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TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Registro: 2015.0000196685 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408, da Comarca de Ourinhos, em que são apelantes CAFE E CEREAIS GIACON LTDA., MARA LUCIA ROQUE (JUSTIÇA GRATUITA) e HERMELINDO GIACON NETO (JUSTIÇA GRATUITA), são apelados CARLOS GOMES AZOIA (ESPÓLIO) e LUCIANA GOMES AZOIA (INVENTARIANTE). ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento aos recursos. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES (Presidente) e GIFFONI FERREIRA. São Paulo, 24 de março de 2015 ROSANGELA TELLES RELATORA Assinatura Eletrônica TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408 - Ourinhos - VOTO Nº 2/7 VOTO N° 2276 APELAÇÃO Nº: 0013780-35.2009.8.26.0408 APELANTES: CAFÉ E CEREAIS GIACON E OUTROS APELADOS: CARLOS GOMES AZOIA E OUTROS COMARCA: OURINHOS JUIZ: JOSE CARLOS HERNANDES HOLGADO FM APELAÇÃO. AÇÃO PAULIANA. Fraude demonstrada. Destinação de valores e prova da existência de outros bens - ônus do devedor. RECURSOS IMPROVIDOS. Recursos de apelação interpostos contra a r. sentença de fls. 558/561, que julgou procedente o pedido formulado para o fim de anular a escritura de venda e compra lavrada em 06.12.2006 do 1º Tabelião de Ourinhos, livro 353, página 072, e em consequência, os atos do registro nº 04 da matrícula nº 37.914, do Cartório de Registro de Imóveis local. Fixou custas e honorários pelos réus, os últimos em R$ 1.000,00. O Réu CAFÉ E CEREAIS GIACON LTDA aduz, em síntese, ausência dos requisitos para o reconhecimento da fraude contra credores e existência de outros bens capazes de solver a dívida. O valor auferido com a venda foi utilizado para o pagamento de encargos trabalhistas. Busca a reforma da r. sentença. (fls. 565/576). Os corréus MARA LUCIA ROQUE E HERMELINO GIACON NETO, aduzem, em síntese, ausência de demonstração da ciência do terceiro acerca da fraude cometida. Inexistência de débitos na data da lavratura da escritura pública em 06/12/2006. Existência de outros bens a época da venda, capazes de saldar o débito. Buscam a reforma da r. sentença (fls. 585/588). Recursos regularmente processados, com apresentação de contrarrazões a fls. 604/616. É o relatório. Os recursos não comportam provimento. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408 - Ourinhos - VOTO Nº 3/7 O decreto de procedência do pedido proferido pelo I. Juiz a quo deve ser mantido. Há mandamento constitucional que assegura a razoável duração dos processos, como direito individual previsto no art. 5, inciso LXXVIII, da CF e art. 8.1. do Pacto de São José da Costa Rica: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Artigo 8º - Garantias judiciais: 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. Nessa linha de intelecção, foram criados diversos instrumentos a fim de massificar e acelerar o julgamento dos litígios, como exemplo da súmula vinculante, julgamentos por amostragem na forma dos arts. 543-B e 543-C do CPC e art. 252 do Regimento Interno deste E. Tribunal de Justiça: Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo. § 1º Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte. § 2º Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos. § 3º Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. § 4o Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada. § 5º O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408 - Ourinhos - VOTO Nº 4/7 Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo. § 1o Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça. § 2o Não adotada a providência descrita no § 1o deste artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. § 3o O relator poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia. § 4o O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia. § 5o Recebidas as informações e, se for o caso, após cumprido o disposto no § 4o deste artigo, terá vista o Ministério Público pelo prazo de quinze dias. § 6o Transcorrido o prazo para o Ministério Público e remetida cópia do relatório aos demais Ministros, o processo será incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. § 7o Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem: I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou II - serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça. § 8o Na hipótese prevista no inciso II do § 7o deste artigo, mantida a decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial. § 9o O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância regulamentarão, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao processamento e julgamento do recurso especial nos casos previstos neste artigo. Art. 252. Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-sea ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver de mantê-la. Dessa forma, adoto como fundamento a r. decisão proferida a fls. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408 - Ourinhos - VOTO Nº 5/7 348/353, pois mostra-se irretorquível. Como se sabe, a ação pauliana nada mais é do que o meio legal de conservação da garantia patrimonial do credor ameaçada pelas alienações indevidas praticadas pelo devedor. Em regra, para a anulação do negocio jurídico por fraude contra credores exige-se os seguintes requisitos: a) consilium fraudis conluio fraudulento entre devedor e adquirente do bem e b) eventus damni prejuízo ao credor. No caso em tela, os fatos narrados permitem concluir pela existência dos requisitos mencionados. Assim como bem tratou o I. Juiz sentenciante: Com efeito, os adquirentes mantém estreito ligamento com os sócios da autora, pois a primeira Mara Lucia Roque é separada judicialmente do sócio Luiz Sérgio Giacon. Corrobora essa situação o fato de mesmo após a separação em 02.03.93 mantinha relacionamento com Luiz Sérgio, tanto é verdade que em 06.04.99 adveio Luiz Sergio Giacon Júnior, filho do casal (fls. 23/24). Da mesma forma, o outro adquirente, Hermelindo Giacon Neto, solteiro, filho do sócio Antônio Célio Giacon (fls. 22 e 43/45), também tinha ciência dos negócios da família. Comprovou ainda, o autor, que pendia várias execuções contra a empresa requerida (fls. 50/51). Dessa forma a insolvência da devedora tornou-se incontroversa a partir da constatação de que alienou o único bem imóvel do qual era proprietário, sede da empresa. Aliás, de se consignar que a ré não provou que possuía bens suficientes a responder por suas dívidas. A documentação juntada às fls. 545/556 ou seja uma escritura e a cópia da matrícula nº 1968, por si só, não comprovam o seu estado de solvência, garantindo todas as dívidas contraídas naquele período. A ela incumbia esse ônus. Não ficou evidenciado pelos demais requeridos não possuírem relação de parentesco ou amizade com os sócios da empresa. Portanto, restou comprovado nos autos os requisitos ensejadores da respectiva ação, quais sejam, a existência de um crédito, insolvibilidade do devedor (“eventus damni”), elemento subjetivo (“consilium fraudis”). Ademais, ainda que na data da lavratura da escritura de compra e venda do imóvel inexistissem apontamentos, conforme certidões colacionadas, era de conhecimento dos adquirentes a obrigação cartularizada pela nota promissória encartada a fls. 17, datada de 06 de junho de 2006, no valor de R$ 100.000,00, capaz de levar o devedor à insolvência. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408 - Ourinhos - VOTO Nº 6/7 Dispõe o art. 159 do CC: Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante. Há presunção de que os réus conheciam a existência da referida dívida, isso porque a corré Mara Lucia Roque é separada judicialmente do sócio Luiz Sérgio Giacon, mas com quem convivia intimamente, tanto que com ele teve um filho Luiz Sérgio Giacon Júnior nascido em 06.04.99 (fls. 23/24). E o corréu Hermelindo Giacon Neto é filho do sócio Antônio Célio Giacon (fls. 22 e 43/45). Nesse contexto, preleciona Jorge Americano citado por Silvio Rodrigues e Carlos Roberto Gonçalves1: “Embora a insolvência não seja notória, pode o adquirente ter motivos para conhecê-la. Jorge Americano, citado por Silvio Rodrigues, refere-se a algumas presunções que decorrem das circunstâncias que envolvem o negócio e reconhecidas pela jurisprudência: d) pelo parentesco ou afinidade entre o devedor e o terceiro”. Ainda nesse sentido, segue jurisprudência do STJ: Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Ação pauliana procedente. Fundamentação. 1. O decisum está devidamente fundamentado, afirmando o Tribunal que o crédito é anterior ao ato de alienação, que a cessão dos bens foi feita por preço meramente figurativo e envolvendo parentes altamente chegados (irmãos) e, ainda, que com a transação o patrimônio que restou ao devedor não se mostra suficiente ao pagamento do débito. Todos esses elementos demonstram a suficiência de fundamentação do Acórdão para que fosse provida a apelação e procedente a ação pauliana. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no Ag 254.863/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2000, DJ 27/03/2000, p. 102) Ademais, os réus não lograram êxito em demonstrar que a destinação do valor auferido com a venda do imóvel, foi para o pagamento de encargos trabalhistas. E, ainda que demonstrasse, tal não modificaria a presente conclusão. Tampouco comprovaram a existência de outros bens livres para a satisfação do débito 1 Direito Civil Brasileiro, volume I: parte geral. 8º ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 450/451. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 0013780-35.2009.8.26.0408 - Ourinhos - VOTO Nº 7/7 original de R$ 100.000,00 e do estado de solvência da empresa ré. As fotos de bens não se prestam a isso. E as matrículas dos imóveis colacionadas a fls. 545/556, em nada alteram este cenário, pois então gravadas de ônus. Nesse sentido: Ementa: AÇÃO PAULIANA. Competência recursal Resolução 623/2013 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Conflito de competência não suscitado. AÇÃO PAULIANA. Doação de imóvel aos filhos Legitimidade para o polo passivo, vez que participaram do negócio que se busca anular Consilium fraudis que se presume Crédito não constituído em definitivo Irrelevância - Para a caracterização da fraude contra credores não há sequer necessidade que o processo já tivesse sido ajuizado, do contrário já caracterizada poderia estar fraude de execução prova da existência de outros bens que garantiriam o débito a cargo do devedor. Sentença de procedência mantida. Recurso improvido2. (g.n.) FRAUDE CONTRA CREDORES. AÇÃO PAULIANA. ONUS DA PROVA. INCUMBE AO DEVEDOR PROVAR A PROPRIA SOLVENCIA. TEMA ADEMAIS QUE, DANDO MOTIVO, NA ORIGEM, PARA A ADMISSÃO DO RECURSO, NÃO PODE SER EXAMINADO, NESTE CASO, PELO STJ, PORQUE A ESPÉCIE TEVE SOLUÇÃO A LUZ DO CONJUNTO FATICO, SIMPLESMENTE. "A PRETENSÃO DE SIMPLES REEXAME DE PROVA NÃO ENSEJA RECURSO ESPECIAL" (SUMULA 7). 2. IMPOSSIBILIDADE DO REEXAME, EM RELAÇÃO A OUTROS ASSUNTOS SUSCITADOS PELO RECORRENTE, POR IDENTIDADE DE RAZÃO. 3. RECURSO NÃO CONHECIDO3. (g.n.) Posto isto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO aos recursos. ROSANGELA TELLES Relatora 2 TJSP. Apelação 0005112-74.2004.8.26.0659. Relatora: Marcia Tessitore. Comarca: Vinhedo Órgão julgador: 2ª Câmara de Direito Privado. j. 25/11/2014. 3 REsp 31.366/SP, Rel. Ministro NILSON NAVES, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/06/1993, DJ 09/08/1993, p. 15229.
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