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Águas- dominialidade e implicações imobiliárias

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ÁGUAS: DOMINIALIDADE E IMPLICAÇÕES IMOBILIÁRIAS
Revista de Direito Imobiliário | vol. 67 | p. 83 | Jul / 2009
Doutrinas Essenciais de Direito Ambiental | vol. 2 | p. 303 | Mar / 2011
DTR\2009\769
Leonardo Brandelli
Mestre em Direito Civil pela UFRGS. Doutorando em Direito pela UFRGS. Professor de Direito Civil.
Oficial de Registro de Imóveis
Silvia Helena Serra
Doutora em Direito do Estado pela USP. Professora de Direito Administrativo da PUC-Camp.
Advogada.
Área do Direito: Civil; Administrativo; Imobiliário e Registral
Resumo: O presente artigo pretende analisar a questão da dominialidade das águas no direito
brasileiro, com vistas à aplicação no direito imobiliário, em especial, no direito registral imobiliário.
Desde a Constituição de 1988 houve uma profunda alteração?no regime jurídico dominial das águas,
o que reclama uma releitura de tal instituto. Diante desse novo quadro constitucional, mister se faz
analisar como deve responder o direito registral imobiliário. Qual o tratamento que deve ser dado aos
imóveis cortados por cursos d?água, ou que tenham águas em seu interior? Qual o tratamento
registral das águas? Estas e outras questões é o que pretende analisar o presente artigo.
Palavras-chave: Águas - Retificação de registro - Propriedade das águas
Resumen: Este artículo se propone examinar la cuestión de la competencia por el agua en la
legislación brasileña, con el fin de aplicar en derecho inmobiliario, en particular la finca registral
derecho. Desde la Constitución de 1988 fue un cambio profundo en el régimen jurídico de la
propiedad del agua, que exige una relectura de este instituto. En este nuevo marco constitucional, se
hace necesario analizar cómo la ley debe responder el direito registral. ¿Qué tratamiento debe darse
a las propiedades de corte por los cursos de agua, o agua en su interior? ¿Cuál es el tratamiento de
las aguas registral? Estas y otras preguntas es lo que desea revisar el presente artículo.
Palabras claves: Agua - Rectificación de registro - Propiedad de agua
Sumário:
1.Dominialidade das águas - 2.Águas em imóveis e suas implicações no direito imobiliário
1. Dominialidade das águas
Antes do advento da Constituição Federal de 1988 e da Lei Federal 9.433/1997, o documento legal
que regulava de forma mais completa as águas era o Código de Águas - Dec. Federal 24.643, de
10.07.1934 -, que já se encontrava em vigor quando da promulgação da Constituição de 1934, em
16.07.1934.
O Código de Águas dispôs sobre as águas públicas, águas comuns e águas privadas. As águas
públicas foram divididas em águas de uso comum e dominicais. 1
Segundo o Código de Águas, são públicos de uso comum os mares territoriais; as correntes, canais,
lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis (excluídos os lagos ou lagoas situadas em um só prédio
particular e por ele exclusivamente cercado, quando não sejam alimentados por alguma corrente de
uso comum); 2as correntes de que se façam estas águas; as fontes e reservatórios públicos; as
nascentes quando forem de tal modo consideráveis que, por si sós, constituam o caput fluminis; e os
braços de quaisquer correntes públicas, desde que os mesmos influam na navegabilidade ou
flutuabilidade. 3
Estabeleceu o Código de Águas que as águas públicas de uso comum, bem como o seu álveo,
pertencem:
"I - À União:
a) quando marítimas;
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b) quando situadas no Território do Acre, ou em qualquer outro território que a União venha a
adquirir, enquanto o mesmo não se constituir em Estado, ou for incorporado a algum Estado;
c) quando servem de limites da República com as nações vizinhas ou se estendam a território
estrangeiro;
d) quando situadas na zona de 100 quilômetros contígua aos limites da República com estas nações;
e) quando sirvam de limites entre dois ou mais Estados;
f) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais Estados.
II - Aos Estados:
a) quando sirvam de limites a dois ou mais Municípios;
b) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais Municípios.
III - Aos Municípios:
a) quando, exclusivamente, situados em seus territórios, respeitadas as restrições que possam ser
impostas pela legislação dos Estados".
Segundo o art. 6.º do Código de Águas, as águas públicas dominicais eram todas as águas situadas
em terrenos que também o sejam, quando elas não forem do domínio público de uso comum, ou não
forem comuns.
Como particulares, o Código de Águas estabeleceu que seriam as nascentes e todas as águas
situadas em terrenos que também o sejam, quando elas não estiverem classificadas entre as águas
comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns. 4As nascentes, conforme o Código de
Águas, são as águas que surgem naturalmente ou por indústria humana, e correm dentro de um só
prédio particular ou, ainda que o transponham, quando elas não tenham sido abandonadas pelo
proprietário deste. 5E, por fim, as águas comuns correspondiam às correntes não navegáveis ou
flutuáveis. 6
A Constituição de 1937, seguindo a Constituição de 1934, estabeleceu que eram do domínio federal
"os lagos e quaisquer correntes em terrenos do seu domínio ou que banhem mais de um Estado,
sirvam de limites com outros países ou se estendam a territórios estrangeiros", 7e que eram do
domínio dos Estados "as margens dos rios e lagos navegáveis destinadas ao uso público, se por
algum título não forem do domínio federal, municipal ou particular". 8
A Constituição de 1946 apenas ampliou os bens dos Estados, passando-lhes a pertencer os lagos e
rios em terrenos do seu domínio e os que tivessem nascente e foz no território estadual. 9
A Constituição de 1967 não alterou a Constituição anterior, de 1946, tendo a EC 1/1969 incluído,
entre os bens da União, o mar territorial.
Dessa forma, as Constituições de 1934 a 1967, se comparadas entre si, pouco foram alteradas em
relação ao domínio das águas. Apenas a Constituição de 1946 ampliou as águas de domínio dos
Estados. Já a Constituição de 1988 deu um grande salto em matéria de meio ambiente, incluídas
neste tema as águas.
A água foi continuamente utilizada de forma irracional e predatória após a Segunda Guerra Mundial,
período marcado "por investimentos que resultaram em um importante crescimento econômico que
envolvia, principalmente, no que se refere ao uso de água, intervenções nas áreas de energia,
abastecimento doméstico e industrial, aumento de produção agrícola por irrigação, transporte fluvial
e marítimo, recreação com lagos artificiais e modificações costeiras, como marinas". 10
Até a década de 60, os tratados internacionais voltavam-se mais para o aspecto econômico do uso
da água, sobretudo para a navegação e hidreletricidade, não abordando, ou abordando de forma
secundária, o uso da água com a finalidade de proteção de um recurso natural.
Foi apenas no final da década de 60 que se iniciou uma conscientização, em escala mundial, de que
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a água não é um bem inesgotável e que seu uso sustentável seria imprescindível para que o homem
pudesse usá-la e reusá-la de forma permanente, garantindo assim sua própria existência.
Diversas conferências e documentos marcaram o início desta conscientização mundial acerca da
preservação da água, como a Carta Europeia da Água, elaborada pelo Conselho da Europa, em
Estrasburgo, na França, em 06.05.1968; a Confederação das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente
Humano, convocada em 1971 pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas para que
fosse realizada em 1972, em Estocolmo; e a Conferência de Mar del Plata, em 1977, na Argentina.
Os países desenvolvidos introduziram, ainda na década de 70, suas leis de proteção ambiental,
pressionados por movimentos ambientalistas que clamavam contra a degradação ambiental, fruto do
intenso processo de industrialização do pós-guerra.
Somente a partir da década de80 é que os países em desenvolvimento introduziram leis de proteção
ambiental em seus ordenamentos jurídicos.
No Brasil, foi editada a Lei Federal n. 6.938, de 31.08.1981, 11que dispõe sobre a Política Nacional do
Meio Ambiente, tendo integrado como princípios, entre outros, o desenvolvimento sustentável e a
racionalização e o planejamento do uso da água. Estabeleceu, ainda, a necessidade da realização e
aprovação de estudos ambientais para estabelecimentos e atividades efetiva ou potencialmente
poluidoras. 12
Foi neste contexto histórico de proteção às águas que foi promulgada a Constituição Federal de
1988, na qual se deu o marco - em sede constitucional - para a proteção dos recursos naturais, em
especial para as águas, tendo adotado os parâmetros norteadores de proteção ao meio ambiente
traçados na Declaração sobre o Meio Ambiente Humano de Estocolmo. 13
Esta Constituição estabeleceu o direito de todos os brasileiros ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, atribuindo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
gerações presentes e futuras. 14
A Constituição Federal de 1988 ainda atribuiu, como competência comum aos Estados federados, a
proteção dos recursos hídricos, bem como atribuiu à União a instituição do sistema nacional de
gerenciamento de recursos hídricos e a definição de critérios de outorga de direitos de seu uso. 15
Em cumprimento à Constituição Federal (LGL\1988\3) vigente, foi editada a Lei Federal 9.433, de
08.01.1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos.
Quanto ao domínio das águas, 16a Constituição de 1988 estabeleceu que são bens da União os
lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um
Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele
provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais, o mar territorial e os potenciais de
energia hidráulica. 17
Quanto aos bens dos Estados, não mais se adotou a posição das Constituições anteriores, segundo
as quais só pertenceriam aos Estados as águas expressamente enumeradas.
A Constituição de 1988 adotou uma posição bem mais abrangente, atribuindo aos Estados todas as
águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na
forma da lei, as decorrentes de obras da União. 18
Note-se que a Constituição de 1988 inovou ao tratar pela primeira vez, de forma expressa, das
águas subterrâneas, inserindo-as entre os bens dos Estados.
Inovou ainda ao atribuir ora aos Estados, ora à União, a titularidade de todas as águas, não havendo
mais águas de titularidade de municípios ou de propriedade particular, ainda que se encontrem em
solo particular, adotando a tendência internacional de publicização das águas.
Seguindo esta tendência, a Lei Federal 9.433/1997, em seu art. 1.º, I, declarou que: "A água é um
bem de domínio público".
Para Leme Machado, 19a água, como elemento do meio ambiente, é bem de uso comum do povo, 20
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visto que, conforme estatuído no art. 225 da Constituição, "Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo (...)". Assim, expõe o mencionado autor
que o art. 1.º do Código de Águas - segundo o qual "as águas públicas podem ser de uso comum ou
dominicais" - foi parcialmente revogado pela Lei 9.433/1997, em consonância com o art. 225 da CF
(LGL\1988\3), dado que as águas não podem mais ser dominicais.
Tomanik Pompeu afirma que "desaparecem, sem qualquer vantagem prática, as águas comuns, as
particulares e as municipais (art. 26, I [CF/1988 (LGL\1988\3)])". 21
Também para Granziera não há mais águas particulares: "Após a edição da Lei 9.433/1997, caíram
por terra quaisquer dúvidas que pudessem restar acerca da publicização dos recursos hídricos no
Brasil. O art. 1.º, I, da Lei das Águas, tornou definitiva a condição pública das águas no Brasil,
fixando que 'a água é um bem de domínio público'". 22
Dessa forma, a água está compreendida no domínio público e deve ser considerada como bem de
uso comum do povo. 23
Sua utilização, dependendo do caso, pode ser comum ou privativa, 24visto que ora independe de
outorga pelo poder concedente, sendo de livre utilização por pessoas indeterminadas, ora depende
de outorga específica a pessoas determinadas.
Disto se extrai, portanto, que não mais vigoram os dispositivos do Código de Águas que estabelecem
o domínio municipal ou particular das águas, bem como os que tratam das águas comuns, ora
porque não foram recepcionados pela Constituição de 1988, ora porque foram revogados pela Lei
Federal 9.433/1997.
Mencione-se, por fim, que permanecem em vigor os dispositivos do Código de Águas que tratam dos
terrenos reservados. Segundo este Código, pertencem aos Estados os terrenos reservados das
margens das correntes e lagos navegáveis, se, por algum título, não forem do domínio federal,
municipal ou particular. 25Os terrenos reservados são os que, banhados pelas correntes navegáveis,
fora do alcance das marés, vão até a distância de 15 metros para a parte de terra, contados desde o
ponto médio das enchentes ordinárias. 26
2. Águas em imóveis e suas implicações no direito imobiliário
2.1 Rios como limítrofes de imóvel
Segundo o art. 213, II, e §§ 2.º e 4.º, da Lei Federal 6.015/1973, o registro 27imobiliário pode ser
retificado a requerimento do interessado, no caso de inserção ou alteração de medida perimetral de
que resulte, ou não, alteração de área, instruído com planta e memorial descritivo assinado por
profissional legalmente habilitado e pelos confrontantes, podendo estes ser apenas notificados para
se manifestarem no prazo de 15 dias, presumindo-se sua anuência caso não apresentem
impugnação dentro deste período.
Igualmente, nas hipóteses de retificação previstas no inc. I do citado artigo, pode haver a
necessidade de a retificação do registro ser bilateral, necessitando assim da anuência dos
confrontantes e seguindo o rito já explicitado no parágrafo anterior. Tais casos são os quais a
retificação gera potencial risco para o direito destes terceiros que deverão anuir.
No caso de um imóvel ter um rio como limítrofe, quem é o confrontante legitimado a se manifestar
sobre a retificação de área deste imóvel? O Poder Público, a quem pertencem as águas do rio? Ou o
proprietário do imóvel contíguo ao outro lado do rio?
Em primeiro lugar, cumpre ressaltar que, após o advento da Constituição de 1988, todas as águas
são públicas. Assim sendo, todos os rios estão compreendidos no domínio público, sem distinções.
Como já mencionamos, o Código de Águas estabelecia as seguintes categorias de águas: as águas
públicas de uso comum, as águas públicas dominicais, as águas comuns e as águas particulares.
Entre as águas públicas de uso comum estariam situadas as correntes, canais, lagos e lagoas
navegáveis ou flutuáveis. E, entre as águas comuns, estariam as correntes não navegáveis ou
flutuáveis.
Contudo, após a Constituição de 1988, tanto as correntes navegáveis quanto as não navegáveis
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estão compreendidas no domínio público, não havendo mais águas fora deste domínio.
Disto se extrai que quaisquer rios limítrofes a um imóvel serão sempre de domínio público, pouco
importando tratar-se de rios navegáveis ou não navegáveis.
Importante notar também que, conforme de longe já pacificado, a propriedade do álveo pertence ao
titular das águas, de modo que formam ambos um todo inseparável. Conforme lição de Lobão, o
"álveo do rio público é tão público como o mesmo rio". 28Também Antônio de Pádua Nunes, no
mesmo sentido, já alertava para o fato de que o "álveo segue a condição do rio". 29
Portanto, em caso de retificação de área de imóvel com rio limítrofe,o poder público a quem
pertence este rio (Estado ou União) é quem deverá manifestar-se, como confrontante, sobre a
retificação em andamento.
2.2 Águas no interior de imóvel - Bibliografia
De acordo com o que já expusemos, também as águas que estão localizadas no interior de um
imóvel particular serão sempre públicas, navegáveis ou não.
Nesse sentido, deverão ser excluídas da área total do imóvel as áreas ocupadas pelas águas,
resultando assim em matrículas distintas? Para melhor análise da questão, serão consideradas duas
situações distintas: a existência de águas no interior de um imóvel que, em virtude de sua disposição
neste, não o corte em duas partes; e a existência de águas que seccionam o imóvel em duas partes.
a) águas que não seccionam o imóvel
A Constituição Federal de 1988 incluiu entre os bens da União os lagos, rios e quaisquer correntes
de água em terrenos de domínio da União, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites
com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os
terrenos marginais e as praias fluviais, o mar territorial e os potenciais de energia hidráulica. Também
incluiu entre os bens dos Estados as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em
depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União.
Após a Constituição Federal de 1988, como vimos, todas as águas são ou da União, ou dos Estados,
não mais havendo águas de propriedades dos Municípios nem dos particulares. Embora do ponto de
vista do direito ambiental o foco esteja primordialmente no fato de que a proteção constitucional
quanto ao domínio público das águas seja dirigida ao bem ambiental água, pouco importando se
implicaria isto uma transferência de domínio imobiliário para a União ou para os Estados, tem-se que
esta transferência ocorre, diante do texto constitucional.
As águas, como vimos, são bens de uso comum do povo. Formalmente, como decorrência do texto
constitucional, as águas (e, por consequência, seu álveo também) passaram a ser propriedade
pública. É certo que a propriedade aqui, no sentido privatista do direito, não vai além da designação
formal, posto que, em virtude da natureza da água (de um bem ambiental necessário para a vida
humana), o Estado atua não como alguém que tem poder de dispor e gozar, mas como alguém que
tem o dever de tutelar. Tratou o texto constitucional de atribuir a propriedade formal das águas ao
poder público, não para que este as tratasse como bem seu - porque seu não é, uma vez que é de
todos -, mas para que pudesse melhor tutelá-las. É preciso aqui abandonar a ideia moderna de
propriedade, vinculada à liberdade individual e ao poder de usar, gozar, fruir e dispor do proprietário,
e avançar para o entendimento de propriedade pós-moderna, com uma função muito mais pública do
que privada. A água não é propriamente do ente público, mas é propriedade formal sua, tão somente
com o intuito de tornar facilitada sua tarefa de tutelá-la e de separá-la das demais coisas que são de
propriedade exclusiva de algum particular.
Note-se que, embora "os bens públicos de uso comum sejam insuscetíveis de direito de propriedade,
a tradição permite empregar o termo para designar o titular da relação jurídica ao qual se confia a
sua guarda e gestão". 30
Aliás, conforme entendimento da doutrina, a dominialidade pública da água consubstanciada na Lei
Federal 9.433/1997 "não transforma o Poder Público federal e estadual em proprietário da água, mas
torna-o gestor desse bem, no interesse de todos. Como acentua o administrativista italiano Massimo
Severo Giannini, 'o ente público não é proprietário, senão no sentido puramente formal (tem o poder
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de autotutela do bem), na substância é um simples gestor do bem de uso coletivo'". 31
Alguns entendem que as águas não são bens públicos, mas sim bens difusos. Veja-se por todos,
nesse sentido, a assertiva de Luciana Cordeiro de Souza: "a tão esperada lei de recursos hídricos, a
Lei 9.433, de 08.01.1997 (...) cometeu uma impropriedade ao considerar (...) a água como sendo um
bem de domínio público. Ora, a água como bem ambiental, de uso comum do povo, trata-se de um
bem difuso". 32
Parece-nos que, do ponto de vista prático, em nada se altera a situação, uma vez que, como vimos,
neste caso, atribuir a propriedade das águas ao Estado, como coisa de uso comum do povo, nada
mais significa do que conferir o dever de tutelar o que é de todos, dentro de uma visão adequada do
que deva ser o direito de propriedade em tal caso.
Ademais, não parece ser o caso de considerar difuso um bem que o texto constitucional atribui a
alguém. Difuso sim é o bem ambiental água, abstratamente falando.
Neste ponto, precisa a lembrança de Tomanik Pompeu: "Há que se fazer distinção todavia, entre
essa categoria de bem ambiental, como um todo, e a dos que têm titular constitucionalmente
definido, como são, p. ex., as águas, mesmo que públicas de uso comum, os potenciais hidráulicos e
as jazidas minerais, bens não difusos, mas concretos, cabendo aos respectivos titulares geri-los,
especificamente". 33
Do ponto de vista registral, importa notar que, sejam as águas bens de uso comum do povo (posição
que parece acertada), sejam bens difusos, não são bens particulares.
A porção de solo ocupada pelas águas (álveo), seja no caso de um rio, seja no caso de um córrego,
ou de uma lagoa, por exemplo, juntamente com as águas, formam um todo que sob uma certa
classificação dos bens podem ser considerados como imóveis (art. 79 do CC/2002 (LGL\2002\400)).
E, não sendo particulares, não podem as águas integrar a matrícula do imóvel particular em que
estão inseridas.
Imaginemos que determinada porção de terras tenha uma área de 30.000 m², e que dentro dela haja
um rio não navegável (no qual, portanto, não há terreno reservado nos termos do art. 14 do Código
de Águas), que ocupa uma área de 5.000 m². Não é possível haver na matrícula uma descrição de
um imóvel contendo uma área de 30.000 m², cortado por um rio, e que pertence a Fulano, como se
os 30.000 m²fossem propriedade particular de Fulano, quando, em verdade, somente 25.000 m²o
são. Não pode o particular beneficiar-se com a inclusão em sua matrícula de área que não lhe
pertence, inclusive, por exemplo, para fins de cálculos de percentuais de que deverão ser
transmitidas ao poder público por ocasião do registro de um parcelamento do solo urbano, ou para
cálculos de aproveitamento urbanístico do solo. Ademais, a unicidade da matrícula não permite ter
em uma só matrícula imóveis distintos, que pertencem, um a tal particular, e outro não. No exemplo
acima, os 5.000 m²correspondentes ao rio deverão ser extirpados da matrícula do imóvel particular,
podendo haver abertura de matrícula em nome do ente público, ao qual corresponda a propriedade,
tal qual ocorre com uma via pública. A propriedade do rio não decorre da existência de matrícula,
mas sim do texto constitucional. Eventual abertura de matrícula será facultativa e meramente
declarativa.
Quanto às águas inseridas artificialmente num imóvel, como caixas d'águas, piscinas, açudes, bem
como quaisquer outras águas estáticas artificiais, 34estas compreendem o imóvel particular, são
propriedade privada, uma vez que já não compõem mais o corpo hídrico - este sim um bem
ambiental e objeto de proteção legal -, tendo já saído do domínio público e passado à esfera
particular, a quem, em regra, deve ter sido outorgada a utilização da água. Por esta razão,
registralmente, devem integrar a matrícula do imóvel do particular no qual se situam. 35
b) Águas que seccionam o imóvel
Nesta segunda hipótese, em que o rio ou córrego seccionam completamente o imóvel particular, da
mesma forma como na hipótese anterior, as águas também não podem integrar a matrícula do
imóvel particular.
Ocorre que, nesta situação, outra questão surge: as águas,ao se destacarem da matrícula do imóvel
particular que cortam, acabam por dividir fisicamente o imóvel particular em duas porções. A partir
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deste fato, indaga-se se é possível a manutenção de ambas as partes do imóvel particular, uma de
cada lado do rio ou do córrego, na mesma matrícula.
A questão não é simples, e pode parecer num primeiro momento que o imóvel público (rio) que
secciona o imóvel particular quebra a contiguidade deste.
Como é sabido, o princípio registral da unitariedade da matrícula veda que haja em uma mesma
matrícula mais de um imóvel, exigindo contiguidade do imóvel matriculado (arts. 176, § 1.º, I, e 234,
da Lei 6.015/1973).
Todavia, tal contiguidade não é física, mas jurídica. Geralmente, os conceitos de contiguidade física
e jurídica coincidem, determinando que possam integrar a mesma matrícula, passando a formar um
único imóvel as porções de terras que sejam vizinhas, porém tal regra não é absoluta. Há casos em
que a contiguidade jurídica existe sem que haja a física, e que passa e surgir a possibilidade de
abertura de matrícula para porções de terras que, sem serem contíguas fisicamente, passam a ser
juridicamente um único imóvel, porque tal é a sua destinação econômica e tal é a sua vocação,
determinada pelo proprietário, ou pela sua função social. Assim, duas porções de terras,
pertencentes a um mesmo proprietário e cortadas por um rio, podem ser consideradas juridicamente
um único imóvel, e assim constarem de uma única matrícula, de modo que, nesta matrícula, possa
ser registrada uma incorporação imobiliária ou um condomínio edilício, por exemplo. O obstáculo
natural existente entre ambas as porções de terras pode ser superado, com pontes, por exemplo, de
modo a torná-los fisicamente unos, além de economicamente.
Interessante, neste ponto, a lição de Manuel Pena Bernaldo de Quirós (2001, 544): "La finca es una
unidad económica y jurídica independiente, de base inmobiliaria, que ordinariamente consiste en un
terreno deslindado, edificado o no. Pero hay supuestos en que la finca no es un terreno continuo".
Contudo, pode haver casos em que, além das áreas ocupadas por águas que cortam um imóvel de
propriedade particular, devam ser excluídos da área total do imóvel também o terreno reservado
existente, quando existir no imóvel, terrenos reservados ou marginais de propriedade imobiliária
estatal não inseridos, por direito, no domínio particular.
Vejamos em que consistem os terrenos marginais e os reservados. Segundo o art. 20, III, da
CF/1988 (LGL\1988\3), são bens da União "os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos
de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se
estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias
fluviais" (grifamos).
Segundo o art. 1.º, b e c, do Dec.-lei 9.760/1946, incluem-se entre os bens imóveis da União "os
terrenos marginais dos rios navegáveis, em Territórios Federais, se, por qualquer título legítimo, não
pertencerem a particular" e "os terrenos marginais de rios e as ilhas nestes situadas na faixa da
fronteira do território nacional e nas zonas onde se faça sentir a influência das marés".
Segundo o art. 4.º do Dec.-lei 9.760/1946, são terrenos marginais os que, banhados pelas correntes
navegáveis, fora do alcance das marés, vão até a distância de 15 metros medidos horizontalmente
para a parte da terra, contados desde a linha média das enchentes ordinárias. Já os terrenos
reservados estão estabelecidos no Código de Águas.
Segundo o art. 11 do Código de Águas, são bens "públicos dominicais" os terrenos reservados nas
margens das correntes públicas de uso comum, bem como dos canais, lagos e lagoas da mesma
espécie, desde que não estejam destinados ao uso comum, ou por algum título legítimo não
pertençam ao domínio particular. E, segundo o art. 31, pertencem aos Estados os terrenos
reservados das margens das correntes e lagos navegáveis se, por algum título, não forem do
domínio federal, municipal ou particular.
Terrenos reservados, de acordo com o art. 14 do Código de Águas, são os que, banhados pelas
correntes navegáveis, fora do alcance das marés, vão até a distância de 15 metros para a parte de
terra, contados desde o ponto médio das enchentes ordinárias.
Dessa forma, segundo o Código de Águas, não obstante a divergência doutrinária em torno do tema,
36os terrenos reservados podem ser públicos dominicais, pertencendo à União ou aos Estados, se
nas margens de correntes públicas de uso comum ou de canais, lagos e lagoas desta espécie, ou
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podem simplesmente pertencer aos Estados, sem exigir a lei que integrem seus bens patrimoniais,
se nas margens das correntes e lagos navegáveis. Em ambos os casos, contudo, desde que não
pertençam a propriedade particular por título legítimo. 37
Assim, os terrenos marginais de propriedade da União estão estabelecidos e regulados no art. 20, III,
da CF/1988 (LGL\1988\3) e no Dec.-lei 9.760/1946. Já os terrenos reservados podem pertencer à
União ou aos Estados, de acordo com o Código de Águas e considerando-se a repartição dominial
de águas previstas na Constituição Federal de 1988. No entanto, como o conceito de terreno
marginal é idêntico ao conceito de terreno reservado estabelecido pelo Código de Águas, a doutrina
tem tratado as expressões como sinônimas. 38
Importante notar, por fim, que, assim como ocorre com as águas, a propriedade dos terrenos
marginais e dos reservados não decorre das respectivas matrículas no competente Registro
Imobiliário, mas sim da lei.
Eventual matrícula aberta para tais áreas terá efeito meramente declarativo, e não constitutivo da
propriedade estatal.
Bibliografia
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1. Art. 1.º.
2. Art. 2.º, § 3.º.
3. Art. 2.º.
4. Art. 8.º.
5. Art. 89 do Código de Águas. Atualmente, a Portaria 222, de 28.07.1997, do Departamento
Nacional da Produção Mineral conceitua nascente como "descarga concentrada da água subterrânea
que aflora à superfície do terreno como uma corrente ou fluxo de água".
6. Art. 7.º.
7. Art. 36, b.
8. Art. 37, b.
9. Art. 35.
10. TUCCI, Carlos E.M. Gestão da água no Brasil. Brasília: Unesco, 2001, p. 55.
11. Mencione-se que, em 1973, havia sido criada a Secretaria Especial do Meio Ambiente (Sema),
pelo Dec. Federal 73.030, de 30 de outubro, vinculada ao Ministério do Interior, "orientada para a
conservação do meio ambiente, e o uso racional dos recursos naturais" (art. 1.º do Dec.
73.030/1973). A Sema foi extinta por meio da Lei Federal 7.735, de 22.02.1989, que criou o Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama).
12. É certo que, em 1934, o Brasil já havia editado o marco legal no campo das águas - o Código de
Águas. Contudo, este diploma teve como preocupação primordial o trato das águas para uso na
indústria hidroelétrica, embora tivesse abarcado algumas regras inovadoras, todavia tímidas, de
proteção às águas. Consta de sua exposição de motivos apresentada por Valladão ( Regime jurídico
das águas e da indústria hidroelétrica. São Paulo: Prefeitura Municipal de São Paulo, 1941, p. 9):
"Efetuados aqueles estudos eu pude assim realizar (...) a elaboração do mais importante livro do
projeto, aquele livro X que se inscreve - Das forças hidráulicas: regulamentação da indústria
hidrelétrica."
13. As Constituições que antecederam a Constituição Federal de 1988 não trataram da água como
um recurso ambiental a ser protegido. As Constituições anteriores que dispuseram sobre a água o
fizeram para estabelecer o seu domínio e a competência legislativa sobre a matéria, para regular a
nomeação de Prefeitos em municípios com estâncias hidrominerais, e para estabelecer
determinadas regras sobre o potencial de energia hidráulica.
14. Art. 225, caput.
15. Art. 21, XIX.
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16. Seguiu neste ponto, a Constituição Federal de 1988, tendência europeia de publicização das
águas, com vistas à sua tutela. Como mostra Guido Astuti, "gli sviluppi della disciplina giuridica delle
acque pubbliche in Italoia, dallŽunificazione legislativa ai nostri giorni, rivelano uma chiara e costante
tendenza verso la progressiva riduzione, se non verso la completa eliminazione, della categoria delle
acque private" (Acque private. Enciclopédia del diritto. Milano: Giuffrè, 1958. v. I, p. 387). Também
em solo espanhol, alerta Jose Luis Lacruz Berdejo que "a partir del dia 1 de enero de 1986 (...) todas
las águas son públicas y que lãs águas privadas tienen un carácter absolutamente excepcional" (
Derechos reales. 3. ed. Barcelona: Bosch, 1991. vol. 1, p. 424).
17. Art. 20, III, VI e VIII.
18. Art. 26, I.
19. Direito ambiental brasileiro. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 442.
20. O autor nos ensina que as consequências da conceituação da água como bem de uso comum do
povo são: "o uso da água não pode ser apropriado por uma só pessoa física ou jurídica, com
exclusão absoluta dos outros usuários em potencial; o uso da água não pode significar a poluição ou
a agressão desse bem; o uso da água não pode esgotar o próprio bem utilizado e a concessão ou a
autorização (ou qualquer tipo de outorga) do uso da água deve ser motivada ou fundamentada pelo
gestor público" (LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito ambiental brasileiro cit., p. 443).
21. Recursos hídricos na Constituição de 1988, Revista de Direito Administrativo 186/10, out.-dez.
1991, p. 21.
22. Direito das águas. São Paulo: Atlas, 2001, p. 90. A autora pondera apenas que o regime
aplicável às águas pluviais não é o público, mas as disposições do Código de Águas, que podem ser
utilizadas pelo dono do prédio em que caírem sem necessidade de qualquer ato administrativo
específico.
23. A classificação dos bens inserta no art. 99 do Código Civil (LGL\2002\400) em bens de uso
comum do povo, bens de uso especial e bens dominicais ou patrimoniais utiliza o critério da
destinação ou afetação dos bens. Pelo critério da titularidade, os bens públicos ainda podem ser
federais, estaduais ou municipais.
24. Conforme Di Pietro, "uso privativo é o que se exerce, com exclusividade, por pessoas
determinadas, mediante título jurídico conferido individualmente pela Administração"; e "uso comum
é o que se exerce, em igualdade de condições, por todos os membros da coletividade, sem
necessidade de consentimento individualizado por parte da Administração" ( Uso privativo de bem
público por particular. São Paulo: Ed. RT, 1983, p. 10).
25. Art. 31 do Código de Águas.
26. Art. 14 do Código de Águas.
27. Registro, aqui, no sentido lato, abrangendo o registro stricto sensu, a averbação e a matrícula.
28. LOBÃO, Manuel de Almeida e Sousa de. Tratado prático e compendiario das águas dos rios
públicos, fontes públicas, ribeiros e nascentes dellas. Lisboa: Imprensa Nacional, 1861, p. 20.
29. NUNES, Antônio de Pádua. Código de águas: Decreto 24.643, de 10.7.1934 ; anotações em face
da doutrina e das leis posteriores e do projeto de Alfredo Valladão de 1907. 2. ed. São Paulo: Ed.
RT, 1980, vol. 1, p. 32.
30. TOMANIK POMPEU, Cid. Direito de águas no Brasil. São Paulo: Ed. RT, 2006, p. 69.
31. LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito ambiental brasileiro. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2007, p. 443.
32. Águas e sua proteção. Curitiba: Juruá, 2004, p. 100.
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33. Direito de águas no Brasil. São Paulo: Ed. RT, 2006, p. 69.
34. Águas estáticas artificiais são aquelas mortas, dormentes (em contraposição às águas
dinâmicas, que são correntes) e que decorrem da obra humana. Veja-se a respeito: TOMANIK
POMPEU, Cid. Direito de águas no Brasil cit., p. 88.
35. Neste ponto, não se pode concordar com a assertiva de José Ribeiro de que todo "corpo de
água", indistintamente, constitui bem público que deve ser separado da matrícula do bem particular,
quando assim manifesta-se: "A transferência das águas particulares e, por consequência, também da
parte do solo que as suporta, ao domínio público, deu-se por força da norma constitucional (...). Não
se vê, por isso, necessidade de abrir matrículas dos 'corpos de água' (...). Todavia, nada obsta que
se abra matrícula de cada 'corpo de água' em nome do ente público titular do domínio,
considerando-se aqui como 'corpo de água', para esse fim, as águas que estiverem em cada
propriedade particular e o álveo ou a porção de solo que lhes serve de suporte físico (p. ex. uma
lagoa, um rio, uma represa, um tanque seria um corpo de água ou um imóvel, para efeito de
matrícula)" (Propriedade das águas e o registro de imóveis. In: FREITAS, Vladimir Passos de. Águas.
Aspectos jurídicos e ambientais. Curitiba: Juruá, 2000, p. 46).
36. Segundo Bandeira de Mello ( Curso de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2008,
p. 907), os terrenos reservados são bens públicos dominicais. Para Di Pietro, os terrenos reservados
podem ser bens públicos ou bens particulares ( Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008,
p. 673). Para Meirelles ( Direito administrativo brasileiro. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p.553),
trata-se tais terrenos de ônus real sobre a propriedade alheia, ou seja, de uma servidão pública ou
administrativa. Afirma o autor que: "Interpretar a reserva dessas faixas como transferências de
domínio é desconhecer a natureza e finalidade da servidão que as onera, e que visa, única e
exclusivamente, a deixar livres as margens das águas públicas para o policiamento pelos Agentes da
administração. Por isso mesmo, em caso de desapropriação indenizam-se também as terras
reservadas. Nem poderia a lei despojar a propriedade particular sem indenização. Se o legislador
assim agisse, praticaria um confisco, vedado pela nossa Constituição".
37. Em relação a este tema já entendeu o STJ, em EREsp 617.822/SP, relatado pelo Min. Castro
Meira em 09.11.2005, que "1. (...) os terrenos que margeiam os rios navegáveis são bens públicos
dominicais, salvo se por algum título legítimo [não] pertencerem ao domínio particular. 2. Até prova
em contrário, presume-se que os 'terrenos reservados' pertencem ao domínio público, presunção que
pode ser ilidida por documento idôneo, comprobatório da propriedade particular (...)" (Ver ainda REsp
47.944, DJU 27.06.1994 e REsp 89.832/PR, DJU 07.02.2006).
38. Nesse sentido, Di Pietro, Direito administrativo, 21. ed., São Paulo: Atlas, 2008, p. 674.
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