Abolição.	Brasília:	Edições	do	Senado	Federal,
2005,	p.	29.
351.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	37-38.
352.	 Ibidem,	 p.	 39.	 “[...]	Maciel	 da	 Costa,	 que	 condenava	 a	 escravidão	 e	 era
favorável,	 em	 princípio,	 à	 cessação	 do	 tráfico,	 acusava	 a	 Inglaterra	 de	má	 fé.
Dizia	 ele	 que	 ‘a	 Inglaterra	 lutava	 com	 tanto	 afinco	 pela	 abolição	 universal	 do
comércio	 de	 escravos,	 porque	 pretendia	 arruinar	 a	 agricultura	 das	 Antilhas
Francesas	 e	 Holandesas	 e	 criar	 obstáculos	 à	 prosperidade	 brasileira’”	 (Costa,
Emilia	Viotti	da.	A	Abolição.	São	Paulo:	Global,	2001,	p.	26).
353.	“Em	nenhuma	das	ações	de	liberdade	julgadas	em	primeira	instência	e	pelo
tribunal	da	relação	do	Rio	de	Janeiro	se	contestava	a	vigência	da	lei	de	1831;	as
discussões	se	davam	na	tentativa	de	contestar	os	fatos	apresentados	por	ambas	as
partes,	discuntindo-se	o	escravo	em	questão	teria	realmente	cruzado	a	fronteira,
se	teria	nascido	no	Uruguai;	ou	se	teria	ido	a	determinado	lugar	a	mando	de	seu
senhor:	 mas	 nunca	 um	 advogado	 ou	 juiz	 argumentou	 que,	 por	 nunca	 ter	 sido
colocada	em	prática,	ou	por	 força	da	 lei	Eusébio	de	Queirós,	de	1850,	a	 lei	de
1831	 não	 poderia	 ser	 considerada	 em	 vigor”	 (Grinberg,	 Keila.	 Escravidão,
alforria	 e	 direito	 no	 Brasil	 oitocentista:	 reflexões	 sobre	 a	 lei	 de	 1831	 e	 o
“princípio	da	liberdade”	na	fronteira	sul	do	Império	brasileiro.	In:	Carvalho,	José
Murilo	 de	 (org.).	 Nação	 e	 Cidadania	 no	 Imperio:	 novos	 horizontes.	 Rio	 de
Janeiro:	 Civilização	 brasileira,	 2007,	 p.	 278).	 Em	 verdade,	 foi	 apresentado
projeto	 de	 lei	 (em	 1837)	 propondo	 a	 revogação	 da	 Lei	 de	 7	 de	 novembro	 de
1831:	 “Nenhuma	 ação	 poderá	 ser	 tentada	 contra	 os	 que	 tiverem	 comprado
escravos,	depois	de	desembarcados,	e	fica	revogada	a	 lei	de	7	de	novembro	de
1831	 e	 todas	 as	 outras	 em	 contrário”	 (Rodrigues,	 Jaime.	 O	 fim	 do	 tráfico
transatlântico	 de	 escravos	 para	 o	Brasil:	 paradigmas	 em	 questão.	 In:	O	Brasil
Imperial,	volume	II:	1831	–	1870.	Rio	de	Janeiro:Civilização	brasileira,	2011,	p.
337).
354.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	74-75.
355.	Pela	aplicação	do	art.	1º	da	Lei	de	07	de	novembro	de	1931.
356.	Lopes,	José	Reinaldo	de	Lima.	O	Oráculo	de	Delfos:	o	Conselho	de	Estado
no	Brasil	–	Império.	São	Paulo:	Saraiva,	p.	286.
357.	“Art.	13.	O	Poder	Legislativo	é	delegado	à	Assembleia	Geral	com	a	Sanção
do	Imperador”.
358.	 “Art.	 15.	 É	 da	 atribuição	 da	 Assembleia	 Geral:	 [...]	 VIII.	 Fazer	 Leis,
interpretá-las,	suspendê-las,	e	revogá-las”.
359.	“Nas	duas	décadas	seguintes	à	promulgação	da	lei,	mais	de	750	mil	negros
foram	 introduzidos	 no	 território	 nacional	 por	 contrabando,	 permanecendo
ilegalmente	escravizados,	assim	como	seus	descendentes”	(Chalhoub,	Sidney.	A
força	 da	 escravidão:	 ilegalidade	 e	 costume	 no	 Brasil	 oitocentista.	 São	 Paulo:
Companhia	das	Letras,	2012,	p.	30).
360.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	73.
361.	Conjuntamente	com	outro	tratado	de	comércio	e	amizade,	pela	Carta	de	Lei
de	17	de	novembro	de	1827.
362.	 Entre	 1837	 e	 1847	 foram	 capturados	 634	 navios	 negreiros,	 apenas	 pelos
ingleses	 (Malheiro,	 Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A	 Escravidão	 no	 Brasil:
ensaio	 histórico-jurídico-social:	 africanos,	 v.	 III.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typographia
Nacional,	1867,	p.	58).
O	 tratado	 de	 1826,	 no	 seu	 art.	 2º,	 ratificava	 o	 de	 1817:	 “[...]	 Por	mais	 que	 o
governo	britânico	 fosse	contra	as	violações	brasileiras	do	 tratado	 [...],	 agora	 já
não	podia	obrigar	 a	 cumpri-lo,	 porque,	 com	a	 expiração	do	 tratado	de	1817,	 a
marinha	 britânica	 já	 não	 tinha	 o	 direito	 de	 abordar	 e	 vistoriar	 os	 navios
brasileiro”	(Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-
Bretanha,	o	Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;
São	Paulo:	Ed.	da	USP,	1976,	p.	249).
363.	Pinto,	Antônio	Pereira.	Apontamentos	para	o	Direito	Internacional.	Rio	de
Janeiro:	F.	L.	Pinto	&	Cia	Livreiro	e	Editores,	1864,	t.	I,	p.	355.
364.	 “Lei	 aprovada	 pelo	 Parlamento	 Britânico	 em	 8	 de	 agosto	 de	 1845,	 que
conferiu	 à	marinha	 britânica	 o	 direito	 de	 aprisionar	 qualquer	 navio	 negreiro	 e
obrigava	 os	 traficantes	 a	 responderem	 perante	 o	 Almirantado	 ou	 de	 qualquer
tribunal	 do	Vice-almirantado	dos	domínios	 ingleses.	A	 repressão	 ao	 tráfico	 foi
assim	intensificada”	(Moura,	Clóvis.	Dicionário	da	Escravidão	negra	no	Brasil.
São	Paulo:	Editora	da	USP,	2004,	p.	69).	“O	bill	Aberdeen	(1845)	previa	prisão
unilateral	de	barcos	brasileiros	envolvidos	no	tráfico	negreiro	e	seu	julgamento
em	tribunais	britânicos.	De	1849	a	1851,	a	Inglaterra	estendeu	sua	aplicação	às
águas	 territoriais	 do	 Império,	 provocando	 um	 estado	 de	 guerra	 virtual	 no	 que
talvez	 tenha	sido	o	pior	 impasse	diplomático	da	história	brasileira.	O	resultado
imediato	 foi	 a	 supressão	definitiva	do	contrabando	 (1850),	mas	a	 Inglaterra	 só
revogou	o	bill	Aberdeen	em	1869,	após	a	Guerra	Civil	selar	o	destino	mundial
da	escravidão”	(Alencar,	José	de.	Cartas	a	favor	da	escravidão.	Org.	de	Tâmis
Parron.	São	Paulo:	Hedra,	2008,	p.	109).
365.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à
extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	44.
366.	Estrada,	Osório	Duque.	A	Abolição.	Brasília:	Edições	do	Senado	Federal,
2005,	p.	33.
367.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à
extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	44.	“A	colônia	britânica	de	Serra	Leoa,
na	costa	ocidental	africana,	era	sede	de	quase	todas	as	comissões	mistas	do	lado
do	continente	africano,	além	de	uma	corte	do	vice-almirantado,	que	 julgava	os
navios	 britânicos	ou	 sem	nacionalidade.	A	 ‘Província	 da	Liberdade’,	 como	 foi
chamada	 por	 seus	 fundadores	 abolicionistas,	 recebeu	 a	maior	 parte	 dos	 navios
levados	a	julgamento	por	tráfico	ilegal	graças	ao	ativo	patrulhamento	do	litoral
pelo	 esquadrão	 da	 Royal	 Navy,	 e,	 consequentemente,	 a	 maioria	 dos	 africanos
emancipados	 durante	 a	 campanha	 abolicionista:	 mais	 de	 90	 mil	 entre	 1808	 e
1867”	 (Mamigonian,	 Beatriz	 G.	 Africanos	 livre:	 a	 abolição	 do	 tráfico	 de
escravos	no	Brasil.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2017,	p.	34).
368.	Brasil.	A	Abolição	no	parlamento,	Brasília:	Senado,	2012,	p.	124.
369.	Pinto,	Antônio	Pereira.	Apontamentos	para	o	Direito	Internacional.	Rio	de
Janeiro:	F.	L.	Pinto	&	Cia	Livreiro	e	Editores,	1864,	t.	I,	p.	357.
370.	“Equiparando	o	contrabando	de	negros	à	pirataria,	capturando	negreiros	nas
águas	e	nos	portos	do	Brasil	e	 levando-os	a	julgamento	perante	os	tribunais	do
Almirantado	 Inglês,	 a	 cujo	 exclusivo	 direito	 ele	 se	 arrogava,	 deu	 a	 Inglaterra,
com	 o	 famoso	 “bill”,	 uma	 demonstração	 de	 desestima	 à	 serena	 política	 de
repressão	 ao	 comércio	 marítimo	 de	 escravos,	 bem	 como	 descrença	 nas
possibilidades	 de	 o	 Império	 imprimir	 o	 justo	 rigor	 que	 o	 caso	 estava	 a	 exigir
[...]”	(Gouveia,	Maurílio	de.	História	da	Escravidão.	Prefácio	de	Pedro	Calmon.
Rio	de	Janeiro:	Editora	Tupy,	1955,	p.	121-122).
371.	“Eles	[os	ingleses]	poderiam	punir	os	seus	súditos	como	piratas,	mas	seriam
capazes	de	fazer	aprovar	uma	lei	para	punir	como	piratas	súditos	de	outra	nação,
por	terem	cometido	uma	ação	contra	súditos	de	uma	terceira	nação?	Não	teriam
mais	direito	a	fazer	uma	lei	vinculando	os	súditos	do	Brasil	do	que	os	da	China
ou	de	qualquer	outra	nação;	e	não	tinham	o	direito	de	puni-los	por	um	alegado
ato	 de	 pirataria	 que,	 pela	 lei	 daquele	 país,	 não	 fosse	 considerado	 como	 tal”
(Bethell,	Leslie.	A	abolição	do	tráfico	de	escravos	no	Brasil:	a	Grã-Bretanha,	o
Brasil	e	a	questão	do	tráfico	de	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Expressão;	São	Paulo:
Ed.	da	USP,	1976,	p.	251).	Ver	 também	Pinto,	Antônio	Pereira.	Apontamentos
para	 o	 Direito	 Internacional.	 Rio	 de	 Janeiro:	 F.L.	 Pinto	 &	 Cia	 Livreiro	 e
Editores,	1864,	t.	I,	p.	358.
372.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	46-47.
373.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	64-65.
374.	Moraes,	Evaristo.	A	escravidão	africana	no	Brasil:	das	origens	à	extinção.
Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	49.
375.	Estrada,	Osório	Duque.	A	Abolição.	Brasília:	Edições	do	Senado	Federal,
2005,	 p.	 32.	 Entretanto,	 para	 Rui	 Barbosa,	 citando	 fontes	 britânicas,	 foram
contrabandeados	mais	de	um	milhão	de	negros	africanos	nesse	mesmo	período,
sendo	que	cem	mil	escravos	só	em	1830.	No	período	compreendido	entre	1849	e
1851	foram	apreendidas	noventas	embarcações	suspeitas	de	tráfico	de	escravos
(Costa,	Emilia	Viotti	da.	A	Abolição.	São	Paulo:	Global,	2001,	p.	28-29).
376.	Chalhoub,	Sidney.	A	força	da	escravidão:	 ilegalidade	e	costume	no	Brasil
oitocentista.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2012,	p.	36.
377.	A	última	tentativa	de	desembarque	de	escravos	no	Brasil	ocorreu	em	1857,
na	Vila	de	Serinhaém,	no	litoral	pernambucano,	a	qual	foi	severamente	reprimida
pelas	 autoridades	 imperiais	 (Estrada,	 Osório	 Duque.	 A	 Abolição.	 Brasília:
Edições	do	Senado	Federal,	2005,	p.	35).
378.	Mattoso,	Kátia	M.	 de	Queirós.	Ser	 escravo	 no	 Brasil:	 séculos	XVI-XIX.
São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.	97.
379.	 Duas	 dezenas	 de	 escravos	 homens,	 na	 faixa	 dos	 vinte	 anos,	 aptos	 ao
trabalho	braçal,	 valiam	 tanto	quanto	um	engenho	 inteiro,	 com	a	 casa	grande	 e
toda	 sua	 mobília,	 na	 Zona	 da	 Mata	 de	 Pernambuco.	 Quanto	 mais	 o	 escravo
estivesse	 apto,	 seja	 pela	 idade	 ou	 por	 sua	 saúde,	 ao	 trabalho	 (e	 à	 procriação),
maior	 o	 seu	 valor.	 Para	 se	 fazer	 uma	 comparação,	 por	 volta	 de	 1870,	 uma
imagem	 trabalhada	 em	 ouro	 de	 um	 santo	 padroeiro	 de	 uma	 Paróquia,	 em
Paudalho,	na	província	de	Pernambuco,	era	estimada	em	quatro	mil-réis;	 a	um
escravo	crioulo	de	17	anos	atribuía-se	um	valor	de	mais	de	um	contoe	duzentos
mil-réis.	 Para	 (para	mais	 detalhes,	 ver	 Luna,	 Luís.	O	Negro	 na	 Luta	 contra	 a
Escravidão.	 Brasília:	 Editora	 Cátedra,	 1976,	 p.	 26-31	 e	Mattoso,	 Kátia	M.	 de
Queirós.	Ser	escravo	no	Brasil:	 séculos	XVI-XIX.	 São	Paulo:	Vozes,	 2016,	 p.
107-121).
380.	 “[...]	 um	 comércio	 cada	 vez	 mais	 lucrativo	 e	 que	 os	 transformaria	 [os
traficantes]	em	verdadeiros	magnatas	das	finanças	do	Império”	(Holanda,	Sérgio
Buarque	de.	Raízes	do	Brasil.	Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1978,	p.	44).
Uma	 outra	 interpretação:	 “A	 abolição	 do	 tráfico	 de	 escravos	 foi	 também	 uma
tentativa	de	silenciar	novas	agitações	internas.	[...]	O	governo	brasileiro	também
deixou	categoricamente	claro	que	todos	os	africanos	importados	ilegalmente	no
país	 entre	 1830	 e	 1850	 permaneceriam	 na	 escravidão.	 Os	 fazendeiro
permaneciam	 confiantes	 na	 duração	 da	 sua	 própria	 instituição	 na	 época	 da
secessão	sulista	norte-americana”	(Drescher,	Seymour.	Abolição:	uma	história	da
escravidão	 e	 do	 antiescravismo.	 Tradução	 de	 Antônio	 Penalves	 Rocha.	 São
Paulo:	Unesp,	2011,	p.	500).
381.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	65.
382.	 “Possuir	 escravos	 significava	 lucro	 e	 ‘status’,	 mesmo	 custando,	 depois,
como	 ocorreu,	 o	 endividamento	 de	 muitos	 dos	 seus	 donos”	 (Figueiredo,
Ariovaldo.	O	negro	e	a	violência	do	branco:	o	negro	em	Sergipe.	Rio	de	Janeiro:
J.Álvaro,	1977,	p.	20).
383.	“A	perpetuação	da	dependência	dos	agricultores	em	relação	aos	traficantes
consubstanciava-se	 no	 endividamento	 daqueles	 para	 com	 estes.	 Isso	 acontecia
exatamente	por	 causa	da	continuidade	do	 tráfico	negreiro.	Esse	endividamento
ocorria	pela	compra	de	escravos,	em	longo	prazo,	com	juros	exorbitantes	e	por
meio	 de	 hipotecas	 de	 suas	 propriedades,	 de	 modo	 a	 limitar	 a	 capacidade	 de
compra	 de	 mais	 escravos	 pelos	 senhores	 escravocratas,	 tornando	 estes	 ainda
mais	 dependentes	 dos	 traficantes”	 (Vale,	 Valter	 do.	 Causas	 da	 extinção	 da
escravatura	no	Brasil.	Recife:	Livro	Rápido,	2007,	p.	47).
384.	Registre-se	que	a	arruinada	cultura	açucareira,	em	meados	do	século	XIX,
estava	passando	por	serias	dificuldades	de	financiamento,	já	que	as	instituições
financeiras	não	tinham	interesse	em	fornecer	empréstimos	para	os	proprietários
de	engenhos	açucareiros.	A	compra	e	venda	de	escravos	só	passou	a	ser	realizada
com	 a	 oferta	 de	 garantias	 reais,	 em	 regra	 de	 imóveis	 (Mattoso,	 Kátia	 M.	 de
Queirós.	Ser	escravo	no	Brasil:	 séculos	XVI-XIX.	 São	Paulo:	Vozes,	 2016,	 p.
105-106).
385.	“[...]	a	circunstância	de	serem	principalmente	portuguesas,	não	brasileiras,
as	grandes	fortunas	formadas	à	sombra	do	comércio	negreiro,	tendia	a	mobilizar
contra	 a	 introdução	 de	 escravos	 e,	 por	 conseguinte,	 em	 favor	 de	 um	 governo
disposto	a	enfrenta-la	sem	hesitações,	 toda	a	descendência	ainda	numerosa	dos
caramurus	da	Regência”	(Holanda,	Sérgio	Buarque	de.	Raízes	do	Brasil.	Rio	de
Janeiro:	J.	Olympio,	1978,	p.	43).
Os	caramurus,	partido	lusófilo,	eram	os	partidários	do	retorno	de	D.	Pedro	I	ao
trono	(Sousa,	Tarquínio.	História	dos	 fundadores	do	 Império	do	Brasil,	v.	VII.
Rio	de	Janeiro:	J.	Olympio,	1942,	p.	217).
386.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	68.
387.	Ibidem,	p.	66-67.
388.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à
extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	50.
389.	Ibidem,	p.	51.
390.	Estabelecidas	na	segunda	parte	do	art.	1º	da	lei	nº	581,	de	4	de	setembro	de
1850.
391.	 Ou	 seja,	 buscava-se	 restringir	 os	 efeitos	 da	 norma	 ao	 Princípio	 da
Territorialidade	da	Lei	Penal.
392.	Foram	estabelecidos,	pela	legislação,	fatos	que	levavam	à	presunção	de	que
o	 sujeito	 de	 direito	 estava	 a	 promover	 o	 tráfico	 de	 escravos:	Dos	 sinais	 que
constituem	presunção	legal	do	destino	das	embarcações	ao	trafico
Art.	32.	Os	sinais,	que	constituem	presunção	 legal,	de	que	uma	embarcação	se
emprega	no	tráfico	de	escravos,	são	os	seguintes:
1º	 Escotilhas	 com	 grades	 abertas	 em	 vez	 das	 fechadas,	 que	 se	 usam	 nas
embarcações	mercantes.
2º	Divisões,	 ou	 anteparos	 no	 porão	 ou	 na	 coberta	 em	maior	 quantidade	 que	 a
necessária	em	embarcações	de	comércio	lícito.
3º	Taboas	de	sobressalente	preparadas	para	se	colocarem	como	segunda	coberta.
4º	Quantidade	d’agua	em	tonéis,	tanques,	ou	em	qualquer	outro	vasilhame	maior,
que	a	necessária	para	o	consumo	da	tripulação,	passageiros,	e	gado,	em	relação	á
viagem.
5º	Quantidade	de	grilhões,	correntes,	ou	algemas,	maior	que	a	necessária	para	a
polícia	da	embarcação.
6º	Quantidade	de	bandejas,	gamelas,	ou	celhas	de	rancho,	maior	que	a	necessária
para	a	gente	de	bordo.
7º	Extraordinária	grandeza	da	caldeira,	ou	número	delas,	maior	que	o	necessário
nas	embarcações	de	comércio	lícito.
8º	 Quantidade	 extraordinária	 de	 arroz,	 farinha,	 milho,	 feijão,	 ou	 carne,	 que
exceda	 visivelmente	 ás	 necessidades	 da	 tripulação	 e	 passageiros,	 não	 vindo
declarada	no	manifesto	como	parte	de	carga	para	comércio.
9º	Uma	grande	quantidade	de	esteiras	ou	esteirões	 superior	ás	necessidades	da
gente	de	bordo.
Art.	 33.	 Também	 constituem	 presunção	 legal	 do	 emprego	 da	 embarcação	 no
tráfico:
1º	A	existência	de	vasilhame	para	 líquidos	além	do	empregado	na	aguada,	que
não	tiver	sido	especialmente	despachado	debaixo	de	fiança	de	ter	destino	licito;
ou	quando	se	mostrar,	que	esse	vasilhame	não	teve	o	destino	que	se	indicou	na
ocasião	de	o	despachar.
2º	A	duplicata	dos	Diários	de	navegação.
3º	A	falta	dos	papeis	mencionados	nos	seis	primeiros	§§	do	Art.	466,	e	nos	Arts.
501	até	504	do	Código	Comercial	depois	que	estiver	em	execução.
4º	A	substituição	do	verdadeiro	capitão	por	outro	de	bandeira,	ou	nominal.
5º	A	fuga	da	 tripulação,	ou	abandono	do	navio	em	presença	de	embarcação	de
guerra	em	tempo	de	paz,	ou	em	presença	de	Autoridade,	que	se	dirija	à	bordo;	o
incêndio,	ou	danificação	voluntariamente	feitos	ao	navio	por	sua	tripulação.
393.	Rodrigues,	Jaime.	O	fim	do	tráfico	transatlântico	de	escravos	para	o	Brasil:
paradigmas	 em	 questão.	 In:	 O	 Brasil	 Imperial,	 v.	 II:	 1831	 –	 1870.	 Rio	 de
Janeiro:	Civilização	Brasileira,	2011,	p.	330.
394.	 Em	 1860	 havia,	 no	 Brasil,	 aproximadamente	 5.000	 africanos	 livres
(Moraes,	Evaristo	de.	A	Campanha	Abolicionista:	 1879-1888.	Brasília:	Editora
Universidade	de	Brasília,	1986,	p.	163).
395.	Quando	fosse	possível,	o	que	não	era	comum	de	ocorrer	devido	ao	custo	do
transporte	e	o	desinteresse	do	governo.	Regra	geral	os	escravos	eram	mantidos
em	 depósitos,	 de	 forma	 degradante,	 para	 os	 parâmetros	 da	 época,	 e,
posteriormente,	 colocados	 para	 trabalhar	 por	 particulares	 nas	 cidades,	 a	 ponto
que	por	meio	do	Decreto	nº	1.303,	de	28	de	dezembro	de	1853,	foram	libertos	os
africanos	 livres	 que	 houvessem	 prestado	 serviço	 a	 particulares	 por	 14	 anos,
sendo	emancipados	de	acordo	com	o	Aviso	de	26	de	janeiro	de	1818	(Malheiro,
Agostinho	Marques	Perdigão.	A	Escravidão	no	Brasil:	ensaio	histórico-jurídico-
social:	africanos,	v.	III.	Rio	de	Janeiro:	Typographia	Nacional,	1867,	p.	64-66	e
Moraes,	 Evaristo	 de.	A	Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:	 Editora
Universidade	 de	 Brasília,	 1986,	 p.	 162).	 Nesse	 mesmo	 sentido:	 “Para	 fazer
cessar	 tais	 irregularidades,	 assinou	o	governo	o	decreto	de	23	de	dezembro	de
1853	dando	emancipação	aos	cativos	portadores	do	certificado	de	livre	e	que	já
tivessem	 prestado	 serviços	 a	 particulares	 pelo	 espaço	 de	 quatorze	 anos”
(Gouveia,	Maurílio	de.	História	da	Escravidão.	Prefácio	de	Pedro	Calmon.	Rio
de	Janeiro:	Editora	Tupy,	1955,	p.	133).
396.	Nos	termos	do	art.	6º,	da	Lei	nº	581,	de	04	de	setembro	de	1850.	O	que	não
aconteceu	 na	 prática,	 quando	 oficiou	 como	 Curador	 desses	 africanos	 livres,
vítimas	 do	 tráfico	 (Malheiro,	 Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A	 Escravidãono
Brasil:	 ensaio	 histórico-jurídico-social:	 africanos,	 v.	 III.	 Rio	 de	 Janeiro:
Typographia	Nacional,	1867,	p.	65-66).
397.	 Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 escravidão	 africana	 no	 Brasil:	 das	 origens	 à
extinção.	Brasília:	Editora	UnB,	1988,	p.	51.
398.	Ao	contrário	da	Lei	de	7	de	setembro	de	1831,	que	atribuía	a	competência
para	julgamento	dos	delitos	o	Júri,	em	face	do	previsto	no	Código	de	Processo
Criminal	do	Império	e	no	art.	Art.	54	da	Lei	nº	261,	de	3	de	dezembro	de	1841:
“As	 sentenças	de	pronuncia	 nos	 crimes	 individuais	 proferidas	 pelos	Chefes	 de
Polícia,	 Juízes	 Municipais,	 e	 as	 dos	 Delegados	 e	 Subdelegados,	 que	 forem
confirmadas	 pelos	 Juízes	 Municipais,	 sujeitão	 os	 réus	 à	 acusação,	 e	 a	 serem
julgados	pelo	Júri,	procedendo-se	na	forma	indicada	no	art.	254	e	seguintes	do
Código	 do	 Processo	 Criminal”.	 Evidente	 que	 foi	 acelerada	 a	 possibilidade	 de
punição	dos	envolvidos	no	crime	de	importação	de	escravos.	
399.	 Regulamentos	 nº	 708,	 de	 14	 de	 outubro	 de	 1850,	 e	 nº	 731,	 de	 14	 de
novembro	de	1850,	explicados	pelo	Aviso	de	9	de	janeiro	de	1854,	que	tinham
por	 objetivo:	 (a)	 evitar	 o	 desembarque	 de	 escravos,	 com	 a	 preensão	 das
embarcações	utilizadas	e	também	as	suspeitas	de	tráfico;	(b)	apreender	em	terra
os	 escravos	 desembarcados;	 (c)	 punir	 os	 traficantes,	 sequestrando	 suas
embarcações;	 (d)	 simplificar	o	procedimento	de	apuração	da	culpa	e	aplicação
da	 pena;	 e	 (e)	 manter	 a	 liberdade	 dos	 africanos	 apreendidos	 (Malheiro,
Agostinho	Marques	Perdigão.	A	Escravidão	no	Brasil:	ensaio	histórico-jurídico-
social:	africanos,	v.	III.	Rio	de	Janeiro:	Typographia	Nacional,	1867,	p.	54-55).
400.	Parecer	do	Conselho	de	Estado,	de	1874,	elaborado	por	Nabuco	de	Araújo,
sustentava	 que	 só	 os	Auditores	 da	Marinha,	 criados	 pela	Lei	 nº	 581,	 de	 1850,
poderiam	sentenciar	acerca	do	estado	e	da	condição	dos	africanos	sobre	os	quais
pairassem	 dúvidas	 acerca	 da	 sua	 importação,	 após	 1831,	 afastando,	 de	 certo
modo,	 do	 Judiciário,	 o	 debate	 acerca	 do	 status	 libertatis	 dos	 escravos	 que
ingressassem	 no	 Brasil	 de	 forma	 ilícita	 (Moraes,	 Evaristo	 de.	 A	 Campanha
Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:	 Editora	 Universidade	 de	 Brasília,	 1986,	 p.
367-368).	Eis	o	que	dispunha	o	art.	8º	da	Lei	nº	581,	de	4	de	setembro	de	1850:
“Todos	 os	 apresamentos	 de	 embarcações,	 de	 que	 tratam	os	Artigos	 primeiro	 e
segundo,	assim	como	a	 liberdade	dos	escravos	apreendidos	no	alto	mar,	ou	na
costa	antes	do	desembarque,	no	ato	dele,	ou	imediatamente	depois	em	armazéns,
e	depósitos	sitos	nas	costas	e	portos,	serão	processados	e	 julgados	em	primeira
instancia	pela	Auditoria	de	Marinha,	e	em	segunda	pelo	Conselho	d’Estado.	O
Governo	marcará	em	Regulamento	a	forma	do	processo	em	primeira	e	segunda
instancia,	 e	 poderá	 criar	 Auditores	 de	 Marinha	 nos	 portos	 onde	 convenha,
devendo	servir	de	Auditores	os	Juízes	de	Direito	das	respectivas	Comarcas,	que
para	isso	forem	designados”.
401.	 “Art.	 3º	 São	 autores	 do	 crime	 de	 importação,	 ou	 de	 tentativa	 dessa
importação	 o	 dono,	 o	 capitão	 ou	 mestre,	 o	 piloto	 e	 o	 contramestre	 da
embarcação,	e	o	sobrecarga.	São	cúmplices	a	equipagem,	e	os	que	coadjuvarem
o	desembarque	de	escravos	no	território	brasileiro,	ou	que	concorrerem	para	os
ocultar	ao	conhecimento	da	Autoridade,	ou	para	os	subtrair	a	apreensão	no	mar,
ou	em	ato	de	desembarque,	sendo	perseguido”.
402.	“A	abolição	do	tráfico	teve	um	impacto	imediato	no	preço	dos	escravos.	[...]
Em	curto	prazo,	 os	 preços	dobraram	e	daí	 por	 diante,	 até	 a	 década	de	oitenta,
continuaram	a	 subir”	 (Costa,	Emilia	Viotti	 da.	A	Abolição.	 São	 Paulo:	Global,
2001,	p.	31).	Uma	outra	consequência	do	aumento	do	preço	dos	escravos:	“[...]
os	 fazendeiros	 de	 café	 tornaram-se	 mais	 resistentes	 quanto	 à	 abolição	 da
escravatura.	 Isso	 porque	 a	 facilidade	 para	 os	 créditos	 sugeria	 a	 permanência
desse	 regime	 de	 trabalho,	 pois	 os	 credores,	 para	 concederem	 financiamentos,
levavam	 em	 consideração	 a	 valorização	 do	 cativo.	 Em	 consequência	 disso,	 os
proprietários	 de	 escravos	 encaravam	 a	 permanência	 do	 regime	 como	 uma
condição	mais	favorável	às	suas	atividades”	(Vale,	Valter	do.	Causas	da	extinção
da	escravatura	no	Brasil.	Recife:	Livro	Rápido,	2007,	p.	58).
403.	 “De	 1856	 a	 1856	 houve	 ainda	 dois	 desembarques,	 em	 Serinhaem	 e	 S.
Mateus;	 foram,	 porém,	 apreendidos	 todos	 os	 africanos,	 à	 exceção	 de	 quatro,
sendo	o	número	total	deles	o	de	542”	(Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A
Escravidão	no	Brasil:	 ensaio	 histórico-jurídico-social:	 africanos,	 v.	 III.	 Rio	 de
Janeiro:	Typographia	Nacional,	1867,	p.	56).
404.	 Também	 denominado	 de	 comércio	 inter-regional	 de	 escravos,	 que
descreveria	 com	 muito	 mais	 propriedade	 o	 deslocamento	 da	 mão	 de	 obra
elemento	 servil	 do	 Norte	 para	 o	 Sul	 do	 império,	 segundo	 a	 terminologia
empregada	por	Mello,	Evaldo	Cabral	de.	O	Norte,	O	Sul	e	a	proibição	do	tráfico
interprovincial	 de	 escravos.	 Revista	 do	 Instituto	 Arqueológico,	 Histórico	 e
Geográfico	Pernambucano,	Recife,	v.	51,	p.	330,	1979.
405.	“Em	1850,	a	população	escrava	significa	31	por	cento	do	total	da	população
brasileira,	 então	de	5.520.000	habitantes”	 (Figueiredo,	Ariovaldo.	O	negro	e	a
violência	do	branco:	o	negro	em	Sergipe.	Rio	de	Janeiro:	J.	Álvaro,	1977,	p.	31).
406.	O	tráfico	interprovincial	de	escravos	não	era	uma	novidade	do	Brasil,	já	que
houve	 significativa	 transferência	 de	mão	 de	 obra	 servil	 para	 a	 região	 aurífera
mineiras,	no	século	XVIII,	entretanto,	houve	uma	intensificação	do	seu	volume,
sobretudo	 ao	 crescimento	 exponencial	 da	 demanda	 de	 força	 de	 trabalho	 na
lavoura	 cafeeira	 (Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 O	 Norte,	 O	 Sul	 e	 a	 proibição	 do
tráfico	interprovincial	de	escravos.	Revista	do	Instituto	Arqueológico,	Histórico
e	Geográfico	Pernambucano,	Recife,	v.	51,	p.	314,	1979).
407.	O	tráfico	interprovincial	de	escravos	não	era	uma	novidade	do	Brasil,	já	que
houve	 significativa	 transferência	 de	mão	 de	 obra	 servil	 para	 a	 região	 aurífera
mineiras,	no	século	XVIII,	entretanto,	houve	uma	intensificação	do	seu	volume,
sobretudo	 ao	 crescimento	 exponencial	 da	 demanda	 de	 força	 de	 trabalho	 na
lavoura	 cafeeira	 (Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 O	 Norte,	 O	 Sul	 e	 a	 proibição	 do
tráfico	interprovincial	de	escravos.	Revista	do	Instituto	Arqueológico,	Histórico
e	 Geográfico	 Pernambucano,	 Recife,	 v.	 51,	 p.	 314,	 1979).	 “Com	 a	 abrupta
supressão	 do	 tráfico	 africano,	 o	 fluxo	 de	 escravos	 do	 norte	 para	 o	 sul
transformou-se	numa	autêntica	torrente	e	começou	sendo	considerado	vital	para
os	 interesses	 dos	 fazendeiros	 da	 região	 do	 café.”	 (Conrad,	Robert.	Os	 últimos
anos	 da	 escravatura	 no	 Brasil.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Civilização	 Brasileira,	 INL,
1975,	p.	65).
408.	Registre-se	que	quando	se	fala	de	províncias	do	Norte	do	Império,	refere-se
ao	que	atualmente	compreendem	os	estados	do	Norte	e	Nordeste	do	Brasil.	De
igual	modo,	 quando	 se	 fala	 de	 províncias	 do	Sul,	 faz-se	 referência	 às	 situadas
principalmente	 no	 atual	Sudeste.	A	 atual	 divisão	do	Brasil	 em	Regiões	 apenas
adveio	no	período	republicano,	após	a	primeira	metade	do	século	XX.
409.	“[...]	O	tráfico	interprovincial	surgiu	tanto	pela	perspectiva	da	abolição	da
escravatura	 nas	 províncias	 do	Norte,	 quanto	 pela	 falta	 de	 condições	 de	muitos
dos	escravocratas	em	sustentaram	seus	próprios	escravos	causada	pelas	grandes
secas	 bem	 como	 pela	 decadência	 da	 cultura	 da	 cana-de-açúcar	 e	 do	 algodão”
(Vale,	 Valter	 do.	Causas	 da	 extinção	 da	 escravatura	 no	 Brasil.	 Recife:	 Livro
Rápido,	2007,	p.	31).
410.	 Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 O	 Norte	 Agrário	 e	 o	 Império:	 1871-1889.
Topbooks,	p.	37.
411.	“O	comércio	inter-regional	atingiu	seu	nível	mais	elevado	nos	anos	setenta.Para	 isto,	 contribuiu	 não	 só	 a	 crise	 da	 agricultura	 nortista	 (aniquilamento	 da
lavoura	 algodoeira	 e	 redução	 dos	 preços	 do	 açúcar	 no	mercado	 internacional,
que	 a	 elevação	 da	 taxa	 cambial	 [...]	 tornara	 ainda	 mais	 insuportável)	 como
também	 a	 grande	 seca	 de	 1877-1879.	 No	 Ceará,	 a	 província	 mais	 atingida,	 a
exportação	 de	 escravos,	 que	 fora	 em	média	 de	 800	 por	 ano	 durante	 o	 triênio
1874-1876,	subia	a	cerca	de	2.000	durante	os	três	anos	de	estio”	(Mello,	Evaldo
Cabral	de.	O	Norte	Agrário	e	o	Império:	1871-1889.	Topbooks,	1999,	p.	47-48).
No	mesmo	sentido	Drescher,	Seymour.	Abolição:	uma	história	da	escravidão	e
do	 antiescravismo.	 Tradução	 de	 Antônio	 Penalves	 Rocha.	 São	 Paulo:	 Unesp,
2011,	p.	515-516.
412.	 Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 O	 Norte	 Agrário	 e	 o	 Império:	 1871-1889.
Topbooks,	1999,	p.	37	e	Costa,	Emilia	Viotti	da.	A	Abolição.	São	Paulo:	Global,
2001,	p.	33.
413.	 Moura,	 Clóvis.	 Dicionário	 da	 Escravidão	 negra	 no	 Brasil.	 São	 Paulo:
Editora	da	USP,	2004,	p.	396.
414.	O	negócio	jurídico	da	compra	e	venda	passou	a	ser	regido	pelos	arts.	510	e
seguintes	das	Consolidações	das	Leis	Civis,	de	Teixeira	de	Freitas,	de	1858.
415.	Tratava-se	do	contrato	de	comissão	mercantil	previsto	no	Código	Comercial
de	 1850:	 “Art.	 165	 A	 comissão	mercantil	 é	 o	 contrato	 do	mandato	 relativo	 a
negócios	mercantis,	quando,	pelo	menos,	o	comissário	é	comerciante,	 sem	que
nesta	 gestão	 seja	 necessário	 declarar	 ou	mencionar	 o	 nome	do	 comitente.	Art.
166	O	comissário,	contratando	em	seu	próprio	nome,	ou	no	nome	de	sua	própria
firma	ou	razão	social,	fica	diretamente	obrigado	às	pessoas	com	quem	contratar,
sem	que	estas	tenham	ação	contra	o	comitente,	nem	este	contra	elas;	salvo	se	o
comissário	fizer	cessão	dos	seus	direitos	a	favor	de	uma	das	partes”.
416.	A	procuração	 era	 o	 instrumento	 que	 fazia	 prova	do	 contrato	 de	mandato:
“Haverá	 mandato	 expresso,	 quando	 o	 mandante	 o	 tiver	 conferido	 por
procuração,	 verbalmente,	 ou	 por	 gestos	 não	 equívocos	 que	 manifestem	 sua
vontade	de	conferi-lo”	(Freitas,	Augusto	Teixeira.	Esboço	do	Código	Civil,	v.	2.
Brasília:	 Fundação	 UnB,	 1983,	 p.	 459).	 O	 contrato	 de	 mandato	 era
regulamentado	 pelo	 art.	 456	 das	 Consolidações	 das	 Leis	 Civis	 de	 1858
(Ordenações	 Filipinas,	 título	 48,	 §	 15):	 “O	 procurador	 não	 é	 legitimamente
constituído,	senão	por	procuração	feita	em	instrumentos	públicos	dos	Tabeliães;
ou	em	instrumentos	particulares	de	pessoas,	à	quem	se	concede	este	privilégio”
(Freitas,	 Augusto	 Teixeira	 de.	 Consolidação	 das	 Leis	 Civis,	 v.	 1.	 Brasília:
Senado,	2003,	p.	317).
417.	 Art.	 470,	 §	 1º,	 das	 Consolidações	 das	 Leis	 Civis	 de	 1858.
Substabelecimento	seria	o	“[...]	ato	de	transferir	um	a	representação,	delegação,
ou	mandato,	ou	o	ato	de	se	substituir	o	mandatário	estabelecido	(instituído),	por
outrem,	que	venha	executar,	por	ele,	o	mandato	que	 lhe	havia	 sido	outorgado”
(Silva,	de	Plácido	e.	Vocabulário	Jurídico.	Atualizadores:	Nagib	Slaibi	Filho	 e
Gláucia	Carvalho.	Rio	de	Janeiro:	Editora	Forense,	2006,	p.	1333).
418.	Até	o	advento	do	Código	de	Processo	Criminal	do	Império,	a	Lei	de	29	de
novembro	 de	 1832,	 era	 exigido	 passaporte	 dos	 Cidadãos	 e	 escravos	 ao	 se
deslocarem	no	 território	nacional.	Posteriormente,	apenas	passou	a	ser	exigido,
na	prática,	passaporte	dos	escravos,	por	interpretação	do	art.	118	do	Código	de
Processo	Criminal	de	1832:	“O	cidadão,	que	viajar	por	mar,	ou	terra	dentro	do
lmpério,	 não	 é	 obrigado	 a	 tirar	 passaporte,	mas	 fica	 sujeito	 ás	 indagações	 dos
Juízes	locais”	(Chalhoub,	Sidney.	A	força	da	escravidão:	 ilegalidade	e	costume
no	Brasil	oitocentista.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2012,	p.	52-53	e	58).
Merece	 registro	 que	 “[...]	 a	 lei	 de	 7	 de	 novembro	 de	 1831	 não	 fora	 suficiente
para	 organizar	 a	 burocracia	 imperial	 quanto	 aos	 passaportes	 de	 escravos	 e
libertos”	 (Chalhoub,	 Sidney.	A	 força	 da	 escravidão:	 ilegalidade	 e	 costume	 no
Brasil	oitocentista.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2012,	p.	57).
419.	“O	 tráfico	 interno	 deslocou	 para	 o	 sudeste,	 a	 partir	 de	meados	 do	 século
XIX,	milhares	de	escravos	que	se	viram	subitamente	arrancados	de	seus	 locais
de	 origem,	 da	 companhia	 de	 seus	 familiares,	 e	 do	 desempenho	 das	 tarefas	 às
quais	 estavam	 acostumados”	 (Chalhoub,	 Sidney.	 Visões	 da	 liberdade:	 uma
história	das	últimas	décadas	da	escravidão	na	Corte.	São	Paulo:	Companhia	das
Letras,	2011,	p.	29-30).
420.	 Chalhoub	 apud	 Jacinto,	 Cristiane	 Pinheiro	 Santos.	 Fazendeiros,
Negociantes	e	Escravos:	Dinâmica	e	Funcionamento	do	Tráfico	Interprovincial
de	 Escravos	 no	 Maranhão	 (1846-1885).	 In:	 Galves,	 Marcelo	 Cherche;	 Costa,
Yuri	(orgs.).	O	maranhão	oitocentista.	Imperatriz:	Ética/São	Luís:	Editora	Uema,
2009,	p.	182.
421.	 Esse	 tributo	 de	 competência	 tributária	 do	 Município	 neutro	 e	 das
Províncias,	 poderia	 ser	 instituída	 para	 incidir	 sobre	 a	 compra	 e	 venda	 de
escravos,	em	operações	inter	ou	intraprovinciais.	Em	São	Paulo,	com	a	fixação
da	alíquota	de	5%	sobre	a	operação,	chegou-se	a	uma	recita	equivalente	a	7%	da
renda	global.	Por	essa	razão,	também	não	existia	interesse	para	a	abolição,	já	que
a	 manutenção	 da	 escravidão	 era	 um	 negócio	 ótimo	 para	 os	 cofres	 públicos
(Luna,	Luís.	O	Negro	 na	Luta	 contra	 a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,
1976,	p.	88-89).
422.	Houve	 tentativas	 de	 criação	 de	 leis	 proibindo	 o	 tráfico	 interprovincial	 de
escravos,	 as	 quais	 não	 prosperaram	 no	 Parlamento	 brasileiro	 (Mello,	 Evaldo
Cabral	de.	O	Norte,	O	Sul	e	a	proibição	do	 tráfico	 interprovincial	de	escravos.
Revista	 do	 Instituto	 Arqueológico,	 Histórico	 e	 Geográfico	 Pernambucano,
Recife,	v.	51,	p.	321,	1979).
423.	 Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	 O	 Norte	 Agrário	 e	 o	 Império:	 1871-1889.
Topbooks,	p.	38.
424.	 Moura,	 Clóvis.	 Dicionário	 da	 Escravidão	 negra	 no	 Brasil.	 São	 Paulo:
Editora	da	USP,	2004,	p.	396-397.
425.	“As	casas	de	comerciantes	que	se	ocupavam	com	esse	gênero	de	negócio
fecharam	 as	 portas,	 e	 hoje	 são	 raras	 as	 vendas”	 (Mello,	 Evaldo	 Cabral	 de.	O
Norte	Agrário	e	o	Império:	1871-1889.	Topbooks,	p.	55).	O	apogeu	desse	tráfico
interprovincial	deu-se	na	década	de	1870,	com	a	crise	da	agricultura	do	Norte,
ligada	 ao	 algodão,	 e	 a	 queda	 do	 preço	 do	 açúcar	 no	 mercado	 internacional
(Mello,	Evaldo	Cabral	de.	O	Norte,	O	Sul	e	a	proibição	do	tráfico	interprovincial
de	 escravos.	 Revista	 do	 Instituto	 Arqueológico,	 Histórico	 e	 Geográfico
Pernambucano,	Recife,	v.	51,	p.	320,	1979).
426.	“Art.	3º.	 [...]	§	19.	O	domicílio	do	escravo	é	 intransferível	para	Província
diversa	 da	 em	que	 estiver	matriculado	 ao	 tempo	 da	 promulgação	 desta	Lei.	A
mudança	 importará	 aquisição	 da	 liberdade,	 exceto	 nos	 seguintes	 casos:	 1º
Transferência	do	escravo	de	um	para	outro	estabelecimento	do	mesmo	senhor.	2º
Se	o	escravo	tiver	sido	obtido	por	herança	ou	por	adjudicação	forçada	em	outra
Província.	 3º	Mudança	 de	 domicílio	 do	 senhor.	 4º	Evasão	 do	 escravo”	 (Lei	 nº
3.270,	de	28	de	setembro	de	1885).
Capítulo	4
	
Estatuto	Civil	do	Escravo
	
	
Falar	 de	 estatuto	 civil	 do	 escravo	 pode	 parecer	 quase	 que	 uma
contradição.	Como	uma	coisa427ou,	no	máximo,	uma	pessoa	que	era
reduzida	 ao	 status	 de	 coisa,	 um	 objeto	 do	 poder	 de	 um	 terceiro,
poderia	possuir	um	estatuto	civil?	Como	falar	de	direitos	e	deveres	se
o	escravo	era	a	antítese	da	capacidade	civil?	Afinal,	 como	o	Direito
brasileiro	 regulamentava	 o	 estatuto	 civil	 do	 escravo,	 considerando	 a
perda	da	sua	liberdade?
Ao	 tratar-se	 do	 Estatuto	Civil	 do	 Escravo,	 além	 de	 vislumbrar	 a
sua	 capacidade	 civil,	 estuda-se	 como	 a	 lei	 civil	 regulamentava	 as
relações	jurídicas	nas	quais	o	cativo	era	agente	ou	paciente.	Registre-
se	que	asregras	civis	aplicadas	aos	cativos	eram	sempre	uma	exceção
ao	Direito	comum	e	que,	em	muitos	momentos,	utilizavam	o	Direito
Romano	 subsidiariamente,	 como	 inclusive	 já	 havia	 decidido	 o
Conselho	de	Estado	do	Império:
A	 doutrina	 que	 autoriza	 esta	 prática	 tem	 assento	 no
Direito	Romano	o	qual	conforme	a	Lei	de	18	de	agosto
de	 1769	 pode	 na	 falta	 de	 lei	 pátria	 ser	 admitido	 como
texto	 para	 julgar-se	 por	 ele	 subsidiariamente	 uma	 vez
que	 concorram	 certas,	 e	 determinadas	 condições.	 É
necessário	para	isto	que	o	Direito	Romano	se	funde	ou
naquela	 boa	 razão,	 que	 consiste	 nos	 primitivos
princípios,	que	contém	verdades	essenciais,	intrínsecas,
e	 inalteráveis	 que	 a	 Ética	 dos	 Romanos	 havia
estabelecido	[...].428
Nas	palavras	de	Malheiro429:
[...]	 qual	 o	 direito	 que	 rege	 as	 relações	 dos	 escravos
entre	si,	com	seus	senhores,	e	com	terceiros,	quanto	aos
direitos	 e	 obrigações	 civis	 e	 naturais	 [...]	 em	 que	 a
própria	 legislação	 Romana	 (a	 fonte	 mais	 abundante	 e
rica	 de	 disposições	 a	 respeito)	 tantas	 vezes	 flutuou
contraditória	 e	 incerta,	 rompendo	 quase	 sempre	 contra
as	regras	gerais.	Por	modo	que	se	pode	dizer	que	as	leis
que	 regem	 essas	 relações	 são	 todas	 de	 exceção	 ao
Direito	Civil	Comum.
Evidente	que,	 ao	 longo	dos	 anos,	 a	 regulamentação	da	vida	 civil
sofreu	alterações,	com	o	advento	da	Lei	do	Ventre	Livre	(Lei	nº	2.040,
de	28	de	setembro	de	1871),	a	qual	estabeleceu	verdadeiramente	um
Estatuto	Civil	para	o	elemento	servil,	revogando	a	legislação	anterior.
Mesmo	 assim,	 trata-se	 de	 um	 diploma	 legal	 que	 apenas	 concedia
“direitos	 civis”	 com	 a	 finalidade	 de	manter	 um	 regime	 exploratório
que	já	perdurava	há	mais	de	300	anos	no	solo	brasileiro.
Como	 afirmou	 Joaquim	Nabuco,	 o	 legislador	 foi	 frio	 e	 seco,	 na
tardia	Lei	do	Ventre	Livre	de	1871:
Não	há	na	lei	de	28	de	setembro	nada	nesse	sentido,	que
revele	 cuidado	 e	 desvelo	 pela	 natureza	 humana	 no
escravo:	 o	 legislador	 neste	 caso	 cumpriu	 apenas	 um
dever,	sem	amor,	quase	sem	simpatia;	naquele,	em	falta
da	 liberdade	 imediata	 que	 lhe	 pesava	 não	 poder
decretar,	ele	mostrou	pelas	vítimas	da	injustiça	social	o
mais	 estranhado	 interesse,	 carinho	 mesmo,	 que	 não
podia	deixar	de	ir-lhes	direito	ao	coração.430
Entretanto,	 deve-se	 frisar	 que	 tal	 lei	 surgiu	 quase	 cinco	 décadas
depois	da	Independência	brasileira,	vigorando	até	então	as	disposições
das	Ordenações	Filipinas431,	 que	 regulamentavam	 cruelmente	 a	 vida
civil	do	elemento	servil.
Para	se	captar	a	brutalidade	de	 tal	estado	de	submissão	civil,	que
levava	 milhões	 de	 homens	 e	 mulheres	 a	 um	 drama	 indizível,	 é
importante	a	 leitura	da	seguinte	passagem	de	Joaquim	Nabuco	sobre
sua	 infância	no	Engenho	Massangana,	no	Cabo	de	Santo	Agostinho,
na	província	de	Pernambuco,	no	século	XIX:
[...]	 a	 escravidão	 para	 mim	 cabe	 toda	 em	 um	 quadro
inesquecido	 da	 infância,	 em	 uma	 primeira	 impressão,
que	decidiu,	estou	certo,	do	emprego	ulterior	de	minha
vida.	Eu	estava	uma	tarde	sentado	no	patamar	da	escada
exterior	da	casa,	quando	vejo	precipitar-se	para	mim	um
jovem	negro	desconhecido,	de	cerca	de	dezoito	anos,	o
qual	 se	 abraça	 aos	meus	pés	 suplicando-me	pelo	 amor
de	Deus	que	o	fizesse	comprar	por	minha	madrinha	para
me	servir.	Ele	vinha	das	vizinhanças,	procurando	mudar
de	 senhor,	 porque	 o	 dele,	 dizia-me,	 o	 castigava,	 e	 ele
tinha	 fugido	 com	 risco	 de	 vida...	 Foi	 este	 o	 traço
inesperado	 que	me	 descobriu	 a	 natureza	 da	 instituição
com	 a	 qual	 eu	 vivera	 até	 então	 familiarmente,	 sem
suspeitar	a	dor	que	ela	ocultava.432
Imagine	presenciar	um	homem	adulto,	ajoelhado	aos	seus	pés,	em
desespero,	implorando	para	ser	comprado,	por	ter	fugido	de	um	outro
cativeiro	 no	 qual	 era	 submetido	 a	 uma	 rotina	 de	 tratamento	 feroz.
Admitir	 que	 a	 capitis	 diminutio	 maxima	 maculava	 a	 dignidade	 do
indivíduo	 é	 imprescindível	 para	 que	 nós,	 homens	 e	 mulheres	 do
século	XXI,	tentemos	compreender	o	que	representava	ter	a	sua	vida
civil	reduzida	à	condição	de	escravo.
O	 desespero	 e	 a	 total	 ausência	 de	 dignidade	 eram	 realidades	 na
existência	 desses	 indivíduos,	 literalmente	 esmagados	 por	 uma
estrutura	 exploratória	 que	 os	 marginalizava	 para	 poder	 oprimi-los.
Joaquim	Nabuco433	 oferece	 uma	 perfeita	 descrição	 ao	 apresentar	 ao
leitor	 as	 consequências	 de	 uma	 relação	 humana	 em	 que	 uma	 das
partes	detinha	total	poder	(o	senhor)	e	a	outra	se	encontrava	em	total
sujeição	(o	escravo):
Como	 se	 há	 de	 definir	 juridicamente	 o	 que	 o	 senhor
pode	 sobre	 o	 escravo,	 ou	 que	 este	 não	 pode	 contra	 o
senhor?	Em	regra,	o	senhor	pode	 tudo.	Se	quiser	 ter	o
escravo	 fechado	 perpetuamente	 dentro	 de	 casa,	 pode
fazê-lo;	 se,	 tendo	 ele	 mulher	 e	 filhos,	 quiser	 que	 eles
não	 se	 vejam	 e	 não	 se	 falem,	 se	 quiser	mandar	 que	 o
filho	 açoite	 a	 mãe,	 apropriar-se	 da	 filha	 para	 fins
imorais,	pode	fazê-lo.
Imaginem-se	todas	as	mais	extraordinárias	perseguições
que	um	homem	pode	exercer	contra	outro,	sem	o	matar,
sem	separá-lo	por	venda	de	sua	mulher	e	filhos	menores
de	 quinze	 anos	 –	 e	 ter-se-á	 o	 que	 legalmente	 é	 a
escravidão	 ente	 nós.	 A	 Casa	 de	 Correção	 é,	 ao	 lado
desse	outro	estado,	um	paraíso.	Exceto	a	ideia	do	crime
–	 que	 é	 pior	 que	 a	 sorte	 do	 escravo	 mais	 infeliz,
tomando-se	por	exemplo	um	condenado	inocente	–	não
há	comparação	ente	um	regime	de	obrigações	certas,	de
dependência	 a	 lei	 e	 dos	 seus	 administradores,	 e	 um
regime	 de	 sujeição	 como	 sua	 propriedade,	 a	 um
indivíduo,	que	pode	ser	um	louco	ou	um	bárbaro.434
Fica	 evidente	 a	 necessidade	 de	 se	 estudar	 a	 natureza	 jurídica	 do
escravo.	 O	 primeiro	 passo	 que	 se	 dá,	 portanto,	 é	 analisar	 como	 o
direito	em	vigor	enxergava	o	escravo.
1.	Natureza	Jurídica	do	escravo
Falar	 da	 natureza	 jurídica	 de	 algo	 é	 inserir	 o	 objeto	 estudado
dentro	 das	 categorias	 lógicas	 do	 direito	 vigente	 naquele	 contexto
histórico,	 ou	 seja,	 é	 dizer	 que	 aquilo	 que	 está	 sendo	 estudado	 tem
características	que	tornam	possível,	para	fins	de	classificação,	indicar
que	 ele	 se	 encontra	 dentro	 de	 um	 específico	 conjunto	 com
propriedades	similares.	O	debate	sobre	a	natureza	jurídica	do	escravo
versa	 necessariamente	 sobre	 a	 controvérsia	 se	 aquele	 ser	 humano,	 à
luz	do	direito,	deveria	 ser	 regido	pelo	 regime	 jurídico	das	coisas	 ou
das	pessoas.
Cumpre	registrar,	a	fim	de	esclarecer	a	natureza	da	relação	jurídica
da	escravidão,	que	não	se	trata	de	uma	locação	de	serviços,	mas	de
uma	relação	em	que	juridicamente	um	ser	humano	está	sujeito	a	outro,
que	o	possui:
[...]	 não	 é	 um	 contrato	 de	 locação	 de	 serviços	 que
imponha	 ao	 que	 se	 obrigou	 certo	 número	 de	 deveres
definido	para	com	o	 locatário.	É	a	posse,	o	domínio,	o
sequestro	 de	 um	 homem	 corpo,	 inteligência,	 forças,
movimentos,	atividades	–	e	só	acaba	com	a	morte.435
Portanto,	 na	 escravidão,	 como	 não	 existe	 a	 manifestação	 da
vontade	para	a	formação	do	vínculo,	não	se	trata	de	uma	relação
contratual436	 e,	 por	 isso,	 sua	 natureza	 jurídica	 possui	 inúmeras
peculiaridades.
2.	O	status	do	escravo	na	legislação	brasileira:	persona
e	res
Para	o	Conselheiro	Joaquim	Ribas,	o	escravo	não	era	tão-somente
uma	 res,	 era	 considerado	 também	 personae,	 ou	 seja,	 os	 direitos	 do
senhor	 sobre	 seu	 escravo	 (dominica	 potestas)	 não	 eram	 apenas
exercidos	a	título	de	dominus,	mas	também	como	potestas:
A	dominica	 potestas	 dos	 Romanos,	 constando	 de	 dois
elementos	 –	 o	 dominium	 e	 a	 potestas,	 impunha	 ao
escravo	 duplo	 sujeição	 ao	 senhor,	 e	 o	 considerava	 ao
mesmo	 tempo	 como	 coisa	 e	 como	 pessoa.	 Esta
instituição	 não	 despessoalizava,	 pois,	 inteiramente	 o
escravo,	 nem	 poderiaele	 sê-lo,	 pois	 que	 a	 sua
incapacidade	era	sujeita	a	restrições.
À	 proporção,	 porém,	 que	 o	 direito	 estrito	 se	 foi
aproximando	do	racional,	foi-se	restringindo	a	dominica
potestas,	 e	 paralelamente	 alargando	 a	 capacidade	 dos
escravos,	 esta	 instituição	 reconhecida	 como	 oposta	 à
natureza,	e	a	liberdade	como	faculdade	natural
Entre	nós	também	os	direitos	do	senhor	sobre	o	escravo
constituem	domínio	 e	 poder,	 em	 relação	 ao	 domínio	 o
escravo	é	cousa,	em	relação	ao	poder	é	pessoa.437
Tal	raciocínio	pode	ser	explicado	pela	compreensão	dos	institutos
de	 direito	 romano	 que	 eram	 aplicados	 subsidiariamente	 para
sistematizar	 a	 escravidão	brasileira:	 o	 escravo	 era	 res	 e	personae	 ao
mesmo	tempo,	desde	que	se	compreenda	esse	último	termo	não	como
sujeito	de	direito,	mas	como	ser	humano:
No	 direito	 romano	 o	 termo	 personae	 era	 usado	 como
equivalente	 a	 homo	 e	 não	 como	 titular	 de	 direito.	 Por
isso	 os	 escravos	 eram	 considerados	 ao	 mesmo	 tempo
personae,	e	res.	Isto	não	significa	que	o	escravo	pudesse
ser	titular	de	direito,	pois	Ulpiano	esclarece	muito	bem
a	 sua	 posição	 perante	 o	 direito	 civil	 –Quod	 attinet	 ad
IUS	CIVILE	SERVI	pro	nullis	habentur.	[...]
O	 escravo	 não	 era	 sujeito	 de	 direito,	 pois	 era
considerado	 uma	 coisa,	 ou	 melhor,	 um	 animal
humano438.	O	dominus	 exercia	 sobre	o	servus	o	direito
de	propriedade	e	para	sancionar	esse	direito	fazia	uso	da
reivindicatio,	isto	é,	da	mesma	ação	de	que	se	servia	em
se	tratando	de	um	objeto	móvel439.
Nesse	sentido,	Malheiro	defende:
Por	 isso	 que	 o	 escravo	 é	 reputado	 coisa,	 sujeito	 ao
domínio	(dominium)	 de	 seu	 senhor,	 e	por	 ficção	da	 lei
subordinado	às	 regras	gerais	da	propriedade.	Enquanto
homem	ou	pessoa	(acepção	lata),	é	sujeito	ao	poder	do
mesmo	 (potestas)	 com	 suas	 respectivas
consequências.440
Para	exemplificar,	pode-se	analisar	um	caso	concreto,	descrito	no
Parecer	 nº	 05,	 de	 20	 de	 março	 de	 1858,	 da	 lavra	 do	 Conselho	 de
Estado	do	 Império,	 que	discutia	 as	questões	 apontadas,	 analisando	a
extensão	do	direito	de	propriedade	do	dominus	sobre	o	servus.
A	questão	levada	ao	Conselho	de	Estado	iniciava-se	com	o	fato	de
que	Porfírio	Fernandes	Siqueira,	residente	na	província	do	Rio	Grande
do	Sul,	hipotecou	três	escravos	seus	a	Francisco	Manuel	dos	Passos.	A
hipoteca441,	 assim	como	hoje,	era	considerada	garantia	 real442.	O	art.
13	do	Regulamento	de	14	de	novembro	de	1846	previa	os	seus	efeitos
legais:	 “[...]	 são	efeitos	 legais	o	 registro	das	hipotecas,	 tornar	nula	a
favor	do	credor	hipotecário,	qualquer	alienação	dos	bens	hipotecados
por	título,	quer	gratuito,	quer	oneroso”.
Posteriormente,	com	a	finalidade	de	retirar	o	gravame	que	incidia
sobre	 seus	 escravos,	 com	 manifesta	 má-fé,	 Porfírio	 Fernandes
Siqueira	 levou-os	 à	 República	 Oriental	 do	 Uruguai,	 cuja	 legislação
considerava	livre	os	escravos	que	ali	se	encontrassem.
Francisco	Manuel	dos	Passos,	diante	do	prejuízo	com	a	perda	da
garantia	real	do	seu	crédito,	formulou	requerimento	ao	Presidente	da
Província	 requerendo	 que	 esse,	 junto	 à	 legação	 imperial	 em
Montevidéu,	 reclamasse	 a	 extradição	 dos	 escravos	 brasileiros
hipotecados	 com	 fundamento	 no	 art.	 6º	 do	 tratado	 de	 extradição
firmado	entre	a	República	Oriental	do	Uruguai	e	o	Império	do	Brasil,
que	dizia:
O	governo	da	República	Oriental	do	Uruguai	reconhece
o	 princípio	 da	 devolução	 dos	 escravos	 pertencentes	 a
súditos	 brasileiros	 que,	 contra	 a	 vontade	 dos	 seus
senhores,	forem,	por	qualquer	maneira,	para	o	território
da	dita	república	e	aí	se	acharem.
Na	 fundamentação	 da	 decisão	 ao	 requerimento	 formulado	 por
Francisco	 Manuel	 dos	 Passos443	 encontra-se	 descrito	 o	 status	 do
servus	perante	a	legislação	brasileira:
[...]	 O	 governo	 [da	 República]	 oriental,	 concedendo	 a
devolução,	 como	 exceção	 da	 lei	 que	 aboliu	 a
escravatura	em	todo	o	 território	da	república,	 limitou-a
aos	casos	em	que	os	escravos	passarem	a	esse	território
contra	a	vontade	de	seus	senhores.
O	Governo	Imperial,	aceitando	essa	limitação,	garantiu
a	liberdade	aos	que	se	acharem	no	caso	contrário.
Por	isso,	em	toda	questão	de	devolução,	é	mister	ter	em
vista	não	somente	os	direitos	do	governo	oriental	 e	do
senhor	 do	 escravo,	 mas	 também	 a	 posição	 deste	 para
com	aquele.
O	escravo	ignora	as	transações	de	que	é	objeto,	não
entra,	 nem	pode	 entrar,	 no	 exame	delas:	 obedece	 a
seu	 senhor.444	 Se	 este	 o	 traz	 para	 o	 Estado	 Oriental,
quaisquer	 que	 sejam	 as	 obrigações	 contraídas,	 haja	 ou
não	 hipotecas,	 por	 aquele	 simples	 fato,	 o	 escravo
adquire	a	sua	liberdade,	é	livre	nesta	república,	é	liberto
no	Brasil.	Ambos	os	governos	estão	obrigados	a	manter-
lhe	 o	 direito	 que	 lhe	 concederam,	 nem	 um	 pode
reclamar	a	sua	devolução,	nem	o	outro	pode	concedê-la.
[...]
Finalmente,	 devem	 ser	 considerados	 libertos	 os
escravos,	que	estando	como	contratados,	ou	em	serviço
autorizado	 por	 seus	 senhores	 no	 território	 indicado	 –
voltarem	à	província	do	Rio	Grande	do	Sul,	porquanto,
pelo	 princípio	 geral	 acima	 exposto,	 o	 fato	 de
permanecer	 ou	 ter	 permanecido,	 por	 consentimento	 do
seu	senhor,	em	um	país	onde	está	abolida	a	escravidão,
dá	 imediatamente	 ao	 escravo	 a	 condição	 de	 liberto
[...]445.
(grifos	nossos)
Tais	 conclusões	 foram	 remetidas	 ao	 Conselho	 de	 Estado	 do
Império,	que	as	ratificou	e	acrescentou:	“Se	esses	escravos	voltassem
ao	 Império,	 então	 poderia	 o	 reclamante	 fazer	 valer	 seus	 direitos
hipotecários	contra	uma	liberdade	conferida	com	fraude	manifesta	e,
ainda	assim,	o	êxito	seria	duvidoso”446.
O	Imperador	aprovou	o	parecer	em	29	de	março	de	1859.	Portanto,
manifestando	que	o	escravo	possuía,	ao	 lado	da	 sua	condição	de
personae,	 a	 natureza	 de	 coisa447,	 tendo	 em	 vista	 que	 sobre	 ele,
inclusive,	 poderiam	 recair	 direitos	 reais	 de	 garantia.	 Como	 ensina
Freitas448:
Na	classe	dos	bens	móveis	entram	os	semoventes,	e	na
classe	dos	semoventes	estram	os	escravos.	Posto	que	os
escravos,	 como	 artigos	 de	 propriedade,	 devam	 ser
considerados	 coisas;	 não	 se	 equiparam	 em	 tudo	 aos
outros	 semoventes,	 e	 muito	 menos	 aos	 objetos
inanimados,	e	por	isso	tem	legislação	peculiar.
Para	o	civilista,	os	escravos	teriam	natureza	jurídica,	para	fins	de
aplicação	 das	 leis	 civis	 e	 comerciais,	 de	bens	móveis	 semoventes449
submetidos	a	um	regime	jurídico	especial.
O	 ordenamento	 jurídico	 brasileiro,	 como	 exposto,	 também
considerava	o	escravo	como	uma	quase-pessoa,	logo,	o	servus	poderia
ser	paciente	ou	agente	de	condutas	que	desencadeariam	o	surgimento
de	consequências	jurídicas450.
A	seguir	será	realizada	a	análise	das	limitações	da	vida	do	cativo,
nas	várias	dimensões	da	personalidade	civil	do	sujeito	de	direito.
3.	Escravo	e	Patrimônio
O	 patrimônio	 é	 um	 elemento	 indispensável	 à	 personalidade	 do
indivíduo	 e	 que	 está	 relacionado	 à	 sua	 capacidade	 para	 adquirir
propriedade	 real,	 na	 terminologia	 utilizada	 pelos	 doutrinadores	 do
século	 XIX,	 que	 era	 um	 dos	 direitos	 fundamentais	 dos	 Cidadãos
brasileiros:
A	propriedade	real,	assim	como	a	 intelectual	ou	moral,
tem	pois	a	sua	origem	na	natureza,	e	é	sagrada,	porque,
como	 já	 dissemos,	 é	 o	 fruto	 dos	 esforços,	 fadigas	 e
sacrifícios	do	homem,	do	suor	do	seu	rosto,	é	o	pão	da
sua	família.	[...]	O	fruto	do	trabalho	do	homem	pertence
decididamente	ao	homem,	e	 lhe	deve	ser	garantido	em
toda	 a	 sua	plenitude,	 ou	 a	propriedade	 se	bens	móveis
ou	imóveis,	corpóreos	ou	incorpóreos.451
Um	 dos	 pressupostos	 para	 a	 aquisição	 do	 patrimônio	 era	 a
capacidade	para	adquirir	direitos,	como	sintetizou	Freitas	no	art.	21	do
seu	Esboço	de	Código	Civil:
A	capacidade	 civil	 é	 de	 direito,	 ou	 de	 fato.	Consiste	 a
capacidade	de	direitono	grau	de	aptidão	de	cada	classe
de	 pessoas	 para	 adquirir	 direitos,	 ou	 exercer	 por	 si	 ou
por	outrem,	atos	que	não	lhe	são	proibidos452.
A	plenitude	do	status	libertatis	seria	a	condição	fundamental	para
que	 a	 personalidade	 existisse	 e	 daí	 derivasse	 a	 capacidade	 para	 a
aquisição	 de	 direitos453.	 Se	 fosse	 ela	 ausente,	 como	 no	 caso	 dos
cativos,	 estaria	 prejudicada	 a	 construção	 de	 um	 patrimônio454.
Naturalmente,	 o	 que	 justificaria	 o	 escravo	 construir	 um	 patrimônio
seria	obter	aquilo	que	lhe	falta,	a	liberdade:	“Obter	direitos	inerentes	à
qualidade	 de	 homem	 livre,	 isto	 é,	 a	 possibilidade	 de	 sair	 da
escravidão,	é	uma	consequência	necessária	da	mesma	escravidão”455.
Diante	disso,	será	realizado	o	estudo	da	capacidade	para	construir
patrimônio	pelo	cativo,	analisando	a	própria	possibilidade	de	alcançar
sua	alforria.
4.	A	Alforria	e	as	Cartas	de	Liberdade
A	alforria	era	conceituada	por	Malheiro	como	uma	representação
do	exercício	do	direito	de	propriedade:
A	 alforria	 não	 é,	 portanto,	 em	 sua	 última,	 única,	 e
verdadeira	 expressão	 mais	 do	 que	 a	 renúncia456	 dos
direitos	 do	 senhor	 sobre	 o	 escravo,	 e	 a	 conseqüente
reintegração	 deste	 no	 gozo	 de	 sua	 liberdade,	 suspenso
pelo	 fato	de	que	ele	 foi	vítima;	o	escravo	não	adquire,
pois,	 rigorosamente	 a	 liberdade,	 pois	 sempre	 a
conservou	 pela	 natureza,	 embora	 latente	 (permita-se	 o
termo)	ante	o	arbítrio	da	lei	positiva457.
Mattoso	 explicita	 que	 a	 intenção	 de	 conceder	 liberdade458,	 no
amparo	da	lei,	ao	escravo	poderia	assumir	diversas	formas:
A	 liberdade	 por	 manumissão459	 era	 uma	 disposição
legal.	 Podia	 ser	 concedida	 solenemente	 ou	 não,	 direta
ou	 indiretamente,	 expressamente,	 tacitamente	 ou	 de
maneira	presumida,	por	certidão	entre	vivos	ou	por	ato
de	 última	 vontade,	 de	 próprio	 punho	 ou	 diante	 de
tabelião,	com	ou	sem	certidão	passada.460
As	cartas	de	liberdade,	também	chamadas	de	cartas	de	alforria461,
eram	 documentos	 que	 faziam	 prova462	 do	 negócio	 jurídico	 da
manumissão	(alforria)	realizada	pelo	senhor463,	em	prol	do	escravo:
Eram	cartas	ou	títulos	de	alforria,	documentos	por	meio
dos	 quais	 os	 senhores	 legitimavam	 a	 liberdade
concedida	aos	seus	escravos.	Era	documento	[em	regra]
registrado	 em	 cartório464	 e,	 com	 ele,	 o	 escravo	 ficava
livre	da	tutela	do	senhor465.
Não	 existia	 previsão	 legal	 de	 forma	 a	 ser	 seguida	 por	 tal
documento,	 nem	 mesmo	 regulamentação	 específica	 sobre	 o
assunto466:
Por	 ato	 voluntário	 do	 senhor	 pode	 o	 escravo	 ser
restituído	à	liberdade.	[...]	Quanto	ao	modo	ou	forma,	é
indiferente	 [...]	Não	a	prejudica,	 igualmente,	 a	 falta	de
escritura	 pública;	 toda	 a	 prova	 é	 admissível,	 seja	 qual
for	o	valor	pecuniário.467
O	 batismo,	 apesar	 de	 ato	 solene,	 por	 si	 só,	 não	 alforriava	 o
escravo,	sendo	necessária	a	manifesta	intenção	de	manumitir	realizada
pelo	senhor468,	 quando	ocorria	 a	 “alforria	 de	pia”469.	 Evidentemente,
somente	o	proprietário	poderia	conceder	a	manumissão470,	entretanto,
Malheiro	elenca	hipóteses	em	que	o	escravo	poderia	ser	alforriado	por
ato	do	anterior	senhor:
1.º	 se	 o	 escravo	 é	 vendido	 com	 a	 cláusula	 de	 ser
libertado	 pelo	 comprador;	 obrigado	 este	 a	 cumpri-lo,
todavia	ficava	sendo	seu	patrono,	ainda	que	coagido	por
sentença;	 disposição	 extensiva	 ao	 caso	 da	 doação	 ou
título	gratuito;	e	de	tal	força,	que	a	mudança	de	vontade
não	prejudica	a	liberdade;
2.º	 se	 por	 algum	 ato,	 sobretudo	 de	 última	 vontade,
alguém	dispõe	a	favor	de	escravo	alheio;	entende-se	em
forma	fideicomissária;
3.º	 se	 o	 legatário,	 ou	herdeiro,	 ou	beneficiado	 aceita	 o
legado,	herança,	ou	doação,	com	semelhante	cláusula	a
bem	de	algum	escravo	seu471;
4.º	 se	 o	 senhor	 se	 satisfaz	 com	 o	 preço	 ou	 valor	 do
escravo	 [de	 quem	 deseja	 comprar	 a	 alforria	 para	 este]
[...]472.
Como	 tais	 cartas	 de	 liberdade	 representavam	 a	 vontade	 do
senhor473	de	alforriar	e	serviam	para	fazer	prova	do	status	de	liberto,
elas	 eram	 individuais,	 mesmo	 que	 a	 manumissão	 tivesse	 como
beneficiários	 um	 grupo	 de	 escravos474.	 As	 cartas	 poderiam	 ser
concedidas	 a	 qualquer	 momento,	 durante	 a	 vida	 do	 proprietário,
inclusive	 por	 meio	 de	 testamento475	 –	 cuja	 eventual	 nulidade	 do
documento,	 por	 inobservância	 de	 formalidade,	 não	 contaminava	 a
manifestação	de	vontade	de	alforriar476.
Tais	 cartas	 de	 alforria	 poderiam	 ser	 consideradas	 nulas	 quando
houvesse	 vício	 na	 manifestação	 da	 vontade	 do	 proprietário,	 erro
substancial,	 incapacidade	 do	 manumissor477,	 ou	 falsidade478	 que
contaminassem	 o	 negócio	 jurídico479.	 Entretanto,	 mesmo	 nessas
situações,	haveria	presunção	legal	de	liberdade	em	situações	em	que	o
escravo	não	deu	causa	à	nulidade:
Assim,	posto	que	falso	o	título,	o	testamento,	por	ex.,	se
o	herdeiro	ou	legatário	libertou	o	escravo,	não	volta	este
ao	 cativeiro;	 há	 apenas	 lugar	 à	 indenização;	 se	 o	 erro
não	é	essencial,	igualmente;	se	o	senhor	é	coagido,	não
pelo	 escravo,	 nem	 pelo	 povo,	 nas	 manumissões	 por
modo	 não	 solene,	 era	 válida	 a	 manumissão	 [...];	 se	 o
menor	incapaz	de	libertar,	exceto	por	justa	causa,	iludia,
nem	por	isto	deixava	de	ser	valiosa	a	manumissão.480
A	 alforria	 condicional	 concedida	 pelo	 proprietário	 colocava	 o
cativo	na	condição	de	statuliber.	Nas	palavras	de	Rui	Barbosa481:
Statuliber	 é	 o	 servo,	 que	 se	 acha	 destinado	 a	 ser	 livre
em	 certo	 tempo,	 ou	 cumprida	 certa	 condição	 [...];	 de
onde	 se	 colige	 que	 essa	 situação	 tem	 um	 caráter
individual,	 resultante	especialmente,	em	relação	a	cada
beneficiado.	 De	 um	 ato	 particular	 da	 pessoa	 que	 o
manumite,	não	de	uma	providência	geral,	instituída	em
lei,	 para	 uma	 geração	 inteira,	 sem	 nenhuma	 alteração
expressa	 quanto	 às	 relações	 habituais	 entre	 ela	 e	 os
senhores.482
Segundo	Malheiro483,	o	alforriado	sob	condição	–	statuliber	–	não
estava	mais	submetido	estritamente	à	escravidão,	portanto,	seu	regime
jurídico	seria	diferente	do	cativeiro484,	já	que:
1.º	[...]	o	statuliber	é	liberto,	embora	condicional,	e	não
mais	rigorosamente	escravo;
2.º	[...]	ele	tem	adquirido	desde	logo	a	liberdade,	isto	é,
o	direito;	ou	antes,	tem	desde	logo	sido	restituído	à	sua
natural	condição	de	homem	e	personalidade;
3.º	 [...]	 só	 fica	 retardado	 o	 pleno	 gozo	 e	 exercício	 da
liberdade	 até	 que	 chegue	 o	 tempo	 ou	 se	 verifique	 a
condição;	à	semelhança	dos	menores,	que	dependem	de
certos	 fatos	 ou	 tempo	 para	 entrarem,	 emancipados,	 no
gozo	de	seus	direitos	e	atos	da	vida	civil;
4.º	[...]	pode	fazer	aquisições	para	si,	como	os	menores;
5.º	 [...]	 não	 é	 passível	 de	 açoites	 nem	 de	 penas	 só
exclusivas	 dos	 escravos;	 nem	 ser	 processado	 como
escravo;
6.º	 [...]	 não	 pode	 ser	 alienado,	 vendido,	 hipotecado,
adquirido	 por	 usucapião;	 é	 mesmo	 crime	 de	 reduzir	 à
escravidão	pessoa	livre;
7.º	 responde	 pessoal	 e	 diretamente	 pela	 satisfação	 do
delito	como	pessoa	livre;
8º	 [...]	 os	 filhos	 da	 statulibera	 são	 livres	 e	 ingênuos,
visto	 como	 livre	 é	 o	 ventre485;	 a	 condição	 ou	 o	 termo
não	mudam	 nem	 alteram	 a	 sorte	 da	mãe	 quanto	 à	 sua
verdadeira	e	essencial	condição	de	livre486;
9.º	[...]	o	serviço,	a	que	o	statuliber	seja	ainda	obrigado,
já	não	é	propriamente	servil;
10.	[...]	não	há	aí	patronos	a	respeito	mesmo	dos	assim
libertos,	à	exceção	somente	do	próprio	ex-senhor.487
Deve-se	frisar	que	a	alforria	concedida,	seja	a	gratuita	ou	onerosa,
estava	isenta	de	quaisquer	direitos,	emolumentos	ou	despesas488.	Nas
cartas	 de	 liberdade	 poderia	 constar	 a	 cláusula	 resolutiva	 do	 negócio
jurídico	 em	 caso	 de	 implementação	 de	 uma	 condição,	 no	 caso,	 a
ingratidão:
Nessa	situação,	o	cativo	que	conseguia	a	alforriapodia
voltar	 à	 condição	 de	 escravo	 do	 seu	 antigo	 senhor,	 se
este	 se	 sentisse	 ofendido	 pelo	 liberto	 por	 qualquer	 ato
que,	 segundo	 ele,	 configurasse	 ingratidão	 do
alforriado.489
A	 ingratidão	 poderia	 ser	 uma	 causa	 de	 revogação	 da	 alforria
concedida.
5.	A	ingratidão:	precariedade	da	liberdade	concedida
Observe-se	 que	 mesmo	 o	 liberto	 –	 o	 escravo	 que	 havia	 sido
alforriado	 –	 vivia	 sob	 um	 estado	 de	 constante	 insegurança	 jurídica,
pois	existia	real	possibilidade	jurídica	de	perda	do	seu	status	libertatis
caso	 fosse	 invocada	 ingratidão	 por	 supostos	 atos	 praticados	 pelo
liberto	 em	 relação	 ao	 seu	 antigo	 dominus490.	 Essa	 possibilidade	 de
revogação	do	status	libertatis	encontrava	fundamento	no	disposto	no
§	7º,	Título	63,	do	Livro	IV,	das	Ordenações	Filipinas:
Se	 alguém	 forrar	 seu	 escravo,	 livrando-o	 de	 toda	 a
servidão,	e	depois	que	for	forro,	cometer	contra	quem	o
forrou,	 alguma	 ingratidão	pessoal	 em	 sua	presença,	 ou
em	sua	ausência,	quer	seja	verbal,	quer	de	 feito	e	 real,
poderá	este	patrono	revogar	a	liberdade,	que	deu	a	este
liberto,	 e	 reduzi-lo	 à	 servidão,	 em	 que	 antes	 estava.	 E
bem	 si	 por	 cada	 uma	 das	 outras	 causas	 de	 ingratidão,
porque	 o	 doador	 pôde	 revogar	 a	 doação	 feita	 ao
donatário,	como	dissemos	acima.
As	 consequências	 práticas	 desse	 odioso	 dispositivo	 podem	 ser
assim	compreendidas:
A	prática	da	alforria	permitia	a	um	indivíduo	constituir
uma	clientela	de	homens	obrigatoriamente	dedicados491.
Mercê	da	alforria,	o	político	escravista	podia	aumentar
o	 número	 de	 votos	 que	 controlava	 nas	 eleições
primárias	 ou	 paroquiais.	 Nisto	 reside	 a	 explicação	 da
circunstância,	 repetidamente	 lamentada	 por	 Joaquim
Nabuco,	 de	 que	 nas	 eleições	 os	 libertos	 votavam	 nos
candidatos	 antiabolicionistas.	 Por	 medo	 de	 serem
acusados	 de	 ingratos,	 os	 libertos	 denunciavam	 as
conspirações	escravas.
O	 liberto	 se	 vinculava	 ao	 patrono	 até	 mesmo	 pelo
sobrenome.	 Escravos,	 como	 se	 sabe,	 não	 tinham
sobrenome,	e	por	 isto	ao	se	alforriarem	adotavam	o	do
patrono492.
É	 importante	 frisar	 que	 esse	 dispositivo,	 que	 permitia	 a	 reversão
no	 status	 do	 liberto,	 somente	 foi	 revogado	 transcorrido
aproximadamente	 meio	 século	 da	 outorga	 da	 Constituição	 imperial,
pela	Lei	n.º	2.040,	de	28	de	setembro	de	1871493,	a	denominada	Lei	do
Ventre	Livre494.
A	Lei	do	Ventre	Livre	criou	um	regime	jurídico	civil	aplicado	ao
escravo,	permitindo	que	ele	viesse	a	constituir	um	patrimônio	com	o
fim	de	obter	a	sua	manumissão.
6.	Lei	do	Ventre-Livre:	direito	à	alforria:indenização
assegurada	ao	senhor
Somente	com	o	advento	da	Lei	do	Ventre-Livre	(Lei	nº	2.040,	de
28	 de	 setembro	 de	 1871),	 o	 escravo	 passou	 realmente	 a	 adquirir	 o
direito	 à	 sua	 alforria	 495,	 independentemente	 da	 manifestação	 de
vontade	do	seu	senhor.	Esse	diploma	legal	criou	uma	regulamentação
civil	 mínima	 para	 os	 escravos,	 assegurando-lhes	 uma	 gama	 de
direitos,	que	serão	estudados	mais	adiante.
De	modo	geral,	antes	do	advento	da	Lei	do	Ventre-Livre,	não	era
possível	 que	 o	 escravo	 construísse	 patrimônio	 próprio	 sem	 que
houvesse	o	consentimento	do	seu	dominus496:
Entre	nós,	nenhuma	lei	garante	ao	escravo	o	pecúlio;	e
menos	 a	 livre	 disposição	 sobretudo	 por	 ato	 de	 última
vontade,	nem	a	sucessão,	ainda	quando	seja	escravo	da
Nação.
Se	os	 senhores	 toleram	que,	 em	vida	ou	mesmo	causa
mortis,	 o	 façam,	 é	 um	 fato,	 que	 todavia	 deve	 ser
respeitado.497
A	Lei	do	Ventre-Livre	alterou	tal	situação,	ao	criar,	para	o	escravo,
o	direito	de	construir	um	patrimônio	próprio.	Pelo	disposto	no	seu	art.
4º,	 permitia-se	 que	 o	 escravo	 formasse	 um	 pecúlio	 decorrente	 de
“doações,	legados	e	heranças”,	bem	como	daquilo	que	obtivesse	com
as	 economias	 decorrente	 do	 seu	 trabalho,	 nesse	 caso,	 com	 o
consentimento	do	seu	senhor:	“É	permitido	ao	escravo	a	formação	de
um	pecúlio	com	o	que	lhe	provier	de	doações,	 legados	e	heranças,	e
com	 o	 que,	 por	 consentimento	 do	 senhor,	 obtiver	 do	 seu	 trabalho	 e
economias	[...]”498.
O	conceito	 de	 pecúlio	 era	 dado	 pelo	 Direito	 Romano:	 “Pecúlio
diz-se	 tudo	 aquilo	 que	 ao	 escravo	 era	 permitido,	 de	 consentimento
expresso	ou	tácito	do	senhor,	administrar,	usufruir,	e	ganhar,	ainda	que
sobre	parte	do	patrimônio	do	próprio	senhor”499.
A	finalidade	de	tal	pecúlio	seria	o	de	obter	a	liberdade,	nos	termos
do	§	2º	do	art.	4º	da	Lei	do	Ventre-Livre:
O	escravo	que,	por	meio	do	seu	pecúlio,	obtiver	meios
para	 indenização	de	seu	valor,	 tem	direito	a	alforria.500
Se	a	 indenização	não	for	 fixada	por	acordo,	o	será	por
arbitramento.	Nas	vendas	judiciais	ou	nos	inventários	o
preço	da	alforria	será	o	da	avaliação.
A	 fim	 de	 respeitar	 o	 direito	 à	 propriedade,	 no	 caso	 de	 escravo
submetido	 à	 condomínio,	 se	 apenas	 um	 dos	 senhores	 libertasse	 o
escravo,	ele	teria	direito	à	alforria,	mas	o	servo	teria	que	indenizar	os
demais	senhores	na	medida	das	suas	quotas	(§	4º	do	art.	4º,	da	Lei	nº
2.040,	 de	 28	 de	 setembro	 de	 1871):	 “O	 escravo	 que	 pertencer	 a
condôminos	e	 for	 libertado	por	um	destes,	 terá	direito	 a	 sua	 alforria
indenizando	os	outros	senhores	da	quota	do	valor	que	lhes	pertencer”.
Nesse	 caso,	 o	 escravo	 poderia	 pagar	 a	 indenização	 mediante	 a
prestação	de	serviços,	por	prazo	não	superior	a	sete	anos	(§	4.º,	do	art.
4º,	 da	Lei	 nº	 2.040,	 de	 28	 de	 setembro	 de	 1871):	 “Esta	 indenização
poderá	ser	paga	com	serviços	prestados	por	prazo	não	maior	de	sete
anos	[...]”.
Outra	 forma	 de	 alforria	 prevista	 na	 Lei	 do	 Ventre-Livre	 foi	 a
cessão	de	trabalho	futuro,	mediante	contrato	com	terceiro:
É,	 outrossim,	 permitido	 ao	 escravo,	 em	 favor	 da	 sua
liberdade,	contratar	com	terceiro	a	prestação	de	futuros
serviços	 por	 tempo	 que	 não	 exceda	 de	 sete	 anos,
mediante	 o	 consentimento	 do	 senhor	 e	 aprovação	 do
Juiz	de	Órfãos.501
Por	 tais	 dispositivos,	 a	 aquisição	 do	 status	 libertatis	 não	 mais
estava	 condicionada	 à	 manifestação	 de	 vontade	 do	 senhor:	 a	 lei
concedia	 ao	 escravo	 o	 direito	 à	 alforria	 se	 o	 seu	 pecúlio	 fosse
suficiente	 para	 indenizar	 o	 seu	 senhor,	 ou	 mesmo,	 concedia	 a
possibilidade	de	a	indenização	ser	adimplida	por	meio	de	trabalho.	A
justificativa	 para	 indenização	 decorre,	 claramente,	 do	 disposto	 no	 §
22,	do	art.	179,	da	Constituição	de	1824,	que	prescreve	a	exceção	ao
direito	à	propriedade:
É	 garantido	 o	 Direito	 de	 Propriedade	 em	 toda	 a	 sua
plenitude.	 Se	 o	 bem	 público	 legalmente	 verificado
exigir	 o	 uso,	 e	 emprego	 da	 Propriedade	 do	 Cidadão,
será	 ele	 previamente	 indenizado	 do	 valor	 dela.	A	 Lei
marcará	 os	 casos,	 em	 que	 terá	 lugar	 esta	 única
exceção,	 e	 dará	 as	 regras	 para	 se	 determinar	 a
indenização.
Ou	seja,	 somente	por	meio	de	 lei,	nos	 termos	da	Constituição	de
1824,	 poderia	 o	Cidadão	 do	 Império	 ter	 o	 seu	 direito	 à	 propriedade
violado,	mas,	 nem	 a	 lei,	mesmo	que	 para	 a	 assegurar	 a	 primazia	 da
liberdade	 dos	 escravos,	 poderia	 “agredir”	 o	 legítimo	 direito	 à	 justa
indenização.
Por	 essa	 razão,	 durante	 os	 debates	 acerca	 da	 Abolição	 da
escravidão,	sempre	foi	defendida	a	tese	(pelos	escravistas)	de	que	não
seria	 possível	 o	Governo	 imperial	 alforriar	 os	 escravos	 sem	 que
fosse	 conferido	 o	 direito	 à	 indenização	 por	 esse	 ato	 de
desapropriação502.
Portanto,	o	escravo	seria	libertado,	sob	condição	de	se	submeter	a
trabalho	 em	 favor	 de	 terceiro,	 por	 período	 não	 superior	 a	 sete	 anos,
com	a	 finalidade	de	 indenizar	o	senhor.	Nesse	caso	a	alforria	estaria
condicionada	tanto	à	aquiescência	do	dominus,	quanto	à	apreciação	do
juiz	de	órfãos.
E	se	o	escravo,	após	obtida	a	liberdade,	não	sendo	mais	um	cativo,
não	cumprisse	o	seu	deverde	prestar	serviços	pelo	prazo	estabelecido
no	momento	da	alforria?	Ele	retornaria	à	situação	de	escravo?
Não.	 O	 inadimplemento	 do	 dever	 de	 prestar	 serviços,	 por	 prazo
certo,	decorrente	do	contrato	de	alforria	não	geraria	a	nulidade	(ou	a
revogação)	da	 liberdade	concedida,	ou	seja,	o	 instituto	da	 ingratidão
havia	desaparecido503.	Nesse	caso,	pela	Lei	do	Ventre-Livre,	o	então
liberto	 seria	 compelido	 a	 trabalhar	 em	 estabelecimentos	 públicos	 ou
para	particulares:
A	 alforria	 com	 a	 cláusula	 de	 serviços	 durante	 certo
tempo	 não	 ficará	 anulada	 pela	 falta	 de	 implemento	 da
mesma	clausula,	mas	o	liberto	será	compelido	a	cumpri-
la	 por	meio	 de	 trabalho	 nos	 estabelecimentos	 públicos
ou	por	contratos	de	serviços	a	particulares.504
Portanto,	 com	 o	 advento	 da	 Lei	 do	 Ventre	 Livre	 a	 alforria
passou	a	ser	um	direito	do	escravo505	que	pudesse	cumprir	com	os
requisitos	legais.
7.	Ações	de	Liberdade
As	ações	de	liberdade	eram	ajuizadas,	perante	o	Poder	Judicial506,
por	 terceiros,	 no	 papel	 de	 curadores	 de	 escravos,	 ou	 pelos	 próprios
libertos,	pelas	quais	se	deduzia	a	pretensão	de	obtenção	da	alforria	ou
a	 manutenção	 do	 seu	 status	 libertatis.	 A	 pretensão	 de	 obtenção	 da
liberdade	era	imprescritível507:
As	ações	de	 liberdade	entre	nós	 têm	lugar	em	diversas
hipótese:	 assim,	 ou	 pode	 ser	 restituída	 a	 liberdade
natural	 aquele	 que	 ilegal	 e	 abusivamente	 está	 dela
privado;	 ou	 aquele	 que,	 tendo	 estado	 a	 princípio
legalmente	sujeito	à	escravidão,	deixou,	entretanto,	de	o
ser	 por	 qualquer	 circunstância;	 ou	 finalmente	 aquele
que,	 reconhecendo	 e	 confessando	 a	 ilegalidade	 de	 seu
estado	 servil,	 oferece,	 entretanto,	 uma	 indenização	 em
troca	de	sua	liberdade.508
Tais	ações,	com	previsão	expressa	no	art.	7º	da	Lei	nº	2.040,	de	28
de	setembro	de	1871,	serviam	de	instrumento	para	que,	recorrendo	o
Poder	 Judicial,	 por	 meio	 curador	 que	 lhe	 representava,	 o	 escravo
viesse	a	obter	a	alforria	não	aceita	pelo	seu	senhor509.
A	ação	ajuizada	não	poderia	ser	de	competência	de	juízo	arbitral,
pois	 não	 era	 possível	 se	 admitir	 transação	 em	 ação	 de	 liberdade	 de
modo	 a	 vir	 prejudicar	 tal	 direito510.	 Por	 essa	 razão,	 a	 ausência	 de
tentativa	de	conciliação511	não	gerava	nulidade	do	feito512	e,	se	viesse
a	 ocorrer,	 seria	 apenas	 para	 reconhecer	 o	 status	 libertatis	 do
escravo513.
Nos	 termos	do	 art.	 10,	 do	Decreto	 de	 12	de	 abril	 de	 1832514,	 tal
ação	poderia	ser	proposta	perante	qualquer	órgão	do	Poder	Judicial515,
entretanto	 passou-se	 a	 entender	 que	 o	 juízo	 competente	 seria	 o	 do
domicílio	do	proprietário516.
Na	 forma	do	§	1º	 do	 art.	 7º	 da	Lei	 nº	 2.040,	 de	28	de	março	de
1871,	 elas	 se	 processavam	 sob	 rito	 sumário517,	 inclusive	 aquela	 em
que	o	autor	viesse	(ou	estivesse)	a	sofrer	um	esbulho	no	seu	direito	à
liberdade518:	 “Uma	 ação	 de	 liberdade	 é	 iniciada	 quando,	 depois	 de
receber	 um	 requerimento	 –	 assinado	 por	 qualquer	 pessoa	 livre,
geralmente	 ‘a	 rogo’	 do	 escravo	 –,	 o	 juiz	 nomeia	 um	 curador	 ao
escravo	e	ordena	o	seu	depósito”519.
O	 ônus	 da	 prova	 seria	 daquele	 que	 postulasse	 contra	 liberdade,
seja	 autor	 ou	 réu,	 uma	 vez	 que	 a	 escravidão	 não	 se	 presume520.
Deveria	ser	nomeado	um	curador	ao	escravo521
No	que	se	refere	ao	julgamento,	de	acordo	com	Malheiro,	devia-se
decidir	preferencialmente	em	favor	da	liberdade,	exceto	se	o	direito	de
propriedade	do	senhor	fosse	evidente	ou,	ao	menos,	possível	o	fim	do
cativeiro	por	meio	de	pagamento	de	indenização522:
Os	casos	em	que	os	escravos	alegam	o	direito	à	carta
de	 alforria	 são	 aqueles	 em	 que	 os	 senhores
prometeram-lhes	 dar	 a	 liberdade,	 geralmente
verbalmente,	 e	 não	 cumpriram,	 ou	 então	 eles	 os
alforriaram	 em	 testamento	 e	 seus	 herdeiros	 não	 os
queriam	libertar523.
O	termo	jurídico	para	as	ações	em	que	o	argumento	é	o
de	que	o	escravo	 já	 tinha	sido	 libertado,	antes	é	“ação
de	manutenção	de	 liberdade”:	 é	 quando	 o	 liberto,	 já
vivendo	como	tal,	sofre	tentativas	de	rescravização	por
parte	de	seu	antigo	senhor	ou	de	qualquer	outro	homem
livre.524
Nas	 ações	 de	 “ventre	 livre”,	 os	 escravos	 alegam	 ser
descendentes	 de	 uma	 mulher	 livre;	 portanto,	 seriam
também	 livres	 e	 não	 poderiam	 ser	 rescravizados.	 Os
casos	 de	 compra	 de	 alforria	 são	 aqueles	 em	 que	 o
escravo	 tenta	 comprar	 sua	 liberdade	 e	 o	 senhor	 não
permite,	 ou	 então	 quando	 este	 desrespeita	 um	 acordo
anteriormente	feito	com	o	primeiro	sobre	seu	valor.
Os	processos	com	base	na	data	de	chegada	ao	Brasil
são	alegações	de	que	o	escravo	teria	chegado	depois	da
primeira	proibição	do	tráfico	negreiro,	em	1931;	e	os	de
violência	são	aqueles	em	que	o	senhor	é	acusado	de	ser
muito	violento	no	trato	com	seus	escravos	ou	de	forçar
alguma	escrava	à	prostituição525.	(grifos	nossos)
Segundo	 o	 §	 2º,	 do	 art.	 7º,	 da	 Lei	 nº	 2.040,	 de	 28	 de	março	 de
1871,	 haveria	 apelações	de	 ofício	 quando	 as	 decisões,	 nessas	 ações,
fossem	contrárias	à	liberdade.
A	sentença526,	que	negasse	o	direito	à	 liberdade,	nunca	transitaria
em	 julgado,	 sendo	 possível	 que	 viesse	 a	 ser	 revisada	 por	 meio	 de
provas	 supervenientes	 ou	 por	 outras	 causas	 e,	 consequentemente,	 o
ajuizamento	de	ação	rescisória,	ainda	que	houvesse	sido	proferida	em
sede	de	recurso	de	revista527.
A	 pretensão	 do	 proprietário	 em	 postular	 uma	 ação	 de
escravidão528,	 demonstrando	 o	 seu	 direito	 de	 propriedade	 contra	 um
indivíduo,	prescrevia	em	cinco	anos,	segundo	Malheiro529.
8.	O	escravo:	família	e	herança
Por	definição,	nas	clássicas	lições	de	Direito	Romano	que	serviam
de	 fonte	 parcial	 para	 o	 estudo	 das	 instituições	 civis,	 o	 escravo	 não
poderia	constituir	uma	família:
O	 Direito	 Romano	 já	 havia	 reconhecido	 e	 firmado	 o
princípio	de	que	–	o	escravo	não	tinha	nem	tem	família;
entre	escravos	não	havia,	em	regra,	casamento,	apenas
contubernium,	 união	 natural	 ou	 de	 fato;	 nem
parentesco;	nem	poder	marital,	ou	pátrio.530
No	 Direito	 brasileiro531,	 admitia-se	 tal	 violenta	 e	 antinatural
impossibilidade	 de	 constituição	 de	 vínculos	 matrimoniais	 e	 familiar
entre	 escravos,	 bem	 como	da	 impossibilidade	 de	 exercício	 do	 pátrio
poder	pelo	cativo,	à	luz	da	lei	civil:
Entre	 nós,	 infelizmente,	 os	 escravos	 vivem	 em	 uniões
ilícitas,	 por	 via	 de	 regra,	 tanto	 os	 do	 serviço	 urbano
como	 os	 do	 rural;	 entregues,	 por	 conseguinte,	 à	 lei	 da
natureza	ou	à	devassidão.	Em	algumas	partes,	é	verdade
confessar,	 sobretudo	 entre	 os	 lavradores,	 não	 é	 raro
verem-se	 famílias	 de	 escravos,	marido,	mulher,	 filhos.
[...]
O	 Direito	 Civil,	 porém,	 quase	 nenhuns	 efeitos,	 em
regra,	lhes	dá,	com	quanto	reconheça	o	fato	e	o	sancione
implicitamente	 pela	 recepção	 das	 leis	 da	 Igreja.
Continuam	marido,	mulher	e	filhos	a	ser	propriedade	do
senhor.532
Portanto,	 o	 senhor	 poderia	 alienar	 separadamente	 o	 casal	 de
escravos,	bem	como	pais	de	filhos	e	as	mães	da	sua	prole533,	pois	não
existia	 nenhuma	 vedação	 legal,	 até	 porque	 a	 lei	 vigente	 em	 nada
protegia	os	cativos534.	Somente	com	o	advento	da	Decreto	n.º	1.695,
de	16	de	setembro	de	1869,	foi	vedada,	sob	pena	de	nulidade,	a	venda
de	 cativos	 casados	 separadamente,	 bem	 como	 o	 filho	 do	 pai	 ou	 da
mãe,	 salvo	 os	 filhos	maiores	 de	 quinze	 anos:	 “Art.	 2º.	Em	 todas	 as
vendas	 de	 escravos,	 sejam	 particulares	 ou	 judiciais,	 e	 proibido,	 sob
pena	de	nulidade,	separar	o	marido	da	mulher,	o	filho	do	pai	ou	mãe,
salvo	sendo	os	filhos	maiores	de	15	anos”.
O	advento	da	Lei	do	Ventre	Livre	(Lei	nº	2.040,	de	28	de	setembro
de	1871),	ampliou	tal	proteção	por	meio	do	disposto	nos	seus	§	5º,	do
art.	1º,	e	§	7º,	do	art.	4º:
§	5º	No	caso	de	alienação	da	mulher	escrava,	seus	filhos
livres,menores	de	12	anos,	a	acompanharão,	ficando	o
novo	senhor	da	mesma	escrava	subrogado	nos	direitos	e
obrigações	do	antecessor	[...]
§	7º	Em	qualquer	caso	de	alienação	ou	 transmissão	de
escravos,	 é	 proibido,	 sob	 pena	 de	 nulidade,	 separar	 os
cônjuges,	e	os	filhos	menores	de	12	anos,	do	pai	ou	da
mãe.
Entretanto,	para	que	o	casamento	fosse	realizado,	era	necessária	a
autorização	do	senhor.	Regra	geral,	os	escravos	não	se	casavam535	e	os
filhos	 nascidos	 de	 uma	 escrava536	 pertenciam	 ao	 senhor537,
obedecendo	 ao	 odioso	 princípio	 romano	 partus	 sequitur	 ventrem538:
“O	 princípio	 regulador	 é	 que	 –	 partus	 sequitur	 ventrem539	 –,	 como
dispunha	o	Dir.	Romano.	Por	 forma	que	–	o	 filho	 da	 escrava	 nasce
escravo	–;	pouco	importando	que	o	pai	seja	livre	ou	escravo”540.
Havia	 um	 debate	 doutrinário541	 acerca	 da	 determinação	 do
momento	 em	 que	 a	 mãe	 era	 escrava542	 a	 fim	 de	 indicar	 também	 a
natureza	do	seu	filho:	a	concepção,	o	nascimento	ou	durante	qualquer
momento	 da	 gestação.	 Na	 experiência	 dada	 pelo	 Direito	 Romano,
após	 muitas	 incertezas	 doutrinárias543,	 fixou-se	 que	 se	 em	 algum
momento	durante	a	gestação	a	mulher	fosse	livre,	seu	filho	também	o
seria:
O	Direito	Romano	vacilou	por	muito	tempo.	A	princípio
olhou-se	à	data	do	nascimento;	de	sorte	que	era	livre	ou
escravo	 o	 filho,	 conforme	 a	 mãe	 o	 era	 também	 nessa
época.	Decidiu-se	mais	tarde	que,	se	a	mãe	era	livre	ao
tempo	 da	 concepção,	 o	 filho	 o	 devia	 igualmente	 ser,
ainda	 que	 ao	 do	 nascimento	 fosse	 ela	 escrava.	 Por
último,	 que,	 ainda	 que	 ela	 fosse	 escrava	 ao	 tempo	 da
concepção	 e	 do	 parto,	 o	 filho	 seria	 livre,	 se	 a	 mãe
durante	a	gestação	foi	livre.544
No	direito	brasileiro,	baseado	em	aplicação	do	Direito	subsidiário,
cristalizou-se	 o	 entendimento	 que	 a	 liberdade	 da	 mãe,	 em	 qualquer
momento	durante	a	gestação,	implicaria	também	na	liberdade	do	filho:
Conseguintemente	 devemos	 assentar	 como	 regra	 a
seguir	 entre	 nós	 –	 que,	 se	 a	 mãe	 é	 livre	 em	 qualquer
tempo,	desde	a	concepção	até	o	parto,	o	filho	nasce	livre
e	ingênuo,	ainda	que	ela	em	qualquer	dessas	épocas	seja
ou	fosse	escrava.545
Registre-se	que,	como	o	escravo	não	poderia	constituir	patrimônio
próprio,	 também	 não	 poderia	 transmitir	 alguma	 posse	 a	 seus
herdeiros,	 uma	 vez	 que	 a	 lei	 não	 reconhecia	 a	 possibilidade	 de
possuírem	 um	 vínculo	 de	 parentesco.	 Se	 não	 poderia	 constituir
nenhum	patrimônio	e	nem	ter	sucessores,	na	forma	da	lei,	não	existiria
transmissão	de	herança	do	escravo	falecido546.	Igualmente,	o	escravo
não	 herdaria,	 nem	 teria	 a	 aptidão	 para	 fazer	 testamento547,	 pois	 ele
integrava	o	conjunto	patrimonial	do	seu	senhor:	“[...]	a	herança,	o
legado:	 se	deixados	 a	 escravos,	 não	os	 adquire	o	 senhor,	 tem-se	por
não	 escritos	 ou	 nulos.	 Era	 ficção	 própria	 da	 legislação	 Romana,
instituição	particular	desse	Direito”548.
Logo,	a	sujeição	jurídica	do	escravo	fazia	com	que	os	institutos	de
direito	 de	 família	 e	 das	 sucessões	 simplesmente	 não	 lhes	 fossem
aplicados	 na	 prática,	 por	 integrarem	 o	 patrimônio	 do	 respectivo
dominus:	 “O	 escravo	 como	 propriedade	 passa	 por	 sucessão	 ou	 por
testamento,	do	mesmo	modo	que	os	outros	bens	do	defunto	senhor.	E
os	impostos	sobre	as	heranças	e	legados	lhes	são	extensivos	da	mesma
maneira”549.
Foi	 pelo	 §	 1º	 do	 art.	 4º	 da	 Lei	 do	 Ventre	 Livre	 que	 o	 escravo
passou	 a	 ter	 direito	 a	 herdar	 o	 pecúlio	 constituído,	 na	 forma	 da	 lei
civil,	por	ocasião	do	falecimento	do	seu	ascendente	ou	cônjuge:
§	 1º	 Por	 morte	 do	 escravo,	 a	 metade	 do	 seu	 pecúlio
pertencerá	 ao	 cônjuge	 sobrevivente,	 se	 o	 houver,	 e	 a
outra	metade	se	transmitirá	aos	seus	herdeiros,	na	forma
da	 lei	 civil.	 Na	 falta	 de	 herdeiros,	 o	 pecúlio	 será
adjudicado	ao	fundo	de	emancipação,	de	que	trata	o	art.
3º.550
Portanto,	 com	o	 passar	 dos	 anos,	 houve	 evolução	 legislativa	 que
passou	a	atribuir	autonomia	jurídica	às	ações	praticadas	pelo	escravo
na	esfera	civil.	Na	compreensão	do	Conselheiro	Joaquim	Ribas:
À	 proporção,	 porém,	 que	 o	 direito	 estrito	 se	 foi
aproximando	do	racional,	foi-se	restringindo	a	dominica
potestas,	 e	 paralelamente	 alargando	 a	 capacidade	 dos
escravos551,	esta	 instituição	reconhecida	como	oposta	à
natureza,	e	a	liberdade	como	faculdade	natural552.
Apesar	 de	 o	 escravo,	 paulatinamente,	 ao	 longo	 do	 século	 XIX,
passar	 a	 adquirir	 legitimação	 para	 a	 prática	 de	 atos	 da	 vida	 civil,
merece	ser	estudado	como	ele	se	 inseria	como	objeto	diante	das	 leis
civis.
9.	O	Escravo	como	agente	e	objeto	de	relações	do
direito	civil
O	escravo	era	um	capital	empregado	para	gerar,	por	seu	trabalho,
riquezas	que	seriam	apropriadas	pelo	seu	senhor553,	que	 tinha	direito
de	 “auferir	 do	 escravo	 todo	 o	 proveito	 possível”554,	 isto	 é,	 explorar
essa	mão	de	obra	de	todas	as	formas555	a	fim	de	que	os	rendimentos	da
sua	 labuta	 viessem	 a	 ser	 incorporados	 ao	 patrimônio	 do
proprietário556.	Nessa	 configuração	 de	 coisa,	 o	 escravo	 poderia	 ser
objeto	de	várias	relações	jurídicas	previstas	na	lei	civil557.
Para	o	Direito	Civil,	 a	 regra	 era	de	que	o	 escravo,	 como	detinha
uma	 capitis	 diminutio	 maxima,	 não	 poderia	 contrair,	 por	 si	 só,
obrigações:	 “[...]	 o	 escravo	 nem	 se	 obriga	 nem	obriga	 ao	 senhor	 ou
terceiros.	 Nem,	 mesmo	 depois	 de	 liberto,	 responde	 pelos	 atos
praticados	enquanto	escravo”558.
Entretanto,	 como	 visto,	 o	 escravo	 também	 era	 considerado	 uma
pessoa.	 Se	 a	 lei	 assim	 não	 o	 admitisse,	 não	 seria	 possível,	 por
exemplo,	estabelecer	efeitos	 jurídicos	para	alguns	atos	civis	por	eles
praticados.	 Coisas	 não	 praticam	 atos	 jurídicos,	 pois	 não	 existe
possibilidade	 de	 que	 venham	 a	 manifestar	 vontade,	 nem	 por	 ficção
legal559.	 Portanto,	 a	 lei	 estabelecia	 consequências	 jurídicas	 para	 os
atos	praticados	pelos	escravos,	como	ensina	Malheiro560:
1.º	 que,	 quando	 o	 escravo	 obrasse	 em	 qualidade	 de
mandatário	 do	 senhor,	 ou	 mesmo	 como	 gestor	 mas
aprovado	 ou	 ratificado	 o	 ato,	 fosse	 o	 senhor	 obrigado
pela	 totalidade;	 compreendendo-se	 nesta	 disposição	 os
mandatos	especiais,	como	de	preposto	à	navegação,	ao
comércio;
2.º	 que	 o	 fosse	 igualmente,	 quando	 do	 ato	 do	 escravo
viesse	proveito	ao	senhor;
3.º	que,	em	relação	ao	pecúlio,	o	senhor	fosse	obrigado
dentro	das	forças	do	mesmo;
4.º	 que	 ainda	 nessas	 relações	 entre	 terceiros,	 senhor,	 e
escravo	 quanto	 ao	 pecúlio,	 no	 caso	 em	 que	 fosse	 este
empregado	no	comércio,	se	desse	ação	entre	os	credores
e	o	senhor	para	seu	pagamento;
5º	 que	 contra	 os	 terceiros	 podia	 o	 senhor	 intentar
diversas	 ações,	 já	 para	 fazer	 valer	 os	 seus	 direitos
dominicais,	 já	 pelas	 aquisições	 provenientes	 dos
escravos	 como	 instrumentos	 delas,	 e	 pelos	 fatos	 e
obrigações	 que	 contraísse	 obrigando-o,	 já	 por	 delitos
contra	os	seus	escravos,	 já	por	corrompê-los,	e	acoutar
os	fugidos;	e
6.º	que	nos	delitos	do	escravo	contra	 terceiros,	embora
fosse	 ele	 obrigado	 naturalmente	 e	 esta	 obrigação	 o
acompanhasse	 mesmo	 depois	 de	 liberto,	 o	 senhor
ficava,	todavia,	sujeito	a	pagar	o	dano.
Evidentemente	 os	 escravos	 poderiam	 ser	 objeto	 de	 contrato	 de
compra	 e	 venda561,	 sendo	 aplicáveis	 as	 normas	 referentes	 a	 vício
oculto	da	“coisa”,	quando	afetasse	a	qualidade	do	cativo	adquirido562.
Se	 tal	 negócio	 jurídico	 excedesse	 determinado	 valor563,	 tal	 contrato
deveria	 ser	 celebrado	 por	meio	 de	 escritura	 pública564,	 sob	 pena	 de
nulidade565.	 Essa	 compra	 e	 venda	 servia	 de	 fato	 gerador	 para
incidência	 de	 tributo566.	 Também	 poderia	 ser	 permutado	 por	 bens
móveis	ou	imóveis567.	Com	o	advento	do	Decreto	nº	1.695,	de	15	de
setembro	 de	 1869,	 foi	 proibida	 vendas	 deescravos	 por	 meio	 de
pregão,	em	leilões,	com	exibição	pública	deles568.
O	escravo	poderia	ser	objeto	de	contrato	de	locação,	por	prazos
variados,	 existindo,	 nos	 centros	 urbanos569,	 mercados	 em	 que	 se
ofereciam	os	cativos	para	aluguel570.	Quando	o	contrato	era	por	prazo
curto,	 geralmente	 os	 contratos	 eram	 celebrados	 verbalmente571,
entretanto,	se	por	prazo	mais	dilatado,	o	negócio	jurídico	era	firmado
perante	tabelião572.
O	escravo	poderia	ser	hipotecado573	ou	empenhado574.	A	hipoteca
era	 realizada	 exclusivamente	 por	 escritura	 pública575	 e	 registrada576,
sendo	judicial	ou	convencional577.	Para	o	pagamento	de	uma	dívida	do
seu	senhor,	o	escravo	poderia	ser	penhorado578,	quando	era	recolhido
a	 uma	 prisão,	 aguardando	 o	 resgate	 da	 dívida	 ou	 que	 houvesse	 a
adjudicação	 para	 pagamento	 do	 valor	 cobrado579.	 Merece	 registro,
também,	 o	 fato	 de	 que	 o	 escravo	 era	 considerado	 um	 acessório	 da
propriedade	rural580.
Além	disso,	o	escravo	poderia	ser	objeto	de	seguro	comercial.	Em
virtude	 de	 sua	 capitis	 diminutio	maxima,	 o	 escravo	 era	 considerado
também	 como	 uma	 coisa	 semovente,	 ou	 seja,	 como	 não	 era	 um
homem	livre,	 seria	possível	 fazer	um	seguro	que	viesse	a	proteger	o
seu	valor581.
Para	 os	 doutrinadores	 da	 época,	 o	 escravo	 poderia	 ser	 objeto	 de
usucapião582,	no	prazo	de	três	anos,	desde	que	o	possuidor	estivesse
munido	 de	 boa-fé,	 com	 justo	 título,	 exercendo	 sua	 posse	 de	 forma
mansa	 e	 pacífica583.	 Entretanto,	 a	 fuga	 do	 escravo	 não	 gerava
prescrição	 extintiva584	 do	 vínculo	 que	 lhe	 submetia	 àquela	 triste
situação585,	já	que	se	entendia	que	havia	uma	espécie	de	“roubo	de	si
mesmo”,	ou	 seja,	 havia	 a	má-fé586.	De	outro	modo,	o	abandono	do
escravo	passou	a	gerar	a	perda	do	direito	de	propriedade587.
Ademais,	 o	 senhor	 era	 responsável	 pelo	 pagamento	 de
indenização	pelos	danos	causados	pelo	escravo588	a	terceiros	por	atos
ilícitos	praticados	por	este,	até	o	limite	do	valor	escravo589.	Por	fim,	o
escravo	seria	objeto	de	herança590	ou	 testamento,	 devendo	o	 valor
deles	ser	incluído	na	base	de	cálculo	dos	respectivos	tributos591.
O	escravo	não	poderia	ser	senhor	de	outro	escravo,	pelo	fato	de
que,	 em	 tese,	 como	 não	 detinha	 capacidade	 jurídica,	 não	 poderia
exercer	 um	 poder	 sobre	 outro	 indivíduo	 e	 as	 suas	 posses	 se
confundiam	com	a	do	seu	dominus.
Evidente	 que	 não	 existia	 no	 ordenamento	 jurídico	 brasileiro	 tal
previsão	 legal,	 afinal,	 como	 era	 considerado	 um	 bem	 semovente,	 o
escravo,	até	o	advento	da	Lei	do	Ventre	Livre,	não	poderia	constituir
patrimônio,	e	quando	pôde	 fazê-lo,	 era	 um	pecúlio	 a	 fim	de	 obter	 a
sua	alforria592.
Por	outro	 lado,	havia	senhores	que	permitiam	que	alguns	de	seus
escravos	viessem	a	ser	“proprietários”	de	outros	escravos593:	 tratava-
se	 de	 uma	 “posse”	 precária	 e	 sempre	 condicionada	 a	 tolerância	 do
senhor594.	A	 finalidade	 desse	 precário	 domínio	 de	 um	 escravo	 sobre
outro	 era	 a	 de	 o	 servus	 vicarius	 obter	 a	 sua	 alforria595.	 Em	 alguns
casos,	os	frutos	do	trabalho	do	seu	escravo	serviam	para	constituir	um
pecúlio596;	 em	 outros,	 o	 “escravo-senhor”,	 que	 possuía	 habilidades
para	 o	 exercício	 de	 determinada	 profissão,	 deveria	 transmitir	 seus
conhecimentos	para	o	outro	cativo,	quando	então	poderia	obter	a	sua
liberdade	treinando	seu	substituto597.
Estudados	 os	 aspectos	 de	 incidência	 da	 lei	 civil,	 volta-se,	 agora,
para	como	o	ordenamento	jurídico	brasileiro	do	século	XIX	dispunha
sobre	a	responsabilidade	penal	dos	escravos.
Notas
427.	“Art.	317.	Todos	os	objetos	materiais	suscetíveis	de	uma	medida	de	valor
são	 coisas.	 [...]	 Entende-se	 por	 coisas	 somente	 os	 objetos	 corpóreos,	 e	 fique
portanto	 em	 esquecimento	 a	 divisão	 que	 fez	 o	 Direito	 Romano,	 e	 que	 fazem
todos	os	códigos,	de	coisas	corpóreas	e	coisas	incorpóreas,	atribuindo	à	palavra
um	sentido	amplíssimo,	e	fazendo-a	compreender	tudo	quanto	pode	ser	objeto	de
direito	na	opinião	de	alguns,	ou	pelo	menos	tudo	quanto	faz	parte	integrante	do
patrimônio	na	opinião	de	outros”	(Freitas,	Augusto	Teixeira.	Esboço	do	Código
Civil,	v.	1.	Brasília:	Fundação	UnB,	1983,	p.	115).
428.	Disponível	em:	<https://goo.gl/XBgLtC>.	Acesso	em:	18	jul.	de	2015.
429.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	39.
430.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	Brasília:	Vozes,	1977,	p.	89.
431.	E	respectiva	legislação	superveniente.
432.	 Nabuco,	 Joaquim.	Minha	 Formação.	 Brasília:	 Senado	 Federal,	 1998,	 p.
182.
433.	Sobre	a	desigualdade	no	 tratamento,	 inclusive	de	negros	heróis	ver	Luna,
Luís.	O	Negro	na	Luta	contra	a	Escravidão.	Brasília:	Editora	Cátedra,	1976,	p.
40-41.	 Por	 motivo	 de	 status,	 mas	 não	 apenas	 por	 essa	 razão,	 muitos	 negros
libertos	 compravam	escravos	para	 atenuar	o	 estigma	da	 sua	cor	diante	de	uma
sociedade	 que	 continuava	 a	 marginalizá-los	 (Narloch,	 Leandro.	 Achado	 e
perdidos	da	história:	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Estação	Brasil,	2017,	p.	118).
434.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	90.
435.	Nabuco,	Joaquim.	O	Abolicionismo.	São	Paulo:	Publifolha,	2000,	p.	90.
436.	 Portanto	 inaplicável,	 por	 exemplo,	 ao	 escravo	 a	 Lei	 nº	 108,	 de	 11	 de
outubro	de	1837,	que	regulamentava	a	locação	de	serviços	de	colonos:	“Art.	1.	O
contracto	de	locação	de	serviços,	celebrado	no	lmperio,	ou	fora,	para	se	verificar
dentro	 dele,	 pelo	 qual	 algum	 estrangeiro	 se	 obrigar	 como	 locador,	 só	 póde
provar-se	por	escrito”.
437.	 Ribas,	 Conselheiro	 Joaquim.	 Direito	 Civil	 Brasileiro.	 Rio	 de	 Janeiro:
Editora	Rio,	1982,	p.	281-282.
438.	“As	Ordenações	Filipinas	–	recompiladas	por	ordem	de	Filipe	I	depois	da
anexação	 de	 Portugal	 à	 Espanha	 em	 1580	 –	 regulavam	 a	 compra	 e	 venda	 de
escravos	no	mesmo	capítulo	dedicado	aos	animais”	(Freitas,	Décio.	Palmares:	a
guerra	dos	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Edições	Graal,	1982,	p.	28).
439.	 Nóbrega,	 Vandick	 Londres	 da.	 História	 e	 Sistema	 do	 Direito	 Privado
Romano.	Rio	de	Janeiro:	Freitas	Bastos,	1955,	p.	120	e	130.
440.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	68.
“O	 escravo	 constituía	 uma	 propriedade	 total	 e	 ilimitada	 do	 amo,	 privado	 de
quaisquer	direitos	e	submetido	a	uma	relação	absoluta	de	dependência.	Não	tinha
existência	civil,	vale	dizer,	não	era	pessoa	natural	capaz	de	direitos	e	obrigações”
(Freitas,	Décio.	Palmares:	a	guerra	dos	escravos.	Rio	de	Janeiro:	Edições	Graal,
1982,	p.	28).
441.	“[o	senhor]	hipotecava	um	escravo	a	 terceiros	por	um	prazo	determinado,
findo	 o	 qual	 e	 não	 sendo	 paga	 a	 hipoteca,	 o	 escravo	 passava	 a	 pertencer	 ao
credor.	 A	 hipoteca	 do	 escravo	 podia	 ser	 estabelecida	 pelas	 partes	 na	 forma
judicial	ou	convencional,	isto	é,	por	uma	formalização	judicial	ou	por	um	pacto
individual	 entre	 as	 partes	 com	 valor	 moral”	 (Moura,	 Clóvis.	 Dicionário	 da
Escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Editora	da	USP,	2004,	p.	190).
442.	Nos	termos	das	Ordenações	Filipinas,	Livro	II,	f.	52,	§	5º	e	Livro	IV,	f.	3º.
443.	De	15	de	dezembro	de	1857,	da	 lavra	do	Presidente	da	Província	do	Rio
Grande	do	Sul.
444.	“Nas	formas	jurídicas	do	século	XIX,	o	escravo	é	tido	como	ser	ausente.	É
ausente	por	não	ser	sujeito	ou	ser	quase-sujeito”	(Costa,	Yuri.	A	transmutação	da
fala:	 uso	 e	 desuso	 de	 testemunhos	 dos	 escravos	 nos	 tribunais	 do	 Maranhão
imperial.	 In:	 Galves,	 Marcelo	 Cherche;	 Costa,	 Yuri	 (orgs.).	 O	 maranhão
oitocentista.	Imperatriz:	Ética/São	Luís:	Editora	Uema,	2009,	p.	204).
445.	Brasil.	O	Conselho	de	Estado	e	a	política	externa	do	Império:	Consultas	da
Seção	 dos	 Negócios	 Estrangeiros:	 1858-1862.	 Centro	 de	 História	 e
Documentação	Diplomática.	Rio	 de	 Janeiro:	CHDD;Brasília:	 Funag,	 2005,	 p.
32-33.
446.	Ibidem,	p.	34.
447.	 “O	 escravo	 subordinado	 ao	 poder	 (potestas)	 do	 senhor,	 e	 além	 disto
equiparado	 às	 coisas	 por	 uma	 ficção	 da	 lei	 enquanto	 sujeito	 ao	 domínio	 de
outrem,	constituído	assim	objeto	de	propriedade,	não	tem	personalidade,	estado.
É,	 pois,	 privado	 de	 toda	 a	 capacidade	 civil”	 (Malheiro,	 Agostinho	 Marques
Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	 I.	Rio	de	Janeiro:	Typografia	Nacional,	p.
44).
448.	 Freitas,	 Augusto	 Teixeira	 de.	 Consolidação	 das	 Leis	 Civis.	 Brasília:
Senado,	2003,	p.	35.
449.	“Art.	389.	Quando	as	coisas	móveis	por	natureza	podem	por	si	mover-se	de
um	 lugar	 para	 outro,	 têm	 a	 denominação	 de	 semoventes”	 (Freitas,	 Augusto
Teixeira.	Esboço	do	Código	Civil,	v.	1.	Brasília:	Fundação	UnB,	1983,	p.	138).
450.	 Diferindo	 das	 perspectivas	 clássicas	 que	 impediam	 a	 atribuição	 das
consequências	jurídicas	para	o	dominus	por	atos	praticados	pelos	seus	escravos
(Malheiro,	Agostinho	Marques	 Perdigão.	A	 escravidão	 no	 Brasil,	 v.	 I.	 Rio	 de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	52).
451.	 Bueno,	 José	 Antônio	 Pimenta.	 Direito	 Público	 Brasileiro	 e	 Análise	 da
Constituição	do	Império.	Brasília:	Senado	Federal,	1978,	p.	421.
452.	 Freitas,	 Augusto	 Teixeira.	 Esboço	 do	 Código	 Civil.	 Brasília:	 Fundação
UnB,	1983,	p.	14.
453.	Silva,	Luís	Antônio	Vieira	da.	História	Interna	do	Direito	Romano	privado
até	Justiniano.	Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	60-61.
454.	Teixeira	de	Freitas	ressaltava	que	no	caso	dos	escravos,	não	havia	um	total
desaparecimento	 da	 capacidade:	 “Sabe-se	 que	 neste	 projeto	 prescindo	 da
escravidão	 dos	 negros,	 reservada	 para	 um	 projeto	 especial	 de	 lei:	 mas	 não	 se
creia	que	teria	de	considerar	os	escravos	como	coisas.	Por	muitas	que	sejam	as
restrições,	ainda	lhes	fica	a	aptidão	para	adquirir	direitos;	e	tanto	basta	para	que
sejam	 pessoas”	 (Freitas,	 Augusto	 Teixeira.	 Esboço	 do	 Código	 Civil.	 Brasília:
Fundação	UnB,	1983,	p.	14.).	Em	sentido	igual:	Nabuco,	Joaquim.	A	escravidão.
Recife:	Fundaj/Editora	Massangana,	1988,	p.	113.
455.	Silva,	Luís	Antônio	Vieira	da.	História	Interna	do	Direito	Romano	privado
até	Justiniano.	Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	80.
456.	 “O	 proprietário	 renunciava	 assim	 voluntariamente	 a	 seu	manus	 sobre	 o
cativo	que	 se	 tornava	homem	 livre	 ‘como	 se	 fosse	de	nascimento’	 conforme	a
expressão	utilizada	nos	textos	das	alforrias”	(Mattoso,	Kátia	M.	de	Queirós.	Ser
escravo	no	Brasil:	séculos	XVI-XIX.	São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.	200).
457.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	123.
458.	“Legalmente,	só	havia	duas	maneiras	do	escravo	adquirir	a	liberdade:	pela
morte	natural	ou	pela	alforria”	(Freitas,	Décio.	Palmares:	a	guerra	dos	escravos.
Rio	de	Janeiro:	Edições	Graal,	1982,	p.	29).
459.	“A	manumissão	é	aquela	declaração	pela	qual	o	senhor	dava	 liberdade	ao
seu	escravo;	declaração	esta,	porém,	que	devia	ser	feita	conforme	os	direitos	que
regulavam	este	ato”	(Silva,	Luís	Antônio	Vieira	da.	História	Interna	do	Direito
Romano	privado	até	Justiniano.	Brasília:	Senado	Federal,	2008,	p.	81).
460.	Mattoso,	Kátia	M.	 de	Queirós.	Ser	 escravo	 no	 Brasil:	 séculos	XVI-XIX.
São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.	200.
461.	Pode-se	dividir	as	cartas	de	liberdade	nas	seguintes	categorias:	(a)	as	que	se
originaram	 na	 gratidão	 do	 senhor;	 (b)	 as	 concedidas	 sob	 condição;	 (c)	 as
vendidas	 a	 escravos	 ou	 pagas	 por	 alguma	 associação;	 (d)	 as	 concedidas	 a
crianças,	filhos	de	escrava	com	o	senhor	e	pai	da	criança;	e	(e)	as	concedidas	em
favor	 de	 determinado	 escravo,	 para	 lhe	 ser	 entregue	 após	 a	 morte	 do	 senhor
(Sena,	Marina	de	Avellar	apud	Moura,	Clóvis.	Dicionário	da	escravidão	negra
no	Brasil.	São	Paulo:	Ed.	USP,	2004,	p.	89).
Eis	um	exemplo	de	carta	de	 liberdade,	concedida	por	Perdigão	Malheiro	e	 sua
esposa	 em	 favor	 do	 seu	 escravo	 Sabino:	 “Registro	 de	 uma	Carta	 de	 liberdade
conferida	pelo	Dr.	Agostinho	Marques	Perdigão	Malheiro	sua	mulher	ao	pardo
Sabino	 [...]	 Pela	 presente,	 por	 um	 de	 nós	 escrita	 e	 por	 ambos	 assinada,
declaramos	que,	desejando	comemorar	por	um	ato	digno	da	Religião	de	Cristo,	o
Redentor,	e	de	humanidade,	o	aniversário	que	hoje	celebramos,	e	atendendo	aos
serviços	 que	 já	 nos	 tem	 prestado	 o	 pardo	 Sabino,	 nosso	 escravo,	 temos	 de
comum	acordo	e	de	muita	nossa	 livre	e	espontânea	vontade,	 resolvido	conferir
ao	mesmo,	como	conferimos,	a	sua	liberdade,	podendo	conduzir-se	como	se	de
ventre	livre	fosse	nascido;	com	a	cláusula,	porém,	de	continuar	servindo-nos	ou
à	pessoa	por	qualquer	de	nós	designada,	ainda	por	espaço	de	cinco	anos,	a	contar
desta	data	[...]”	(Chalhoub,	Sidney.	Visões	da	liberdade:	uma	história	das	últimas
décadas	 da	 escravidão	 na	 Corte.	 São	 Paulo:	 Companhia	 das	 Letras,	 2011,	 p.
174).
462.	 “[...]	 se	 não	 havia	 documento	 escrito,	 era	 preciso	 provar	 por	 meio	 de
testemunhas	que	houve	alforria”	(Mattoso,	Kátia	M.	de	Queirós.	Ser	escravo	no
Brasil:	séculos	XVI-XIX.	São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.	200).
463.	“[...]	em	geral,	a	alforria	era	concedida	por	carta,	assinada	pelo	senhor	ou,	a
seu	pedido,	por	um	terceiro,	quando	era	iletrado”	(Mattoso,	Kátia	M.	de	Queirós.
Ser	escravo	no	Brasil:	séculos	XVI-XIX.	São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.	200).
464.	“Nem	sempre	essas	cartas	eram	transcritas	no	Livro	de	Notas	do	Cartório
local.	Às	vezes	eram	entregues	a	pessoas	de	confiança	do	concedente	até	que	ele
falecesse,	 para	 então	 serem	 levadas	 ao	 Cartório	 para	 legaliza-las,	 ou	 ainda
podiam	ser	guardadas	junto	ao	testamento	do	senhor	do	escravo	e	só	eram	dadas
a	 conhecer	 com	 a	 abertura	 deste”	 (Moura,	 Clóvis.	Dicionário	 da	 escravidão
negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Ed.	USP,	2004,	p.	89).
465.	Ibidem,	p.	89.
466.	“Esses	 documentos	 não	 obedeciam	 a	 uma	 determinada	 forma.	Aliás,	 não
havia	 praticamente	 nenhuma	 norma	 a	 ser	 obedecida	 rigidamente”	 (Ibidem,	 p.
89).
467.	Ibidem,	p.	82-83.
468.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	236.
469.	“Isto	somente	ocorria	quando	o	pai	era	 também	o	senhor	da	escrava,	mas
queria	beneficiá-la	com	a	liberdade	do	filho	bastardo.	No	entanto,	era	raro	o	fato
e	 não	 chegou	 a	 se	 transformar	 em	 norma,	 pois	 a	 filosofia	 dos	 senhores	 de
escravos	 era	 fazer	 filhos	 nas	 negras	 para	 aumentar	 o	 plantel”	 (Moura,	 Clóvis.
Dicionário	da	escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Ed.	USP,	2004,	p.	90).
470.	 “[...]	 apesar	 do	 benigno	 acolhimento	 que	 as	 ideias	 filantrópicas
recomendam	 em	 questões	 de	 liberdade,	 contudo,	 como	 há	 oposição	 no
reconhecido	senhor	[...]	não	pode	ser	privado	do	domínio	[...]”	(Provis.	de	15	de
dezembro	 de	 1823)	 (Malheiro,	Agostinho	Marques	 Perdigão.	A	 escravidão	 no
Brasil,	v.	I.	Rio	de	Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	239).	“O	testador	não
pôde	 conferir	 alforria	 direta	 senão	 a	 seus	 próprios	 escravos,	 isto	 é,	 que	 lhe
pertençam	ao	 tempo	do	 testamento,	 ou	 ao	 tempo	de	 seu	 falecimento”	 (Freitas,
Augusto	 Teixeira	 de.	Consolidação	 das	 Leis	 Civis,	 v.	 II.	 Brasília:	 Senado,	 p.
2003,	p.	653).
471.	Chalhoub,	Sidney.	Visões	da	liberdade:	uma	história	das	últimas	décadas	da
escravidão	na	Corte.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2011,	p.	158.
472.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	84.
473.	 Vontade	 que	 somente	 poderia	 ser	 externada	 por	 quem	 fosse	 capaz:	 “O
louco,	demente,	furioso	é	incapaz	[para	alforriar],	exceto	em	lúcidos	intervalos”.
Malheiro	entendia	que	o	pródigo,	interditado	por	sentença,	poderia	realizar	atos
em	favor	da	liberdade;	bem	como	a	mulher	casada,	em	atos	entre	vivos,	também
poderia	alforriar,	apesar	de	sua	capacidade	estar	 limitada	(Malheiro,Agostinho
Marques	 Perdigão.	 A	 escravidão	 no	 Brasil,	 v.	 I.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typografia
Nacional,	1867,	p.	85	e	243).
474.	Moura,	Clóvis.	Dicionário	da	escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Ed.
USP,	2004,	p.	89.
475.	Ibidem,	p.	89.
476.	 Acórdão	 do	 Supremo	 Tribunal	 de	 Justiça,	 de	 29	 de	 outubro	 de	 1864
(Malheiro,	Agostinho	Marques	 Perdigão.	A	 escravidão	 no	 Brasil,	 v.	 I.	 Rio	 de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	82	e	236).
477.	 Evidentemente,	 escravos	 não	 poderiam	 alforriar,	 por	 não	 ter	 capacidade
civil;	 nem	 menores,	 tutelados	 ou	 curatelados,	 por	 igual	 razão.	 Tutores	 ou
curadores	 não	 o	 podiam	 conceder	 alforria	 pelo	 fato	 de	 que	 eles	 apenas
administravam	 o	 patrimônio	 de	 incapazes,	 não	 podendo	 praticar	 atos	 de
alienação.	O	usufrutuário	também	não	poderia	conceder	a	liberdade	por	não	ter
direto	de	dispor	de	patrimônio	alheio	(Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A
escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de	Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	84).
478.	Era	vedada	a	concessão	de	manumissões	que	viessem	a	prejudicar	terceiros
credores	 do	 proprietário,	 sendo	 consideradas	 fraudulentas:	 “1.º	 a	 respeito	 do
escravo	especialmente	hipotecado	ou	dado	em	penhor;	2.º	 a	alforria	em	fraude
dos	 credores;	 3.º	 nas	 manumissões	 testamentárias	 a	 alforria	 em	 fraude	 ou
prejuízo	 dos	 herdeiros	 necessários	 [...]”	 (Malheiro,	 Agostinho	 Marques
Perdigão.	 A	 escravidão	 no	 Brasil,	 v.	 I.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typografia	 Nacional,
1867,	p.	89).	“A	alforria	era	proibida	[...]:	primeiramente,	quando	no	documento
de	venda	do	escravo,	venda	privada	ou	em	leilão,	o	primeiro	senhor	estipulava
que	o	escravo	não	poderia	nunca	ser	alforriado.	Por	outro	lado,	o	documento	de
venda	podia	também	incluir	cláusulas	que	liberavam	o	escravo	a	termo	ou	se	o
novo	senhor	o	obrigasse	a	se	prostituir.	[...]”	(Mattoso,	Kátia	M.	de	Queirós.	Ser
escravo	no	Brasil:	séculos	XVI-XIX.	São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.	205).	“É	nula	a
alforria,	 quando	 a	 herança	 é	 insolvável,	 ainda	 que	 se	 transmita	 a	 um	 herdeiro
rico	[...]	Reputa-se	em	fraude	dos	credores	a	alforria	dada	pelo	devedor,	quando
este	 é	 insolvável	 no	momento	 dela,	 ou	 deve	 ficar	 insolvável	 em	 virtude	 dela”
(Freitas,	 Augusto	 Teixeira	 de.	 Consolidação	 das	 Leis	 Civis,	 v.	 II.	 Brasília:
Senado,	2003,	p.	656).
479.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	83.
480.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	83.
481.	“[...]	estado	livre	é	aquele	a	quem	ê	concedida	a	liberdade	para	certo	tempo
ou	sob	certa	condição.	(Dig.	Livro	40,	tit.	7º)”	(Pereira,	J.	Baptista.	Da	condição
atual	dos	escravos:	especialmente	após	a	promulgação	da	Lei	nº	3.270	de	28	de
setembro	 de	 1885.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Imprensa	 Nacional,	 p.	 6).	 A	 alforria
condicional	estava	prevista	nas	Ordenações	Filipinas,	Livro	4,	título	63.
482.	 Barbosa,	 Rui.	 Emancipação	 dos	 Escravos.	 Rio	 de	 Janeiro:	 Typographia
Nacional,	1884,	p.	80-81.
483.	 “[...]	 o	 statuliber	 já	 não	 é	 própria	 e	 rigorosamente	 escravo”	 (Malheiro,
Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A	 escravidão	 no	 Brasil,	 v.	 I.	 Rio	 de	 Janeiro:
Typografia	Nacional,	1867,	p.	24).
484.	Chalhoub,	Sidney.	Visões	da	liberdade:	uma	história	das	últimas	décadas	da
escravidão	na	Corte.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2011,	p.	159-161.
485.	Há	uma	interessante	análise	de	um	caso	concreto	envolvendo	uma	escrava
alforriada	sob	condição,	que	já	estava	grávida,	em	Chalhoub,	Sidney.	Visões	da
liberdade:	uma	história	das	últimas	décadas	da	escravidão	na	Corte.	São	Paulo:
Companhia	das	Letras,	2011,	p.	151ss.
486.	“[O	Instituto	dos	Advogados	do	Brasil,	consolidou	entendimento,	em	1857,
1º)	 que	 a	 escrava,	 a	 quem	 por	 testamento	 se	 conferira	 a	 liberdade	 com	 a
obrigação	de	servir	a	alguma	pessoa,	enquanto	esta	vivesse,	ou	por	certo	prazo
de	tempo,	era	desde	logo	livre	os	filhos	que	lhe	nascessem	nesse	entretempo;	2º)
que	 em	 tal	 caso,	 ademais,	 a	 obrigação	de	prestar	 serviços	 seria	 antes	 um	ônus
imposto	 à	 liberdade	 do	 que	 uma	 condição	 suspensiva;	 e	 3º)	 que	 a	 hipótese	 de
modo	algum	se	poderia	confundir	com	aquela	outra	em	que	a	escrava	se	deixava
em	legado	para	servir	a	alguma	pessoa	por	certo	tempo,	findo	o	qual	se	lhe	daria
a	 liberdade:	 em	cujo	 caso,	 porém,	 igualmente,	 ingênuos	 seriam	os	 seus	 filhos,
como	 nascidos	 de	 ventre	 livre”	 (Nequete,	 Lenine.	 Alforria	 ‘condicionada’	 à
prestação	 de	 serviços:	 a	 exemplaridade	 de	 um	 acórdão	 da	 Relação	 de	 Porto
Alegre.	Revista	da	AJURIS,	Porto	Alegre,	n.	20,	ano	VII,	p.	151,	1980).
487.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	126-127.
488.	 “As	 alforrias,	 quer	 gratuitas,	 quer	 a	 título	 oneroso,	 serão	 isentas	 de
quaisquer	direitos,	emolumentos	ou	despesas”	(§	6º,	do	art.	4º,	da	Lei	nº	2.040,
de	 28	 de	 setembro	 de	 1871	 e	 §	 1º	 do	 art.	 1º	 do	 Decreto	 nº	 2.699,	 de	 28	 de
novembro	de	1860:	“§	1º	Excetuam-se	da	regra	acima	estabelecida:	1º	a	alforria
de	qualquer	escravo,	onerosa	ou	gratuita,	qualquer	que	seja	a	forma	do	ato	por
que	ela	se	efetue;	2º	as	compras	de	escravos	feitas	pela	Fazenda	Nacional”.
489.	Moura,	Clóvis.	Dicionário	da	escravidão	negra	no	Brasil.	São	Paulo:	Ed.
USP,	2004,	p.	89-90.
490.	Chalhoub,	Sidney.	Visões	da	liberdade:	uma	história	das	últimas	décadas	da
escravidão	na	Corte.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2011,	p.	164-166.
491.	“A	representação	senhorial	dominante	sobre	a	alforria	no	século	XIX,	pelo
menos	até	o	seu	terceiro	quartel,	era	a	de	que	o	escravo,	sendo	dependente	moral
e	 materialmente	 do	 senhor,	 não	 podia	 ver	 essa	 relação	 bruscamente	 rompida
quando	 alcançava	 a	 liberdade.	 [...]	 A	 possibilidade	 da	 revogação	 [da	 alforria]
seria	 um	 forte	 reforço	 à	 ideologia	 da	 relação	 entre	 senhores	 e	 escravos	 como
caracterizada	por	paternalismo,	dependência	 e	 subordinação,	 traços	que	não	 se
esgotariam	 com	 a	 ocorrência	 da	 alforria”	 (Chalhoub,	 Sidney.	 Visões	 da
liberdade:	uma	história	das	últimas	décadas	da	escravidão	na	Corte.	São	Paulo:
Companhia	 das	 Letras,	 2011,	 p.	 169).	 Para	 uma	 minuciosa	 análise	 do
dispositivo,	ver	Nequete,	Lenine.	Escravos	&	magistrados	no	segundo	reinado.
Brasília:	Ministério	da	Justiça/Fund.	Petrônio	Portella,	1988,	p.	9-33.
492.	 Freitas,	 Décio;	 et	 al.	A	 Cidadania	 no	 Brasil:	 o	 índio	 e	 o	 escravo	 negro.
Brasília:	Ministério	do	Interior,	1988,	p.	55-56.
493.	“Fica	derrogada	a	Ord.	liv.	4.º,	tit.	63,	na	parte	que	revoga	as	alforrias	por
ingratidão”	(§	9º	do	art.	4º	da	Lei	nº	2.040,	de	28	de	setembro	de	1871).
494.	A	Lei	Rio-Branco	(Lei	nº	2.040,	de	28	de	setembro	de	1871),	ao	revogar	o
dispositivo	 das	 Ordenações	 que	 facultava	 a	 revogação	 da	 alforria,	 conferiu	 a
todos	 os	 libertos	 a	 mais	 completa	 independência	 jurídica,	 mas	 nem	 por	 isso
suprimiu	a	restrição	aos	seus	direitos	políticos	(Freitas,	Décio;	et	al.	A	Cidadania
no	Brasil:	o	índio	e	o	escravo	negro.	Brasília:	Ministério	do	Interior,	1988,	p.	55-
56).
Registre-se	 que	 “[...]	 não	 faltou	 quem	 sustentasse,	 [...]	 que	 continuavam	 em
vigor	entre	nós	as	Ordenações	do	Reino,	enquanto	não	se	organizasse	um	novo
Código	 ou	 nãop	 fossem	 elas	 especialmente	 alteradas”	 (Nequete,	 Lenine.
Escravos	 &	 magistrados	 no	 segundo	 reinado.	 Brasília:	 Ministério	 da
Justiça/Fund.	Petrônio	Portella,	1988,	p.	17).
495.	 A	 pretensão	 para	 obtenção	 da	 liberdade,	 pela	 alforria	 prevista	 na	 Lei	 do
Vente	Livre,	se	assemelhava	ao	exercício	de	um	direito	potestativo	pelo	escravo,
já	 que	 não	 havia	 uma	 contraprestação	 decorrente	 da	 manumissão,	 após	 o
pagamento	 da	 indenização,	 já	 que	 almejava-se	 a	 simples	 alteração	 do	 status
libertatis:“Nas	 ações	 para	 o	 exercício	 de	 um	 direito	 potestativo,	 o	 autor	 não
exige	 prestação	 alguma	 do	 réu,	 querendo	 apenas	 que	 o	 juiz	 modifique,	 por
sentença,	a	relação	jurídica	que	admite	a	modificação	pretendida	[...]”	(Gomes,
Orlando.	Introdução	ao	Direito	Civil.	Rio	de	Janeiro:	Forense,	1995,	p.	109).
496.	“O	escravo	nada	adquiria,	nem	adquire,	para	si;	 tudo	para	o	senhor.	Tal
era	 o	 princípio	 do	 Direito	 Romano;	 fossem	 direitos	 reais,	 desmembrações	 da
propriedade,	 créditos,	 legados,	 herança,	 posse,	 ainda	 que	 sem	 ciência	 e
consentimento	 do	 senhor”	 (Malheiro,	 Agostinho	 Marques	 Perdigão.	 A
escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de	Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	48).
497.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	4-50.
498.	 A	 regulamentação	 protetiva	 desse	 pecúlio	 adviria	 de	 atos	 normativos
praticados	 pelo	 Estado	 imperial:	 “O	 governo	 providenciará	 nos	 regulamentos
sobre	a	colocação	e	segurança	do	mesmo	pecúlio”	(art.	4º,	segunda	parte,	da	Lei
do	Ventre-Livre).
499.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	49.
500.	 “No	 entanto,	 nenhuma	 lei	 garantia	 ao	 escravo	 a	 livre	 utilização	 do	 que
ganhava;	ademais,	o	escravo	nada	possuía	em	si.	O	senhor	deveria	decidir	se	tal
situação	era	tolerável	e	se	o	escravo,	que	trabalhava	para	fora,	tinha	o	direito	de
guardar	 para	 si	 o	 dinheiro	 que	 permitiria	 que	 comprasse	 sua	 liberdade.	 A
constituição	desse	pecúlio	resultava	assim	de	um	verdadeiro	acordo	verbal	entre
o	 senhor	 e	 o	 escravo,	 pois	 ele	 deveria	 ao	 senhor	 uma	 soma	 fixa	 diária	 ou
semanal,	dessa	forma,	o	que	conseguia	a	mais	lhe	pertencia”	(Mattoso,	Kátia	M.
de	Queirós.	Ser	escravo	no	Brasil:	séculos	XVI-XIX.	São	Paulo:	Vozes,	2016,	p.
213).
501.	§	3º,	do	art.	4º,	da	Lei	nº	2.040,	de	28	de	setembro	de	1871.
502.	Muitos	 abolicionistas	 que	 defendiam	 a	 escravidão	 sem	 indenização	 eram
chamados	 de	 divulgadores	 de	 ideias	 socialistas	 ou	 comunistas	 (Barbosa,	 Ruy.
Emancipação	dos	Escravos.	Rio	de	Janeiro:	Typographia	Nacional,	1884,	p.	64).
Em	meio	 ao	 procedimento	 para	 a	 aprovação	 da	Lei	Áurea,	merece	 destaque	 a
fala	do	Barão	de	Cotegipe,	quem	refutava	a	 tese	da	abolição	sem	 indenização:
“Enfim,	 decreta-se	 que,	 neste	 país,	 não	 há	 propriedade,	 que	 tudo	 pode	 ser
destruído	 por	meio	 de	 uma	 lei	 sem	 atenção	 nem	 a	 direitos	 adquiridos,	 nem	 a
inconvenientes	futuros!	A	verdade	é	que	vai	haver	uma	perturbação	enorme	no
país	 durante	 muitos	 anos,	 o	 que	 não	 verei,	 talvez,	 mas	 aqueles	 a	 quem	Deus
conceder	mais	vida,	ou	que	forem	mais	moços	presenciarão”	(Moraes,	Evaristo
de.	A	 Campanha	 Abolicionista:	 1879-1888.	 Brasília:	 Editora	 Universidade	 de
Brasília,	1986,	p.	277).
503.	Chalhoub,	Sidney.	Visões	da	liberdade:	uma	história	das	últimas	décadas	da
escravidão	na	Corte.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	2011,	p.	172.
504.	§	5º,	do	art.	4º,	da	Lei	nº	2.040,	de	28	de	setembro	de	1871.
505.	 Na	 prática,	 o	 escravo	 levava,	 pelos	 seus	 ganhos	 diários,	 mais	 de	 uma
década	 para	 obter	 os	 valores,	 pelo	 seu	 trabalho,	 para	 constituir	 um	 pecúlio
suficiente	 para	 obter	 a	 sua	 alforria,	 como	 analisado	 em	Mattoso,	 Kátia	M.	 de
Queirós.	Ser	escravo	no	Brasil:	 séculos	XVI-XIX.	 São	Paulo:	Vozes,	 2016,	 p.
214-215.
506.	Denominação	atribuída	ao	Poder	Judiciário	pelo	art.	10	da	Constituição	de
1824.
507.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	134.
508.	Cirne,	Adolfo	apud	Nequete,	Lenine.	Escravos	&	magistrados	no	segundo
reinado.	Brasília:	Ministério	da	Justiça/Fund.	Petrônio	Portella,	1988,	p.	166.
509.	“[...]	 estas	 ações	 de	 liberdade,	 seus	 procedimentos	 e	 seus	 resultados,	 não
eram	uma	prática	anormal	no	Estado	imperial	brasileiro,	mesmo	que	o	acesso	de
escravos	ao	sistema	judiciária	(como	autores	de	ações	e	não	réus)	tenha	sido,	no
fundo,	tão	restrito”	(Grinberg,	Keila.	Liberata:	a	lei	da	ambiguidade:	as	ações	de
liberdade	 da	 Corte	 de	 Apelação	 do	 Rio	 de	 Janeiro	 no	 século	 XIX.	 Rio	 de
Janeiro:	Relume-Dumará,	1994,	p.	45).
510.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	132.
511.	Art.	23	do	Regulamento	nº	737,	de	25	de	novembro	de	1850	(Paula,	Jônatas
Luiz	Moreira	de.	História	do	Direito	Processual	Brasileiro:	das	origens	lusas	à
escola	crítica	do	processo.	Barueri:	Manole,	2002,	p.	237).
512.	 “Art.	 161.	 Sem	 se	 fazer	 constar,	 que	 se	 tem	 intentado	 o	 meio	 da
reconciliação,	não	se	começará	Processo	algum”	(Constituição	do	Império).
513.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	133.
514.	“Art.	10.	Em	qualquer	 tempo,	em	que	o	preto	requerer	a	qualquer	Juiz	de
Paz,	ou	Criminal,	que	veio	para	o	Brasil	depois	da	extinção	do	tráfico,	o	Juiz	o
interrogará	 sobre	 todas	 as	 circunstâncias,	 que	 possam	 esclarecer	 o	 fato,	 e
oficialmente	procederá	a	todas	as	diligencias	necessárias	para	certificar-se	dele:
obrigando	 o	 senhor	 a	 desfazer	 as	 dúvidas,	 que	 suscitarem-se	 a	 tal	 respeito.
Havendo	 presunções	 veementes	 de	 ser	 o	 preto	 livre,	 o	 mandará	 depositar,	 e
procederá	nos	mais	termos	da	Lei”.
515.	“O	argumento	de	Luiz	Gama	buscava	ressaltar	que	esse	decreto	tratava	de
um	princípio	geral	e	indubitavelmente	pensado	para	favorecer	todos	os	escravos
que,	 introduzidos	 através	do	 tráfico	 ilegal	 em	 território	brasileiro,	 requeressem
seu	direito	à	 liberdade	em	qualquer	foro	comum”	(Azevedo,	Elciene.	O	direito
dos	 escravos:	 lutas	 jurídicas	 e	 abolicionismo	 na	 província	 de	 São	 Paulo.
Campinas:	Editora	Unicamp,	2010,	p.	102).
Nos	debates	sobre	a	Lei	nº	2.040,	de	28	de	setembro	de	1871,	foi	expressamente
afastada	a	criação	de	um	“juízo	excepcional”	para	processar	e	 julgar	 tais	ações
(Rio-Branco,	 Miguel	 P.	 do.	 Centenário	 da	 Lei	 do	 Ventre	 Livre.	 Brasília:
Conselho	Federal	de	Cultura,	1975,	p.	206-207).
516.	Azevedo,	Elciene.	O	direito	dos	escravos:	lutas	jurídicas	e	abolicionismo	na
província	de	São	Paulo.	Campinas:	Editora	Unicamp,	2010,	p.	201.
517.	No	curso	do	processo	poderia	o	indivíduo	que	postulava	a	sua	liberdade	vir
a	ser	depositado	em	poder	de	pessoa	idônea,	com	o	objetivo	de	assegurar	a	sua
segurança	e	sua	liberdade	de	defesa	(Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A
escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de	Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	137).
“Este	 ‘depósito’	 refere-se	 ao	 contrato	 de	 depósito,	 no	 qual	 alguém	obriga-se	 a
guardar,	 quando	 lhe	 for	 exigido,	qualquer	objeto	móvel	que	de	outrem	 receba.
Neste	 caso,	 o	 escravo	 cuja	 ação	 é	 aceita	 deixa	 de	 ficar	 sob	 a	 guarda	 de	 seu
senhor,	 indo	 para	 um	 ‘depósito’,	 provavelmente	 aos	 cuidados	 de	 seu	 curador”
(Grinberg,	Keila.	Liberata:	a	lei	da	ambiguidade:	as	ações	de	liberdade	da	Corte
de	Apelação	do	Rio	de	Janeiro	no	século	XIX.	Rio	de	Janeiro:	Relume-Dumará,
1994,	p.	22).
518.	Entretanto,	Malheiro	ressalva:	“mas	por	estilo	de	foro,	é	tratada	em	forma
ordinária,	bem	como	a	de	escravidão;	porque,	em	regra,	são	ou	podem	tornar-se
de	 alta	 indagação,	 e	 a	 questão	 de	 liberdade	 é	 conexa	 com	 a	 de	 escravidão”
(Malheiro,	Agostinho	Marques	 Perdigão.	A	 escravidão	 no	 Brasil,	 v.	 I.	 Rio	 de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	133).
519.	Grinberg,	Keila.	Liberata:	a	 lei	da	ambiguidade:	as	ações	de	 liberdade	da
Corte	de	Apelação	do	Rio	de	 Janeiro	no	 século	XIX.	Rio	de	 Janeiro:	Relume-
Dumará,	1994,	p.	22.
520.	Malheiro,	Agostinho	Marques	Perdigão.	A	escravidão	no	Brasil,	v.	I.	Rio	de
Janeiro:	Typografia	Nacional,	1867,	p.	134.	Todavia,	“[...]	se	tal	posse	de	estado
não	há,	e	o	indivíduo	tem	ao	contrário	vivido	em	cativeiro”,

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