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Apostila Trypanosoma cruzi e Trypanosoma brucei

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PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 92 
 
 
 
 
PARASITOLOGIA CLÍNICA 
Tema 3 
Trypanosoma spp. (Trypanosoma 
cruzi e Trypanosoma brucei) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 93 
 
TEMA 3 
TRYPANOSOMA SPP. (TRYPANOSOMA 
CRUZI E TRYPANOSOMA BRUCEI) 
 
2.1.4. TRYPANOSOMA CRUZI 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
 
Fig 27 – Trypanosoma cruzi no meio de eritrócitos 
 
O médico Carlos Chagas descobriu a doença e descreveu praticamente todos os 
seus aspectos. Ao realizar uma campanha contra a malária, a norte de Minas 
Gerais, encontrou tripanosomas no sangue de uma menina doente. Após exame 
às fezes de insetos existentes na região e ao sangue de animais mamíferos, 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 94 
 
constatou também a presença dos mesmos parasitas. Carlos Chagas pôde então, 
descrever o agente causador, o transmissor e o modo de transmissão da doença, 
assim como comprovar a existência de vertebrados que são reservatórios 
silvestres e domésticos do parasita, relatando assim os aspectos básicos da 
epidemiologia da doença. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fig 28 - A doença de Chagas ou Tripanosomíase Americana foi descoberta pelo médico 
Carlos Justiniano Ribeiro das Chagas – Carlos Chagas – em 1909. 
 
A doença de Chagas é um problema sério no Continente Americano. É causada 
por um protozoário, que surge nos humanos como um hemoflagelado e como 
parasita intracelular sem flagelo externo – Trypanosoma cruzi. Os vectores da 
doença são insetos hematófagos (percevejos), conhecidos como “percevejos do 
beijo”, pois ao atacar as pessoas enquanto dormem têm o hábito de fazer a sua 
refeição de sangue na zona em redor dos lábios, mas esta designação é 
exagerada, visto que os percevejos picam qualquer parte do corpo com pele 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 95 
 
exposta. É responsável por enorme morbilidade e mortalidade na América Latina. 
É uma doença de evolução crónica, debilitante e que apresenta quadros clínicos 
com características e consequências muito variadas. O tratamento é controverso e 
a vacina é improvável, devido à possível indução de autoimunidade pelos 
antigénios do Trypanosoma cruzi. 
 
2. CLASSIFICAÇÃO TAXONÓMICA 
 
O Trypanosoma cruzi é um protozoário cuja classificação científica se pode 
descrever da seguinte forma: Reino Protista; Filo Euglenozoa; Classe 
Kinetoplastea; Ordem Trypanosomatida; Família Trypanosomatidae; Género 
Trypanosoma; Espécie Trypanosoma cruzi. 
Este protozoário é assim um ser unicelular eucariota, flagelado e com uma 
estrutura proeminente, conhecida como cinetoplasto. Esta estrutura corresponde a 
uma condensação de DNA localizado no interior de uma mitocôndria única e 
ramificada por todo o corpo do protozoário. Dentro da família Trypanosomatidae, o 
género Trypanosoma é um dos mais importantes por incluir uma série de espécies 
causadoras de doenças humanas importantes, como o Trypanosoma cruzi, agente 
da Doença de Chagas. Como já referido anteriormente, com base no 
comportamento do parasita nos seus hospedeiros, principalmente no vector, o 
género Trypanosoma foi dividido em dois grupos. O T. cruzi foi incluído no grupo 
chamado Stercoraria, onde se englobam tripanosomas que se desenvolvem no 
tubo digestivo do vector, progredindo no sentido da porção intestinal com 
libertação de formas infestantes pelas fezes. A grande complexidade no 
comportamento biológico dos tripanosomatídeos do género Trypanosoma levou à 
criação de alguns subgéneros, pertencendo o T. cruzi ao subgénero 
Schizotrypanum. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 96 
 
Quanto ao vector de transmissão, os membros da subfamília Triatominae são os 
que apresentam grande interesse porque são hematófagos e transmissores do T. 
cruzi. A classificação taxonomica destes insetos faz-se principalmente através do 
conceito morfológico tradicional, e a subfamília, considerada inicialmente um grupo 
monofilético, sabe-se hoje que engloba duas grandes linhagens filogenéticas (T. 
cruzi I e II). 
Os transmissores do agente etiológico da doença de Chagas são artrópodes com a 
seguinte taxonomia: Filo Arthropoda; Classe Insecta; Subclasse Pterygota; Ordem 
Hemíptera; Subordem Heteroptera; Família Reduviidae; Subfamília Triatominae. 
São deste modo, insetos de corpo e pernas segmentados, em que o corpo está 
dividido em cabeça, tórax e abdómen, apresentando sempre três pares de pernas 
articuladas e um par de antenas. Tal como os percevejos em geral, apresenta 
cabeça com rostro (conjunto lábio-estiletes bucais) 
trissegmentado e dois pares de asas; estes 
percevejos têm a cabeça fina e alongada, pescoço 
bem marcado, rostro longo e reto, alcançando o 
primeiro par de pernas, e aparelho bucal do tipo 
picador-sugador. Tanto as fêmeas como os 
machos são hematófagos. Sugam sangue em 
todas as fases do seu ciclo evolutivo e vivem em 
média entre um a dois anos, com evolução de ovo, ninfa e adulto, com grande 
capacidade de reprodução e, dependendo da espécie, com intensa resistência ao 
jejum. 
 
 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 97 
 
 
 
Fig 29 – Ovos de triatomídeo vector da doença de Chagas 
 
 
 
 
Fig 30 - Estadios evolutivos de ninfas de triatomídeo vector da doença de Chagas A = 
ninfa de primeiro estadio; B = ninfa de segundo estadio; C = ninfa de terceiro estadio; D = 
ninfa de quarto estadio; E = ninfa de quinto estadio. 
 
3. CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS 
 
As células de Trypanosoma são pequenas e heterotróficas. A estrutura da célula 
tem um papel muito importante, permitindo que ela se possa apresentar em três 
formas diferentes (tripomastigota, epimastigota e amastigota) durante o seu ciclo 
de vida, dependendo da localização no hospedeiro. A localização do cinetoplasto 
em relação ao núcleo e ao flagelo determina em que fase o Trypanosoma se 
encontra. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 98 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fig 31 – Estadios evolutivos de Trypanosoma cruzi 
 
 
 
Fig 32 – Caracterização dos tripomastigotas de Trypanosoma cruzi 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 99 
 
 
 
 
 
 
 
Fig 33 – Caracterização de epimastigotas e amastigotas de Trypanosomacruzi 
 
Quando analisada ao microscópio electrónico de transmissão, técnica utilizada 
para o estudo da organização celular, a superfície de todas as formas evolutivas 
do T. cruzi apresenta um discreto glicocálice com aproximadamente 7 nm de 
espessura. Este glicocálice é constituído pelos carboidratos que se projetam para o 
lado externo da célula e que estão associados às proteínas periféricas ou integrais, 
formando as glicoproteínas e os lipídos, ou seja, os glicolipídos. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 100 
 
 
 
 
Fig 34 - Esquema geral da forma epimastigota do T. cruzi mostrando as estruturas 
celulares 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 101 
 
A membrana plasmática que envolve as células tem um importante papel de 
separação entre o ambiente extracelular e o intracelular. Como em todas as 
células, a membrana plasmática do T. cruzi apresenta uma bicamada lipídica à 
qual as proteínas de diferentes naturezas se encontram associadas em diferentes 
graus. A análise das proteínas da membrana plasmática do T. cruzi permitiu 
demonstrar que existem vários domínios na membrana plasmática que envolve o 
T. cruzi bem como dos outros tripanosomatídeos e que existem significativas 
diferenças entre as várias formas evolutivas. A membrana que reveste as formas 
epimastigotas é muito mais rica em proteínas integrais do que a que reveste a 
forma amastigota e esta maior que a que reveste a forma tripomastigota. No caso 
das formas epimastigotas e amastigotas encontra-se noutro domínio de membrana 
altamente especializado, localizado na região anterior do corpo do parasita, 
próximo à abertura da bolsa flagelar. Esta região especial é denominada citóstoma 
e está envolvida na captação de macromoléculas do meio. 
Todos os membros da família Tripanosomatidae apresentam um flagelo que 
emerge de uma área de invaginação da membrana que reveste o corpo celular e 
forma a bolsa flagelar. Na forma amastigota, o flagelo é muito curto e permanece 
frequentemente no interior da bolsa flagelar, razão pela qual por vezes não é visto 
ao microscópio óptico (o que levou à criação do termo amastigota - sem flagelo). O 
flagelo do T. cruzi apresenta uma estrutura básica semelhante a outros flagelos, 
sendo envolvido por uma membrana flagelar e contendo um axonema típico, que 
apresenta um padrão de nove pares de microtúbulos periféricos e um par central. 
O flagelo encontra-se associado a um corpúsculo basal, estrutura firmemente 
associada ao citoplasma da célula e que se caracteriza por apresentar nove 
“triplets” periféricos de microtúbulos. Esta estrutura encontra-se firmemente 
associada à membrana mitocondrial externa, na zona onde ocorre a condensação 
de DNA e que é conhecida como cinetoplasto. Ao lado do axonema, o flagelo das 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 102 
 
formas epimastigota e tripomastigota apresenta uma estrutura complexa chamada 
de corpo paraxial ou estrutura paraflagelar e uma parte deste encontra-se aderida 
ao corpo celular. O facto de existir esta firme associação faz com que haja certo 
movimento do corpo quando ocorre o batimento flagelar, o que confere a 
impressão da existência de uma membrana ondulante. Um papel importante do 
flagelo do T. cruzi é fazer com que ele se movimente e este movimento é 
fundamental no final do ciclo intracelular, quando as formas tripomastigotas são 
formadas e se movimentam intensamente no citoplasma da célula hospedeira. 
Esta movimentação é aparentemente responsável pelo rompimento da célula já 
alterada e pela libertação de formas tripomastigotas no espaço intercelular, que 
necessitam migrar para interagir com novas células ou atingir a corrente 
sanguínea. 
O T.cruzi, bem como todos os membros da família Tripanosomatidae, apresenta 
uma única mitocôndria que se ramifica por todo o corpo do protozoário. Como em 
todas as células eucarióticas, a mitocôndria dos tripanosomatídeos apresenta um 
DNA mitocondrial. No entanto, além de um DNA que corresponde àquele 
encontrado noutras mitocôndrias, há uma grande quantidade de um DNA que se 
organiza na forma de mini círculos e se concentra numa determinada região da 
mitocôndria, localizada logo abaixo do corpúsculo basal, dando origem a uma 
estrutura intramitocondrial chamada de cinetoplasto. A concentração de DNA 
encontrada num cinetoplasto pode representar cerca de 30% do DNA total da 
célula. Esta estrutura é basofílica, pelo que pode facilmente ser observada ao 
microscópio óptico, em preparações coradas pelo corante de Giemsa. A 
ultraestrutura do cinetoplasto do T. cruzi varia de acordo com o estádio do ciclo 
evolutivo. 
 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 103 
 
4. CICLO DE VIDA 
 
 
Fig 35 – Ciclo de vida de Trypanosoma cruzi 
 
O T. cruzi pode infectar mais de 100 espécies de mamíferos. Na natureza, o 
parasita existe em diferentes populações de hospedeiros vertebrados, tais como 
seres humanos, animais selvagens e domésticos, e invertebrados, como os insetos 
vectores. Apresenta variações morfológicas e funcionais, alternando entre estadios 
que sofrem divisão binária (epimastigotas no tubo digestivo do vector e 
amastigotas nas células de mamíferos) e formas não replicativas e infectantes 
(tripomastigotas metacíclicos nas fezes e urina do vector e tripomastigotas no 
sangue de mamíferos). 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 104 
 
 
Fig 36 – Ciclo de vida de Trypanosoma cruzi segundo o CDC 
 
Durante a fase no hospedeiro invertebrado, o T. cruzi transforma-se em 
epimastigotas e então, no intestino posterior, estes se diferenciam em 
tripomastigotas metacíclicos (metaciclogénese) os quais, eliminados pelas fezes e 
urina do insecto vector, são capazes de infectar o hospedeiro vertebrado. O 
parasita não penetra na pele intacta, só infectando o hospedeiro por via mucosa ou 
através de um ferimento na pele (por exemplo, ao coçar devido à comichão 
resultante da picada). Nos mamíferos, os parasitas desenvolvem-se no interior das 
células, sendo libertados na corrente sanguínea após rompimento destas. Durante 
a alimentação do inseto, as formas tripomastigotas que se encontram no sangue 
do hospedeiro vertebrado infectado, são ingeridas pelo inseto. Alguns dias após, 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 105 
 
os parasitas transformam-se em epimastigotas e esferomastigotas. Uma vez 
estabelecida a infecção no estômago do inseto, as formas epimastigotas dividem-
se repetidamente por divisão binária e podem aderir às membranas das células 
intestinais. Ligam-se em grande número à cutícula retal, diferenciam-se em 
tripomastigotas metacíclicos, podendo assim ambas as formas, diferenciadas ou 
não, ser eliminadas pelas fezes ou urina. 
O ciclo no hospedeiro vertebrado inicia-sequando as formas infectantes 
eliminadas pelo inseto infectado entram em contato com mucosas ou regiões 
lesadas da pele destes hospedeiros. As formas tripomastigotas metacíclicas são 
altamente infectantes, podendo invadir os primeiros tipos celulares que encontram 
(macrófagos, fibroblastos ou células epiteliais, entre outras). Ao invadirem estas 
células ocorre proliferação intracelular e libertação de formas tripomastigotas, 
assim como algumas formas intermediárias e amastigotas (estas últimas em menor 
proporção) no espaço intercelular. Estas formas podem invadir novas células 
localizadas no local da infecção, mas se atingirem a corrente sanguínea, podem 
alcançar todos os tecidos do hospedeiro, onde vão invadir diferentes tipos 
celulares. 
A cinética de todo este processo evolutivo varia com a subespécie do T. cruzi, com 
o animal infectado e com o estabelecimento da infecção no inseto vector. 
No entanto, no sangue apresenta-se sempre como microrganismo unicelular com 
um flagelo (para se deslocar) e corpo alongado e curvo, afilando-se nas 
extremidades. Quando passa do sangue para as células dos tecidos, adopta a 
forma ovóide, cresce e reproduz-se rapidamente, inundando a célula invadida. 
Multiplica-se a ponto de destruir a célula e, rompendo-a, retorna à corrente 
sanguínea, onde reassume a forma alongada e se espalha por todo o organismo, 
invadindo novas células em qualquer parte do corpo, mas de preferência as fibras 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 106 
 
musculares e, muito particularmente, os músculos cardíacos. A partir daqui o ciclo 
repete-se indefinidamente, servindo a forma alongada para locomoção e migração 
do parasita e a forma ovóide para assegurar a sua permanência e reprodução. 
 
5. PATOLOGIA E SINTOMATOLOGIA 
 
O T. cruzi após ser depositado sobre a pele humana, pode ser introduzido no 
organismo por duas vias principais: 
 
 Atravessando a pele, infecta o local da picada e passa para o sangue; 
 Penetrando em qualquer mucosa (boca e olho principalmente). 
 
Se uma pessoa picada por um percevejo infectado, coçar o local da picada e 
depois passar os dedos infectados sobre os olhos, dias depois estará com a 
conjuntiva inflamada e as pálpebras inchadas de tal forma que não vai conseguir 
abri-las. Semanas mais tarde surgirão outros sintomas da infecção, como febre, 
mal-estar, fraqueza, palpitações e cansaço generalizado. Estes são os sintomas 
típicos da doença de Chagas. Nesta altura, diz-se que a doença está na sua forma 
aguda, e tanto pode ser fatal para o paciente, em consequência de uma inflamação 
difusa e intensa a nível cardíaco (miocardite), como também é possível que os 
sintomas regridam espontaneamente. Esta regressão pode durar semanas, meses 
ou até anos sem qualquer outra manifestação, passando esta doença a estar na 
forma crónica. Em geral, passado o período de cura aparente, surgem as 
manifestações da cardiopatia – tensão arterial baixa, taquicardia ou bradicardia, 
tonturas, falta de ar, inchaço nas pernas, podendo então o paciente morrer quer de 
forma repentina, quer lentamente. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 107 
 
 
Fig 37 – A forma aguda da doença de Chagas - A, B: formas metaciclícas do 
Trypanosoma cruzi; C: chagoma cutâneo; D: miocardite aguda chagásica, com presença 
de ninhos de amastigotas do T. cruzi nos cardiomiócitos (hematoxilina e eosina, 100X); E: 
Conjuntiva inflamada. 
 
Normalmente, o período de incubação desta parasitose varia de 5 - 14 dias após a 
transmissão pelo percevejo e 30 - 40 dias para infecções por transfusão 
sanguínea. A descoberta da doença nesta fase inicial é extremamente importante, 
pois os recursos para tratamento disponíveis hoje em dia, podem proporcionar a 
cura total da infecção, especialmente se o medicamento for dado adequada e 
precocemente. Passada esta fase aguda, as manifestações da doença vão 
depender de vários fatores, como a capacidade de defesa do organismo e a 
intensidade agressora do tripanosoma. Quando passa à fase crónica pode afetar 
vários órgãos, sendo o coração e o sistema nervoso os mais críticos. Enquanto a 
infecção se estende, a outros tecidos e a parasitemia aumenta, a resposta imune 
começa a ser montada com a produção de anticorpos e intensa reatividade celular 
no local de inoculação. Caso esta resposta se torne mais intensa e eficaz, o 
número de parasitas circulantes diminui progressivamente até que sejam 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 108 
 
completamente eliminados da circulação, caracterizando o fim da fase aguda da 
doença. Com o fim da fase aguda, os tripanosomas que não foram eliminados pela 
resposta humoral, podem permanecer viáveis no interior das células infectadas. A 
partir daqui começa a fase crónica da doença, que se pode tornar 
oligossintomática ou não revelar manifestações evidentes da doença, a não ser a 
reação serológica. Nas formas sintomáticas mais graves, ocorre dilatação das 
cavidades: cardiopatia crónica, megaesófago e megacólon. 
Os parasitas ao se multiplicarem (no coração, por ex.), ocupam o maior eixo do 
músculo e formam grandes aglomerados, autênticos ninhos. A lesão predominante é 
sobre o miocárdio, mas são atingidos também o pericárdio, o endocárdio e as 
artérias coronárias. Nas fibras musculares, eles alteram a disposição em camadas, 
que é a principal característica das fibras normais. No sistema nervoso originam 
encefalites e mielites. No sistema sanguíneo, provocam uma linfocitose precoce e 
persistente. 
A transmissão desta doença pode ocorrer também durante a gravidez, de mãe para 
filho, ou através de transfusão sanguínea. A gravidez ao provocar depressão 
transitória da imunidade mediada por células, para não haver rejeição do feto, pode 
induzir uma maior susceptibilidade à infecção. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 109 
 
 
 
Fig 38 - Forma crónica cardíaca da doença de Chagas - A: lesão anatómica característica 
da miocardite crónica chagásica (aneurisma da ponta do ventrículo esquerdo do coração); 
B: aspecto microscópico da miocardite crónica chagásica (hematoxilina e eosina, 100X); C: 
sistema de condução do coração. Fibrose e inflamação crónica (Tricrómico de Masson, 
100X); D: traçado eletrocardiográfico mostrando sucessivas paragens sinusais. 
 
Fig 39 – Megacólon: uma das patologias mais drásticas na doença de Chagas 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 110 
 
 
A reativação da doença de Chagas em pacientes imunodeprimidos mostra que o 
parasita está presente na fase crónica da doença, provavelmente na forma latente e 
sob constante vigilância imunológica. Durante a imunodepressão, a ruptura da 
vigilância imunológica causa uma intensa proliferação do parasita e invasão tecidual, 
de forma semelhante ao que ocorre na fase aguda. 
 
Fig 40 – Cardiopatiadevida à infecção com Trypanosoma cruzi 
Vários estudos evidenciam que o T. cruzi, da mesma forma que muitos outros 
agentes infecciosos parasitários, induz alterações no sistema imune do hospedeiro 
que lhe permitem evadir-se dos ataques imunológicos durante e após a entrada nas 
suas células. Ocorre supressão da imunidade mediada por células T e aumento da 
apoptose de linfócitos, o que pode contribuir para a persistência do parasita no 
hospedeiro. O T. cruzi diminui a expressão das moléculas CD3+, CD4+ e CD8+ da 
superfície dos linfócitos. A miocardite crónica chagásica tem predominância de 
células T CD8+ que por outro lado são as células que aumentam na presença de 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 111 
 
antigénios do T. cruzi, enquanto o número de células T CD4+ permanece 
consistentemente baixo. 
 
6. EPIDEMIOLOGIA E DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA 
 
 
Fig. 41 – Áreas de preferência do barbeiro 
O Trypanosoma cruzi é o agente responsável pela tripanosomíase americana, sendo 
por isso encontrado em numerosos países no continente americano. O seu habitat 
varia consoante a espécie, sendo os fatores ambientais determinantes na sua 
distribuição. 
 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 112 
 
 
Fig. 42 – Mapa com a distribuição da Tripanossomíase americana ou doença de Chagas 
(a vermelho) 
 
As formas correntes de transmissão da doença de Chagas humana são as ligadas 
diretamente ao vector, à transfusão de sangue, à via congénita, e mais 
recentemente, as que ocorrem via oral, pela ingestão de alimentos contaminados. 
Os mecanismos menos comuns envolvem acidentes de laboratório, 
manuseamento de animais infectados, transplante de órgãos e pelo leite materno. 
Uma via teoricamente possível, mas extremamente rara, é a transmissão sexual. 
A doença de Chagas passou a constituir um problema de saúde pública, após a 
domiciliação dos vetores, provocada pela desagregação ambiental. Deve ser 
considerado o mecanismo primário de difusão da doença, pois dele dependem as 
outras formas de transmissão. Das várias espécies de insetos vetores, todas da 
subfamília Triatominae, cerca de 12 espécies são as de maior interesse na 
infecção humana, pela sua capacidade de invadirem e procriarem dentro das 
casas. Dentre elas destacam-se, o Triatoma infestans ao sul e o Rhodnius prolixus 
e Triatoma dimidiata, ao norte da linha do Equador. 
Quanto à distribuição epidemiológica dos grupos T. cruzi I e T. cruzi II verifica-se 
que as linhagens do grupo T. cruzi I predominam no ciclo silvestre e as linhagens 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 113 
 
do grupo T. cruzi II predominam no ciclo doméstico da transmissão do parasita. A 
ligação entre os dois ciclos é feita pelos vectores que albergam o T. cruzi II e que 
invadem os domicílios. Em países do norte da América do Sul e na América 
Central e México, a Doença de Chagas é provocada por linhagens do grupo T. 
cruzi I. 
 
 
 
 
 
 
 
Fig 43 – Ciclo silvestre e ciclo doméstico de Trypanossoma cruzi. 
 
Em países do Sul, isolados do grupo T. cruzi II originam diferentes apresentações 
clínicas da doença de Chagas. Desta forma, parece claro que a patogénese da 
Doença de Chagas resulta da inter-relação entre as características genéticas (e, 
portanto, biológicas) dos isolados do parasita e as características imunogenéticas 
do hospedeiro humano. Atualmente, estes marcadores genéticos estão a ser 
ativamente pesquisados, uma vez que têm um valor preditivo para a evolução da 
doença e, consequentemente, serão úteis para a adopção de procedimentos 
terapêuticos no âmbito do Sistema de Saúde. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 114 
 
A possibilidade de infecção pela transfusão de sangue depende de vários fatores, 
como a presença de parasitemia no momento da dádiva, o volume de sangue 
transfundido, o estado imunológico do receptor, a prevalência da infecção pelo T. 
cruzi entre os candidatos a dadores de sangue e da qualidade do sangue 
transfundido. Com exceção do plasma liofilizado e dos derivados sanguíneos 
expostos a procedimentos físico-químicos de esterilização (albumina, 
gamaglobulina), todos os componentes sanguíneos são infectantes. O T. cruzi 
permanece viável a 4°C por 18 dias e até 250 dias, se mantido à temperatura 
ambiente. 
A principal via da transmissão vertical é a transplacentária e pode ocorrer em 
qualquer fase da doença materna (aguda indeterminada ou crónica). A 
transmissão também pode ocorrer em qualquer época da gestação, sendo mais 
provável no último trimestre, ou ocorrer na passagem no canal do parto, pelo 
contato das mucosas do feto com o sangue da mãe infectada. Os fatores 
relacionados com a transmissão congénita da doença de Chagas ainda são pouco 
conhecidos, mas sabe-se que a mãe pode transmitir o parasita numa gestação e 
não transmitir na gestação seguinte. O grau de parasitemia e as características da 
população do parasita nas mães infectadas, fatores placentários, obstétricos, 
imunitários e de nutrição materna podem estar relacionados com esse mecanismo 
de transmissão. 
As formas crónicas da doença, particularmente as formas cardíacas, não dispõem 
de tratamento específico, pelo que se procede à Vigilância Epidemiológica. Os 
objetivos da vigilância epidemiológica da Doença das Chagas são: 
 Detectar todos os casos agudos, para adopção das medidas de 
controlo; 
 
 
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 Realizar inquéritos, para conhecer as áreas onde continua a 
transmissão vectorial; 
 Programa de controlo de vectores domiciliares; 
 Impedir a transmissão por transfusão; 
 Impedir a expansão da doença. 
 
Todos os casos agudos devem ser notificados, visando uma investigação rápida e 
adopção de medidas de controlo. Os inquéritos devem ser realizados nas áreas 
endémicas, para avaliar os resultados da ação vectorial e orientar quanto à 
necessidade ou não de intensificação das ações de controlo dos triatomídeos 
domiciliares. Os triatomídeos têm ampla distribuição geográfica na América, desde 
o sul dos Estados Unidos até ao Chile e Argentina. Das 137 espécies conhecidas, 
a grande maioria é americana. Todas as espécies são potenciais vetores para o T. 
cruzi, mas sete são as de maior importância epidemiológica na América do Sul, 
onde esta doença figura entre as quatro principais endemias: Triatoma infestans, 
T. brasiliensis, T. dimidiata, T. pseudomaculata, T. sordida, Panstrongylus 
megistus e Rhodnius prolixus. 
 
 
Fig 44 – Exemplos de triatomídeos 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 116 
 
 
Fig 45 – Locais preferenciais para os barbeiros 
A doença estava primitivamente limitadaaos pequenos mamíferos das matas e 
campos da América, desde a Patagónia até ao sul dos Estados Unidos. Esses 
animais (tatus, gambas, roedores) conviviam com percevejos silvestres, e através 
de uma intervenção biológica, o T. cruzi circulava entre eles. Com a chegada do 
Homem e os processos de colonização, em muitos locais ocorreram desequilíbrios 
ecológicos (desmatamentos, queimadas) e os percevejos foram desalojados, 
invadindo as habitações rústicas e pobres dos lavradores e colonos. Estas casas, 
com reboco defeituoso e sem forro, servem de habitat para o percevejo, que dorme 
de dia nas ranhuras das paredes e sai à noite para sugar o sangue de que se 
alimenta, defecando ao mesmo tempo e 
ocorrendo então a transmissão do parasita 
através das suas fezes. Deste modo, a 
doença chegou ao Homem e aos mamíferos 
domésticos. Actualmente supõe-se que 
existam 18 milhões de pessoas infectadas 
pelo T. cruzi e que morram cerca de 20000 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 117 
 
por ano. 
Existem já relatados casos de Doença de Chagas tanto a norte como a sul da 
América do Norte. Pensa-se que os imigrantes da América Central e do México 
são a causa da migração da doença para norte 
 
7. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL 
 
O diagnóstico da infeção pelo Trypanosoma cruzi, agente causal da doença de 
Chagas, tem como base três parâmetros: 
 As manifestações clínicas que, se presentes, permitem ao médico 
suspeitar da infecção; 
 Os antecedentes epidemiológicos, que também induzem o clínico à 
suspeita; 
 E os métodos de diagnóstico, em geral laboratoriais, que permitem 
confirmar ou excluir a suspeita diagnóstica na maioria das situações. 
 
Caberá ao clínico, na posse destas informações, decidir se o indivíduo está infetado 
ou não. Na infecção pelo T. cruzi, mais da metade dos infectados não apresenta 
cardiopatia, nem megaesófago ou megacólon, as principais manifestações da 
doença de Chagas. Nestes casos em particular, o diagnóstico é sugerido pelos 
antecedentes epidemiológicos e confirmado ou excluído pelo resultado dos exames 
laboratoriais. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 118 
 
Os primeiros métodos desenvolvidos foram os parasitológicos e, passado quase 
um século, o diagnóstico continua a ser realizado da mesma forma, com a 
pesquisa direta do T. cruzi no sangue periférico. 
Outros testes foram utilizados, tais como a detecção de antígeno circulante, 
antigenúria e testes de hipersensibilidade tardia, porém não foram incorporados na 
rotina e não são utilizados. Inúmeras tentativas de utilização de testes serológicos 
empregando outros métodos (testes de precipitação, de aglutinação de látex, de 
floculação) não frutificaram, ora pela baixa eficiência ora pelos custos elevados. 
Em 1962, Cerisola e colaboradores descreveram a utilização do teste de 
hemaglutinação indireta (HAI) para o diagnóstico serológico desta infecção. Este 
teste, de fácil execução e bom desempenho, é utilizado até hoje, embora 
apresente sensibilidade menor que os testes de imunofluorescência e de ELISA 
(enzyme-linked immunosorbent assay). Por esta razão, não é recomendado para 
exclusão de dadores de sangue. Pouco tempo depois (1966) Camargo aperfeiçoou 
a utilização do teste de imunofluorescência indireta, já descrito por Fife e Muschel. 
Dada a sua elevada sensibilidade, é ideal para estudos epidemiológicos, assim 
como para diagnóstico, embora apresente reações cruzadas, em particular com 
leishmanioses. O mesmo continua a ser usado até hoje, simultaneamente com a 
HAI e a ELISA, constituindo os três os chamados testes convencionais, com os 
quais há grande experiência em todos os países da América Latina. 
Em 1975, Voller e colaboradores descreveram o teste imune enzimático de ELISA 
em amostras de papel-filtro, método que foi aperfeiçoado e que é atualmente 
utilizado na rotina diagnóstica dos serviços de hemoterapia e de diagnóstico. 
De 1976 até ao presente, a biologia molecular aprimorou os métodos existentes e 
desenvolveu outros. Na década de 1990, os estudos dirigiram-se para a 
amplificação de ácidos nucléicos do próprio parasita, para diagnóstico 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 119 
 
parasitológico, pela amplificação por reação da polimerase em cadeia (PCR). Hoje 
em dia, é possível verificar a presença de um parasita em 20 ml de sangue. 
Atualmente, na fase aguda e nas formas crónicas da doença de Chagas o 
diagnóstico etiológico pode ser realizado pela detecção do parasita através de 
métodos parasitológicos (diretos ou indiretos) e pela presença de anticorpos no 
soro, através de testes serológicos. Os mais utilizados são a imunofluorescência 
indireta (IFI), HAI e ELISA. Testes de maiores complexidades como o teste 
molecular, utilizando PCR acoplado à hibridização com sondas moleculares, e o 
Western blot (WB) têm sido utilizados como testes confirmatórios tanto na fase 
aguda como nas formas crónicas da doença. Na fase aguda da doença de Chagas 
o diagnóstico laboratorial é, principalmente, baseado na observação do parasita 
presente no sangue dos indivíduos infectados, através de testes parasitológicos 
diretos como exame de sangue a fresco, esfregaço e gota espessa. O teste direto 
a fresco é mais sensível que o esfregaço corado e deve ser o método de escolha 
para a fase aguda. 
 
Fig. 46 - Formas tripomastigotas sanguíneas do Trypanosoma cruzi em esfregaços 
corados pelo Giemsa. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 120 
 
 
Fig. 47 - Formas epimastigotas de cultura do Trypanosoma cruzi corados pelo Giemsa. 
 
Na fase crónica da doença o diagnóstico parasitológico direto torna-se difícil 
devido à ausência de parasitémia. Assim, o diagnóstico na fase crónica é 
essencialmente serológico e deve ser realizado utilizando dois testes de princípios 
metodológicos diferentes: 
 Um teste de elevada sensibilidade (ELISA com antígeno total ou fracções 
semi-purificadas do parasita ou a IFI); 
 E outro de alta especificidade (ELISA, utilizando antígenos recombinantes 
específicos do T. cruzi). 
 
 
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Fig. 48 - Fluxograma para a realização de testes laboratoriais para a doença de Chagas 
na fase crónica. PCR=Polymerase Chain Reaction; WB=Western Blot. 
 
Desde o início de 2007, o teste para despiste da doença de Chagas é obrigatório 
nos bancos de sangue americanos. 
 
8. TRATAMENTO E RESISTÊNCIA 
 
A recuperação de uma infeção requer a geração de uma resposta imunológica 
eficiente que possa eliminar, ou pelo menos controlar, o patógeno infectante. Os 
componentes clássicos da imunidade inata, como células dendríticas (DC), 
macrófagos e células NK parecem ter um papel crucial na imunidade anti-T. cruzi. 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAULJ S SANTOS – 2017 Página 122 
 
No sistema imune inato, uma classe de receptores de reconhecimento de padrões 
(os PRRs) é expressa nas células apresentadoras de antígenos (APC), 
macrófagos e DC, que reconhecem estruturas denominadas de padrões 
moleculares associados a patógenos (os PAMPs). Entre os diversos PRRs, os 
receptores tipo Toll (TLR) são os melhor estudados. Cada membro dessa família 
reconhece um componente essencial dos diversos microrganismos e, atuando em 
conjunto, esses receptores reconhecem a maioria dos patógenos. Na infeção foi 
demonstrada a diminuição da atividade migratória e do processo de maturação de 
DC, bem como da apresentação antigénica via MHC (complexo principal de 
histocompatibilidade) de classe I. Juntos, estes dados sugerem que esta 
desregulação poderá comprometer a resposta celular, facilitando a permanência 
do parasita em órgãos-alvo da infecção. Além da susceptibilidade genética 
diferencial do hospedeiro, é possível que mecanismos imunológicos envolvidos na 
interação conjunta de células do sistema imune gerem uma patologia altamente 
complexa, dificultando o desenvolvimento de vacinas e imunoterapias eficientes. O 
desenvolvimento de estratégias terapêuticas que visam a regulação da 
funcionalidade celular e da modulação de componentes inflamatórios, associado 
às drogas antiparasitárias, seriam alvos importantes no tratamento da doença de 
Chagas. 
A medicação é dada sob acompanhamento médico nos hospitais, devido aos 
efeitos colaterais que provoca, e deve ser mantida, no mínimo, por um mês. O 
efeito do medicamento costuma ser satisfatório na fase aguda da doença, 
enquanto o parasita está na corrente sanguínea. Na fase crónica, não compensa 
utilizá-lo e o tratamento é direcionado às manifestações da doença a fim de 
controlar os sintomas e evitar as complicações. 
O nifurtimox e o benzonidazol foram introduzidos na clínica nas décadas de 60-70. 
Nenhum destes compostos é ideal por vários fatores: 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 123 
 
o Não são ativos durante a fase crónica da doença e apresentam sérios 
efeitos colaterais; 
o Requerem administração por longos períodos de tempo sob supervisão 
médica; 
o Há grande variação na susceptibilidade de isolados do parasita à ação 
destas drogas; 
o Populações de parasitas resistentes a ambos compostos têm sido 
relatadas; 
o Apresentam elevado custo; 
o E não há formulações pediátricas, apesar das crianças até aos 12 anos 
terem maiores chances de beneficiar com o tratamento, por não 
apresentarem ainda a sintomatologia crónica da doença. 
 
Ambos os compostos têm sido utilizados, nomeadamente no tratamento de 
pacientes agudos e crónicos recentes, nos quais se observam resultados positivos, 
principalmente em crianças ( 15 anos). Calcula-se uma média de cura de cerca 
de 80%, no tratamento de infecções congénitas, transplantes de órgãos de 
dadores infectados e quadros de re-agudização de pacientes imunodeprimidos. 
Apesar da maioria dos estudos revelarem uma baixa eficiência destes fármacos 
durante a terapia de pacientes crónicos, avaliações recentes têm sugerido o 
tratamento de modo a retardar ou mesmo evitar a evolução da doença crónica. 
O conhecimento sobre a síntese de esteróis em fungos levou à possibilidade de 
interferência nesta via, culminando com o desenvolvimento de uma gama de 
drogas para o tratamento de micoses superficiais e sistémicas. O T. cruzi, à 
semelhança dos fungos, sintetiza ergosterol, e não colesterol, e assim, neste 
parasita, etapas da biossíntese de esteróis que são divergentes em relação à 
síntese realizada por células de mamíferos têm sido intensamente estudadas como 
 
 
 PARASITOLOGIA CLÍNICA – MEDICINA - UNIT – SAUL J S SANTOS – 2017 Página 124 
 
alvo quimioterápico. A lovastatina em combinação com cetoconazol ou a alilamina 
terbinafina mostraram-se ativas in vitro e in vivo sobre o parasita. Também drogas 
que contêm nitrogénio (bifosfonatos) e que bloqueiam a síntese de esteróis se têm 
mostrado eficazes, como pamidronato e risedronato. Novos azóis têm também sido 
estudados, alguns dos quais com bons resultados, como albaconazol (sobre 
amastigotas intracelulares e epimastigotas) e posaconazol (sobre epimastigotas, 
inibindo a síntese de ergosterol). Este último age em sinergia com a amiodarona 
(composto antiarrítmico frequentemente prescrito para o tratamento da Doença de 
Chagas sintomática). As diaminas têm sido estudadas, por se complexarem com o 
DNA, levando à inibição seletiva de enzimas e/ou à inibição direta da transcrição. 
No entanto, apenas alopurinol, itraconazol, fluconazol e posoconazol foram 
submetidos a ensaios clínicos desde a introdução do nifurtimox e do benzonidazol. 
Este facto deve-se, em muitos casos, à inexistência de indicação forte do efeito 
curativo, ao potencial efeito tóxico e/ou teratogénico (em geral somente analisado 
em modelos in vitro), realçando a necessidade do desenvolvimento de modelos 
experimentais mais adequados, bem como a padronização de protocolos de 
ensaio in vitro. Se tal não se verificar, continuar-se-á a dispender muito esforço em 
estudos experimentais sem se chegar a uma droga que possa ser posteriormente 
submetida a ensaios clínicos. Com o conhecimento acumulado sobre a biologia e 
a bioquímica de T. cruzi, é urgente a agregação e convergência de esforços 
dirigidos à compreensão do mecanismo de ação de potenciais compostos contra 
este parasita. Outra linha atualmente em desenvolvimento diz respeito à 
elaboração de diferentes formulações de drogas que possam ser direcionadas 
para sítios adequados. 
 
 
 
 
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9. CONTROLO E PREVENÇÃO 
 
Apesar de muitas pesquisas e de grandes progressos alcançados no estudo da 
doença de Chagas, o seu tratamento apresenta, ainda hoje, muitos problemas. 
Novos medicamentos estão a ser investigados, mas as lesões do coração e outros 
órgãos, que já estiverem presentes, são irreversíveis e não serão curadas com a 
eliminação do parasita. Não existindo vacina contra esta doença, a melhor forma 
de enfrentá-la é através da prevenção e controlo. 
Devido ao ciclo de transmissão, as medidas de controlo são dirigidas ao combate 
do vector e ao controlo de qualidade do sangue transfundido. 
 Controlo da transmissão vectorial: 
 Melhoria das habitações; 
 Controlo químico: utilização de inseticidas nas habitações infestadas. Se a 
espécie é estritamente domiciliária, o objetivo é a sua eliminação, como é o 
caso do T. infestans. No caso do Panstrongylus megistus, T. brasiliensis, T. 
pseudomaculata e T. sordida, o controlo pretendido é a manutenção dos 
intradomicílios livres de colónias, visto que a existência de focos silvestres 
possibilita a reinfestação das habitações; 
 
 
 
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Fig. 49 - Controlo químico: utilização de inseticidas nas habitações infestadas 
 
 Controlo biológico: o uso de inibidores do crescimento, feromonas, 
microrganismos patogénicos e esterilização induzida estão em estudo, masa utilização sistemática destes métodos não é aplicável na prática. 
 
O controlo da transmissão por transfusão consiste na fiscalização das unidades de 
hemoterapia, fazendo o controlo de qualidade do sangue. Portadores do parasita, 
mesmo que assintomáticos, não podem doar sangue. O controlo da transmissão 
em laboratório deve ser feito através de rigoroso uso das normas de 
biossegurança. A transmissão pelo leite materno, apesar de descrita, não tem 
significado epidemiológico. Não existe prevenção da forma congénita. 
 
10. PANORAMA GERAL DA DOENÇA NO BRASIL (2013) 
 
No Brasil, atualmente predominam os casos crônicos de doença de Chagas 
decorrentes de infecções adquiridas no passado. No entanto, nos últimos anos, a 
 
 
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ocorrência de doença de Chagas aguda (DCA) tem sido observada nos estados da 
Amazônia Legal, com ocorrência de casos isolados em outros estados. 
 
No passado, a área endêmica, ou seja, com risco de transmissão da doença de 
Chagas pela presença de vetores infectados, conhecida no final dos anos 70, 
incluía 18 estados e mais de 2,2 mil municípios, nos quais se comprovou a 
presença de triatomíneos e destes 711 com presença do Triatoma infestans, 
principal vetor estritamente domiciliar no Brasil. Ações sistematizadas de controle 
químico foram instituídas a partir de 1975 mantidas em caráter regular, e desde 
então levaram a uma expressiva redução da presença de T. infestans e, 
simultaneamente, da sua transmissão às pessoas. Em reconhecimento, o Brasil 
recebeu em 2006 a certificação internacional de interrupção da transmissão da 
doença pelo T. infestans, concedida pela Organização Panamericana da Saúde e 
Organização Mundial da Saúde. Com o sucesso do controle do mecanismo 
majoritário de transmissão os mecanismos minoritários passaram a ter importância 
em saúde pública. 
 
Hoje, o perfil epidemiológico da doença apresenta um novo cenário com a 
ocorrência de casos e surtos na Amazônia Legal por transmissão oral e vetorial 
(sem colonização e extradomiciliar). Com isso, evidenciam-se duas áreas 
geográficas onde os padrões de transmissão são diferenciados: a) a região 
originalmente de risco para a transmissão vetorial, onde ações de vigilância 
epidemiológica, entomológica e ambiental devem ser concentradas, com vistas à 
manutenção e sustentabilidade da interrupção da transmissão da doença pelo T. 
infestans e por outros vetores passíveis de domiciliação; b) a região da Amazônia 
Legal, onde a doença de Chagas não era reconhecida como problema de saúde 
pública, as ações de vigilância devem ser estruturadas e executadas de forma 
extensiva e regular na região por meio de: detecção de casos febris, apoiada na 
 
 
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vigilância da malária; identificação e mapeamento de marcadores ambientais, a 
partir do reconhecimento das áreas preferenciais das diferentes espécies de 
vetores prevalentes e na investigação de situações em que há evidências ou 
suspeita de domiciliação de alguns vetores. 
 
Surtos de doença de Chagas aguda relacionados à ingestão de alimentos 
contaminados (caldo de cana, açaí, bacaba, entre outros) e casos isolados por 
transmissão vetorial extradomiciliar vem ocorrendo especialmente na Amazônia 
Legal. No período de 2000 a 2011 foram registrados mais de mil e duzentos casos, 
70% por transmissão oral, 7% por transmissão vetorial e 22% sem identificação do 
modo de transmissão. 
 
A alteração do quadro epidemiológico da doença de Chagas no Brasil promoveu a 
mudança nas ações e estratégias de vigilância, prevenção e controle, por meio da 
adoção de um novo modelo de vigilância epidemiológica, de acordo com os 
padrões de transmissão da área geográfica: 
 
1. Regiões originalmente de risco para a transmissão vetorial (AL, BA, CE, DF, 
GO, MA, MG, MS, MT, PB, PE, PI, PR, RN, RS, SE, SP, TO): vigilância 
epidemiológica visa detectar a presença e prevenir a formação de colônias 
domiciliares do vetor; atenção integral aos portadores crônicos da infecção. 
2. Amazônia Legal (AC, AM, AP, RO, RR, PA, parte do TO, MA e do MT): 
vigilância centrada na detecção precoce de casos agudos e surtos e apoiada na 
Vigilância Epidemiológica da Malária, pela capacitação de microscopistas para 
identificação de T. cruzi nas lâminas para diagnóstico da malária e nas ações 
preventivas da vigilância sanitária sobre as cadeias produtivas de alimentos. 
 
 
 
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Fig. 50 – A Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), através do Programa de Melhoria 
Habitacional para o Controle da Doença de Chagas (MHCDCh) considerou os municípios 
classificados (a vermelho) como sendo de Alto Risco para a transmissão da doença por 
isso prioritários para a construção de novas habitações. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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2.1.5. TRYPANOSOMA BRUCEI 
DOENÇA DO SONO 
 
 
Fig 51 – Tripanossomas á volta de eritrócitos (micrografia electrónica) 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
A Tripanosomíase Africana Humana (HAT) também conhecida por doença do sono 
é uma doença causada por um grupo de parasitas designado por tripanossomas. 
Existem 2 subespécies de Trypanossoma brucei, o protozoário causador da HAT: 
T. brucei gambiense e o T. brucei rhodesiense. Enquanto a infecção causada tanto 
pelo T. b. gambiense e T. b. rhodesiense têm como resultado final a HAT, as 
manifestações clínicas da infecção, o tratamento, a distribuição geográfica do 
parasita, a epidemiologia, a transmissão e as opções de controlo diferem 
significativamente. Assim, cada forma de HAT é de facto uma doença diferente. 
 
 
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O aumento exponencial da prevalência de Tripanosomíase Africana Humana no 
inicio do século XX é um dos melhores exemplos de uma infecção emergente. 
Registos de comerciantes árabes sugerem que a doença do sono existiu durante 
centenas de anos em focos limitados e discretos no lago Chad e na base do 
Congo, contudo com o inicio da era colonial nos primeiros anos de 1800, a 
distribuição geográfica da HAT difundiu-se até à região subsariana. 
 
A HAT é a única doença parasitária transmitida por vector cuja distribuição 
geográfica está confinada ao continente africano. Registaram-se três epidemias 
graves: uma no fim do Século XIX, a segunda nos anos 1920 e a terceira desde os 
anos 70 até ao presente. 
 
A doença evolui-se em duas fases, às quais se segue um período assintomático de 
várias semanas ou meses. A fase inicial caracteriza-se normalmente por sintomas 
idênticos aos do paludismo, incluindo, fadiga, dor de cabeça, febre recorrente e 
inchaço dos nódulos linfáticos. Nas fases avançadas, a doença afecta o sistema 
nervoso central, causando graves perturbações neurológicas e mentais e deixandoos pacientes na dependência de outrem. Os indivíduos infectados ficam 
debilitados, às vezes por muitos anos, o que causa perdas económicas, pobreza e 
miséria social. Quando não tratada, a Tripanosomíase Humana Africana é 
absolutamente fatal. Nos dias de hoje a Tripanosomíase Africana Humana é 
considerada uma das doenças mais negligenciadas, em termos do 
desenvolvimento de fármacos e continua a infectar África. 
 
Dada a re-emergência da tripanosomíase, tanto humana como animal, o seu 
potencial epidémico, a taxa elevada de mortalidade e o seu impacto negativo no 
 
 
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desenvolvimento sócio-económico de muitos países a tripanosomíase representa 
um grave problema de saúde pública na região africana. 
 
HAT tem maior impacto sobre a saúde e desenvolvimento num largo número de 
pessoas marginalizadas, e coincide com as populações mais pobres do planeta. 
 
 
 
 
Fig 52 - A infecção contribui mais para a pobreza através dos seu efeitos no gado do que 
em humanos. Nos animais, a tripanossomíase africana causa perdas económicas na 
ordem dos 4,5 biliões de dólares todos os anos. A presença da mosca de tsetse limita 
efectivamente a produção de carne em vastas regiões, contribuindo para o aumento da 
pobreza. 
 
 
2.TAXONOMIA E BIOLOGIA 
 
O T. brucei pertence ao género Trypanosoma na família dos Trypanosomatidae, 
um amplo grupo de parasitas protozoários unicelulares. Com base no seu modo de 
transmissão, dois sistematas, Hoare e Losos concordaram na divisão do género 
 
 
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Trypanosoma em duas secções: “Salivaria” e “Stercoraria”. Os tripanosomas da 
secção Salivaria são aqueles transmitidos através das glândulas salivares 
(inoculativa), e os Stercoraria aqueles que são transmitidos por meio das fezes dos 
insectos vectores (contaminativa). O T. brucei pertence à secção “Salivaria”. 
 
 
 
Fig 53 - Representação esquemática da filogenia do Tripanosoma brucei (adaptado 
de www.biomedcentral.com) 
 
As formas tripomastigotas encontradas na corrente sanguínea são basicamente 
lancetadas, o corpo é alongado e achatado. Ao corte transversal apresenta-se 
elíptico ou oval e as suas extremidades são afiladas. 
 
 
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Fig 54 – Formas que o trypanossoma pode assumir 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fig 55 – Estrutura de Trypanossoma brucei 
 
A extremidade pela qual o parasita avança durante a locomoção é normalmente 
descrita como anterior final. Ela termina tipicamente num fino ponto, enquanto o 
final da extremidade posterior varia na forma, mas geralmente é mais larga, 
afilando mais abruptamente ou terminando numa forma rombuda. As dimensões 
 
 
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do corpo variam entre 20 a 30 e 1.5 a 3.5 µm de largura, com um flagelo único. O 
flagelo emerge da terminação posterior, desenvolvendo-se ao longo da membrana 
celular, a qual está ligada por uma membrana ondulante e estende-se para além 
da parte anterior da célula. A base do flagelo está associada ao cinetoplasto, uma 
grande vesícula contendo o DNA da única mitocôndria. O tripomastigote é a única 
forma observada no mamífero hospedeiro, enquanto a forma epimastigote ocorre 
durante o seu desenvolvimento da mosca tsetse. Durante o seu ciclo de vida, as 
células T. brucei multiplicam-se por fissão binária e é considerado um organismo 
exclusivamente extracelular. 
 
3.DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA 
 
A mosca de tsetse vive na vegetação da savana e das florestas da África 
equatorial. Assim a doença do sono encontra-se limitada a uma região 
perfeitamente definida. As taxas de tripanosomiase africana são superiores nas 
regiões da África central, onde existe a coexistência da mosca e humanos. O tipo 
específico de T. brucei que infecta os hospedeiros mosca de tsetse/humanos varia 
entre as regiões: T. b. rhodesiense que se encontra, sobretudo na África oriental 
(Botswana, Etiópia, Quénia, Malawi, Tanzânia, Uganda, Zaire e Zimbabwe), 
enquanto que T. b. gambiense encontra-se nas áreas da África ocidental e central. 
 
O Trypanosoma brucei gambiense encontra-se na África central e ocidental, 
causando uma infecção crónica - uma pessoa pode-se encontrar infectada durante 
meses, e ate mesmo anos sem se desenvolverem sintomas - a qual emerge 
apenas quando a doença atinge a fase final. O T. b. rhodesiense, encontra-se na 
África austral, causa uma infecção aguda que emerge em poucas semanas, é mais 
virulenta do que o T. b. gambiense. Os animais domésticos e selvagens são 
 
 
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conhecidos como os maiores reservatórios do T. b. rhodesiense, mas o seu papel 
ainda não é claro. 
 
 
Fig. 56 - Endemicidade da tripanossomíase humana africana na região Africana 
(www.med.nyu.edu) 
 
 
4.CICLO DE VIDA 
 
O Trypanosoma brucei possui um ciclo de vida complexo que envolve o 
desenvolvimento no hospedeiro mamífero e a transmissão através de um vector, a 
mosca tsetse. T.brucei desenvolveu diversos mecanismos que permitem a sua 
sobrevivência nestes diferentes ambientes. 
 
 
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A forma tripomastigote do T. brucei multiplica-se no intestino médio do insecto, 
onde ao fim dos 10 dias os tripomastigotes começam a migrar até às glândulas 
salivares, onde se converte na forma epimastigote e se ligam às células do lúmen 
reproduzindo-se assexualmente. Transforma-se depois em tripomastigote 
metaciclico, esta é a única fase no vector que é patogénica para o vertebrado. Ao 
se alimentar, o inseto inocula a forma metacíclica transferindo milhares de 
parasitas. 
 
Fig. 57 - Representação esquemática do ciclo de vida do T. brucei em humanos e na 
mosca tsetse. (adaptado de Alexander e Melanie Moser, Centers for Disease Control 
Public Health Image Library). 
 
A Infecção do mamífero hospedeiro começa com a mordedura da mosca tsetse 
(Glossina spp.), a qual injeta a forma tripomastigote metaciclica do parasita 
presente na saliva antes da sua refeição de sangue. 
 
 
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Fig 58 – Mosca tsé-tsé (Glossina morsitans), em micrografia electrónica (á esquerda) e 
em tamanho normal (á direita). 
 
Os tripanossomas multiplicam-se localmente no local da mordedura alguns dias 
antes de entrar no sistema linfático e na corrente sanguínea. Através do qual 
atingem outros tecidos e órgãos incluindo o sistemanervo central (CNS). 
 
 
Fig 59 – Ciclo de vida na mosca tsé-tsé 
 
 
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Duas diferentes formas de tripomastigote podem ser observadas no mamífero: 
uma longa e fina, a forma proliferativa, e uma forma curta e não proliferativa. 
Ambas existem na mosca tsetse, mas só a última tem a capacidade de um ciclo de 
vida complexo que dura 2 a 3 semanas na mosca. 
 
Um pequeno número de T. brucei existe também na forma não proliferativa em 
humanos, durante esta forma, o parasita pode ser transmitido ao vector 
perpetuando o ciclo entre vector e o homem. 
 
 
 
Fig. 60 - Ciclo de vida do Tripanossoma brucei segundo (El-Sayed NM.) 
 
 
 
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A presença de flagelo longo e fino na forma do T. brucei é essencial para a 
viabilidade do parasita na corrente sanguínea do homem. 
 
No hospedeiro, a célula tripomastigote é completamente coberta por uma densa 
monocamada de glicoproteinas idênticas que protegem o parasita contra a lise 
pelo complemento. O parasita só é destruído quando é reconhecido pelos 
anticorpos. Graças a um impressionante mecanismo de variação antigénica 
contínua, a qual foi estudada extensivamente em modelos animais, a pequena 
fracção da população de parasitas é capaz de invadir a resposta imunitária 
humoral do mamífero e proliferar ate que a nova superfície antigénica seja 
reconhecida por uma nova geração de anticorpos específicos, principalmente IgM. 
 
 
Fig. 61 – Gráfico representando a variação antigénica em Trypanosoma brucei. 
 
 
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Cerca de 1,000 genes diferentes codificam a variação das glicoproteinas de 
superfície no genoma do T. brucei. Este fenómeno explica o número flutuante de 
tripanosomas em circulação do sangue dos pacientes, a qual contribui para os 
limitados métodos na detecção do parasita na prática clínica. 
 
5.PATOLOGIA 
 
O T. brucei invade o sistema imunitário através de um complexo sistema de 
variação antigénica geneticamente programado. Quando um parasita atravessa a 
barreira epitelial através da mordedura de uma mosca tsetse infectada, a resposta 
do sistema imunitário inato ao invasor é a inflamação e a dor. Contudo, quando os 
mecanismos inatos, não específicos não são suficientes para eliminar o patogénico 
(o que é frequente nos humanos), o parasita desenvolve-se e multiplica-se na 
corrente sanguínea, enquanto a resposta imune adaptativa primária é montada. 
 
 
 
Fig. 62 – Trypanossoma brucei rodeado de eritrócitos e células do sistema imunitário. 
 
 
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 A resposta adaptativa é evidenciada pelo aparecimento de rubor e prurido no local 
da infecção 1 a 2 semanas depois da picada da mosca. As glicoproteinas de 
superfície variáveis ou VSGs do parasita são reconhecidos como antigénios “não 
self” por receptores específicos. Geralmente, ocorre uma resposta por anticorpos 
mediada por células B altamente específicas contra os epitopes dos VSG. 
A resposta imune adaptativa pode eventualmente destruir todos os clones do 
parasita original. Contudo, alguns parasitas alteram espontaneamente as VSG, 
alterando o gene VSG que é expresso. Este processo é conhecido como 
conversão de genes. Existem 806 genes diferentes que codificam VSGs. Cada 
gene VSG codifica VSGs estruturalmente muito semelhantes, mas únicos. De tal 
forma que os VSGs são suficientemente distintos para que o sistema imunitário o 
reconheça como um novo patogénico, uma nova resposta imune adaptativa 
primaria tem de ser gerada para eliminar os parasitas com novos VSGs. O tempo 
necessário para que esta nova resposta seja montada permite que o parasita se 
divida, multiplique, e altere os VSG de superfície novamente. Assim, apesar de 
teoricamente o sistema imunitário humano poder eliminar todos T. brucei, as 
alterações espontâneas que envolvem a expressão de VSG permitem que o 
parasita esteja sempre um passo à frente do sistema imunitário. O progresso da 
doença através destes ciclos conduz a uma inflamação crónica, febre e construção 
de imuno-complexos. Alem disso, danos graves, e muitas vezes irreversíveis 
neurológicos ocorrem quando o parasita atinge zonas internas e menos protegidas 
do corpo, como o cérebro. A fadiga é o resultado provável de o corpo mobilizar 
tantos recursos para combater uma infecção constante e interminável. 
 
 
 
 
 
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6.SINTOMATOLOGIA 
 
A apresentação clínica do T. b. gambiense e T. b. rhodesiense no HAT são 
notavelmente diferentes. 
 
Fig. 63 – A – Úlcera típica formada no local de mordedura da mosca tsé-tsé – B – 
Trypanossoma deslocando-se por entre eritrócitos. 
 
Enquanto HAT originada por T. b. gambiense é geralmente uma doença crónica 
que se prolonga durante anos, a HAT por T. b. rhodesiense apresenta-se 
habitualmente como uma doença febril aguda, fatal em semanas ou meses se não 
for tratada. 
 
Doenças como a malária, febre entérica, meningite tuberculosa e infecção HIV 
podem imitar ou até coexistir com a HAT. Assim, as suspeitas têm de ser sempre 
confirmadas laboratorialmente. 
 
 
 
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Fig. 64 - Os parasitas proliferam no local da mordedura e 5 a 15 dias depois, 
ocasionalmente forma-se um nódulo ou ulcera que desaparece espontaneamente 
nalgumas semanas. Nos pacientes africanos a úlcera geralmente encontra-se ausente 
durante o diagnóstico da doença. Isto contrasta com a elevada prevalência de úlcera 
observada em pacientes europeus, em particular naqueles infectados pelo T. b. 
rhodesiense. 
 
Doença originada pelo T. b. gambiense 
 
Após um longo e variável período assintomático, os pacientes com HAT T. b. 
gambiense podem apresentar sintomas intermitentes não específicos tais como 
febre, fadiga, enxaquecas, artralgia e prurido. Pode ocorrer edema, onde se 
formam grandes nódulos linfáticos indolores no triângulo cervical posterior. No 
entanto, o aumento dos nódulos linfáticos cervicais está ausente em mais de 50% 
dos pacientes. 
 
 
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Fig. 65 – Estes nódulos, de Witerbottom, foram reconhecidos como um sinal de alerta da 
HAT pela primeira vez por Sir Thomas Winterbottom, que utilizava a palpação do pescoço 
como indicador de sonolência e comportamentoanormal em escravos indesejáveis no 
século XVII. 
 
Esplenomegalia é outro sinal não específico e mais comum do que hepatomegalia. 
Este quadro clínico corresponde à primeira fase da doença, a fase hemolinfatica. 
 
Na fase secundária da doença ocorrem sinais e sintomas neuropsiquiatricos, 
devido à invasão do CNS pelos tripanosomas e resultantes da resposta imunitária. 
Gradualmente estes sinais tornam-se mais promitentes. O intervalo entre o inicio 
da infecção e o segundo estado neuronal é da ordem de meses ou anos. 
 
Os sintomas clínicos da neuropatogenese do segundo estado da HAT podem ser 
agrupados em categorias, tais como psiquiátrica, motor, sensorial e anomalias no 
sono. Os distúrbios mentais podem incluir irritabilidade, enxaqueca, alterações de 
 
 
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personalidade e outras apresentações psiquiátricas, tais como psicose. Rigidez e 
tremores, disarteria e ataxia são desordens comuns. Pode-se também registar um 
aumento da sensação da dor (sinal de Kerandel). 
 
 
 
 
 
Fig. 66 – Segundo as autoridades do seu país, este doente com HAT está amarrado para 
ser protegido dos seus ataques de origem neurológica. 
 
 
É típica uma alteração do ciclo do sono, com sonolência de dia e insónias 
noturnas. É também queixas frequentes a perda de peso e anomalias endócrinas, 
tais como amenoreia e impotência. Se não forem tratados os pacientes morrem 
devido a consequências de disfunções do sistema imunitário, coma profundo, e 
tonturas causado por infecções bacterianas como pneumonia ou meningite. 
 
 
 
 
 
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HAT causada pelo T. b. rhodesiense 
 
A HAT causada pela infecção do T. b. rhodesiense manifesta-se como uma 
doença febril aguda (por vezes fulminante). Tem inicio 1 a 3 semanas após a 
mordedura infecciosa, não pode ser clinicamente diferenciada de outras febres 
tropicais como a malária, febre entérica e meningite bacteriana. Comparada com a 
infecção causada pelo T. b. gambiense, os episódios febris são mais pronunciados 
e frequentes, generalizando-se uma linfoadenopatia. Já foi observado conjuntivite 
e queratite. Há uma menor demarcação entre o primeiro e o segundo estado da 
doença, e o envolvimento do CNS pode ser limitado clinicamente a tonturas e 
tremores. 
 
 
 
Fig. 67 – Doente em estado avançado com HAT 
 
 
 
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Figura 68 - Relação entre a conversão 
de genes das VSG do T. brucei e os 
ciclos crónicos de infecção. 
Pancardite com ataque cardíaco congestivo, arritmia, e efusão pericardial podem 
matar o doente antes do envolvimento pronunciado do CNS se tornar evidente. A 
maioria das mortes (80%) ocorre durante os primeiros 6 meses da doença. Os 
sintomas da fase hemolinfática incluem: nódulo inflamado, de cor vermelha e 
doloroso no lugar da picada da mosca, gânglios linfáticos inflamados em todo o 
corpo: os nódulos linfáticos inflamados e congestionados no tronco e pernas. Estes 
nódulos são conhecidos como sinal de Winterbotom. Quando o tripomastigote se 
está a reproduzir, ocasiona febre alta, dor de cabeça, febre e transpiração. 
 
7.IMUNOPATOLOGIA 
A resposta local na pele corresponde à primeira 
protecção desenvolvida pelo hospedeiro. Após a 
inoculação do T. brucei no hospedeiro mamífero, 
pela mosca tsetse, é induzida uma reacção local 
na pele causada pela proliferação do parasita. 
Os tripanosomas são detectados na linfa 1 a 2 
dias antes após o aparecimento da úlcera. O 
seu número declina depois durante o 
desenvolvimento da úlcera (6 dias) e torna a 
aumentar posteriormente. 
A superfície dos parasitas T. brucei é coberta 
por uma fina camada de glicoproteinas 
designadas por glicoproteinas de superfície 
variáveis (VSGs), tratam-se de heteropolimeros 
de polisacarideos ligados a proteínas ancorados 
à membrana plasmática. Usualmente, num 
determinado momento é apenas expressa uma 
 
 
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VSG específica na superfície do parasita. As VSGs evitam que o hospedeiro possa 
atingir directamente a membrana plasmática do parasita e providencia um meio 
para variação antigénica. 
Durante o primeiro estado da doença, os tripanosomas expressam antigénios 
variáveis, os quais são alterados alguns dias depois. Uma resposta por anticorpos 
específicos a estas VSGs acontece primeiro na linfa e posteriormente no plasma . 
 
Fig. 69 - Representação esquemática das VSGs ancoradas às proteínas da membrana 
plasmática. 
 
Reações mediadas pelo Complemento 
 
A ativação do complemento na HAT ocorre pelas duas vias. A via alternativa, 
independente de anticorpos específicos, que induz a lise dos tripanosomas. O soro 
só induz a lise dos parasitas em tripanosomas que não se encontrem revestidos 
por VSG, isto é durante a forma prociclica. Contudo, o aparecimento de VSG no 
parasita evita a sua destruição. 
 
A via clássica, mediada por anticorpos específicos contra os tripanosomas, pode 
estar envolvida na clearance do parasita através de anticorpos que medeiam a lise 
e/ou por opsonisaçao, nos estágios em que o T.b. brucei se encontra revestido por 
 
 
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VSG. Contudo durante a activação do complementa, o aparecimento de 
fragmentos solúveis, incluindo anafilatoxinas C3a e C5a e o complexo C567, pode 
induzir, por um lado a quimiotaxis de neutrofilos e monocitos, e por outro lado a 
libertação de aminas envolvidas na vasoconstrição e aumento da permeabilidade 
vascular, participando assim na resposta inflamatória inicial da úlcera. 
 
Reações mediadas por células T 
 
Estudos iniciais demonstraram alterações nas funções das células T na 
tripanosomiase. Exames histológicos revelaram uma expansão massiva das 
células B nos nódulos linfáticos e baço. Estas alterações ocorrem durante os 
primeiros 7 dias depois da infecção e persistem durante os 70 dias seguintes. 
 
Em diversos estudos, verificou-se uma resposta de células T transitiva e 
proliferativa provocada pelos antigénios tripanosomais durante os primeiros dias da 
infecção. As proteínas cinetoplastidas da membrana dos tripanosomas são um 
potente estimulador da proliferação dos linfocitos T. 
 
Assim, apesar das células T especificas não atuarem da mesma forma que as 
células T citotoxicas, elas alteram as respostas imunes, especialmente pela 
secreção de citoquinas. Actuam alterando as funções das células B (síntese de 
anticorpos, alteração de isótipos) e macrofagos (apresentação dos antigénios e 
mecanismos efectores). 
 
Células B 
 
Na tripanosomiase Africana, a principal alteração a nível do sistema imunitário é o 
aumento dramático dos níveis de imunoglobulinas (especialmente IgM), incluindo

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