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Centro Federal de Educação Tecnológica de Química de Nilópolis - RJ
Unidade Maracanã
Química Inorgânica
Professor Rodrigo
PARTE B:
4. A Regra do Octeto 28
5. Ligação Iônica 31
5.1 – Sólidos Iônicos 31
5.2 – As Estruturas Cristalinas dos Sólidos Iônicos
5.2.1 – A Estrutura do Cloreto de Sódio 34
5.2.2 – Estrutura do Cloreto de Césio 34
5.2.3 – A Estrutura da Esfarelita 35
5.2.4 – Estrutura da Fluorita e Antifluorita 36
5.2.5 – Outras Estruturas 36
5.3 – Energia do Retículo Cristalino 36
5.4 – Raio Iônico 41
5.5 – Regras de Fajans: Poder Polarizante e Polarizabilidade 42
5.6 – Hidrólise de Cátions 43
6. Ligação Covalente 46
6.1 – Estruturas de Lewis 46
6.2 – Teoria da Ligação de Valência 50
6.2.1 – Hibridação dos Orbitais Atômicos 52
6.2.1.1 – Hibridação do tipo sp3 52
6.2.1.2 – Ligações π: Hibridação do tipo sp2 e sp 53
6.2.1.3 – Expansão do Octeto 55
6.2.2 – Teoria da Repulsão dos Pares de Elétrons da Camada
de Valência 60
6.2.3 - Ressonância 64
Exercícios Parte B 65
Bibliografia Parte B 66
2006
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28
4. A Regra do Octeto
Os gases nobres apresentam valores altos de EI e valores positivos de AE, o que
significa que não perdem ou ganham elétrons com facilidade. Some isto ao fato de serem
praticamentes inertes (ainda hoje existem poucos compostos formados por gases nobres)
e tem-se alguns elementos com propriedades intrigantes para os cientistas da época. Tão
intrigantes que a inércia química dos gases nobres foi considerada um modelo de
estabilidade para qualquer átomo da Tabela Periódica. Os átomos reagiam, se
combinavam com os outros, para atingirem a estabilidade de um gás nobre e, portanto,
chegar a um estado de menor energia. Esta foi a proposta de Gibert N. Lewis.
Gilbert Lewis foi um homem de idéias simples, porém extremamente úteis.
Primeiro propôs uma nova divisão para as substâncias como polares e não polares ao
invés de inorgânicas e orgânicas. Seguindo essa idéia de substâncias polares e não
polares, ele concluiu certas coisas interessantes. As diferentes propriedades que estas
substâncias apresentavam estavam ligadas à mobilidade dos elétrons da molécula. Ele
escreveu:
“Se então considerarmos moléculas não polares como sendo aquelas onde os
elétrons pertencentes a um átomo em particular estão restritos de tal forma que eles não
podem se afastar muito de suas posições normais, enquanto nas moléculas polares os
elétrons, tendo mais mobilidade, se separam na molécula formando partes positivas e
negativas, então todas as propriedades diferentes entre os dois tipos de compostos
tornam-se dependentes dessa hipótese(...)” (Traduzido de LEWIS, 1916).
Hoje essa idéia é um conceito bem sólido para os químicos. No entanto, numa
época onde Niels Bohr tinha acabado de propor seu modelo atômico de órbitas
quantizadas, atribuir as propriedades de substâncias químicas à mobilidade dos elétrons
era algo revolucionário. No entanto, sua outra idéia, sobre o “átomo cúbico” teria um
impacto ainda maior na química, pois explicaria porque os elementos se ligam uns com os
outros da maneira que o fazem.
Era sabido na época que a diferença entre a valência máxima positiva e negativa
de um elemento era, frequentemente, oito (e nunca mais que oito). Lewis então propôs a
idéia do “Átomo Cúbico” (Figura 17), que sustenta que quando os átomos possuem oito
elétrons – um em cada vértice de um cubo – tem-se uma situação de grande estabilidade.
Por conta disso, o flúor (Figura 17g) recebe um elétron, apresentando uma carga negativa
em seus compostos. E é claro, todos os gases nobres possuem todos os vértices dos
cubos preenchidos com elétrons. É preciso lembrar que a mecânica quântica de
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Schrödinger, que traria os conceitos de orbitais e configuração eletrônica, só apareceria
dez anos depois das primeiras idéias de Lewis. No entanto, nem a introdução de uma
nova teoria do átomo mudou o foco central das idéias de Lewis. É claro que se
abandonou a idéia de elétrons localizados em vértices de cubos, completamente
incompatível com o caráter probabilístico da mecânica quântica, mas a estabilidade
através dos oito elétrons se manteve. Mudou-se também o nome de “Átomo Cúbico” para
a conhecida Regra do Octeto.
Li
(a) (b)
Be
(c) (d)
(e) (f) (g) (h)
B C
N O F Ne
Figura 17. Exemplos da idéia de Lewis sobre do “Átomo Cúbico.”
A Regra do Octeto está relacionada com o número de elétrons na camada de
valência. Um átomo qualquer estará mais estável quando ficar com oito elétrons em sua
camada de valência – que é o número de elétrons da camada de valência dos gases
nobres. A exceção feita a esta regra é o hélio, que só possui apenas dois elétrons. Os
átomos próximos a este gás nobre, como hidrogênio, lítio e berílio, seguirão a sua
configuração eletrônica. Ou seja, a Regra do Octeto pressupõe que um átomo alcança a
estabilidade máxima quando está com a configuração eletrônica do gás nobre mais
próximo a ele. Selecionando o segundo e terceiro períodos da Tabela Periódica:
2He
3Li 4Be 5B 6C 7N 8O 9F 10Ne
11Na 12Mg 13Al 14Si 15P 16S 17Cl 18Ar
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As configurações eletrônicas dos gases nobres He, Ne e Ar são:
2He 1s2
10Ne 1s2 2s2 2p6
18Ar 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6
Enquanto para os outros elementos mostrados acima:
3Li 1s2 2s1
4Be 1s2 2s2
5B 1s2 2s2 2p1
6C 1s2 2s2 2p2
7N 1s2 2s2 2p3
8O 1s2 2s2 2p4
9F 1s2 2s2 2p5
11Na 1s2 2s2 2p6 3s1
12Mg 1s2 2s2 2p6 3s2
13Al 1s2 2s2 2p6 3s2 3p1
14Si 1s2 2s2 2p6 3s2 3p2
15P 1s2 2s2 2p6 3s2 3p3
16S 1s2 2s2 2p6 3s2 3p4
17Cl 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5
Pode-se acompanhar que os elementos Li, Be e B, irão, perder seus elétrons para
chegar à configuração eletrônica do He. Do carbono até o alumínio, tem-se elementos
que atingirão a configuração eletrônica do neônio. Do silício ao cloro, elétrons serão
ganhos para chegar-se até a configuração eletrônica do argônio.
Segundo a Regra do Octeto, o lítio, sódio e os outros elementos do grupo 1,
perderão um elétron, formando cátions de carga +1. Já os do grupo 2, perderão dois
elétrons, formando cátions de carga +2. Por sua vez, os elementos do grupo 3, perderão
três elétrons. Agora é possível entender os valores de energia de ionização apresentados
anteriormente na Tabela 5. Os elementos do grupo têm a menor 1° EI pois, perdendo
apenas um elétron, eles chegam na configuração de gás nobre. Da mesma forma, a 2° EI
é menor no grupo 2 porque os elementos deste grupo precisam perder dois elétrons e a
3° EI é menor no grupo 3 já que é necessária a saída de três elétrons destes átomos para
que se chegue até a configuração estável dos gases nobres.
Então alguns elementos formarão cátions enquanto outros formarão ânions para
alcançar a estabilidade na configuração eletrônica. Uma consequência lógica disto é que,
se um elemento necessita perder elétrons e outro ganhar, a transferência de elétrons será
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altamente favorável, como no caso do sódio (que precisa perder um) e do cloro (que
precisa ganhar um). O sódio se tornará um cátion e o cloro um ânion, estabilizando a
ambos durante este processo. Mas, existem outros casos, como nos óxidos de nitrogênio,
NOx, onde ambos os elementos necessitam ganhar elétrons para chegar na configuração
eletrônica mais estável. Neste caso, não haverá a formação de cátions e ânions, pois isto
não traria a estabilidade para os átomos da molécula. Portanto, a ligação química terá
diferentes aspectos de acordo com os elementos envolvidos nela.
5. Ligação Iônica
A ligação iônica é, fundamentalmente, a atração eletrostática entre um cátion e um
ânion de um dado composto. Um exemplo é o cloreto de sódio, onde há um cátion, Na+, e
o ânion,Cl–, que se atraem mutuamente.
Como foi dito anteriormente, ela se forma pela conveniência de um dado elemento
perder um elétron e outro ganhar. Dessa forma, tem-se:
 11Na = 1s2 2s2 2p6 3s1 17Cl = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5
Na Cl
que irão formar um par iônico:
11Na+ = 1s2 2s2 2p6 17Cl– = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6
Na Cl
+
O NaCl, como se sabe, é um sólido na temperatura ambiente. Como é formado
ligações iônicas, o NaCl e diversos outros sólidos formados por íons, são chamado de
sólidos iônicos. Por exemplo, uma barra de ferro ou aço ou uma bolinha de naftalina são
sólidos mas têm características muito diferentes do NaCl. E as propriedades de sólidos
iônicos estão todas relacionadas com a natureza iônica de suas ligações.
5.1 – Sólidos Iônicos
Algumas características são comuns a diversos sólidos iônicos, como a baixa
condutividade elétrica, o alto ponto de fusão, a solubilidade a dureza e clivagem. Estas
características estão todas relacionadas ao modelo eletrostático da ligação iônica.
A baixa condutividade elétrica observada em compostos iônicos no estado sólido
se deve, principalmente, a falta de mobilidade existente no estado sólido, uma vez que a
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condutividade está ligada diretamente à presença e mobilidade de íons no sistema. No
entanto, uma vez fundidos, os compostos iônicos conduzem eletricidade. No entanto,
precisa-se de muita energia para fundir um sólido iônico.
 Os altos pontos de fusão dos sólidos iônicos se devem a dois fatores. O primeiro
deles está relacionado com a força da ligação iônica. Sendo uma ligação relativamente
forte, a energia necessária para separar os íons é grande. No entanto, o segundo fator,
que é o predominante, está no número de ligações que devem ser quebradas. A ligação
iônica em um sólido iônico é dita, multidirecional, isto é, se propaga em todas as direções.
Portanto, um íon positivo está ligado a vários outros íons negativos que também estarão
ligados a alguns outros íons positivos e assim por diante, num grande arranjo
tridimensional. Portanto, para se fundir um sólido iônico, não basta quebrar a ligação de
um único par iônico.
Quando solúveis, os sólidos iônicos liberam íons em solução e, por este motivo,
são bons condutores uma vez dissolvidos. Uma outra característica é que a solubilidade
dos sólidos iônicos aumenta com o aumento da constante diéletrica (permissividade
elétrica) do solvente. Isto pode ser explicado utilizando o modelo da atração eletrostática
entre os íons. A energia de atração entre o cátion e o ânion é dada pela Lei de Coulomb:
r
qqE
...4
.
επ
−+
= (5)
onde E é a energia, q+ e q– são as cargas do cátion e do ânion respectivamente, ε é a
constante de permissividade do meio e r é a distância entre o cátion e o ânion.
A Tabela 8 mostra os valores da constante de permissividade elétrica para alguns
solventes normalmente utilizados. Como solubilizar é separar os íons do estado sólido,
quanto menor for a energia dada pela equação (5), mais solúvel será o sólido. Portanto,
ao aumentarmos o valor de ε do meio, estaremos diminuindo a atração entre os íons do
sólido iônico. Isto explica a solubilidade destes sólidos em água, que possui uma
constante de permissividade elétrica alta.
Uma outra maneira de entender este mesmo fenômeno é considerando os dipolos
existentes nos solventes. Quanto maior é a constante de permissividade elétrica, mais
intenso é o dipolo. Como os íons têm carga, a existência de pólos positivos e negativos no
solvente favorece a dissociação, já os íons são orientados durante a solvatação.
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Tabela 8. Constantes de permissividade elétrica de alguns meios.
Meio ε (C2/J.m)
Vácuo 8,85.10–12
Água 7,25.10–10
Acetonitrila 2,90.10–10
Amônia 2,20.10–10
Os sólidos iônicos costumam ser duros, porém quebradiços. Estes sólidos
possuem cristais característicos e, também, planos de clivagem característicos. A
clivagem é um dos métodos preliminares de se identificar minerais. Os planos de
clivagem podem ser explicados utilizando o modelo mostrado na Figura 18. Um sólido
iônico (Figura 18a) é golpeado em um local de seu cristal (Figura 18b). Suas camadas se
modificarão de forma que íons de mesma carga têm suas distâncias diminuídas, o que
leva a grande repulsão dentro do sólido (Figura 18c). A repulsão é tanta que há a quebra
do sólido (Figura 18d).
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 18. O modelo de clivagem nos sólidos iônicos.
Embora tenham propriedades semelhantes, os sólidos iônicos apresentam
diversas estruturas cristalinas. Como o arranjo tridimensional dos elementos no cristal irá
influenciar diretamente algumas propriedades, é preciso se conhecer um pouco destas
estruturas cristalinas.
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5.2 – As Estruturas Cristalinas dos Sólidos Iônicos
5.2.1 – A Estrutura do Cloreto de Sódio
O cloreto de sódio apresenta uma estrutura cristalina com célula unitária cúbica de
face centrada (cfc) (Figura 19). Cada átomo de sódio está ligado, diretamente, a seis
átomos de cloro; assim como cada átomo de cloro se liga a seis outros átomos de sódio,
em arranjo octaédrico, formando assim a estrutura tridimensional. Como existem seis
átomos de cloro ligado ao um de sódio, diz-se que o número de coordenação (NC) do
sódio é seis. Nesta estrutura, o NC do cloro também é seis.
Figura 19. A estrutura cristalina do cloreto de sódio em visão frontal e em perspectiva.
Um outro fator importante é a proporção entre sódio e cloro dentro da célula
unitária. Considere que os átomos de sódio sejam os vermelhos na Figura 19. Apenas 1/8
dos átomos localizados no vértice do cubo está do lado de dentro da célula unitária. Como
são oito os vértices, tem-se um átomo do lado dentro. Cada átomo na face do cubo está
com metade do átomo do lado de dentro e a outra metade do lado de fora. Então, como
são seis faces, a soma total dá três átomos. Assim, o total de átomos de sódio dentro da
célula unitária é de quatro átomos (um dos vértices e três dos átomos da face). Fazendo o
mesmo para os átomos de cloro, chegaremos a conclusão que existem os mesmos quatro
átomos. Portanto, a proporção é de 4:4, como deveríamos esperar, o número de átomos
de sódio é igual ao número de átomos de cloro.
Outros sólidos iônicos que possuem a mesma estrutura do cloreto de sódio são:
LiCl, KBr, KCl, KI, RbI, AgCl, AgBr, MgO, CaO, TiO, FeO, etc.
5.2.2 – Estrutura do Cloreto de Césio
O cloreto de césio apresenta uma cristalização distinta da do cloreto de sódio
possivelmente pelo seu maior raio em relação ao sódio. Sua estrutura é cúbica e o
número de coordenação, tanto do cátion quanto do ânion, é oito para sólidos com este
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arranjo cristalino (Figura 20). A proporção cátion-ânion na célula unitária é de 1:1. São
exemplos de outros sólidos com esta estrutura o CsBr, CsI, CsCN, CaS, etc.
Figura 20. A estrutura cristalina do cloreto de sódio em perspectiva.
5.2.3 – A Estrutura da Esfarelita
A esfarelita, mineral do sulfeto de zinco, também conhecido como blenda possui
um empacotamento cfc com os átomos de enxofre ocupando os vértices e faces do cubo
e os de zinco formando um tetraédro dentro da célula unitária (Figura 21). O número de
coordenação de ambos é quatro, em arranjo tetraédrico. A proporção de átomos de zinco
e de enxofre na célula unitária é semelhante àquela observada para o cloreto de sódio:
4:4.
O cloreto de cobre (I), sulfeto de cádmio e sulfeto de mercúrio (II) são alguns
exemplos de sólidos iônicos que cristalizam desta forma.
O sulfeto de zinco também pode cristalizar de outra forma, conhecida como
wurtzita. Na wurtzita há um empacotamento hexagonal expandido, sendomuito diferente
da estrutura da blenda. Como este é um empacotamento menos comum, não se
detalhará seus aspectos.
Figura 21. A estrutura cristalina do ZnS em perspectiva, destacando o tetraédro dos átomos de
zinco e um dos tetraédros entre o zinco e átomos de enxofre.
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5.2.4 – Estrutura da Fluorita e da Antifluorita
A fluorita, CaF2, apresenta um cristal com empacotamento cfc, a célula unitária
contendo um cubo interno (Figura 22). Os átomos de cálcio ocupam o cubo externo e,
portanto, existem um total de quatro átomos de cálcio na célula unitária. Os átomos de
flúor formam o cubo interno e todos estão dentro da célula unitária e, portanto, a
proporção entre cálcio e flúor na célula unitária é de 4:8. O número de coordenação para
cálcio e flúor também são diferentes. Cada cálcio está ligado a oito átomos de flúor,
enquanto o NC observado para o flúor é quatro. São exemplos de sólidos iônicos com
estrutura da fluorita: UO2, BaCl2, CaCl2, HgF2, PbO2, etc.
Na estrutura da antifluorita tem-se a posição de cátions e ânions invertida. Os
seguintes sólidos iônicos são exemplos da estrutura da antifluorita: K2O, K2S, Li2O, Na2O,
Na2S, etc.
Figura 22. A estrutura cristalina do cloreto de sódio em visão frontal e em perspectiva.
5.2.5 – Outras Estruturas
Apenas as estruturas mais comuns foram comentadas com detalhes, mas existem
diversas outras estruturas de sólidos iônicos, como a do rutilo, do arseneto de níquel ou
da wurtzita (Consulte livros de mineralogia para mais detalhes do assunto).
5.3 – Energia do Retículo Cristalino (U0)
Define-se energia do retículo cristalino como a energia liberada quando os íons de
um composto iônico no estado gasoso formam um cristal, como mostra a equação abaixo.
M+(g) + X–(g) → MX(s) (6)
Para calcular esta energia, precisa-se levar em conta todos os aspectos
envolvidos na equação (6). Como já foi discutido, o modelo de força eletrostática é
adequado para descrever a atração entre os íons. Portanto, começaremos a análise com
a equação (5), apenas trocando as cargas dos íons pelo número de carga dos mesmos
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(Z+ e Z–) multiplicado pela carga do elétron (e) e com o valor da constante de
permissividade elétrica no vácuo (ε0) uma vez que se está no estado gasoso. Com isso,
tem-se:
r
eZZEcoulomb ...4
..
0
2
επ
−+
= (7)
A equação (7), da Energia de Coulomb, representa a atração de um par iônico.
Quanto maior é o número de carga dos íons, maior é a atração. Da mesma forma, quanto
maior é a distância r entre os íons, menor é a atração. Da mesma forma, quanto menor é
a distância, maior é a atração. Para distâncias muito pequenas, a Energia de Coulomb
torna-se cada vez menor (lembre-se que esta energia é negativa! Mais atração = energia
mais negativa). A Figura 23 mostra o perfil de energia obtido com a equação (7). Deve-se
pensar se o que mostra a Figura 23 é realmente possível. O mínimo de energia será para
distâncias cada vez menores; e quando a distância tende a zero, a energia é infinitamente
negativa. Isto, claro, é impossível. O problema desta análise é considerar somente a
atração entre os íons. Mas, os cátions e ânions têm elétrons que irão se repelir
mutuamente se a distância entre o par iônico for muito pequena. Portanto, é preciso levar
em conta a repulsão dos íons no cálculo da energia do retículo cristalino. Para grandes
valores de r, a repulsão será mínima, próxima de zero. A repulsão irá aumentando
conforme os íons vão se aproximando. Para distâncias muito pequenas, a repulsão
tenderá ao infinito, como mostra a Figura 24. Além da distância entre os íons, a repulsão
dependerá também do número de elétrons do sistema. Quanto maior o número de
elétrons, maior será a repulsão. Na Tabela 9 estão resumidos os fatores de repulsão em
função do número de elétrons do sistema.
Então, para uma descrição correta da ligação iônica e para calcular a energia do
retículo cristalino, é preciso levar em consideração tanto a atração quanto a repulsão.
Rescrevendo a equação (7) com o termo de repulsão (n):
⎟⎠
⎞⎜⎝
⎛ −=
−+
nr
eZZEtotal
11.
...4
..
0
2
επ (8)
Mas a equação (8) ainda deixa de fora aspectos importantes, como por exemplo a
estrutura cristalina dos sólidos iônicos. Como as estruturas são diferentes, desde o
arranjo espacial até o número de coordenação, as forças atuantes em cada átomo serão
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diferentes. Portanto, é preciso considerar-se este fator geométrico nos cálculos. Isto se
faz introduzindo a constante de Madelung (A), que terá um valor para cada estrutura
cristalina (Tabela 10).
Figura 23. Gráfico da energia de Coulomb para um par iônico em função da distância entre os íons
Figura 24. Energias de atração e repulsão em função da distância entre os íons.
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Tabela 9. Fatores de repulsão.
Configuração eletrônica do íon Fator de Repulsão (n)
He 5
Ne 7
Ar, Cu+ 9
Kr, Ag+ 10
Xe, Au+ 12
Tabela 10. Constante de Madelung para algumas estruturas cristalinas.
Estrutura Cristalina Constante de Madelung (A)
Cloreto de Sódio 1,74756
Cloreto de Césio 1,76267
Esfarelita 1,63806
Wurtzita 1,64132
Fluorita 2,51939
A equação (8) mostra a energia da ligação para um par de íons. No entanto um
par de íons não forma um cristal. O cloreto de sódio, para citar um exemplo, precisa de no
mínino 4 pares de íons para formar uma célula unitária de seu cristal. Por isso, precisa-se
considerar um grande número de íons para se ter a energia do retículo cristalino.
Introduzindo a constante de Avogadro (N) na equação (8), obtém-se o valor para um mol
do sólido iônico. A equação (8) com a constantes de Madelung e de Avogadro torna-se:
⎟⎠
⎞⎜⎝
⎛ −=
−+
nr
eZZANU 11.
...4
..
00
2
0 επ (9)
onde r0 é a distância de ligação entre o cátion e o ânion no retículo cristalino. A Figura 25
mostra o resultado da equação (9) de maneira gráfica. Através da equação (9), tendo o
valor da distância da ligação ou dos raios iônicos, pode-se calcular o valor da energia do
retículo cristalino para um sólido iônico.
Por exemplo, a energia do retículo cristalino do cloreto de sódio pode ser calculada
facilmente apenas sabendo os raios iônicos típicos dos íons sódio (114 pm) e cloreto (167
pm). A distância entre os íons, r0, será a soma entre os raios iônicos:
r0 = 114 pm + 167 pm = 281 pm (10)
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Figura 25. Perfil energético de uma ligação iônica em função da distância entre os íons. Há um
mínimo de energia, que corresponde à energia do retículo cristalino, quando se atinge o
comprimento de ligação.
O fator de Madelung para a estrutura cloreto de sódio pode ser encontrado na
Tabela 10. Para usarmos o fator de repulsão, é preciso conhecer a configuração
eletrônica do íon e consultar a Tabela 9. O íon sódio, Na+, tem a seguinte configuração
eletrônica:
11Na+ = 1s2 2s2 2p6
que é a mesma configuração eletrônica do Ne. Portanto, o fator de repulsão para o sódio
é igual a sete. O cloreto, Cl–, tem a seguinte configuração eletrônica:
17Cl– = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6
que é a configuração eletrônica do Ar. Segundo a Tabela 9, o fator de repulsão neste
caso é igual a nove. Então, o fator de repulsão (n) para o cloreto de sódio será a média
daqueles encontrados para seus íons:
8
2
97 =+=n (11)
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Reunindo todos os dados e constantes para o NaCl:
A = 174756 n = 8 r0 = 2,81.10-10 m
Z+ = +1 Z– = –1 N = 6,02.1023 /mol
e = 1,602.10–19 C ε0 = 8,85.10–12 C2/J.m
e substituindo os valores na equação (9),
U0 = – 754 kJ/mol
O valor experimental para a energia do retículo cristalino do NaCl é – 770 kJ/mol.
Isto significa que pode-se estimar a energiado retículo cristalino com erro muito pequeno
através da equação (9).
A energia do retículo cristalino pode ser utilizada como uma medida da
estabilidade do agregado iônico. Quanto mais energia for liberada durante a formação do
retículo cristalino, mais forte é a ligação entre os íons. Isto implica que, para separá-los,
será preciso mais energia. Considere dois sólidos iônicos, MX e MZ. Imagine que o sólido
MX tenha U0 = – 500 kJ/mol enquanto o MZ libera 800 kJ/mol quando se forma. Se a
energia de hidratação dos íons X– e Z– são semelhantes, pode-se supor que o sólido MZ
tenha uma solubilidade inferior ao MX, uma vez que para separar seus íons é necessária
uma quantidade muito maior de energia. Da mesma forma, MZ terá um ponto de fusão
maior que MX. Portanto, conhecendo-se a energia do retículo cristalino é possível estimar
o comportamento de sólidos iônicos para diferentes propriedades.
5.4 – Raio Iônico
Quando um átomo perde ou ganha elétrons, seu tamanho varia em relação ao do
átomo neutro. Então, o raio atômico não serve como parâmetro para o tamanho dos íons.
Ao perder um ou mais elétrons, o tamanho do átomo diminui porque uma camada antes
ocupada pode ficar sem elétrons (casos dos grupo 1 e 2) e também por conta da maior
atração exercida pelo excesso de prótons em relação ao número de elétrons. Isto leva a
uma outra consequência: quanto maior for a carga do cátion, menor será seu raio.
No caso contrário, quando são formados ânions, o raio aumenta. A atração do
núcleo para cada elétron diminui, uma vez que existem mais elétrons para “dividir” a força
de atração do núcleo. Outro motivo é a repulsão entre os elétrons. Quanto maior for o
número de elétrons em excesso, maior será a repulsão. Portanto, quanto maior for a
carga do ânion, maior será o raio iônico.
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5.5 – Regras de Fajans: Poder Polarizante e Polarizabilidade
O poder polarizante representa o quanto um íon pode distorcer, polarizar a nuvem
eletrônica de um outro íon em sua direção. Ou seja, o quanto um núcleo de um átomo
atrai os elétrons de outro átomo. Tanto o cátion como o ânion polarizam um ao outro.
Normalmente costuma-se tratar de poder polarizante apenas para cátions, uma vez que o
efeito do poder polarizante dos ânions em cátions são muito mais fracos. O poder
polarizante depende de dois parâmetros principais: o raio iônico e a carga do cátion. Para
avaliar corretamente o efeito de cada parâmetro no poder polarizante, variaremos um de
cada vez.
Primeiramente, considere dois cátios de mesma carga, MN+, mas de raios iônicos
diferentes. Segundo a equação (7) uma mesma carga, quando em distâncias diferentes,
terá forças de atrações diferentes. Como a força (ou a energia de atração) são
inversamente proporcionais à distância, no cátion de menor raio, a força do núcleo será
mais atuante na periferia do núcleo. Portanto, quanto menor for o raio iônico do cátion,
maior será seu poder polarizante.
Da mesma forma, considere dois cátions de cargas diferentes, mas com o mesmo
raio iônico. A variável da equação (7) agora é Z+. A força de atração aumentará sempre
que a carga aumentar. Portanto, o cátion de maior carga atrairá os elétrons do ânion de
forma mais efetiva.
Mas, é preciso que se lembre, carga e raio iônico estão intimamente ligados como
foi explicado no item anterior. Portanto, quando a carga do cátion aumenta, diminui-se o
seu raio. Assim, para melhor descrever o poder polarizante, usa-se a razão carga-raio dos
cátios. Cátions de elevada razão carga-raio, são mais polarizantes que cátions de razão
carga-raio pequena.
A polarizabilidade pode ser descrita como o inverso do poder polarizante. É quanto
um íon se permite polarizar na presença de outro íon. Novamente, esta medida é
dependente da carga e do raio do ânion. Ânions grandes, dos últimos períodos da Tabela
Periódicas, são muito polarizáveis. Da mesma forma, ânions de carga elevada tendem a
ser mais polarizáveis, uma vez que seus elétrons não estão sofrendo grande atração do
próprio núcleo.
O que acontece quando temos um cátion com grande poder polarizante e um
ânion extremamente polarizável? Quando o ânion se deixa polarizar, seus elétrons vão
em direção ao cátion, dando um caráter covalente a esta ligação. Então, o poder
polarizante e a polarizabilidade são importantes parâmetros na análise de da ligação
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43
iônica. Sabe-se que existe um grau de covalência nas ligações iônicas e isto é governado
por estes dois parâmetros. Fajans resumiu estas idéias em quatro regras, que são
conhecidas como Regras de Fajans:
1) Um cátion pequeno favorece a covalência.
Em íons pequenos a carga positiva se concentra em um pequeno volume. Com
isto o íon se torna altamente polarizante e, por isso, tenderá a distorcer mais o ânion.
2) Um ânion grande favorece a covalência.
Íons grande são altamente polarizáveis, já que os elétrons de periferia estão
afastados da influência próprio núcleo, ficando suscetíveis a influência de núcleos
vizinhos, como os do cátion.
3) Cargas elevadas, em qualquer um dos íons, favorece a covalência.
Como foi visto, a carga elevada aumenta o poder polarizante do cátion e também a
polarizabilidade do ânion.
4) O poder polarizante de cátions sem a configuração de gases nobres favorece a
covalência.
Este é um aspecto interessante. Os cátions sem a configuração de gases nobres,
são, normalmente, elementos dos blocos d ou f da Tabela Periódica. Neste caso, a
péssima blindagem dos orbitais do tipo d e/ou f causam um grande aumento na carga
nuclear efetiva destes cátions. A consequência é que seu poder polarizante é ainda maior
que de um cátion com configuração de gás nobre.
5.6 – Hidrólise de Cátions
Uma vez que grande parte da química é feita em meio aquoso, temos que
conhecer as propriedades dos compostos neste meio. O estudo da dissociação em meio
aquoso trouxe vários conceitos novos e muito importantes para o dia a dia da química. O
mais importante destes conceitos é, sem dúvida, o de ácidos e bases. O Sueco Svante
Arrhenius definiu um ácido como composto que, em água, liberava íons H+, enquanto uma
base liberaria íons OH–. Mais de 20 anos depois, o dinamarquês Johannes N. Brønsted e
o inglês Thomas M. Lowry, separadamente, formularam novas idéias sobre ácidos e
bases. O conceito de ácido é de uma substância capaz de doar um próton (comumente
tratado como o íon H+) enquanto a base é a substância que irá acomodar o próton. Como
as reações ácido-base de Brønsted-Lowry são reações em equilíbrio, pode-se determinar
as constantes de destes equilíbrios ácido-base e então montar uma escala, chamada de
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44
pH, para classificar as substâncias como ácidas, neutras ou básicas. No meio aquoso, um
ácido segundo Brønsted e Lowry se comporta da seguinte forma:
HA + H2O H3O+ + A– (12)
enquanto uma base apresentaria a seguinte reação:
B + H2O HB+ + OH– (13)
Considere o ânion A–, a base conjugada do ácido HA na reação (12). Ao
dissolvermos um sal MA em água, o ânion A– sofrerá um processo que chamamos de
hidrólise salina, representado na equação abaixo (considerando que M+ é um íon
espectador).
A– + H2O HA + OH– (14)
Da mesma forma, o ácido conjugado HB+ sofrerá uma hidrólise se um sal HBX for
dissolvido em água (considerando X– um íon espectador):
HB+ + H2O H3O+ + B (15)
Na reação (14) a hidrólise foi do tipo básica enquanto na reação (15) a hidrólise foi
ácida. Se, por exemplo, o sal fosse formado pelo cátion HB+ e o ânion A- teríamos os dois
tipos de hidrólise acontecendo. Mas, nem todos os cátions e ânions apresentam reações
de hidrólise. Por exemplo, as bases conjugadas de ácidos fortes não se comportam como
o ânion A–. O mesmo se aplica para cátionsde bases fortes: não apresentam hidrólise. No
entanto, o processo de hidrólise para os cátions é mais sutil que para os ânions. A
questão vai além de ser derivado de uma base forte ou fraca. Por exemplo, como se
explica uma solução de cloreto férrico ou de alumínio ter pH ácido?
Quando um sólido iônico é dissolvido em um solvente, há a quebra da ligação
entre cátion e ânion, mas também há a formação de ligações entre soluto e solvente. Isto
é, os cátions e os ânions formam ligações (em grande parte intermoleculares) com o as
moléculas solvente, o que chamamos de solvatação. Quando o solvente é a água,
chamamos este processo de hidratação. A água é um solvente sabidamente polar, então,
sua parte positiva, os hidrogênios, se aproximam dos ânions enquanto a parte negativa, o
oxigênio, interage com os cátions. Para os cátions há a formação de compostos
chamados de complexos aquo-íons, normalmente na proporção de um cátion para seis
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45
moléculas de água como mostra a Figura 26. É a partir desses aquo-íons que o fenômeno
de hidrólise acontece.
M
H2O
H2O OH2
OH2
OH2
OH2
n+
[M(H2O)6]
n+
Figura 26. Um aquo-íon de um cátion de carga n, com número de coordenação igual a seis.
Dependendo das características do cátion Mn+, a interação com o oxigênio da água
pode ser intensa. Tão intensa a ponto do oxigênio preferir uma ligação com o cátion do
que com um dos hidrogênios. O mecanismo do processo é muito simples. Quanto mais o
cátion atrair o par de elétrons, isto é, quanto maior for o poder polarizante do cátion, mais
intensa será a interação. Conforme a interação cátion-oxigênio se torna forte, a ligação
oxigênio-hidrogênio enfraquece, até que a ligação se rompe, liberando um íon H+ para o
meio. Isto faz do aquo-íon [M(H2O)6]n+ um ácido de Brønsted. Para uma solução de
cloreto férrico, existirão os seguintes equilíbrios em solução:
[Fe(H2O)6]3+(aq) + H2O(l) [Fe(H2O)5(OH)]2+(aq) + H3O+(aq)
[Fe(H2O)5(OH)]2+(aq) + H2O(l) [Fe(H2O)4(OH)2]+(aq) + H3O+(aq)
[Fe(H2O)4(OH)2]+(aq) + H2O(l) [Fe(H2O)3(OH)3](s) + H3O+(aq)
O hidróxido de férrico, [Fe(H2O)3(OH)3], é um precipitado cor ferrugem que,
normalmente, está presente nas soluções de ferro (III). Para evitar sua formação,
adiciona-se um pouco de ácido à solução, deslocando as reações de equilíbrio no sentido
inverso. De maneira contrária, a adição de base favorece a formação do hidróxido.
Dependendo do cátion, os hidróxidos podem apresentar comportamento anfótero.
Um composto é dito anfótero quando reage tanto com ácidos como com bases. O
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hidróxido de alumínio, insolúvel, quando em presença de ácidos ou bases, se
dissolvendo segundo as reações abaixo:
Al(OH)3 + 3H3O+ Al3+ + 6H2O
Al(OH)3 + OH– [Al(OH)4]–
um processo semelhante ao do hidróxido de zinco:
Zn(OH)2 + 2H3O+ Zn2+ + 4H2O
Zn(OH)2 + OH– [Zn(OH)3]–
O mesmo tipo de reação é observada para óxidos e/ou hidróxidos de berílio, gálio,
ferro (III), manganês (IV) e outros.
6. Ligação Covalente
Como foi discutido no final do item 4, a ligação entre sódio e cloro no cloreto de
sódio tem características diferentes de uma ligação num óxido de nitrogênio, NOx, uma
vez que nem o oxigênio nem o nitrogênio têm tendência a doar elétrons um ao outro.
Portanto, para este tipo de ligações, não é adequado tratar os átomos como íons e o
modelo eletrostático, tão útil para descrever as propriedades de compostos iônicos, não
pode ser utilizado. Para descrever as ligações covalentes – aquelas onde há o
compartilhamento de elétrons numa ligação – existem diversos modelos. Desde o mais
simples, proposto por Lewis até a moderna Teoria dos Orbitais Moleculares.
6.1 – Estruturas de Lewis
Lewis fez a proposta mais simples para descrever as ligações covalentes. Os
compostos dividem elétrons até que ambos respeitem a regra do octeto. Para isto,
poderiam fazer ligações simples (com dois elétrons), duplas (duas de dois elétrons) ou até
triplas (três de dois elétrons). Ele desenvolveu uma série de regras para construir as
“Estruturas de Lewis”, que nada mais são que as representações das ligações nas
moléculas. Para exemplificar estas regras, usaremos o CH4 e o NO2–.
1) Identifique o átomo central
Normalmente, o átomo central é aquele que fará o maior número de ligações
(maior valência) ou o átomo que está em menor quantidade na molécula.
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47
Na molécula de CH4, estes dois critérios convergem para o átomo de carbono, que
precisa fazer quatro ligações para completar o octeto enquanto o hidrogênio só precisa de
uma ligação. No ânion NO2– os dois critérios também convergem para o nitrogênio, que
precisa de três ligações ao invés de duas do oxigênio.
2) Ligar os outros átomos ao átomo central até seu limite máximo (valência)
Uma vez que o átomo central esteja identificado, ligue-o aos outros átomos,
conforme mostra a Figura 27. Cuidado para não ultrapassar a valência do átomo central
(como colocar 5 ligações para o carbono).
3) Se a valência do átomo central esgotar e ainda restarem átomos, ligue-os aos átomos
ligados ao átomo central.
Nas moléculas exemplo, não existe este caso. Isto é necessário nas moléculas de
HClO4, H2SO4 ou H3PO4.
H C
H
H
H
O N O
Figura 27. Segunda regra para a construção da estrutura de Lewis.
4) Contagem do número de elétrons da molécula
O próximo passo é saber quantos elétrons existem na molécula. Para isso,
soma-se todos os elétrons da camada de valência de cada átomo. Para cada carga
positiva que a molécula tiver, um elétron é retirado do total. Em contrapartida, para cada
carga negativa, um elétron é somado ao total.
O CH4 é formado de um carbono(6C = 1s2 2s2 2p2) que possui quatro elétrons na
camada de valência e de quatro hidrogênios (1H = 1s1) cada um com um elétron na
camada de valência. Como é uma molécula neutra, o número total de elétrons será:
1 Carbono + 4 Hidrogênios = CH4
4 elétrons + 4 x 1 elétron = 8 elétrons
O NO2– é formado por um nitrogênio (7N = 1s2 2s2 2p3), que tem cinco elétrons na
camada de valência e de dois oxigênios (8O = 1s2 2s2 2p4) cada um com seis elétrons na
última camada. Fora isso, a molécula tem uma carga negativa. O número total de elétrons
é, então:
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1 Nitrogênio + 2 Oxigênios + 1 carga negativa = NO2–
5 elétrons + 2 x 6 elétrons + 1 elétron = 18 elétrons
5) Complete os octetos e conte os elétrons da molécula
Uma vez com os átomos ligados ao átomo central, deve-se completar os octetos.
Cada ligação conta como dois elétrons. Então, um átomo com três ligações, precisará de
mais dois elétrons. Um átomo que só faz uma ligação, precisará de mais seis elétrons
(com exceção dos átomos que só precisam de dois elétrons, como o hidrogênio). Uma
vez completo todos os octetos, deve-se contar o número de elétrons na molécula. Se o
número for igual ao encontrado no passo 4, a estrutura já está definida. Se o número for
diferente, é preciso fazer ligações múltiplas entre os átomos.
Na Figura 27, para o CH4, vemos que existem quatro ligações, num total de oito
elétrons para o átomo de carbono. Cada átomo de hidrogênio está participando de uma
ligação, de forma que todos têm dois elétrons. Então, estão todos respeitando a regra do
octeto. Logo, não é preciso adicionar nenhum elétron na estrutura, tampouco realizar
ligações múltiplas, já que o número e elétrons do passo 4 coincide com o da estrutura (4
ligações = 8 elétrons).
Já para o ânion NO2–, é preciso completar o octeto. Na Figura 27 vemos que o
nitrogênio faz duas ligações, num total de quatro elétrons. Portanto, é preciso se adicionar
mais quatro elétrons ao nitrogênio para que este fique com o octeto completo (Figura
28a). Os oxigêniosprecisam de mais seis elétrons cada um, já que estão com apenas
uma ligação simples (Figura 28b).
O N O
(a)
O N O
(b)
Figura 28. (a) Os quatro elétrons para completar o octeto do nitrogênio e (b) os seis elétrons para
completar o octeto dos oxigênios.
No entanto, existem vinte elétrons na estrutura da Figura 28b e no passo quatro
calculou-se que o ânion NO2– deveria ter apenas dezoito elétrons. Para reduzir o número
de elétrons em uma estrutura de Lewis, faz-se ligações duplas ou triplas. Fazendo uma
ligação dupla entre o átomo de nitrogênio e de oxigênio, chega-se a uma estrutura com
apenas dezoito elétrons (Figura 29).
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49
O N O
Figura 29. Estrutura de Lewis para o NO2–.
6) Determine as cargas formais
Com a estrutura montada, deve-se determinar as cargas formais. É preciso ter em
mente que as cargas formais não são os números de oxidação dos átomos. Para
determinar as cargas formais precisa-se da configuração eletrônica de um dado átomo e
do número de elétrons deste mesmo átomo na estrutura de Lewis. O número de elétrons
na estrutura de Lewis é feito da seguinte forma (procedimento apenas para determinar a
carga formal!): conta-se os elétrons não-ligantes normalmente enquanto que cada ligação
conta como um elétron para cada átomo.
A carga formal será a diferença entre o número de elétrons que o átomo tem em
sua camada de valência determinada por sua configuração eletrônica e o número de
elétrons presente na estrutura de Lewis. O somatório das cargas formais de todos os
átomos da estrutura de Lewis deve ser igual à carga apresentada pela molécula.
No CH4 o carbono faz quatro ligações (Figura 27). Portanto, o número de elétrons
na estrutura de Lewis, para o carbono, será de quatro elétrons. Como este é o número de
elétrons de sua camada de valência, a carga forma para o átomo de carbono nesta
molécula será igual a zero. Da mesma forma, os hidrogênios fazem uma só ligação.
Então, cada um possui um elétron na estrutura de Lewis. Como este também é o número
de elétrons em sua camada de valência, as cargas formais para os átomos de hidrogênio
têm valor igual a zero.
Avançando para o NO2–, o nitrogênio faz três ligações e tem dois elétrons não
ligantes (Figura 29), um total de cinco elétrons. Este também é o número de elétrons em
sua camada de valência, por isso, o nitrogênio tem carga forma igual a zero. Como os
oxigênios são diferentes na estrutura da Figura 29, precisam ser tratados de forma
diferente. Começando pelo oxigênio da dupla (duas ligações e quatro elétrons não
ligantes), tem-se um total de seis elétrons. O mesmo número de elétrons em sua camada
de valência – então a carga formal para este oxigênio é zero. O segundo oxigênio, faz
uma ligação e tem mais seis elétrons não ligantes, um total de sete elétrons na estrutura
de Lewis. Como o oxigênio só possui seis na camada de valência, a carga formal para
este oxigênio é de –1 (carga formal: 6 – 7 = –1).
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O somatório das cargas formais dos átomos que forma NO2– coincide com a carga
total do ânion (c.f. = 0 + 0 + (–1) = –1). Isto indica que a estrutura de Lewis está coerente.
Como as estruturas de Lewis para as moléculas derivam de um modelo muito
simples, elas têm diversos problemas. O primeiro deles é não prever a geometria espacial
da molécula, parâmetro fundamental em muitas propriedades. Outro fator é sua limitação
a moléculas que respeitem a regra do octeto. Apenas com as idéias de Lewis não é
possível explicar porque alguns átomos conseguem ir além do octeto. Um outro problema
pode ser visto na estrutura do NO2–. Na estrutura da Figura 29, um dos oxigênios faz uma
ligação dupla e outro faz uma ligação simples. Como os dois oxigênios são iguais, as
ligações poderiam estar invertidas. Qual seria a estrutura certa? Nenhuma? As duas?
Cada uma estaria certa em 50%? A solução para alguns destes problemas veio com a
Teoria da Ligação de Valência.
6.2 – Teoria da Ligação de Valência
A Teoria da Ligação de Valência (TLV) cresceu diretamente das idéias de Lewis
sobre o emparelhamento de elétrons de dois diferentes átomos. Em 1927, W. Heitler e F.
London propuseram um modelo baseado na recém formulada mecânica quântica para
tratar a molécula de hidrogênio. Este tratamento quântico ficou conhecido como método
da ligação de valência e foi desenvolvido nos anos seguintes, principalmente por Linus
Pauling e John C. Slater. Não se irá abordar aqui os aspectos matemáticos da TLV,
apenas suas consequências e os avanços que trouxe para o entendimento da ligação
química.
A idéia central da TLV vem do entrosamento dos orbitais atômicos de cada átomo
para formar ligações químicas. Se os orbitais se encontram de maneira frontal (Figura
30a), tem-se uma ligação do tipo sigma (σ). Se os orbitais estão paralelos (Figura 30b),
forma-se uma ligação do tipo π.
Figura 30. (a) Ligação σ entre um orbital do tipo s e um do tipo p e (b) Ligação π entre dois orbitais
do tipo p.
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51
Usaremos a molécula do CH4 para compreender estas idéias. A configuração
eletrônica dos átomos desta molécula são:
6C = 1s2 2s2 2p2 1H = 1s1
considerando apenas as camadas de valência de ambos os átomos, tem-se:
2s 2p
Para o Carbono:
4 orbitais 
 1s
Para os 4 Hidrogênios:
Sabe-se que o carbono fará uma ligação com cada hidrogênio (Figura 27) e como
é preciso um elétron de cada um dos átomos para formar estas ligações, os elétrons
emparelhados no orbital 2s do carbono precisarão ser desemparelhados. Além disso, um
desses elétrons precisará ser excitado até o orbital p vazio. Isto é chamado de promoção
do elétron. Por conta da promoção do elétron, o carbono estará com quatro orbitais com
um elétron cada, podendo então ligar-se a quatro outros átomos. Então, as ligações do
CH4 se formam da seguinte maneira:
2s 2p
1s 1s 1s 1s
Carbono
Hidrogênios
Segundo a TLV, tem-se uma ligação entre dois orbitais do tipo s e três ligações
entre orbitais s do hidrogênio e os do tipo p do carbono (Figura 31). Uma conclusão disto
é que uma das ligações do metano será diferente das demais, já que os orbitais
envolvidos são diferentes. No entanto, resultados experimentais dizem o contrário: todas
as ligações entre carbono e hidrogênio na molécula de CH4 são iguais em comprimento e
em termos energéticos. Para justificar observações como esta, foi introduzido um novo
conceito dentro da TLV: o de hibridação dos orbitais atômicos.
CEFET Química Química Inorgânica
52
Figura 31. Tipos diferentes de ligações: (a) entre dois orbitais s e (b) entre um orbital s e um p.
6.2.1 – Hibridação dos Orbitais Atômicos
Voltemos à etapa de promoção de um dos elétrons do orbital 2s para o orbital
vazio do subnível 2p. Existe um gasto de energia para promover o elétron para um orbital
de maior energia, que será compensado depois com a formação da ligação. Este gasto de
energia seria inexistente se os orbitais dos subníveis 2s e 2p tivessem a mesma energia.
No entanto, só orbitais do mesmo tipo podem ser degenerados.
Aqui entra uma particularidade dos orbitais. Como são as representações
espaciais das funções de onda, estas podem ser combinadas de diversas maneiras, de
forma que a energia total da molécula seja minimizada. A combinação das funções de
onda dão origem a outras funções, que geram outros orbitais, que serão as combinações
dos orbitais iniciais. Este é o fundamento da hidridação dos orbitais atômicos. Eles se
combinam de forma a minimizar a energia da molécula e, por fim, justificar as
observações experimentais.
6.2.1.1 – Hibridação do tipo sp3
Na hidridação do tipo sp3 um orbital do tipo s irá se combinar com três orbitais do
tipo p que formarão quatro orbitais híbridosdo tipo sp3. É este o tipo de hidridação com os
orbitais do carbono no metano, para citar um exemplo. No carbono do metano,
representa-se a hibridação da seguinte maneira:
2s 2p
4 orbitais híbridos do tipo sp3
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São estes 4 orbitais híbridos do tipo sp3 do carbono que irão se ligar aos 4
hidrogênios. Com o modelo da hibridação, todos os orbitais do carbono envolvidos nas
ligações com os hidrogênios são iguais, explicando porque as quatro ligações no metano
são idênticas.
A hibridação dos orbitais também define a geometria da molécula. Como os
orbitais se combinam buscando minimizar a energia do sistema, eles se distribuem no
espaço tentando minimizar as repulsões entre as ligações. Isto é, eles se afastarão o
máximo possível um do outro. Se houvessem duas ligações, o ângulo entre elas seria de
180°. Com quatro ligações (quatro orbitais do tipo sp3) a maior distância possível é
encontrada quando o ângulo entre as ligações é de 109,47°. Este arranjo espacial é
chamado de tetraedro (Figura 32). O tetraedro tem quatro faces triangulares e quatro
vértices. O átomo central, o carbono no CH4, se posiciona no centro do tetraedro
enquanto os outros átomos, os hidrogênios neste exemplo, ocupam os vértices do
tetraedro (Figura 33).
Figura 32. O tetraedro.
HH
H
H
C
H
C
H
H
H
109,47o
Figura 33. Algumas maneiras de visualizar a geometria tetraédrica do CH4.
6.2.1.2 – Ligações π: Hibridação do tipo sp2 e sp
As ligações π têm uma particularidade: os orbitais que formarão a ligação precisam
estar paralelos. Por esta razão, os orbitais que participarão de uma ligação do tipo π não
podem ser híbridos. Tomemos as móleculas de eteno (C2H4) e o dióxido de carbono (CO2)
como exemplos. Suas estruturas de Lewis são mostradas na Figura 34. Cada carbono no
eteno tem uma ligação do tipo π e três do tipo σ. No dióxido de carbono são duas ligações
CEFET Química Química Inorgânica
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π para um só carbono. Então, cada carbono do eteno terá que “reservar” um dos orbitais p
para fazer a ligação π. Da mesma forma, o carbono do CO2 terá de “reservar” dois de
seus orbitais do tipo p.
C C
H
H
H
H
O C O
Figura 34. As estruturas de Lewis do eteno e do dióxido de carbono.
Então, a hibridação dos carbonos no eteno seria do tipo sp2, conforme o esquema abaixo:
2s 2p 2s 2p Ligação π
1 orbital s + 2 orbitais p
 = 
 3 orbitais híbridos sp2
São os três orbitais híbridos do tipo sp2 que farão as três ligações σ de cada
carbono na molécula de eteno. Estas ligações formam um plano e têm um ângulo de 120°
entre elas. Este arranjo é chamado de trigonal plano (ou trigonal planar) e a ligação π
está perpendicular ao plano das ligações σ (Figura 35).
C
C
HH
HH
120o
Orbitais p não hibridizados que
formarão a ligação π
Figura 35. A geometria trigonal plana e a posição dos orbitais p não hibridizados.
Já para a molécula de dióxido de carbono, a hidridação será do tipo sp, uma vez
que apenas um dos orbitais p estará disponível para combinar-se com o orbital s:
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2s 2p 2s 2p
Para duas
ligações π1 orbital s + 1 orbital p
 =
 2 orbitais híbridos sp
As duas ligações σ, formadas pelos orbitais híbridos sp, estarão separadas por um
ângulo de 180°, dando origem a uma geometria angular (Figura 36). As ligações π são
perpendiculares entre si (como os orbitais p não hidridizados). Na Figura 36, uma das
ligações π é formada ao longo do eixo z (orbitais p azuis) enquanto a outra é formada no
eixo x (orbitais p vermelhos).
O C O
180o
CO O
zzz
y
x
x x
Figura 36. A geometria linear com os orbitais híbridos sp e as ligações π.
As hibridações do tipo sp3, sp2 e sp descrevem de maneira correta os compostos
onde o átomo central é um elemento que segue a regra do octeto. Moléculas que têm
como átomo central elementos do segundo período da Tabela Periódica apresentarão
uma destas hibridações citadas acima. No entanto, a formação de orbitais híbridos com
apenas orbitais do tipo s e p não conseguem explicar a existência de alguns compostos,
como o PCl5 ou o SF6.
6.2.1.3 – Expansão do Octeto
Tanto o PCl5 como o SF6 são exemplos de compostos onde o átomo central
ultrapassa o número de ligações esperado pela regra do octeto. Para formar um maior
número de ligações, os átomos centrais precisam de mais orbitais disponíveis que os do
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56
tipo s e p. E a partir do terceiro período da Tabela Periódica estes novos orbitais, do tipo
d, estão disponíveis. Para melhor entender este fenômeno, deve-se olhar em particular
cada caso.
O fósforo é o átomo central da molécula de PCl5. Situado no grupo 15, o mesmo
do nitrogênio, no bloco p da Tabela Periódica, o fósforo precisaria de três ligações para
completar o octeto. E isso é observado em alguns de seus compostos como nas
moléculas de PH3 ou PCl3. A configuração eletrônica do fósforo é:
15P = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p3
É a partir da terceira camada que o subnível d começa, estando disponível para
hibridizar com os orbitais do subnível 3s e 3p do fósforo. Aqui está a razão central da
expansão do octeto. Átomos que tenham orbitais d vazios em suas camadas de valência
podem usá-los para fazer um número maior de ligações. Como estes orbitais d vazios têm
energia próxima a dos outros orbitais preenchidos da camada de valência, a hibridação
com orbitais de um subnível vazio não tem um custo energético muito grande. No final, a
energia liberada com o maior número de ligações compensará o gasto na hibridação.
É por isso que os elementos do segundo período não expandem o octeto, pois em
suas camadas de valência, a segunda, não existem subníveis com orbitais vazios de
energia próxima da dos ocupados.
Então, o fósforo apresentará o seguinte esquema para a hibridação:
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3s
3p
3d
E
E
1 orbital s + 3 orbitais p + 1 orbital d
5 orbitais híbridos sp3d
4 orbitais do tipo d
 não hibridizados
Com cinco orbitais híbridos do tipo sp3d, o fósforo pode fazer as cinco ligações
observadas no composto PCl5. Na hibridação do tipo sp3d tem-se um arranjo espacial
bipiramidal triangular, pois a figura corresponde à duas pirâmides que dividem a mesma
base triangular (Figura 37). As ligações da base das pirâmides (ligações equatoriais)
estão separadas por ângulos de 120° entre si e por um ângulo de 90° com as ligações
axiais (Figura 38).
Cl
ClCl
P
Cl
Cl
Cl
P
Cl
Cl
Cl
Cl
Figura 37. A geometria bipiramidal triangular em diversas representações.
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Cl
ClCl
P
Cl
Cl
90o
120o
Figura 38. Ângulos da geometria bipiramidal triangular.
O caso do enxofre no SF6 será semelhante ao observado para o fósforo no PCl5. A
diferença está no número de ligações e no número de elétrons do enxofre em relação ao
fósforo. A configuração eletrônica do enxofre é
16S = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p4
Como precisa formar uma ligação a mais do que o fósforo no PCl5, o enxofre usará
um orbital d a mais, formando seis orbitais híbridos, do tipo sp3d2, segundo o esquema:
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3s
3p
3d
E
E
1 orbital s + 3 orbitais p + 2orbitais d
6 orbitais híbridos sp3d2
3 orbitais do tipo d
 não hibridizados
A distribuição das ligações no espaço segue um arranjo octaédrico (Figura 39).
Um octaedro pode ser descrito como sendo duas pirâmides unidas por uma base
quadrada. Todas as ligações fazem ângulos de 90° entre elas.
F
F
F
F
F
F
S F
F
F
F S
F
F
S
F
F F
F
F
F
Figura 39. Diferentes maneiras de se representar um octaedro.
Existem outros tipos de hibridaçãode orbitais, mas ou não são muito comuns ou
são pequenas variações dos tipos que foram apresentados, como a hibridação sd3 que
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60
apresenta as mesmas características da sp3, mas usa orbitais d ao invés dos orbitais p.
De toda forma, estas variações também são incomuns.
6.2.2 – Teoria da Repulsão dos Pares de Elétrons da Camada de Valência
No início dos anos 40, N.V. Sidgwick e H.M. Powell fizeram um levantamento das
estruturas das moléculas até então conhecidas e perceberam que era possível prever
suas formas aproximadas a partir do número de pares de elétrons na camada de valência
do átomo central da molécula. Anos mais tarde, em 1957, R.J. Gillespie e R.S. Nyholm
aperfeiçoaram as idéias de Sidgwick e Powell e desenvolveram o que se chamou de
Teoria da Repulsão dos Pares Eletrônicos da Camada de Valência (ou teoria VSEPR,
sigla do inglês Valence Shell Electron Pair Repulsion).
A teoria da VSEPR é extremamente útil para se determinar a geometria das
moléculas partindo apenas da estrutura de Lewis. Além disso, é mais simples usar o
modelo VSEPR que a teoria da hibridação, sendo que ambos darão, obrigatoriamente, o
mesmo resultado para as estruturas moleculares. De certa maneira, é mais fácil usar a
teoria VSEPR para descobrir a hibridação a partir da geometria do que o contrário.
A teoria da VSEPR é bem simples e sustenta que o arranjo das moléculas no
espaço é determinado pelas repulsões entre os pares de elétrons presentes no nível de
valência, uma vez que qualquer par de elétrons, ligante ou não ligante, ocupa espaço e
repelem um ao outro.
Pares de elétrons isolados repelem mais que os que participam de uma ligação,
uma vez que só são atraídos por um núcleo, enquanto que os pares ligantes são atraídos
por dois núcleos. Por conta dessa maior repulsão, eles “ocupam mais espaço” que os
demais e, com isso, causam distorções no arranjo espacial da molécula.
As ligações duplas apresentam maior repulsão que as simples, pois a densidade
eletrônica entre os dois átomos envolvidos é maior quando há ligações multiplas. Pelo
menos motivo, a ligação tripla apresenta maior repulsão que a dupla. Embora sejam
consideradas em termos repulsivos, as ligações π não são consideradas como pares de
elétrons ligantes para a definição da geometria molecular. Isto é, se um átomo central tem
três ligações σ e uma do tipo π, para o modelo da VSEPR só deve-se contar apenas três
pares de elétrons, uma vez que o par que forma a ligação π estará restrito ao espaço
definido pela ligação σ. A repulsão aumenta conforme a sequência: ligações simples <
ligações duplas < ligações triplas < pares isolados. O par de elétrons de maior repulsão
força a aproximação dos outros pares de elétrons.
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61
Também é preciso definir a diferença entre o arranjo espacial de uma molécula e
sua geometria. O arranjo espacial leva em conta qualquer par de elétrons, ligante ou
isolado. Está diretamente ligado à hibridação do átomo central. Por outro lado, a
geometria só leva em consideração as posições nucleares, isto é, só os átomos e
ligações são consideradas. Os pares de elétrons que não participam de ligações são
ignorados na geometria molecular. No entanto, ambos conceitos estão relacionados. A
geometria da molécula é dependente do arranjo espacial (e da hibridação).
A Tabela 11 mostra a relação entre o número de pares de elétrons, arranjos
espaciais, hibridação e a geometria das moléculas. A Figura 40 mostra alguns os
exemplos citados na Tabela 11.
Tabela 11. Relação entre número de pares de elétrons e parâmetros da geometria
molecular. Legenda: M = átomo central, L = pares de elétrons de ligações σ e E = pares
de elétrons não ligantes. Exemplos podem ser vistos na Figura 40.
N° de pares
de elétrons
Tipo de
molécula
Arranjo
espacial Hibridação Geometria Exemplo
2 ML2 Linear sp Linear BeH2
3 ML3 TrigonalPlanar
sp2 Trigonal Planar BCl3
3 ML2E TrigonalPlanar
sp2 Angular SO2
4 ML4 Tetraédrico sp3 Tetraédrica CH4
4 ML3E Tetraédrico sp3 Piramidal NH3
4 ML2E2 Tetraédrico sp3 Angular H2O
5 ML5 BipiramidalTrigonal
sp3d Bipiramidal
Trigonal
PCl5
5 ML4E BipiramidalTrigonal
sp3d Tetraédro
Distorcido
TeCl4
5 ML3E2 BipiramidalTrigonal
sp3d Forma de “T” ClF3
5 ML2E3 BipiramidalTrigonal
sp3d Linear I3–
6 ML6 Octaédrico sp3d2 Octaédrica SF6
6 ML5E Octaédrico sp3d2 Piramidal deBase Quadrada
BrF5
6 ML4E2 Octaédrico sp3d2 QuadradoPlanar
XeF4
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Be HH
Cl
B
Cl Cl
H
C
H
H
H
N
H
H
H
S
O O
O
H
H
Cl
P
Cl
Cl
Cl
Cl
Cl
Te
Cl
Cl
Cl
I
I
I
F
Cl
F
F
S
F
F F
F
F
F
Br
F
F F
F
F
Xe
F
F F
F
Figura 40. Estruturas das moléculas citadas na Tabela 11.
Uma forma simples de compreender como funciona a teoria VSEPR é analisando
o caso do CH4, NH3 e H2O. Na Figura 41 estão representadas as estruturas de Lewis para
estas moléculas. Em todas o átomo central tem quatro pares de elétrons: no CH4 são
quatro pares ligantes; no NH3 um não ligante e três ligantes e na molécula de H2O são
dois de cada tipo. Então, nas três moléculas, o arranjo espacial será tetraédrico. Este
arranjo define a hibridação do tipo sp3 para todas as moléculas. A geometria molecular,
como já foi dito, depende apenas dos átomos (ou dos pares ligantes), então o metano terá
geometria tetraédrica, a amônia piramidal e a água terá geometria angular. A outra
diferença está nos ângulos das ligações. No metano, os ângulos serão aqueles
observados para o tetraedro: 109,47° (Figura 33). Na amônia há um par de elétrons não
ligante, o que causará uma distorção nos demais ângulos. Como a repulsão do par de
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elétrons não ligante é maior, os demais ângulos serão menores, em torno de 107° entre
as ligações, como mostra a Figura 42. Na água a repulsão será ainda maior, pois são dois
os pares não ligantes. Por isso, o valor do ângulo entre as ligações da água será o menor
observado entre estas moléculas, por volta de 104° (Figura 43).
H C
H
H
H H N
H
H H O H
Figura 41. As estruturas de Lewis das moléculas de CH4, NH3 e H2O.
N
H
H
H
Maior Repulsão
107o
Figura 42. A geometria da amônia e seus ângulos.
O
HH
 Grande
Repulsão
Repulsão
Figura 43. A geometria da água e seus ângulos.
Com uma teoria de argumentos simples como a TLV e a VSEPR pode-se prever,
partindo-se das estruturas de Lewis, a geometria molecular e a hibridação das moléculas.
Mas isto ainda não é suficiente para compreender o comportamento de todas as
moléculas que se conhece. O “problema” do íon nitrito, NO2–, de ter duas estruturas
equivalentes (comentado anteriormente na página 49) é muito comum e tem grande
importância nas propriedades destas moléculas. A Teoria da Ligação de Valência propôs
uma primeira explicação para este fenômeno, que hoje é conhecido por ressonância.
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64
6.2.3 – Ressonância
Na Figura 44 podem ser vistas algumas moléculas que possuem mais de uma
estrutura de Lewis equivalentes. Uma só estrutura é insuficiente para descrever estas
moléculas, de forma que a estrutura “real” da molécula seria uma mistura de todos estas
estruturas, uma média de todos os estados. A “média” dessas estruturas é chamada de
estrutura de ressonância (Figura 45). A ressonância é a explicação para interessantes
fenômenos nas moléculas. Moléculas que apresentam ressonância são mais estáveis do
que se esperaria. Alguns exemplos são os carboxilatos, ânions e cátions vinílicos e
substâncias aromáticas.
N O
O
N O
O
C O
O
O 2
C O
O
O 2
C O
O
O 2
S O
OS O
O
Figura 44. Algumas moléculas com mais de uma estrutura de Lewis.
N O
O
C O
O
O 2
S O
O
Figura 45. Estrutura de ressonância para o nitrito, carbonato e dióxido de enxofre.
Por conta deste efeito, tem-se uma última regra para a construção das estruturas
de Lewis: considerar todas as estruturas de ressonância de uma espécie.
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Exercícios Parte B
1 – A Regra do Octeto é baseada em algumas propriedades atípicas dos elementos do
grupo 18. Quais são estas propriedades e que relação elas têm com oito elétrons?
2 – Por que os compostos iônicos não conduzem eletricidade no estado sólido mas o
fazem quando dissolvidos ou fundidos?
3 – Os haletos de potássio apresentam os seguintes valores de solubilidade em água à
10°C: KCl = 30g/100g de água; KBr = 60g/100g de água; KI = 135g/100g de água.
Sabendo que todos têm a estrutura cristalina do cloreto de sódio, explique o aumento da
solubilidade destes compostos utilizando para isso a energia do retículo cristalino.
DADOS: Raios iônicos: K+ = 152 pm; Cl– = 167 pm; Br– = 182 pm e I– = 206 pm.
4 – Defina polarizabilidade e poder polarizante.
5 – Segundo as regras de Fajans, a ligação entre um cátion pequeno e um ânion grande
será mais covalente que a ligação entre um cátion grande e um ânion grande. Explique
este efeito.
6 – Em prédios antigos onde o encanamento é de ferro a água da torneira apresenta uma
leve coloração amarela. Se um copo com essa água for deixado em repouso, passado um
tempo se observará um precipitado alaranjado. Baseado nestas informações, responda:
a) Como se forma este precipitado?
b) A água que contém este precipitado tem pH neutro?
7 – Descreva como a Teoria da Ligação de Valência explica a formação de uma ligação
covalente entre dois átomos.
8 – Escreva as estruturas de Lewis para as moléculas de NH4+ e H3O+. Mostre como os
orbitais dos átomos centrais serão hibridizados e explique que consequências isto trará
para os parâmetros geométricos da molécula (como comprimentos e ângulos de ligação).
9 – Por que os elementos a partir do terceiro período da tabela periódica podem expandir
o octeto e os do segundo período não o fazem?
10 – Escreva as estruturas de Lewis para cada espécie abaixo. Escreva também as
cargas formais para cada átomo, a hibridação do átomo central e a geometria de cada
espécie.
a) H2O b) SO2 c) PCl3 d) PCl5 e) BrF5 f) O3
g) NO2– h) NO2+ i) NH3 j) CH2O k) CO2 l) I3–
m) SO3 n) CH3+ o) ClF3 p) BH3 q) SF6 r) XeF4
s) NO3– t) SO42– u) CO32– v) PO43– x) TeCl4 z) TeCl6
11 – Identifique as moléculas do exercício 10 que apresentam ressonância e escreva
todas as estruturas possíveis para estas moléculas.
CEFET Química Química Inorgânica
66
Bibliografia Parte B
ATKINS, P. W. e SHRIVER, D. F. Inorganic Chemistry. 3a edição. Oxford: Oxford
University Press, 1999.
HUHEEY, J. E. Inorganic Chemistry: Principles of structure and reactivity. 3a edição. New
York: Harper Collins Publishers, 1983.
LEE, J. D. Química Inorgânica Não Tão Concisa. 4a edição. São Paulo: Editora Edgard
Blücher Ltda, 1996.
LEWIS, G. N. “Valence and tautomerism.” J. Am. Chem. Soc., 35, 1448 – 1455, 1913.
LEWIS, G. N. “The atom and the molecule.” J. Am. Chem. Soc., 38, 762 – 785, 1916.
Referências para as figuras:
Figuras 23, 24, 25, 30 e 31:
Extraídas e adaptadas de:
ATKINS, P. W. e SHRIVER, D. F. Inorganic Chemistry. 3a edição. Oxford: Oxford
University Press, 1999.
	Capa Parte B.pdf
	Inorg_B_2007.pdf

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