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Arcadismo
arcadismo
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Características do Arcadismo
A imitação da natureza: ao contrário do Barroco, que é urbano, o Arcadismo propõe um retorno à ordem natural, como na literatura clássica, na medida em que a natureza adquire um sentido de simplicidade, harmonia e verdade. O bucolismo se torna um imperativo literário e o poeta imita a natureza em sua serenidade. A literatura pastoril não surge da vivência direta com a natureza – uma distância enorme separa os pastores reais dos árcades, que procuram no campo o esquecimento de suas frustrações de homens citadinos.
Imitação dos clássicos: processa-se, no período árcade, um retorno às fontes clássicas. O escritor árcade está preocupado em ser simples, racional e inteligente e, para se atingir esses requisitos, exigia-se a imitação dos autores da Antigüidade, principalmente os pastoris.
Ausência da subjetividade: a constante utilização de imagens clássicas tradicionais sedimenta uma poesia despersonalizada. O escritor adota um pseudônimo pastoril. A renúncia à subjetividade faz parte do decoro e da dignidade. O poeta deve expressar sentimentos comuns, sem o exagero barroco. O amor perde o conteúdo passional, a impulsividade – expressa-se de uma maneira elegante e discreta, exatamente porque as regras desse jogo exigem o comedimento.
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O Arcadismo no Brasil
O período árcade é o segundo período da literatura no Brasil e tem como centro cultural mais importante a região das cidades históricas de Minas Gerais.
Muitos daqueles que participaram das arcádias brasileiras haviam passado pela Universidade de Coimbra e haviam mantido contato com os grandes iluministas europeus. O grupo que, no Brasil, produzia literatura e ciência era, basicamente, o mesmo grupo de oposição política ao regime português. Os iluministas europeus pregavam a racionalidade e essa característica foi fundamental para os inconfidentes mineiros.
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Na literatura
Carpe Diem: literalmente, significa “aproveite a vida”. Para o poeta árcade, nossa existência é curta demais para ser desperdiçada. É necessário vivê-la intensamente, aproveitando tudo o que a vida pode oferecer de melhor. 
Fulgere Urbem: significa “fuga da cidade”. A natureza é o cenário ideal para que o poeta árcade escreva seus textos bucólicos. A cidade não apresenta nenhuma qualidade ideal já que é um ambiente que oprime e sufoca o poeta.
Pseudônimos: os poetas árcades assinam suas obras com pseudônimos de pastores gregos da região grega da Arcádia. Esta é uma característica não só do período árcade brasileiro mas do mundo inteiro.
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As arcádias
	O nome Arcadismo vem de uma região grega chamada Arcádia (que é uma região continental de tradição pastoril daquele país) e representa os valores que os poetas desejavam em suas obras. No Brasil, surgem as arcádias – academias literárias cujos componentes se propunham a continuar o Classicismo e adotavam nomes simbólicos.
Os árcades brasileiros, filhos da classe mais alta da sociedade mineira, tiveram contato com o Iluminismo em Portugal e discutiam, em grupos, nas arcádias, o racionalismo iluminista aplicado à tentativa de libertação do Brasil-colônia do julgo lusitano (metrópole).
 O Iluminismo designa o esforço cultural cujo objetivo era atualizar conceitos, leis e técnicas, visando a atingir maior eficácia e justiça na ordem social. Todo esse esforço baseava-se na concepção de que o progresso poderia trazer mais felicidade a um número maior de pessoas. Por isso, o século XVIII é conhecido como o Século das Luzes, momento histórico em que se acreditava que tudo podia ser explicado pela razão e pela ciência. 
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Escritores do Arcadismo
Manuel Maria du Bocage: merece destaque no Arcadismo português. Bocage nasceu em 1765, em Setúbal. Sua vida boêmia inclui a paixão por Gertrudes, que se transformaria em sua musa sob o pseudônimo de Gertrúria. Seguem-se episódios de uma vida aventureira e dissoluta, a que não faltam prisões e até o recolhimento forçado num mosteiro. Morreu em 1805, em Lisboa, vítima de aneurisma. Seu pseudônimo árcade era Elmano Sadino. A obra de Bocage compreende poesia satírica e lírica.
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Desejo Amante
Elmano, de teus mimos anelante,
Elmano em te admirar, meu bem, não erra;
Incomparáveis dons tua alma encerra,
Ornam mil perfeições o teu semblante:
 
Granjeias sem vontade a cada instante
Claros triunfos na amorosa guerra:
Tesouro que do Céu vieste à Terra,
Não precisas dos olhos de um amante.
 
Oh!, se eu pudesse, Amor, oh!, se eu pudesse
Cumprir meu gosto! Se em altar sublime
Os incensos de Jove a Lília desse!
 
Folgara o coração quanto se oprime;
E a Razão, que os excessos aborrece,
Notando a causa, revelara o crime.
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Escritores do Arcadismo
Claúdio Manuel da Costa: nasceu em Minas Gerais e, após completar o curso de Direito em Coimbra, viveu um tempo em Lisboa, onde entrou em contato com as novidades do Arcadismo. Retornando ao Brasil, tomou parte na Inconfidência Mineira. Morreu na prisão. Glauceste Satúrnio foi seu pseudônimo árcade, sendo Nise sua musa-pastora.
	Obras: “Obras” (1768) e “Vila Rica” (1837).
Tomás Antônio Gonzaga: filho de pai brasileiro e mãe portuguesa, nasceu no Porto (Portugal) em 1744. Estudou Direito em Coimbra, tendo voltado para o Brasil em 1782. Exerceu o cargo de juiz em Vila Rica, antes de ser preso junto com os outros inconfidentes. Sua pena foi o degredo para Moçambique, onde se casou com uma viúva. Seu pseudônimo árcade foi Dirceu. Marília é o pseudônimo que criou para Maria Dorotéa Joaquina de Seixas, sua musa, uma jovem de 16 anos por quem se apaixonou e por quem escreveu suas conhecidas Liras. Morreu em Moçambique, em 1810.
	Obras: “Marília de Dirceu” (1792) e “Cartas Chilenas” (1845).
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Escritores do Arcadismo
Basílio da Gama: nasceu em Minas Gerais e, órfão, foi para o Rio de Janeiro estudar em colégio de jesuítas. Estava para professar na Companhia quando ela foi dissolvida por ordem de Pombal. Abandonou-a e, após um tempo em Roma, foi para Portugal. Estando na Universidade de Coimbra, foi preso por suspeita de atividades jesuíticas, salvou-se do desterro dirigindo um poema de louvor ao casamento (epitalâmio) da filha do Marquês de Pombal. Pombal se tornaria seu protetor, especialmente depois da publicação de sua obra “O Uraguai”, poema que coloca Basílio da Gama dentro dos padrões ideológicos do Iluminismo, representada pelo primeiro-ministro.
	Obra: “O Uraguai” (1769).
Frei José de Santa Rita Durão: nascido em Mariana (1722), estudou no Colégio dos Jesuítas no Rio de Janeiro até os dez anos, partindo depois para a Europa, onde se formaria padre e de onde jamais retornaria. Faleceu em 1784.
	Obra: “Caramuru” (1781).
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Os autores árcades
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Poesias de Cláudio Manuel da Costa
Lira
Pastores, que levais ao monte o gado,
Vede lá como andais por essa serra,
Que para dar contágio a toda a terra,
Basta ver-se o meu rosto magoado:
Eu ando (vós me vedes) tão pesado;
E a pastora infiel, que me faz guerra,
É a mesma, que em meu semblante encerra
A causa de um martírio tão cansado.
Se a quereis conhecer, vinde comigo,
Vereis a formosura que eu adoro;
Mas não; tanto não sou vosso inimigo:
Deixai, não a vejais; eu vo-lo imploro;
Que se seguir quiserdes o que eu sigo,
Chorareis, ó Pastores, o que eu choro.
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Lira
Torno a ver-vos, ó montes; o destino
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte rico e fino.
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino.
Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço e mais valia,
Que da Cidade o lisonjeiro encanto;
Aqui descanse a louca fantasia;
E o que até agora se tornava em pranto,
Se converta em afetos de alegria.
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“Marília de Dirceu”
Lira I 
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d' expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela!
Eu vi o meu semblante numa fonte,
Dos anos inda não está cortado:
Os pastores, que habitam este monte,
Respeitam o poder do meu cajado.
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste;
Nem canto letra, que não seja minha,
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela! 
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Mas tendo tantos dotes da ventura,
Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
Depois que teu afeto me segura,
Que queres do que tenho ser senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
De um rebanho, que cubra monte, e prado;
Porém, gentil Pastora, o teu agrado
Vale mais q'um rebanho, e mais q'um trono.
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela!
 
Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do Sol em vão se atreve:
Papoula, ou rosa delicada, e fina,
Te cobre as faces, que são cor de neve.
Os teus cabelos são uns fios d'ouro;
Teu lindo corpo bálsamos vapora.
Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,
Para glória de Amor igual tesouro.
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela! 
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Leve-me a sementeira muito embora
O rio sobre os campos levantado:
Acabe, acabe a peste matadora,
Sem deixar uma rês, o nédio gado.
Já destes bens, Marília, não preciso:
Nem me cega a paixão, que o mundo arrasta;
Para viver feliz, Marília, basta
Que os olhos movas, e me dês um riso.
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela!
Irás a divertir-te na floresta,
Sustentada, Marília, no meu braço;
Ali descansarei a quente sesta,
Dormindo um leve sono em teu regaço:
Enquanto a luta jogam os Pastores,
E emparelhados correm nas campinas,
Toucarei teus cabelos de boninas,
Nos troncos gravarei os teus louvores.
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela! 
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Depois de nos ferir a mão da morte,
Ou seja neste monte, ou noutra serra,
Nossos corpos terão, terão a sorte
De consumir os dois a mesma terra.
Na campa, rodeada de ciprestes,
Lerão estas palavras os Pastores:
"Quem quiser ser feliz nos seus amores,
Siga os exemplos, que nos deram estes.“
		Graças, Marília bela,
		Graças à minha Estrela! 
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“Cartas Chilenas”
1ª. Carta
Amigo Doroteu, prezado amigo,
 Abre os olhos, boceja, estende os braços
 E limpa das pestanas carregadas
 O pegajoso humor, que o sono ajunta.
 Critilo, o teu Critilo é quem te chama;
 Ergue a cabeça da engomada fronha,
 Acorda, se ouvir queres coisas raras.
 "Que coisas ( tu dirás ), que coisas podes
 Contar que valham tanto, quanto vale
 Dormir a noite fria em mole cama,
 Quando salta a saraiva nos telhados
 E quando o sudoeste e outros ventos
 Movem dos troncos os frondosos ramos?“
 É doce este descanso, não to nego.
 Também, prezado amigo, também gosto
 De estar amadornado, mal ouvindo
 Das águas despenhadas brando estrondo. 
E vendo, ao mesmo tempo, as vãs quimeras,
Que então me pintam os ligeiros sonhos. 
Mas, Doroteu, não sintas que te acorde; 
Não falta tempo em que do sono gozes: 
Então verás leões com pés de pato, 
Verás voarem tigres e camelos, 
Verás parirem homens e nadarem 
Os roliços penedos sobre as ondas. 
Porém que têm que ver estes delírios 
Co'os sucessos reais, que vou contar-te? 
Acorda, Doroteu, acorda, acorda; 
Critilo, o teu Critilo é quem te chama: 
Levanta o corpo das macias penas; 
Ouvirás, Doroteu, sucessos novos, 
Estranhos casos, que jamais pintaram 
Na idéia do doente, ou de quem dorme, 
Agudas febres, desvairados sonhos.
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Ora pois, doce amigo, vou pintá-lo
Da sorte que o topei a vez primeira;
Nem esta digressão motiva tédio
Como aquelas que são dos fins alheias, 
Que o gesto, mais o traje nas pessoas
Faz o mesmo que fazem os letreiros
Nas frentes enfeitadas dos livrinhos,
Que dão, do que eles tratam, boa idéia.
Tem pesado semblante, a cor é baça,
O corpo de estatura um tanto esbelta,
Feições compridas e olhadura feia;
Tem grossas sobrancelhas, testa curta,
Nariz direito e grande, fala pouco
Em rouco, baixo som de mau falsete;
Sem ser velho, já tem cabelo ruço,
E cobre este defeito e fria calva
À força de polvilho, que lhe deita.
Pois se queres ouvir notícias velhas
Dispersas por imensos alfarrábios,
Escuta a história de um moderno chefe,
Que acaba de reger a nossa Chile,
Ilustre imitador a Sancho Pança.
E quem dissera, amigo, que podia
Gerar segundo Sancho a nossa Espanha!
Não cuides, Doroteu, que vou contar-te.
Por verdadeira história uma novela
Da classe das patranhas, que nos contam
Verbosos navegantes, que já deram
Ao globo deste mundo volta inteira.
Uma velha madrasta me persiga,
Uma mulher zelosa me atormente,
E tenha um bando de gatunos filhos,
Que um chavo não me deixem, se este chefe
Não fez ainda mais do que eu refiro. 
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Os grandes do país, com gesto humilde, 
Lhe fazem, mal o encontram, seu cortejo;
Ele austero os recebe, só se digna 
A frouxar do toutiço a mola um nada,
Ou pôr nas abas do chapéu os dedos.
Caminha atrás do chefe um tal Robério,
Que entre os criados tem respeito de aio:
Estatura pequena, largo o rosto,
Delgadas pernas e pançudo ventre,
Sobejo de ombros, de pescoço falto;
Tem de pisorga as cores, e conserva
As bufantes bochechas sempre inchadas.
Bem que já velho seja, inda presume
De ser aos olhos das madamas grato. 		 (trecho da obra)
Ainda me parece que o estou vendo
No gordo rocinante escarranchado
As longas calças pelo umbigo atadas,
Amarelo colete e sobre tudo
Vestida uma vermelha e justa farda.
De cada bolso da fardeta pendem
Listadas pontas de dois brancos lenços;
Na cabeça vazia se atravessa
Um chapéu desmarcado, nem sei como
Sustenta o pobre só do laço o peso.
Ah! tu, Catão severo, tu que estranhas
O rir-se um cônsul moço, que fizeras
Se em Chile agora entrasses e se visses
Ser o rei dos peraltas quem governa?
Já lá vai, Doroteu, aquela idade
Em que os próprios mancebos, que subiam
À honra do governo, aos outros davam
Exemplos de modéstia, até nos trajes. 
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“O Uraguai”
Este poema épico critica drasticamente os jesuítas, antigos mestres do autor Basílio da Gama. Ele alega que os jesuítas apenas defendiam os direitos dos índios para serem eles mesmos seus senhores. O enredo em si é a luta dos portugueses e espanhóis contra os índios e os jesuítas dos Sete Povos das Missões. De acordo com o tratado de Madrid, Portugal e Espanha fariam uma troca de terras no sul do País: Sete Povos das Missões para os portugueses e Sacramento para os espanhóis. Os nativos locais recusam-se a sair de suas terras, travando uma guerra. Foi escrito em versos brancos decassílabos, sem divisão de estrofes e divididos em cinco cantos. Para muitos estudiosos de literatura, a obra marca o início do Romantismo.
No Canto I, o poeta apresenta já o campo de batalha coberto de destroços e de cadáveres, principalmente de indígenas. Voltando no tempo, apresenta um desfile do exército luso-espanhol, comandado por Catâneo (Gomes Freire de Andrade). No Canto II, relata o encontro entre os caciques Cepê e Cacambo e o comandante português. Gomes Freire de Andrade à margem do rio Uruguai. O acordo  é impossível porque os jesuítas portugueses se negavam a aceitar a nacionalidade espanhola. Ocorre, então, o combate entre os índios e as tropas luso-espanholas. Os índios lutam valentemente, mas são vencidos pelas armas de fogo dos europeus. Cepé morre em combate. Cacambo comanda a retirada. 
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No Canto III, o falecido Cepê aparece em sonho a Cacambo
sugerindo o incêndio do acampamento inimigo. Cacambo aproveita a sugestão de Cepé com sucesso. Na volta da missão, Cacambo é traiçoeiramente assassinado (envenenado) por ordem do jesuíta Balda, o vilão da história, que deseja tornar seu ilegítimo filho Baldeta cacique, em lugar de Cacambo. Observa-se aqui uma forte crítica aos jesuítas. No Canto IV, o poeta apresenta a marcha das forças luso-espanholas sobre a aldeia dos índios, onde se prepara o casamento de Baldeta e Lindóia. A moça , entretanto, prefere a morte por meio de uma picada de cobra venenosa. Com a chegada das tropas de Gomes Freire, os índios se retiram após queimarem a aldeia.  No Canto V, o poeta expressa suas opiniões a respeito dos jesuítas, colocando-os como responsáveis pelo massacre dos índios pelas tropas luso-espanholas. Eram opiniões que agradavam ao Marquês de Pombal, o todo-poderoso ministro de D. José I. Nesse mesmo canto, ainda aparece a homenagem ao general Gomes Freire de Andrade, que respeita e protege os índios sobreviventes. Convém ressaltar que “O Uraguai”, além das características árcades, já apresenta, algumas tendências românticas na descrição da exuberante natureza brasileira.
A obra é um epitalâmio, ou seja, é dedicada ao casamento da filha do Marquês de Pombal, líder português responsável pelo Brasil colonial. Com a dedicatória, o autor esperava conseguir a absolvição para o desterro, o que deu resultado eficaz.
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Missões jesuíticas no Brasil
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Este lugar delicioso e triste
Cansada viver, tinha escolhido
Para morrer, a mísera Lindóia.
Lá reclinada, como que dormia,
Na branda relva e nas mimosas flores,
Tinha a face na mão e a mão no tronco
De um fúnebre cipreste, que espalhava
Melancólica sombra. Mais de perto
Descobrem que se enrola em seu corpo
Verde serpente, e lhe passeia, e cinge
Pescoço e braços, e lhe lambe o seio.
Fogem de a ver assim, sobressaltados,
E param cheios de temor ao longe,
E nem se atrevem a chamá-la, e temem
Desperte assustada e irrite o monstro
E fuja, e apresse no fugir a morte.
Porém o destro Caitutu, que treme
Do perigo da irmã, sem mais demora
Dobrou as pontas do arco, e quis
Três vezes soltar o tiro, e três vezes
Vacilou entre a ira e o temor. Enfim,
Sacode o arco e faz voar a aguda seta,
Que toca o peito de Lindóia, e fere
A serpente na testa, a boca e os dentes
Deixou cravados no vizinho tronco.
Açouta o campo co’a ligeira cauda
O irado monstro, e em tortuosos giros
Se enrosca no cipreste, e verte envolto
Em negro sangue o lívido veneno.
Leva no braços a infeliz Lindóia
O desgraçado irmão que, ao despertá-la
Conhece, com que dor! No frio rosto
A morte de Lindóia
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Os sinais do veneno, e vê ferido
Pelo dente sutil o branco peito.
Os olhos, em que Amor reinava, um dia,
Cheios de morte; e muda aquela língua
Que ao surdo vento e aos ecos tantas vezes
Contou a larga história de seus males.
Nos olhos, Caitutu não sofre o pranto.
E rompe em profundíssimos suspiros,
Lendo na testa da fronteira gruta
De sua mão já trêmula gravado
O alheio crime e a voluntária morte.
É por todas as partes repetido
O suspirado nome de Cacambo.
Inda conserva o pálido semblante
Um não sei quê de magoado e triste;
Que os corações mais duros enternece.
Tanto era bela no seu rosto a morte! 
 (trecho de “A morte de Lindóia”)
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“Caramuru”
A ação do poema é o descobrimento da Bahia, feito quase no meio do século XVI pelo nobre Diogo Álvares Correia, compreendendo em vários episódios a história do Brasil, os ritos, tradições, milícias dos seus indígenas, como também a natural, e política das colônias.
Diogo Álvares passava ao novo descobrimento da capitania de São Vicente, quando naufragou nos baixos de Boipebá, vizinhos à Bahia. Salvaram-se, com ele, seis dos seus companheiros (que foram devorados pelos gentios antropófagos) e ele esperado, por vir enfermo, para melhor nutrido servir-lhes de mais gostoso pasto. Encalhada a nau, deixaram-no tirar dela pólvora, bala, armas e outras espécies, de que ignoravam o uso. Com uma espingarda, matou ele caçando certa ave, de que espantados, os bárbaros o aclamaram Filho do Trovão (Caramuru). Combatendo com os gentios do sertão, venceu-os e fez-se dar obediência daquelas nações bárbaras. Ofereceram-lhe os principais do Brasil as suas filhas por mulheres; mas, de todas, escolheu Paraguassu, que depois conduziu consigo à França, ocasião em que outras cinco Brasilianas, seguiram a nau francesa a nado, por acompanhá-lo, até que Moema se afogou e, intimidadas, as outras se retiraram.
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