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AVALIAÇÃO DE BIODIGESTORES COMO SISTEMAS SUSTENTÁVEIS PARA TRATAMENTO DE EFLUENTES DA SUINOCULTURA Joney Tadeu Papi Muzzi de Gouvêa1, Carlos Alberto Leite Soares2 RESUMO O crescimento acentuado na quantidade de suínos produzidos no país, juntamente com a crescente demanda mundial por carne e alinhados à falta de planejamento de infraestrutura sanitária para a destinação final dos efluentes gerados pela suinocultura, geraram nas últimas décadas, no Brasil, um grande passivo ambiental, sobretudo nas pequenas propriedades rurais, com baixo acesso aos sistemas de tratamento. Os biodigestores apresentam-se como uma alternativa de tratamento dos efluentes rurais, com fácil manejo e implantação, o que os tornam uma das melhores formas de mitigar os passivos ambientais gerados pela suinocultura. Com base em levantamentos bibliográficos foi possível detalhar a concepção dos biodigestores empregados no meio rural e identificar suas potencialidades para utilização em propriedades rurais produtoras de suínos. Através do dimensionamento de um sistema de tratamento para um plantel hipotético de suínos, foi possível verificar quantitativamente dados relacionados à geração do biogás, geração de energia e redução de potencial poluidor do efluente. Palavras chave - biodigestores; efluentes rurais; suinocultura, biogás, fertirrigação. INTRODUÇÃO De acordo com o Censo Agropecuário Brasileiro, elaborado pelo IBGE (2017), o Brasil possuía 1.445.363 estabelecimentos agropecuários produtores de suínos e um plantel na ordem de 39.176.271 de cabeças de suíno. Deste total, a região sul do país concentrava 54% do rebanho, seguida pelo sudeste com 16%, centro-oeste com 15%, nordeste com 10% e norte com apenas 4%. Entre os anos de 1996 e 2017, o número de cabeças de suínos aumentou de 1 Engenheiro Civil, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, joneymuzzi@gmail.com 2 Orientador, Professor do curso de Especialização em Engenharia Sanitária e Ambiental, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, carleite61@hotmail.com 27.811.244 para 39.176.271, o que representa um incremento de 41% na quantidade de animais produzidas no país (IBGE, 2017). O crescimento na capacidade produtiva da agropecuária brasileira e na quantidade de suínos não foi acompanhada por um crescimento proporcional no manejo e tratamento dos dejetos gerados por esse tipo de produção. Os impactos ambientais ocasionados pela produção animal confinada, na qual a suinocultura figura como uma das principais, são reconhecidos como um problema já identificado em diversas partes do mundo (MIRANDA, 2005). Dadas as características predominantes de produção de suínos, grandes quantidades de animais confinados em áreas reduzidas e, muitas vezes, com propriedades produtoras próximas umas das outras, a suinocultura é considerada uma atividade produtiva de elevado potencial poluidor (DAL MAGO, 2009). A forma com que a lógica produtiva da suinocultura foi elaborada permitiu otimizar a produção ocupando uma menor área agrícola por suíno alojado. Miranda (2005), relata que a produção industrial de suínos permitiu que a área agrícola por animal fosse reduzida, entretanto a aplicação de dejetos diretamente no solo se manteve como o manejo predominante. A prática de manejo adotada em somatória ao volume de dejetos produzidos não permite que as culturas agrícolas assimilem todos os nutrientes gerados, tornando os dejetos suínos uma crescente causa da degradação da qualidade ambiental. O despejo dos efluentes e dejetos oriundos da produção de suínos, muito comumente, são realizados diretamente nos solos sem nenhum tipo de tratamento prévio. Dal Mago (2009) destaca que devido a quantidade produzida, o solo e as culturas agrícolas perdem a capacidade de absorção e de assimilação de todo o dejeto gerado, ocasionando a redução da qualidade ambiental e por consequência, gerando poluição no solo, água e ar. Para Miranda (2005), quando lançados no ambiente sem o devido tratamento, os dejetos suínos provocam a poluição dos recursos hídricos, causando a diminuição do oxigênio dissolvido (OD) e podem ocasionar o aumento de nutrientes, que em excesso, geram danos a fauna e flora aquática. Do processo de acondicionamento diretamente no solo, os principais problemas e efeitos nocivos são gerados pela emissão do nitrogênio, fósforo e demais minerais existentes nos dejetos (MIRANDA, 2005). Como resultante do acúmulo desses minerais no solo e o carreamento destes pela chuva, pode-se destacar a possibilidade e eutrofização dos cursos d’água. O aumento exagerado na quantidade de fósforo e nitrogênio na água, gera a eutrofização, culminando no aumento da quantidade de algas e na consequente baixa na quantidade de oxigênio presente no meio. A redução da quantidade de oxigênio dissolvido na água acarreta a mortandade da fauna e flora aquática. Os efluentes gerados pelas granjas suínas, segundo Belli Filho (1995) apud Dal Mago (2009), são compostos basicamente por uma mistura de fezes e urina dos suínos, água de higienização e lavagem dos equipamentos, resíduos de ração, água dos bebedouros dos animais e eventuais águas pluviais. O tamanho do rebanho, a quantidade de água empregada na limpeza das baias e desperdícios gerados nos bebedouros influenciam diretamente na quantidade de dejetos gerados. (OLIVEIRA et al., 1993). Perdas com a água, por exemplo, podem gerar aumento nos custos de armazenamento, transporte, tratamento e distribuição dos dejetos, devido ao acréscimo no volume dos efluentes gerados. Ainda segundo Oliveira et al. (1993), outro ponto fundamental para a quantidade de dejetos produzidos diariamente está relacionado ao peso vivo de cada animal. A quantidade de resíduos gerados por cabeça pode variar de 4,9% a 8,5% do peso vivo/dia, o que pode corresponder de 15kg a 100kg dia. A produção diária média de esterco por suíno pode ser observada na tabela 01. Tabela 01: Produção média diária de esterco (kg), esterco + urina (kg) e dejetos líquidos por animal por fase. Categoria de suínos Esterco kg/dia Esterco + urina kg/dia Dejetos líquidos l/dia 25 – 100 kg 2,30 4,90 7,00 Porcas em gestação 3,60 11,00 16,00 Porcas em lactação 6,40 18,00 27,00 Machos 3,00 6,00 9,00 Leitão desmamado 0,35 0,95 1,40 Fonte: Adaptado de Oliveira et al. (1993). Nesse contexto, faz-se extremamente necessária a inclusão, disseminação e implantação de sistemas de tratamento de efluentes que permitam aos produtores rurais mitigar os passivos ambientais gerados pela suinocultura, de forma conjunta a uma sustentabilidade econômico- financeira da sua propriedade. Os sistemas anaeróbios de tratamento, destacando-se os biodigestores, despontam como alternativas a serem implantadas nessas propriedades rurais. SISTEMAS ANAERÓBIOS DE TRATAMENTO Apesar do termo biodigestor também ser empregado para sistemas de tratamento anaeróbio de outras fontes de efluentes, o conceito de biodigestor normalmente é utilizado para denominar os tratamentos anaeróbios utilizados no tratamento de dejetos suínos (DAL MAGO, 2009). Chernicharo (2016), ressalta que os digestores anaeróbios têm sido amplamente utilizados para o tratamento de efluentes biológicos, incluindo culturas agrícolas, dejetos de animais, lodos de ETEs. Fatores como a viabilidade econômica de implantação e a possibilidade de geração de subprodutos influenciam no tipo de sistema a ser adotado. Para Monteiro (2005), a utilização de sistemas anaeróbios para o tratamento dos efluentes é fundamentada na relação custo benefício para o produtor rural, sobretudo pela possibilidade de geração de insumos resultantes do tratamento, como o condicionamento do lodo no solo, como biofertilizante, a geração de energia a partir do biogás e a produção de macrófitas de superfície que podem ser utilizadas como alimento para a piscicultura. O sistema de tratamento mais simples empregado nas propriedades rurais é o de lagoa anaeróbia, conhecida popularmente no meio rural como esterqueira. Segundo Monteiro (2005), este tipo de lagoa possui a função de captar o volume de dejetos líquidos produzidos e reserva- los por 120 dias, para que ocorra o processo de fermentação anaeróbia da matéria orgânica. As lagoas anaeróbias são uma forma alternativa de tratamento, onde a alta carga de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio), ocasionada pela grande presença de matéria orgânica, é essencial para que as condições anaeróbias sejam estabelecidas. Esse tipo de lagoa tem sido empregado no tratamento de esgoto doméstico e industrial com características predominantemente orgânicas, com altos teores de DBO, como matadouros, laticínios, bebidas e etc. (VON SPERLING, 2017). Ainda segundo Von Sperling (2017), as lagoas anaeróbias atingem uma eficiência de 50% a 70% na remoção da DBO, por este motivo, é necessária a utilização de um sistema secundário de tratamento, utilizando-se normalmente uma lagoa facultativa, desta forma a eficiência na remoção da DBO estaria entre 75% e 85%. A figura 01 demonstra o sistema de lagoa anaeróbia seguida de lagoa facultativa. Figura 01: Sistemas de lagoa anaeróbia seguido por lagoa facultativa. Fonte: Von Sperling (2017). O processo de digestão anaeróbia existente no sistema ocorre em duas etapas: na primeira, caracterizada pela presença de bactérias acidogênicas, ocorre a conversão da matéria orgânica em moléculas mais simples e depois em ácidos. Na segunda etapa, caracterizada pela presença de bactéricas metanogênicas, ocorre a remoção da DBO, juntamente com a matéria orgânica e ácidos, sendo convertida em metano, gás carbônico e água, principalmente (VON SPERLING, 2017). A eficiência do sistema de tratamento composto por uma lagoa anaeróbia seguida por uma lagoa facultativa pode ser observada na tabela 02. Tabela 02: Característica do sistema para remoção de DBO. Item geral Item específico Sistema de lagoa anaeróbia seguida de lagoa facultativa Eficiência DBO (%) 75 – 85 DQO (%) 65 – 80 SS (%) 70 – 80 Amônia (%) < 50 Nitrogênio (%) < 60 Fósforo (%) < 35 Coliformes (%) 90 - 99 Fonte: Adaptado de Von Sperling (2017). Chernicharo (2016) apresenta outras formas de tratamento anaeróbio para os efluentes com alta carga orgânica. Dentre estes, podem ser destacados os Digestores Anaeróbios de Lodo, Tanque Séptico e os Reatores de Fluxo Ascendente e Manda de Lodo (UASB). Esses sistemas normalmente são constituídos de uma câmara de digestão, construída normalmente em estrutura de concreto pré-fabricada ou moldada in loco, onde ocorrerá a sedimentação dos sólidos suspensos, a formação do lodo, a digestão da carga orgânica e a formação do biogás. O sistema construtivo das câmaras de digestão anaeróbia, com materiais como o concreto armado, torna esses sistemas potencialmente mais caros quando comparados ao sistema de lagoas anaeróbias. BIODIGESTORES RURAIS Os sistemas de tratamento anaeróbio empregados no meio rural normalmente recebem o nome de biodigestor. Existem alguns modelos distintos de biodigestores, dentre os quais podem ser destacados os modelos: Indiano, Chinês, Canadense (fluxo tubular) e o de Batelada. Para Oliveira (2004), esses modelos de biodigestores têm se mostrado atraentes devido ao baixo custo, devido à pouca tecnologia associada e a facilidade de manutenção. Oliveira et al, (1993), descreve os biodigestores como sistemas constituídos, normalmente, por um tanque de digestão (ou câmara) e por um gasômetro (campânula), sendo o primeiro, responsável pelo processo de armazenagem e de digestão anaeróbia do efluente e o segundo pela armazenagem do biogás produzido pela digestão anaeróbia. Monteiro (2005), descreve os biodigestores como câmaras destinadas a realizar a digestão anaeróbia da matéria orgânica e que geram, como resultados do processo, o biogás e o biofertilizante. Ainda segundo o autor, os biodigestores podem ser do tipo batelada ou contínuo. A frequência de fornecimento de dejetos para tratamento é determinante para a definição do tipo de sistema adotado, batelada ou contínuo. Nas propriedades produtoras de suínos, por exemplo, em que os dejetos são gerados diariamente e por consequência a limpeza das granjas também é diária, são indicados os sistemas contínuos (Canadense, Indiano e Chinês). Para Oliveira (2004), os modelos indiano e canadense (lagoa) possuem fácil execução e são muito úteis nos casos em que exista uma produção contínua de dejetos, como é o caso dos sistemas de produção de suínos. Em granjas de aves de corte, onde a retirada dos dejetos ocorre apenas na troca da cama da granja, em tempos espaçados, é indicado o sistema de batelada, onde o biodigestor é alimentado uma única vez com o efluente a ser tratado sendo descarregado apenas quando todo o processo de tratamento é concluído. A essência de funcionamento dos biodigestores é muito similar aos sistemas de lagoas anaeróbias, tanques sépticos e UASB. Sendo que esses sistemas também são empregados em algumas propriedades rurais no país. As concepções dos modelos indiano, chinês e batelada são bastante similares. Segundo Oliveira (2004), as câmaras de digestão desses modelos normalmente são construídas abaixo do nível do solo, com materiais como pedra, tijolos e concreto. No topo dessas câmaras são instaladas campânulas para o armazenamento do biogás, que podem ser feitas de ferro, fibra de vidro ou PVC. Nos modelos indiano e de batelada, as campânulas normalmente são concebidas para possuírem certa mobilidade no sentido vertical, no modelo chinês a campânula é fixa. O esquema construtivo de um biodigestor modelo indiano pode ser visualizado na figura 02. Figura 02: Esquema construtivo de um biodigestor modelo indiano. Fonte: Deganutti et al (2002). Onde: H é a altura do nível de substrato Di é o diâmetro interno do biodigestor Dg é o diâmetro do gasômetro; Ds é o diâmetro interno da parede superior; h1 é a altura ociosa (reservatório do biogás); h2 é a altura útil do gasômetro; a é a altura da caixa de entrada; e é a altura de entrada do cano com o efluente. Oliveira (2004) ressalta que o modelo de lagoa anaeróbia coberta com lona de PVC, modelo de biodigestor denominado Modelo Canadense, tem ganhado destaque no uso nas propriedades rurais devido ao seu menor custo, menor manutenção e facilidade de implantação, além de proporcionar a captação de biogás. A lagoa anaeróbia coberta possui uma concepção muito similar a uma esterqueira, diferenciando-se pela presença da cobertura, feita de lona de PVC ou PEAD, responsável pela acumulação do biogás para posterior captação (DAL MAGO, 2009). O dimensionamento do biodigestor modelo canadense segue os mesmos princípios de uma lagoa anaeróbia, considerando, por exemplo, o volume de efluentes gerados diariamente pela propriedade, o tempo de retenção hidráulica para o tratamento e a geometria da lagoa. O sistema de biodigestor Canadense composto por biodigestor seguido de lagoa facultativa pode ser visualizado na imagem 01. Imagem 01: Biodigestor modelo Canadense seguido de lagoa facultativa. Fonte: Sansuy (2019). O tempo de retenção hidráulica (TRH) adotado nos biodigestores, ou seja, o período em que o efluente ficará inserido no sistema, varia de acordo com o nível de contaminação do efluente, sendo este período estimando entre 30 e 50 dias, mas é comum encontrar sistemas com TRH variando entre 22 a 30 dias (OLIVEIRA, 2004). O dimensionamento do biodigestor será influenciado por fatores como a área disponível para a implantação deste e pela quantidade de dejetos a serem tratados. Monteiro (2005), ressalta que o tamanho do biodigestor deve ser condizente com a demanda energética da propriedade, a capacidade de consumo do biogás produzido, com o número de animais produtores de dejetos e com a área para aplicação do biofertilizante. A produção do biogás é apenas uma das vantagens obtidas pela biodigestão anaeróbia, podem também ser destacados o tratamento do efluente, a redução de patógenos e DBO (demanda bioquímica de oxigênio), a produção de biofertilizante, baixos custos operacionais e a possibilidade de se executar sistemas descentralizados de tratamento de efluentes na propriedade (OLIVEIRA, 2004). BIOGÁS O biogás é um subproduto oriundo do processo de tratamento anaeróbio que pode ser composto por uma mistura e concentração de diversos gases. Os principais gases componentes do biogás são o gás metano (CH4) e o gás carbônico (CO2) (DAL MAGO, 2009). A formação do biogás, de acordo com Oliveira (2004), parte do processo de digestão anaeróbia, que consiste em um combinado de microrganismos que metabolizam materiais orgânicos complexos como carboidratos, lipídios e proteínas e produzem metano (CH4), dióxido de carbono (CO2) e material celular. Monteiro (2005) aponta o gás metano como o principal componente do biogás, com características próprias como as de ser inodoro, incolor e insípido. O autor aponta ainda a existência de outros gases na composição do biogás, estes com características como odor ácido, semelhantes ao de vinagre e ovo podre, como é o caso do gás sulfídrico (H2S). A composição do biogás gerado no tratamento anaeróbio da suinocultura constitui-se de uma mistura de metano (65-70%), gás carbônico (30-35%) e vapor de água, sendo que a presença do metano confere ao biogás o potencial energético que o permite ser um substituto do gás liquefeito de petróleo (GLP), da lenha, de combustíveis fósseis para alimentação de motores geradores de energia e como fonte de geração de energia térmica (OLIVEIRA, 2004). A composição média do biogás pode ser observada na tabela 02. Tabela 02: Composição média da produção de biogás. Composição de Gases Percentagem (%) Metano 55 – 70 Dióxido de Carbono 27 – 45 Nitrogênio 3 – 5 Hidrogênio 1 – 10 Oxigênio 0,1 Sulfeto de hidrogênio Traços Monóxido de Carbono 0,1 Fonte: National Academy of Sciences, (1977); La Farge (1995) apud Oliveira (2004). O potencial calorífico e a pureza do biogás são diretamente relacionadas a quantidade de metano existe no composto, quanto maior essa quantidade, maior será a pureza do biogás. O poder calorífico do biogás atinge de 5.000 a 7.000 kcal/m³ de acordo com a sua pureza, relacionada a presença do gás metano (ZAGO, 2003 apud. MONTEIRO, 2005). A tabela 03 apresenta a comparação do potencial calorífico do biogás em relação a outros tipos de fontes de energia. Tabela 03: Poder calorífico do biogás em relação a outras fontes de energia. Fontes de energia Poder calorífico (Joules / cm³) (kcal / m³) Biogás (65 – 70%, CH4) 21,5 – 27,7 5.155 – 6.622 Metano 33,2 – 39,6 7.931 – 9.460 Gás Carvão 16,7 – 18,5 3.990 – 4.420 Gás Natural 38,9 – 81,4 9.293 – 9.446 Propano 81,4 – 96,2 19.446 – 22.982 Butano 107,3 – 125,8 24.561 – 30.054 Fonte: National Academy of Sciences (1977) apud Oliveira (2004). Segundo Chernicharo (2016), os sistemas anaeróbios de tratamento de efluentes possuem a vantagem de converter cerca de 50 a 70% do material orgânico degradável em metano e apenas de 5 a 10% em biomassa (lodo). Dal Mago (2009) afirma que a produção de biogás está relacionada a diversos fatores, todos eles passíveis de controle, podendo a produção de gás ser relacionada, por exemplo, ao tipo de biomassa utilizado. A produção de metano a partir da biomassa também pode ser estimada levando a consideração de sólidos voláteis (SV) removidos nos processos anaeróbios. Oliveira (1991), relata que os dejetos suínos possuem bom potencial energético para produção de biogás devido a sua constituição, mais de 70% dos sólidos totais são constituídos por sólidos voláteis, que são o substrato dos microrganismos responsáveis pela produção do biogás. Na mesma linha de pensamento, Chernicharo (2016) defende que as características do composto orgânico a ser degradado serão determinantes para a composição do biogás gerado e a proporção dos gases nele existentes, as condições ambientais do reator também influenciam no biogás. A tabela 04 apresenta dados sobre a produção diária de biogás para diferentes sistemas de criação animal. Tabela 04: Produção de dejeto e de biogás de acordo com o peso vivo de cada animal. Animal (peso vivo) Kgesterco/animal.dia m³biogás/ Kgesterco m³biogás/Kg SV m³biogás/animal.dia Bovino (500kg) 10 – 15 0,038 0,094 – 0,31 0,36 Equino (400kg) 10 – 12 0,022 0,082 – 0,28 0,2 Suínos (90kg) 2,3 – 2,5 0,079 0,37 – 0,50 0,24 Aves (2,5kg) 0,12 – 0,9 0,05 0,31 – 0,62 0,014 Ovinos (35kg) 0,5 – 0,9 0,022 0,10 – 0,28 0,22 Fonte: National Academy of Sciences (1997) apud Oliveira et al. (1993). O biogás resultante do processo anaeróbio realizado no tratamento dos efluentes suínos possui elevado poder energético e sua composição varia conforme a biomassa existente. O biogás produzido por um biodigestor consegue suprir praticamente toda a demanda energética básica de uma residência rural, como: cozimento, iluminação e geração de energia elétrica para diversas atividades (MONTEIRO, 2005). Seguindo a mesma linha de raciocínio, Oliveira (2004) defende que o biogás produzido pode ser aproveitado no próprio sistema de produção de suínos, como no aquecimento das granjas, na refrigeração, iluminação, incubação, misturadores de ração e geradores de energia elétrica. A tabela 05 apresenta as diferentes aplicabilidades do biogás dentro de uma propriedade e seu consumo para cada tipo de uso ou insumo em que possa ser um substituto. Tabela 05: Consumo de biogás em diferentes atividades específicas. Atividade Especificação Consumo / biogás Cozimento Pessoa/dia 0,34 a 0,42 m³/h Iluminação Lâmpada/100W Camisa/40W (lampião 0,13 m³/h 0,45 a 0,51 m³/h Motor a gasolina ou diesel Biogás/HP (25% eficiência) 0,45 a 0,51 m³/h Incubadora Por m³ de capacidade 0,46 a 0,71 m³/h Água (ebulição) Litro 0,11 m³/h Gasolina Litro 1,33 m³ Diesel Litro 1,6 a 2,07 m³ Óleo Fuel (caldeira) Litro 1,4 a 1,8 m³ Eletricidade KWh 0,62 m³/h Campânula aquecimento 1.400 KW (suínos/aves) 0,15 m³/h - 0,17 m³/h Fonte: Biomass Energy Institute (1978); La Farge (1995) apud Oliveira (2004). Outra comparação em relação ao potencial de usos do biogás em relação a outras fontes de energia é apresentada por Deganutti et al. (2002), conforme pode ser observado na tabela 06. Tabela 06: Relação comparativa entre biogás e os combustíveis usuais. Biogás Equivalência I m³ de biogás 0,61 L de gasolina 0,57 L de querosene 0,55 L de óleo diesel 0,45 kg de gás liquefeito 0,79 L de álcool combustível 1,54 kg de lenha 1,43 kWh de energia elétrica Fonte: Deganutti et al. (2002). O biogás gerado nos processos de metabolização bacteriana dentro dos biodigestores é retido e acumulado nas estruturas de PVC e PEAD fixadas sobre as lagoas. Conforme pode ser observado na imagem 02. Imagem 02: Estrutura em PVC para armazenagem do biogás. Fonte: Dal Mago (2009). A condução deste biogás é realizada em tubulações e pode ser destinada para dois pontos subsequentes à lagoa, são direcionados para queima ou para um ponto de armazenamento onde, a partir daí, poderá ser destinado para as diversas atividades existentes dentro da propriedade rural. Os pontos de queima e o sistema de condução do biogás podem ser observados na imagem 03. Imagem 03: Sistema de condução e queima do biogás. (a) detalhe da tubulação de saída do biogás; (b) queimador do biogás. (a) (b) Fonte: Dal Mago (2009). FERTIRRIGAÇÃO Um dos subprodutos mais valorizados do processo de tratamentos dos efluentes da suinocultura é o biofertilizante, que podem ser aplicados diretamente no solo como adubo orgânico. Segundo Dal Mago (2009), esses biofertilizantes possuem alto teor nutritivo para o solo, podendo substituir parcialmente ou totalmente o uso de adubos químicos, gerando aumento da produtividade agrícola e a redução nos custos de produção da propriedade. Ainda segundo o autor, para que o biofertilizante se torne rentável ao produtor em relação à utilização dos adubos químicos é necessária uma análise de viabilidade prévia de elementos como a existência de instalações e maquinário para manejo e tratamento do dejeto. Também devem ser analisadas as condições nutricionais do biofertilizante, como a concentração de nitrogênio, fósforo e potássio (NPK) existentes e a distância do ponto de armazenagem do biofertilizante e os locais de aplicação. Monteiro (2005), ressalta que a competitividade econômica do uso de biofertilizante em relação aos fertilizantes minerais dependerá de análises de instalações e equipamentos existentes na propriedade, além da composição química-mineral do biofertilizante. Deve-se considerar a concentração de nitrogênio, fósforo e potássio nos dejetos, a logística de distribuição do adubo na lavoura, o sistema de aplicação e o volume anual a ser aplicado, conforme necessidade nutricional na cultura e do solo. Scherer (2002), aponta a necessidade de se realizar análises periódicas do solo, determinar a quantidade de nutrientes existentes no adubo, e com base nos índices quantitativos de cada nutriente encontrado, determinar a quantidade de adubo para cada cultura. As características nutricionais de cada solo e a densidade dos dejetos são fundamentais para que se possa avaliar a aplicabilidade da adubação orgânica nas propriedades, e em muitos casos, é necessária a complementação com adubação química. (GIROTTO; CHIOCHETTA, 2004). Scherer (2002), destaca que os dejetos mais densos podem ser aplicados no solo com a utilização de tanques de distribuição acoplados em tratores, os dejetos mais líquidos, com maior teor de água, devem ser aplicados, preferencialmente com sistemas de aspersão com motobomba. A aplicação com tanque de distribuição acoplada em trator pode ser melhor visualizada na imagem 04. Imagem 04: Fertirrigação com uso de tanque de distribuição acoplado a trator. Fonte: Fatritol (2019). Estudos apresentados por Konzen (2003) demonstraram que em áreas adubadas de até 6 hectares a aspersão foi mais onerosa em relação ao tanque mecanizado, em áreas de 12 hectares os custos de ambos os processos se tornam equivalentes, a partir de 18 hectares o sistema de aspersão se torna mais atrativo. Nos mesmos estudos foi descrito que a produção de milho adubado com dejetos suínos obteve uma rentabilidade de 64% a 68%, sem serem considerados os efeitos benéficos que a adubação orgânica gerou no solo. Desta forma, os benefícios econômicos dos sistemas de produção de grãos com utilização de dejetos tratados da suinocultura superam seus custos. PADRÕES DE QUALIDADE DA ÁGUA E LANÇAMENTO EM CORPO HÍDRICO O Brasil possui legislação específica sobre a classificação dos cursos d’água quanto as suas características físicas e bioquímicas. As Resoluções nº 357/2005 e nº 430/2011 determinaram 4 classes de corpos hídricos, sendo cada uma mais restritiva em relação a outra em aspectos como o tipo de uso. O tipo de uso da água em relação a classificação do corpo hídrico pode ser observado no quadro 01 Quadro 01: Classificação do corpo hídrico em relação aos usos preponderantes. Uso da água Classe 1 2 3 4 Abastecimento Doméstico X X X Preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas Recreação de contato primário X X Proteção das comunidades aquáticas X X Irrigação X X X Pesca X X Dessedentação de animais X Navegação X Harmonia paisagística X Fonte: adaptado de Brasil – Ministério do Meio Ambiente (2005). O lançamento de qualquer efluente gerado nas propriedades rurais, em um corpo hídrico, deve respeitar os parâmetros de qualidade estipulados nas resoluções. Parâmetros como a DBO, oxigênio dissolvido, pH, turbidez e etc., são determinantes para o enquadramento da água em uma das classes existentes. O quadro 02 apresenta os níveis de DBO tolerados para cada classe de corpo hídrico. Quadro 02: Padrões de qualidade da água – relação DBO e classe de corpo hídrico Parâmetro Unidade Classe 1 2 3 4 Demanda Bioquímica de Oxigênio mg/L 3 5 10 - Fonte: adaptado de Brasil – Ministério do Meio Ambiente (2005). MATERIAIS E MÉTODOS Para uma exemplificação prática dos conceitos e dados apresentados anteriormente, foi elaborado um sistema de tratamento de efluentes para uma unidade hipotética produtora de suínos, no município de Pará de Minas, no estado de Minas Gerais, contendo 500 animais com pesos variando de 30kg a 90kg. Considerando a disponibilidade, na propriedade, de elementos como área para implantação do sistema de tratamento, água, equipe de funcionários a serem treinados para operação/manutenção do sistema e recursos financeiros para implantação, optou-se pela construção de um sistema composto por um biodigestor (tratamento primário), seguido de duas lagoas facultativas (tratamentos secundário e terciário). Desta forma, espera-se obter um efluente final dentro dos padrões de qualidade compatíveis com um corpo hídrico classe 2. Com base nos dados apresentados anteriormente na tabela 01, pode-se considerar, para as características de peso dos animais da granja a ser dimensionada, a produção média diária de 7,00 litros de dejetos líquidos por animal. Oliveira et al (1993), apresenta dados referentes a composição completa dos resíduos líquidos em unidades de crescimento e terminação com suínos de 25kg a 100kg. Esses dados podem ser observados na tabela 07. Tabela 07: Características dos dejetos de suínos em unidade de crescimento e terminação. Parâmetros Média Coeficiente de Variação (%) pH 6,94 2,45 Matéria seca (%) 8,99 13,68 Sólidos totais/ST (%) 9,00 27,33 Sólidos voláteis/SV (%) 73,05 5,86 Nitrogênio total (%) 0,60 8,33 Fósforo (%) 0,25 28,00 Potássio (%) 0,12 33,33 DBO5 (g/litro) 52,27 22,71 DQO (g/dia) 98,65 17,32 Fonte: Konzen (1980) apud Oliveira (1993). Para dimensionar a lagoa anaeróbia seguida de lagoa facultativa foram considerados os seguintes dados: Quantidade de suínos = 500 Vazão afluente = 3.500l/dia ou 3,5m³/dia DBO afluente So = 52,27g/L = 52270mg/L (com base na tabela 07) Temperatura = 23°C (líquido) Dimensionamento da Lagoa Anaeróbia Dimensionamento do Biodigestor Com base nos dados apresentados anteriormente na tabela 01, pode-se considerar, para as características de peso dos animais da granja, a produção média diária de 7,00 litros de dejetos líquidos por animal. Desta forma, o total diário de efluente gerado na granja (Q) é obtido através da equação 1: Q = N x q (Equação 1) Onde: Q = efluente gerado na granja (m³/d) N = número de suínos q = produção diária de dejetos por animal (l/dia) Para o estudo, temos: Q = 500 suínos x 7,00L/dia Q = 3.500L/dia ou 3,5m³/dia O dimensionamento do biodigestor anaeróbio se inicia através da determinação do tempo de retenção hidráulica (TRH) adotado para o sistema e, através desta, o volume útil necessário para o reator. O TRH adotado será de 30 dias, adequado ao prazo médio para as atividades de tratamento de efluentes da suinocultura, descrito por Oliveira (2004). O tempo de detenção, segundo Von Sperling (2017), é dado por: t = V Q (Equação 2) Onde: t = tempo de retenção hidráulica (dias) V = volume útil da lagoa/reator (m³) Q = vazão média do afluente (m³/d) Para o estudo de caso, considerando o TRH de 30 dias, o volume útil da lagoa será: V = t x Q V = 30d x 3,5m³/d V = 105m³ Segundo Von Sperling (2017), as lagoas anaeróbias devem possuir de 3m a 5m de profundidade para que as condições anaeróbias sejam predominantes no sistema e que a relação comprimento e largura deve ser de 2 a 4. Oliver et al. (2008) ressalta que a relação entre o comprimento e a largura de um biodigestor pode variar entre 2,7 a 3,0 para taludes com maiores dimensões. Para o biodigestor proposto foi adotada a profundidade de 5 metros. A área da lagoa será obtida por: A = V P (Equação 3) Onde: A = área do biodigestor V = volume útil da lagoa/reator (m³) P = profundidade Neste caso, a área do biodigestor desenvolvido será: A = 105m³ / 5m A = 21m² Para a área encontrada adotou-se a dimensão de 7m de comprimento e 3m de largura, obtendo-se a relação entre comprimento e largura de 2,33. Os valores para DQO, sólidos totais (ST) e sólidos voláteis (SV) do afluente foram considerados conforme dados apresentados por Dal Mago (2009) em seus estudos. Para a DQO foi encontrado o valor médio de 57,1g/L (57100mg/L), para ST o valor médio foi de 56,6g/L (56600mg/L) e para os SV o valor médio de 40,4g/L (40400mg/L). A determinação da concentração do efluente final, segundo Chernicharo (2016), pode ser realizada a partir da eficiência esperada para o sistema na remoção da DBO, DQO e ST, através da equação 4. S = 𝑆0 − 𝐸 𝑥 𝑆0 100 (Equação 4) Onde: S: concentração de DBO/DQO/SV/ST efluente (mg/L) S0: concentração de DBO/DQO/SV/ST afluente (mg/L) E: eficiência de remoção de DBO/DQO/SV/ST (%) Considerando a taxa de eficiência de 70% para remoção da DBO, DQO e SV, para remoção de ST adotou-se 65%, obtêm-se os seguintes valores para concentração do efluente do biodigestor: SDBO = 52270mg/L – (70x52270mg/L)/100 SDBO = 15681mg/L SDQO = 57100mg/L – (70x57100mg/L)/100 SDQO = 17130mg/L SSV = 40400mg/L – (70x40400mg/L)/100 SSV = 12120mg/L SST = 56600mg/L – (65x56600mg/L)/100 SST = 19810mg/L As taxas adotadas para eficiência na remoção de SV, ST, DBO e DQO se enquadram nos valores encontrados por Dal Mago (2009), sendo estes de 75,5% para SV, de 68% para ST e de 72% para DQO. Dimensionamento de Lagoa Facultativa Para o dimensionamento da lagoa facultativa optou-se por um TRH de 180 dias. Dessa forma, o volume requerido pela lagoa será dado pela equação 2. V = t x Q V = 180d x 3,5m³/d V = 630m³ A altura adotada para a lagoa facultativa foi de 1,8m, encontra-se a seguinte área requerida, conforme equação 3: A = 630m³ / 1,80m A = 350m² Respeitando a relação comprimento/largura entre 2 e 3, adotou-se as dimensões de 28m de comprimento e 12,50m de largura. Após obtidas as dimensões da lagoa, deve-se determinar o coeficiente de remoção da DBO, dado pela equação 5. KT = K20 x θ (T-20) (Equação 5) Onde: KT: coeficiente de remoção da DBO em uma temperatura do líquido T qualquer (d) K20: coeficiente de remoção da DBO na temperatura do líquido de 20°C (d) θ: coeficiente de temperatura Segundo Von Sperling (2017), os valores de K (20°C), para lagoas facultativas, variam de 0,27d a 0,32d e o valor de θ é 1,05. Logo, KT = 0,27d x 1,05 (23-20) KT = 0,31d A concentração de DBO Solúvel Efluente será obtida através da equação 6. S = S0 / 1+K.t (Equação 6) Onde: S: concentração de DBO solúvel efluente (mg/L) S0: concentração de DBO total afluente (mg/L) K: coeficiente de remoção de DBO (d-1) t: tempo de detenção total (d) S = 15681 mg/L / 1+0,31x180d S = 276,07 mg/L A eficiência de remoção do sistema será encontrada com base na equação 7. E = 100 x (S0 – DBOefl) / S0 (Equação 7) Onde: E = eficiência do sistema biodigestor seguido de lagoa facultativa S0 = concentração de DBO total efluente do biodigestor (mg/L) DBOefl = DBO solúvel no efluente E = 100 x (52270 – 276,07) / 52270 = 99,47% de eficiência Dada a elevada concentração de DBO encontrada após o tratamento secundário na lagoa facultativa, foi necessária a implantação de um tratamento terciário realizado por outra lagoa facultativa de menor dimensão. Para a segunda lagoa adotou-se o um TDH de 120 dias e profundidade de 1,8m. Dessa forma, o volume requerido pela segunda lagoa será dado pela equação 2. V = t x Q V = 120d x 3,5m³/d V = 420m³ Em sequência, encontra-se a seguinte área requerida, conforme equação 3: A = 420m³ / 1,80m A = 233,33m², considerado 234m² Respeitando a relação comprimento/largura entre 2 e 3, adotou-se as dimensões de 24m de comprimento e 9,75m de largura. Após encontrar as dimensões da lagoa, deve-se determinar o coeficiente de remoção da DBO, dado pela equação 5. KT = 0,27d x 1,05 (23-20) KT = 0,31d A concentração de DBO Solúvel Efluente será obtida através da equação 6. S = 276,07 mg/L / 1+0,31x120d S = 7,23 mg/L A eficiência de remoção do sistema será encontrada com base na equação 7. E = 100 x (52270 – 7,23) / 52270 = 99,98% de eficiência Produção de Biogás Segundo Chernicharo (2016), a avaliação de produção de biogás pode ser feita a partir da estimativa da carga de DQO afluente do biodigestor/reator, que é convertida em gás metano. A determinação da parcela de DQO transformada em metano CH4 pode ser feita por: DQOCH4 = Q.(S0-S) - Yobs.Q.S0 (Equação 8) Onde: DQOCH4: carga de DQO convertida em CH4 (kgDQOCH4.d -1) Q: vazão do esgoto afluente (m³.d-1) S0: concentração de DQO afluente (kgDQO. m -3) S: concentração de DQO efluente (kgDQO. m-3) Yobs: coeficiente de produção de sólidos no sistema, em termos de DQO (0,11 a 0,23 kgDQOlodo/kgDQOapl) DQOCH4 = 3,5m³/d x (57,10 - 17,13 kgDQO/m³) - 0,20 kgDQOlodo/kgDQOapl x 3,5m³/d x 57,10 kgBQO/m³ DQOCH4 = 99,93 kgDQOCH4/d Deve-se encontrar, em seguida, o fator de correção para temperatura operacional do biodigestor/reator, dada por: f (T) = P x KDQO / Rx(273+T) (Equação 9) Onde: f (T): fator de correção para a temperatura operacional do reator (kgDQO/m³) P: pressão atmosférica (1 atm) KDQO = DQO correspondente a um mol de CH4 (64 gDQO/mol) R: constante dos gases (0,08206 atm.L/mol.K) T: temperatura operacional do biodigestor/reator (°C) f (T) = (1atm x 64 gDQO/mol) / [0,08206atm.L/mol.K x (273+23°C)] f (T) = 2,63 kgDQO/m³ Em seguida é calculada a produção volumétrica de metano QCH4, através da equação 10. QCH4 = DQOCH4 / f (T) (Equação 10) Onde: QCH4: produção volumétrica de metano (m³/d) DQOCH4: carga de DQO convertida em CH4 (kgDQOCH4.d -1) f (T): fator de correção para a temperatura operacional do reator (kgDQO/m³) QCH4 = 99,93 kgDQOCH4/d / 2,63 kgDQO/m³ QCH4 = 38,00m³/d Após a obtenção da produção volumétrica teórica de metano, pode-se estimar o biogás produzido pelo sistema, considerando a taxa de 70% de metano no biogás, conforme afirma Oliveira (2004). A produção volumétrica do biogás produzido é dada por: Qbiogás = QCH4 / CCH4 (Equação 11) Na qual: Qbiogás: produção volumétrica de biogás (m³/d) QCH4: produção volumétrica de metano (m³/d) CCH4: concentração de metano no biogás, usualmente entre 70% e 80% Para o sistema dimensionado teremos: Qbiogás = 38,00m³/d / 0,70 Qbiogás = 54,29m³/d Considerando a redução de 39,97 kgDQO/m³.d (57,10 – 17,13) em relação a produção de biogás diária 54,29m³/d, teremos a geração de 1,36m³ biogás/kg DQOremov, que se aproxima bastante do valor encontrado por Dal Mago (2009), de 1,53m³ biogás//kg DQOremov. Com base nos dados presentes na tabela 6, obtêm-se a equivalência do biogás produzido no sistema dimensionado, conforme tabela 08. Tabela 08: Relação comparativa entre biogás dimensionado e os combustíveis usuais. Biogás Equivalência Biogás dimensionado Equivalência dimensionado I m³ de biogás 0,61 L de gasolina 54,29m³/d 33,12 L de gasolina 0,57 L de querosene 30,94 L de querosene 0,55 L de óleo diesel 29,86 L de óleo diesel 0,45 kg de gás liquefeito 24,43 kg de gás liquefeito 0,79 L de álcool combustível 42,89 L de álcool combustível 1,54 kg de lenha 83,61 kg de lenha 1,43 kWh de energia elétrica 77,63 kWh de energia elétrica Fonte: o autor. Com base na tabela 05, também é possível obter a relação comparativa do biogás gerado no sistema dimensionado em diferentes atividades específicas, como pode ser observado na tabela 09. Tabela 09: Consumo de biogás em diferentes atividades específicas em relação ao volume produzido. Atividade Especificação Consumo / biogás Biogás dimensionado Equivalência Cozimento Pessoa/dia 0,34 a 0,42 m³/h 54,29m³/d ou 2,26m³/h 6,65 a 5,39 Iluminação Lâmpada/100W Camisa/40W (lampião 0,13 m³/h 0,45 a 0,51 m³/h 17,38 5,02 a 4,43 Motor a gasolina ou diesel Biogás/HP (25% eficiência) 0,45 a 0,51 m³/h 5,02 a 4,43 Incubadora Por m³ de capacidade 0,46 a 0,71 m³/h 4,91 a 3,23 Água (ebulição) Litro 0,11 m³/h 20,55L Gasolina Litro 1,33 m³ 1,70L/h Diesel Litro 1,6 a 2,07 m³ 1,41 a 1,09L/h Óleo Fuel (caldeira) Litro 1,4 a 1,8 m³ 1,61 a 1,26L/h Eletricidade KWh 0,62 m³/h 3,64kWh Campânula aquecimento 1.400 KW (suínos/aves) 0,15 m³/h - 0,17 m³/h 15,07 a 13,29 Fonte: o autor. CONSIDERAÇÕES FINAIS A suinocultura possui um papel inegável para a economia do país e também como uma das principais geradoras de passivos ambientais de alto impacto nas regiões onde este tipo de atividade produtiva encontra-se instalada. A aplicação de sistemas de tratamento anaeróbio mostrou-se uma alternativa bastante sustentável para os produtores rurais. Os sistemas anaeróbios de tratamento permitem a sua aplicabilidade na maioria das propriedades rurais devido a facilidade de implantação e construção das unidades de tratamento, independente do seu porte, atrelada ao fator econômico de conservação do sistema, por demandar pouca manutenção e a quase inexistência de componentes elétricos para seu funcionamento. Os sistemas apresentados forneceram subprodutos, como o biogás e o adubo orgânico, que geram valor agregado ao processo de tratamento dos dejetos, tornando os sistemas ainda mais atrativos para os produtores rurais. A possibilidade de produção de energia elétrica e adubo no próprio sistema produtivo, reduzindo os custos com energia e fertilizantes químicos utilizados na produção rural, permitem uma grande sustentabilidade em todo o ciclo de tratamento da suinocultura. Quando bem gerida, toda a cadeia de produção de suínos, tratamento dos dejetos e geração de subprodutos para reutilização na propriedade, faz com que os ganhos ambientais estejam fortemente atrelados aos ganhos econômicos dos produtores rurais. Desta forma, os biodigestores e sistemas anaeróbios de tratamento se mostraram alternativas sustentáveis para o tratamento dos dejetos da suinocultura. Com base no dimensionamento realizado e na pesquisa bibliográfica foi possível mensurar quantitativamente o quanto a existência do tratamento com biodigestor atrelado ao aproveitamento do biogás pode gerar em possibilidade de ganhos para a propriedade. O uso do potencial energético do biogás pode acarretar em redução no consumo de outros insumos essenciais em uma propriedade rural, como a energia elétrica e os combustíveis fósseis. Dois pontos devem ser observados quanto ao sistema proposto. O primeiro está relacionado a disponibilidade prévia de todos os recursos financeiros, materiais e de mão de obra necessários para a implantação e manutenção do biodigestor e das lagoas. O segundo ponto está relacionado com a eficiência no tratamento do efluente, por exemplo, obtendo valores de 99,98% de redução da DBO. A eficiência apresentada pelo sistema, com DBO final de 7,23 mg/L, se enquadra em valor absoluto, em média mensal e anual, para lançamento em corpos receptores de rios de classe 2, atingindo a eficiência almejada no início do dimensionamento. Ressalta-se que a água oriunda de corpos hídricos de classe 2 pode ser utilizada em atividades pertinentes a uma propriedade rural, como irrigação, pesca e dessedentação de animais. Para a possibilidade de lançamento nos de classe 1 ou aumento da eficiência do tratamento, indica-se a necessidade de complementação do tratamento, podendo este ser realizado por wetlands construídos, valas de infiltração ou filtros anaeróbios. Para tal implantação sugere-se a realização de estudos futuros que abranjam o dimensionamento do sistema terciário e seu respectivo potencial de tratamento do efluente. REFERÊNCIAS BRASIL, Ministério do Meio Ambiente. Resolução nº 357, de 17 de março de 2005. Ministério do Meio Ambiente, Conselho Nacional do Meio Ambiente. Brasília, 2005. p. 58-63. CHERNICHARO, Carlos Augusto de Lemos. Princípios do tratamento biológico de águas residuárias: reatores anaeróbios. 2 ed., Belo Horizonte: Editora UFMG, 2016, v. 5, 379p. DAL MAGO, Anigeli. Avaliação de biodigestores com o uso de dejetos de suínos, em Braço do Norte e em Concórdia. Dissertação de Mestrado – Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Programa de Pós-graduação em Engenharia Ambiental. Florianópolis, 2009. 152p. DEGANUTTI, Roberto; PALHACI, Maria do Carmo Jampaulo Plácido; ROSSI, Marco; TAVARES, Roberto; SANTOS, Claudemilson dos. Biodigestores rurais: modelo indiano, chinês e batelada. Universidade Estadual Paulista – UNESP, 2002. FATRITOL. Distribuidores de adubos orgânicos acoplados a trator. Disponível em: < http://www.fatritol.com.br/detalhes/1- distribuidores_de_adubos_organicos_com_bombas_a_vacuo_de_anel_liquido.html> Acesso em: 28, mar., 2019. GIROTTO, Ademir Francisco; CHIOCHETTA, Oldemir. Aspectos econômicos do transporte e utilização dos dejetos. In: OLIVEIRA, Paulo Armando Victória de. Tecnologias para o manejo de resíduos na produção de suínos: manual de boas práticas. Concórdia: Embrapa Suínos e Aves, 2004. Cap. 1, pág 11–16. IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário de 2017. IBGE, Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: <https://censos.ibge.gov.br/resultados-censo-agro-2017.html> Acesso em: 04, mar., 2019. KONZEN, Egídio Arno. Aproveitamento de dejetos líquidos de suínos para fertirrigação e fertilização de grandes culturas. Circular Técnica 32. Sete Lagoas: Embrapa Milho e Sorgo, 2003. 11p. MIRANDA, Cláudio Rocha de. 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