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A-Constitucionalizacao-do-Processo-Penal-Brasileiro

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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 
 
Org. Antonio Eduardo 
Ramires Santoro 
 
A Constitucionalização 
do Processo Penal 
Brasileiro 
O Projeto de Lei do Senado nº 156/2009 e o Juiz das 
Garantias 
 
RODOLFO SANTOS CORREIA DA SILVA 
 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 ii 
RODOLFO SANTOS CORREIA DA SILVA 
 
 
 
 
A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO 
PROCESSO PENAL BRASILEIRO: 
O PLS nº 156/2009 e o Juiz das Garantias 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas 
Organizador da Coleção Antonio Eduardo Ramires 
Santoro 
 
Rio de Janeiro 
Novembro de 2010 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 iii 
 
 
 
 
S586 Silva, Rodolfo Santos Correia. 
A constitucionalização do processo penal brasileiro: o PLS nº 
156/2009 e o juiz das garantias / Rodolfo Santos Correia da 
Silva 
68 f. 
Coleção Monografia Jurídicas. 
Processo Penal. I. Direito Constitucional. 
 
 CDD 
341.430981 
 
 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 iv 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho a Maria de Lourdes, minha mãe, por me 
ter ensinado, com o exemplo, a não esmorecer ante as 
intempéries da vida, tendo força, raça e gana sempre; a viver a 
vida, apesar do pesares, com manha, graça e sonho sempre; a 
acreditar num mundo melhor, mantendo, sempre, essa estranha 
mania de ter fé na vida. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 v 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço, em primeiro lugar, ao Lá De Cima, por tudo 
que me deu, que me dá e que me ainda dará, sobretudo pela luz 
que me alumia os caminhos da vida. 
 Em seguida, agradeço àqueles que diretamente 
colaboraram e sem os quais este trabalho não seria possível: 
Professora Paula Calainho, pela atenção, paciência e zelo não 
só comigo, mas para com todos os seus orientandos; e 
Professor Antonio Santoro, de quem eu tive o duplo privilégio 
de tê-lo como professor durante a graduação e, fora da sala de 
aula, de tê-lo com um amigo. Todos os eventuais créditos 
deste trabalho são destes professores; os equívocos e 
omissões, descréditos meus. 
 Não poderia faltar, aqui, referência a Samanta Felix, 
especialista em Processo Constitucional pela Universidade do 
Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e mestranda em Direito Penal 
Internacional pela Universidade de Granada (Espanha). Afora o 
exemplo de profissional da advocacia, tenho a agradecer por 
sua amizade sincera e honesta, e pela força que me dá para 
continuar caminhando. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 vi 
 Agradeço também a alguns professores que tiveram 
vital importância na minha formação jurídica. São eles: Antonio 
Santoro (de novo), Carlos Eduardo Adriano Japiassú, Telson 
Pires, Floriano André, Guilherme Bollorini, Pablo Arruda e 
André Luiz. 
 Por fim, mas não menos importantes, os 
agradecimentos aos meus amigos de faculdade, que me 
apoiaram, me incentivaram; que comigo discutiram, 
debateram; com quem troquei idéias e experiências de vida; 
com quem amadureci nestes cinco anos de curso. Não 
esqueço, porém, de meus familiares e amigos pessoais, que 
tiveram a compreensão necessária para entender que as horas 
que deixamos de passar juntos foram investidas em uma boa 
causa. 
 Aos meus irmãos, Rômulo e Rodrigo, um muito 
obrigado mais do que especial por tudo o que representam em 
minha vida. 
 
 
 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 vii 
Maria, Maria 
É um dom, uma certa magia 
Uma força que nos alerta 
Uma mulher que merece 
Viver e amar 
Como outra qualquer 
Do planeta 
Maria, Maria 
É o som, é a cor, é o suor 
É a dose mais forte e lenta 
De uma gente que rí 
Quando deve chorar 
E não vive, apenas aguenta 
Mas é preciso ter força 
É preciso ter raça 
É preciso ter gana sempre 
Quem traz no corpo a marca 
Maria, Maria 
Mistura a dor e a alegria 
Mas é preciso ter manha 
É preciso ter graça 
É preciso ter sonho sempre 
Quem traz na pele essa marca 
Possui a estranha mania 
De ter fé na vida.... 
(Milton Nascimento e Fernando Brant) 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 viii 
RESUMO 
SILVA, Rodolfo Santos Correia da. A constitucionalização do 
processo penal brasileiro: o PLS 156/2009 e o juiz das garantias. 
2010. 33f. Monografia (Graduação em Direito) – Centro Universitário 
da Cidade, Rio de Janeiro, 2010. 
O presente estudo inicia-se pela conceituação do Estado Democrático 
de Direito e todos os reflexos decorrentes de sua adoção pela 
Constituição da República de 1988, dentre eles as funções do Poder 
Judiciário neste modelo de Estado. Passa-se, então, à análise do 
processo penal, começando por uma análise histórica, passando pela 
conceituação e desenvolvimento histórico dos sistemas processuais, 
pela caracterização do processo penal condizente com um Estado 
Democrático de Direito e, por fim, perquiri-se o papel do juiz no 
processo penal. O derradeiro capítulo versa sobre o Projeto de Lei do 
Senado nº 156/2009 (projeto de Código de Processo Penal), que 
tramita no Congresso Nacional, tendo sido aprovado em primeiro 
turno pela Casa Legislativa de origem. Tal projeto tem como mote a 
constitucionalização do processo penal brasileiro, tornado, com isso, a 
estrutura do processo penal brasileiro compatível com a Constituição 
da República de 1988, o que não ocorre com a estrutura atual, vez que 
baseada no Código de Processo Penal de 1941, cuja essência é 
inquisitorial. A citada constitucionalização se dá em razão do 
reposicionamento do juiz no processo penal, exercendo ele, agora, seu 
verdadeiro papel: o de julgador imparcial e garantidor dos direitos 
fundamentais do indivíduo. 
Palavras-Chave: Estado Democrático de Direito. Processo Penal. 
Projeto de Lei do Senado nº 15/2009. Jus das Garantias. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 ix 
PREFÁCIO 
Rodolfo é daqueles estudantes que se diferenciam à 
primeira manifestação. Aos professores acostumados ao 
marasmo da mediocridade soa petulante, àqueles que esperam 
por algo que tenha valido à pena o esforço do magistério eis a 
recompensa. 
O convite à pesquisa veio acompanhada da dedicação e 
com ela esta audaciosa monografia com cara de livro. 
O tema, além de novo (aliás, mais do que isso, 
incipiente beirando ao prematuro) já é uma digna contribuição 
para compreensão do papel do Juiz das Garantias cuja inserção 
em nosso sistema processual positivo tem tudo para acontecer. 
E o melhor, de antemão encontra sua fundamentação 
constitucional e axiológica (neste ponto até mais do que o autor 
pretendeu fazê-lo) neste trabalho. 
No mais, à leitura... 
Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 2010. 
 
Antonio Eduardo Ramires Santoro 
Organizador da Coleção 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da SilvaColeção Monografias Jurídicas nº 2 x 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO .......................................................................12 
1 A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 E A 
ELEIÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE 
DIREITO...................................................................................14 
1.1 A Eleição do Estado Democrático de 
Direito.......................................................................................16 
1.1.1 Conceito de Estado Democrático de 
Direito.......................................................................................17 
1.1.2 Implicações Jurídicas.......................................................19 
1.1.3 A Nova Pirâmide Jurídica na Visão do Supremo Tribunal 
Federal ......................................................................................21 
1.1.4 O Papel do Poder Judiciário.............................................24 
2 PROCESSO PENAL.............................................................32 
2.1 Breve Escorço Histórico do Processo Penal.......................32 
2.2 Sistemas Processuais Penais ..............................................35 
2.2.1 Sistema Acusatório..........................................................35 
2.2.2 Sistema Inquisitório ........................................................37 
2.2.3 Sistema Misto...................................................................39 
2.2.4 A Superação do Reducionismo do Conceito de Sistema 
Misto ........................................................................................41 
2.3 Processo Penal Democrático...............................................43 
2.4 O Papel do Juiz no Processo Penal.....................................45 
3 O PLS Nº 156/2009 E O JUIZ DAS GARANTIAS..............47 
3.1 A Compatibilização do Processo Penal com a Constituição 
da República..............................................................................47 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 xi 
3.2 O Instituto do Juiz das Garantias........................................51 
CONCLUSÃO..........................................................................55 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................61 
 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 12 
INTRODUÇÃO 
 
Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 
do Senado (PLS) nº 156/2009, fruto do trabalho de uma 
Comissão de Juristas instituída pela Presidência do 
Senado Federal do Brasil, composta por Antonio Correia, 
Antonio Magalhães Gomes Filho, Eugênio Pacceli de 
Oliveira, Fabiano Augusto Martins Silveira, Felix Valois 
Coelho Júnior, Hamilton Carvalhido, Jacinto Nelson de 
Miranda Coutinho, Sandro Torres Avelar e Tito Souza do 
Amaral. Tal projeto visa à reforma global do processo 
penal brasileiro, substituindo não só o famigerado Código 
de Processo Penal, que data de 1941, mas todas as leis 
esparsas processuais penais. 
O fato de a futura aprovação do citado projeto 
ocasionar a mudança de toda a sistemática processual 
penal do ordenamento jurídico pátrio é o que justifica o 
esforço expendido na presente pesquisa, porquanto O 
PLS 156/2009, visando à constitucionalização do 
processo penal brasileiro, traz diversas inovações, dentre 
elas o instituto do juiz das garantias. 
A análise do papel reservado justamente ao juiz 
das garantias, e se tal papel é compatível, ou não, com os 
ditames da Constituição da República, é o objetivo do 
presente estudo. Para tanto, foi utilizado o método de 
pesquisa bibliográfica, tomando-se como manancial 
teórico o constitucionalismo moderno, que tem como 
apoio a doutrina jusfilosófica pós-positivista, decorrente 
da criação dos Estados Constitucionais de Direito 
emergentes do processo de valorização do ser humano e 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 13 
da dignidade da pessoa humana surgido no segundo pós-
guerra do século passado. 
Inicia-se a presente pesquisa com o estudo da 
opção política realizada pela Constituição da República 
ao adotar o Estado Democrático de Direito, sendo feitas 
algumas delineações acerca do momento histórico em 
que se deu a elaboração da Constituição de 1988; 
algumas delineações acerca do modelo de Estado 
adotado, tais como, o conceito de Estado Democrático de 
Direito, as implicações jurídicas e a posição do Supremo 
Tribunal Federal sobre a nova pirâmide jurídica, referente 
à hierarquia das normas; e, no fim da primeira parte, são 
versadas as funções do Poder Judiciário neste modelo de 
Estado. 
Em seguida, é feita uma análise do processo 
penal. Faz-se uma breve incursão histórica; são traçadas 
linhas gerais sobre os sistemas processuais penais; 
afirma-se o tipo de processo penal condizente com um 
Estado democrático; e são afirmadas as principais 
funções do juiz no processo penal de matiz democrático. 
Por derradeiro, é feita uma análise sobre o PLS 
156/2009, mais especificamente sobre a motivação de sua 
elaboração, qual seja, a necessidade de uma reforma 
global do processo penal brasileiro, visando à 
compatibilização do Direito Processual Penal com a 
Constituição da República de 1988, passando-se, logo 
após, à análise do instituto do juiz das garantias e do 
papel que lhe é reservado pelo projeto, ressaltando-se ao 
fim a compatibilidade constitucional do papel reservado 
pelo legislador, ao elaborar o PLS 156/2009, ao juiz que 
atuará na fase pré-processual da persecução penal. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 14 
 
1 A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 E A 
ELEIÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE 
DIREITO 
 
05 de outubro de 1988. Congresso Nacional. 
Brasília, Distrito Federal. É promulgada a Constituição 
da República Federativa do Brasil, democraticamente 
elaborada, votada e aprovada por uma Assembléia 
Nacional Constituinte composta por parlamentares eleitos 
diretamente pelo povo para a Câmara dos Deputados e 
para o Senado Federal, cujo presidente foi Ulysses 
Guimarães. É tempo de redemocratização no país após 
longos e duradouros 20 anos de regime ditatorial militar. 
Em 1985, alguns anos antes da promulgação da 
Constituição da República, havia sido eleito, de forma 
indireta, o primeiro presidente da República após a 
regime militar (a emenda Dante de Oliveira, que 
asseguraria a eleição diretamente pelo povo, não foi 
aprovada pelo Congresso Nacional, sendo o presidente 
eleito pelo Colégio Eleitoral), que teve como missão 
maior realizar a transição do autoritarismo para a 
democracia, tarefa nada fácil, pesando sobre seus ombros 
a responsabilidade de evitar rupturas bruscas que 
pusessem o país em colapso. A transição foi realizada 
com sucesso. De lá até os dias de hoje passaram-se 22 
anos, maior período de estabilidade política por que 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 15 
passou o Brasil, tendo sido exercidos 07 mandatos 
presidenciais por 05 presidentes da República
1
. 
Sob o ângulo de Lei Fundamental, Constituição é 
“o conjunto de normas que organiza os elementos 
constitutivos do Estado”,2 isto é, o instrumento político-
jurídico de fundação de um Estado. Esse é o conceito 
clássico. Hodiernamente, todavia, tal conceito foi 
ampliado pela doutrina. Assim,este é o conceito trazido 
por Luis Roberto Barroso:
3
 
 
“A Constituição, portanto, cria ou reconstrói o Estado, 
organizando e limitando o poder político, dispondo 
acerca dos direitos fundamentais, valores e fins públicos 
e disciplinando o modo de produção e os limites de 
conteúdo das normas que integrarão a ordem jurídica por 
ela instituída. Como regra geral, terá a forma de um 
documento escrito e sistemático, cabendo-lhe o papel, 
decisivo no mundo moderno, de transportar o fenômeno 
político para o mundo jurídico, convertendo o poder em 
Direito.” 
 
Além de prever a organização da estrutura de 
funcionamento do Estado, a Constituição consagra 
 
1
 Em 31 de outubro do presente ano foi eleita em segundo turno 
a candidata Dilma Roussef para o exercício do oitavo mandato 
presidencial do período pós-ditadura. Será a sexta pessoa – a 
primeira mulher – que exercerá o comando do Poder Executivo 
federal no país no referido período. 
2
 SILVA, José Afonso da. Direito constitucional positivado, 28 
ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 89. 
3
 BARROSO, Luis Roberto. Curso de direito constitucional 
contemporâneo, 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 75. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 16 
direitos e garantias fundamentais, sejam eles individuais, 
coletivos ou difusos, e elege valores que irradiarão por 
todo o ordenamento jurídico. Dentre os princípios 
fundamentais, um merece destaque no presente estudo: o 
modelo de Estado – Estado Democrático de Direito.4 
 
1.1 A Eleição do Estado Democrático de Direito 
 
O poder constituinte originário, como 
contraponto ao autoritarismo que dominou o país durante 
o período do regime militar (1964-84), elegeu o Estado 
Democrático de Direito como modelo de Estado. A 
população foi às ruas contra a Ditadura, porque a 
prosperidade econômica, que dava guarida ao regime 
autoritário, já não mais se fazia presente. O povo já não 
tolerava mais a imposição de um regime de força; a 
democracia se fazia necessária. Povo às ruas, 
movimentos democráticos, movimentos estudantis, 
Diretas Já. A emenda à Constituição que daria ao povo o 
direito de eleger diretamente o novo presidente da 
República não foi aprovada. A eleição do chefe do Poder 
Executivo federal ficou por conta do Colégio Eleitoral, e 
Tancredo Neves, candidato com apoio popular, foi eleito, 
mas não assumiu em razão de seu falecimento, fazendo-o 
em seu lugar o vice-presidente eleito, José Sarney. 
Sarney tocou o projeto de Tancredo e convocou uma 
Assembléia Nacional Constituinte para a elaboração de 
uma nova Constituição. A Assembléia foi instalada e seus 
trabalhos tiveram fim no referido 05 de outubro de 1988, 
 
4
 Artigo 1º da Constituição da República Federativa de 1988. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 17 
tendo como resultado final a Constituição Cidadã
5
. A 
democracia estava de volta; ou, ao menos, deveria estar. 
No artigo 1º da Constituição da República está 
prevista a citada escolha pelo Estado Democrático de 
Direito. Estado Constitucional de Direito, Estado 
Constitucional Democrático e Estado Constitucional e 
Democrático de Direito são tratados aqui como 
sinônimos, não sendo, para o presente estudo, relevante 
discorrer sobre as sutilezas semânticas que os 
diferenciam.
6
 
Tal modelo foi eleito. Mas o que vem a ser um 
Estado Democrático de Direito? 
 
1.1.1 Conceito de Estado Democrático de Direito 
 
O conceito é formado pela palavra Estado, que 
recebe dupla adjetivação: democrático e de direito. 
Estado é “a ordem jurídica soberana que tem por fim o 
bem comum de um povo situado em determinado 
território
”7
. Estado de Direito é aquele que se assenta 
“sobre o monopólio estatal de produção jurídica e sobre o 
princípio da legalidade
”8
. Nele há uma ordem vigente, 
denominada ordenamento jurídico, ordem esta que 
subordina não somente as pessoas, mas também o Estado. 
 
5
 O termo foi cunhado por Ulysses Guimarães, deputado que 
presidiu da Assembléia Nacional Constituinte que promulgou a 
CRFB/88. 
6
 BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit., p. 245. 
7
 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do 
estado, 22ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 118. 
8
 BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit. p. 244. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 18 
Afirma-se sua caracterização “pela simples existência de 
algum tipo de ordem legal cujos preceitos materiais e 
procedimentais sejam observados tanto pelos órgãos de 
poder quanto pelos particulares
”
.
9
 
O Estado Democrático de Direito é uma evolução 
do Estado de Direito. Desenvolveu-se a partir do segundo 
pós-guerra e caracteriza-se pela “subordinação da 
legalidade a uma Constituição rígida
”10
, daí a adoção por 
parte da doutrina da nomenclatura Estado Constitucional 
de Direito.
11
 Além da exigência do cumprimento formal 
do processo legislativo, no Estado Democrático de 
Direito há a necessidade de efetiva compatibilidade 
material das normas infraconstitucionais com as normas 
constitucionais, afora a determinação de deveres de 
atuação por parte do Poder Executivo e do Poder 
Legislativo.
12
 
Com isso, ampliou-se a limitação ao poder do 
Estado, que antes dizia respeito somente às liberdades 
públicas, o que significava dizer que havia apenas a 
previsão de deveres negativos – obrigações de não fazer – 
concernentes ao poder Público. Agora, ao Estado é dado 
o dever de promover políticas públicas que visem ao 
cumprimento dos direitos e garantias fundamentais 
(deveres positivos, obrigações de fazer). 
Tal fenômeno, todavia, não restou restrito 
somente aos Poderes Executivo e Legislativo, tendo se 
 
9
 Ibidem, p. 41. 
10
 Ibidem, p. 244. 
11
 GOMES, Luiz Flávio. Estado constitucional de direito e a 
nova pirâmide jurídica. São Paulo: Premier Máxima, 2008. 
12
 BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit. p. 245. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 19 
espraiado também para o Poder Judiciário, o que 
implicou efeitos na forma de interpretar e aplicar o 
ordenamento jurídico. 
 
1.1.2 Implicações Jurídicas 
 
A opção política pelo Estado Democrático de 
Direito deságua inexoravelmente no processo de 
Constitucionalização do Direito, é dizer, “a passagem da 
Constituição para o centro do sistema jurídico”.13 A 
Constituição, agora, é o “filtro através do qual se deve ler 
todo o direito infraconstitucional”.14 Tal fenômeno pode 
ser observado sob diversos ângulos, importando para o 
presente estudo dois deles: a normatividade das normas 
constitucionais e a relevância das opções realizadas pela 
Constituição na interpretação das normas 
infraconstitucionais.
15
. 
O primeiro de há muito já vem sendo 
defendido,
16
 não obstante seu reconhecimento no Brasil 
só tenha-se dado com a promulgação da Carta da 
República de 1988. Desde Kelsen se reconhece a 
supremacia da Constituição dentro do ordenamento 
 
13
 Ibidem, p. 86. 
14
 Ibidem, p. 87. 
15
 Ibidem,p. 352. 
16
 Já em 1968, José Afonso da Silva escreveu a monografia 
Aplicabilidade das normas constitucionais, em que defendia a 
aplicabilidade direta das normas constitucionais, e não apenas 
sua aplicação como normas orientadoras ao legislador. Em 
1987, Luis Roberto Barroso defendeu sua tese de livre-
docência A força normativa da Constituição, texto cujo título é 
auto-explicativo. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 20 
jurídico, porém, nos países de tradição jurídica romano-
germânica (como o Brasil), o reconhecimento da 
normatividade das normas constitucionais se deu apenas 
com a superação do liberal Estado de Direito
17
. Exemplo 
irretorquível desta normatividade é a previsão, dentre os 
direitos e garantias fundamentais, do Mandado de 
Injunção – remédio constitucional que tem como objetivo 
a garantia da aplicação da norma constitucional cuja 
eficácia esteja condicionada à regulamentação pelo 
legislador infraconstitucional, e que não está produzindo 
seus efeitos em razão da inércia do Poder Legislativo. 
Agora, na nova ordem constitucional, as normas 
constitucionais são verdadeiras normas jurídicas, 
dirigidas aos juízes, inclusive, e não mais meras diretivas 
políticas direcionadas apenas aos legisladores.
18
 
Sobre o segundo ponto, tem clareza solar a 
explanação de Luis Roberto Barroso:
19
 
 
“A idéia de constitucionalização do Direito aqui 
explorada está associada a um efeito expansivo das 
normas constitucionais, cujo conteúdo material e 
axiológico se irradia, com força normativa, por todo o 
sistema jurídico. Os valores, os fins públicos e os 
comportamentos contemplados nos princípios e regras da 
Constituição passam a condicionar a validade e o sentido 
de todas as normas do direito infraconstitucional.” 
 
 
17
BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit. p. 244. 
18
 Ibidem, p. 86. 
19
 Ibidem, Op. Cit. p. 353. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 21 
A interpretação do ordenamento jurídico no 
Estado Democrático de Direito deve ser feita sob a forma 
de cotejo das normas infraconstitucionais com a 
Constituição, tanto do aspecto formal, quanto do aspecto 
material, sendo tarefa do intérprete realizar a aplicação do 
direito infraconstitucional a fim de atender aos valores e 
aos fins eleitos pelo poder constituinte originário. Ou 
seja: é necessário verificar a adequação constitucional da 
legislação, aplicando-a sempre de forma a atender aos 
fins colimados pelo constituinte.
20
 
Como afirmado, desde Kelsen se reconhece a 
supremacia da Constituição na pirâmide jurídica. Tal 
pirâmide, no entanto, sofreu significativa alteração com a 
emersão do Estado Democrático de Direito, fruto da 
constitucionalização e internacionalização dos direitos 
humanos. O Supremo Tribunal Federal delineou uma 
nova hierarquia entre as normas jurídicas. 
 
1.1.3 A Nova Pirâmide Jurídica na Visão do Supremo 
Tribunal Federal 
 
Há muito tempo se discute a questão da 
hierarquia das normas jurídicas. No que toca ao direito 
interno, discussões de repercussão não há. No entanto, no 
que pertine ao direito internacional, o assunto não é 
pacífico na doutrina. 
 
20
 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura: no 
estado constitucional e democrático de direito. São Paulo: 
Editora Revista dos Tribunais, 1997, p. 122. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 22 
Para alguns, há dois ordenamentos jurídicos: o 
interno e o internacional. Chamam-se dualistas os que 
assim pensam.
21
 Por outro lado, existe o grupo que, ao 
revés, entende haver apenas um ordenamento jurídico, 
que é composto tanto pelas normas internas quanto pelas 
normas internacionais: são denominados monistas.
22
 
Dentro do monismo há uma subdivisão, que leva 
em consideração o posicionamento acerca da prevalência 
das normas jurídicas. Alguns defendem a prevalência do 
direito internacional sobre o interno; outros o reverso; e 
outros a aplicação do princípio geral do direito segundo o 
qual lei posterior derroga lei anterior.
23
 
Na doutrina pátria, há ainda aqueles que invocam 
o parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição da República 
para defender que os Tratados que versam sobre direitos 
humanos são incorporados automaticamente ao 
ordenamento pátrio com o status constitucional.
24
 
O poder constituinte reformador, acerca dos 
Tratados Internacionais de Direitos Humanos, em parte, 
pôs fim à discussão, incorporando ao artigo 5º da Carta 
Magna o parágrafo 3º, que confere status de emenda 
constitucional aos referidos tratados, desde que sua 
incorporação no ordenamento jurídico pátrio se dê em 
 
21
 JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O tribunal penal 
internacional: a internacionalização do direito penal. Rio de 
Janeiro: Lúmen Juris, 2004, p. 2. 
22
 JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Op. Cit. p. 2. 
23
 JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Op. Cit. p. 3. 
24
 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito 
constitucional internacional. 3ª ed. São Paulo: Max Limonad, 
1997, p. 111 apud JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Op. 
Cit., p. 4. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 23 
processo legislativo idêntico ao necessário para a 
aprovação daquele tipo de norma. 
Com relação aos tratados que versam sobre 
direitos humanos e já estão incorporados ao ordenamento 
por meio da aprovação de decreto-legislativo e que não 
seguiram o trâmite do citado parágrafo 3º, o Supremo 
Tribunal Federal fincou bases e adotou um 
posicionamento com relação ao tema no julgamento do 
recurso extraordinário 466.343, oriundo do estado de São 
Paulo. Na ocasião, entendeu o Pretório Excelso que na 
pirâmide jurídica nacional os Tratados Internacionais de 
Direitos Humanos estariam acima das leis ordinárias e 
abaixo da Constituição; teriam eles, portanto, status 
supralegal, mas infraconstitucional. 
No julgamento do citado recurso extraordinário, 
o relator, Ministro Cezar Peluso, em seu voto não se 
pronunciou sobre o tema, mas, em aditamento, admitiu 
considerar os Tratados internacionais sobre direitos 
humanos supralegais, não se posicionando, porém, se 
teriam status constitucional ou infraconstitucional. Em 
seguida, o Ministro Gilmar Mendes proferiu voto 
defendendo a supralegalidade infraconstitucional dos 
referidos documentos internacionais, no que foi 
acompanhado pelos ministros Carmem Lúcia, Ricardo 
Lewandowski, Carlos Brito, Marco Aurélio e Menezes 
Direito. O Ministro Joaquim Barbosa inclinou-se para a 
adoção da norma (seja ela internacional ou interna) mais 
favorável ao indivíduo. O decano, Ministro Celso de 
Mello, proferiu seu voto no sentido de conferir status 
constitucional aos Tratados em matéria de direitos 
humanos. O Ministro Eros Grau estava ausente e a 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 24 
Ministra Ellen Gracie, não votou no exercício da 
presidência. 
Portanto, com essa decisão, verifica-se que o 
Poder Judiciário ganha especial relevo no Estado 
Democrático de Direito, tendo seu papelampliado em 
decorrência da superação do marco juspositivista, que 
colocava o juiz na posição burocrática de ser apenas a 
boca da lei.
25
 
 
1.1.4 O Papel do Poder Judiciário 
 
Em um Estado Democrático de Direito, os 
poderes são independentes e harmônicos entre si.
26
 Como 
prelecionava Montesquieu, os poderes compõem um 
sistema de freios e contrapesos, exercendo um a 
fiscalização do outro, o que dá o equilíbrio necessário ao 
seu exercício, evitando-se assim que haja sobreposição de 
um sobre o outro. 
Ao Poder Executivo é destinada a função 
precípua de administrar, de governar, executando as leis e 
promovendo as políticas públicas. Ao Legislativo foi 
reservada a função típica de legislar, de elaborar as leis 
que regularão as relações entre os indivíduos. 
Por fim, ao Poder Judiciário cabe a função 
jurisdicional, cuja raiz etimológica radica na expressão 
latina jurisdictio, que significa dizer o Direito. O Poder 
Judiciário tem a função precípua de solucionar litígios, 
dizendo o Direito e aplicando-o ao caso concreto. Age o 
 
25
 GOMES, Luiz Flávio. Op. Cit. p. 120. 
26
 Artigo 2º da CRFB/88. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 25 
Judiciário somente por provocação, salvo exceções, uma 
vez que é este poder o responsável legítimo pela solução 
de litígios em um Estado de Direito, sendo vedado, em 
regra, o exercício arbitrário das próprias razões, isto é, 
fazer justiça pelas próprias mãos.
27
 
O Poder Judiciário, porém, em um Estado 
Democrático de Direito, não se presta somente a este 
desiderato, havendo outras funções exercidas pela 
Magistratura
28
. Segundo as lições de Luiz Flávio Gomes, 
à Magistratura são reservadas as seguintes funções: a) 
solucionar litígios; b) controle dos demais poderes; c) 
autogoverno; d) tutela dos direitos e garantias 
fundamentais; e e) garante do Estado Constitucional e 
Democrático de Direito. 
Para o presente estudo, interessa mais 
profundamente a segunda, a quarta e a quinta funções, 
haja vista que a primeira é de unânime reconhecimento e 
a terceira, diz respeito a uma questão eminentemente 
administrativa de autogestão. 
O controle dos demais poderes não é novidade. 
Como dito, Montesquieu já o conclamava nos idos do 
século XVIII. Todavia, questão curial para uma perfeita 
compreensão do tema diz respeito à legitimidade 
democrática do Poder Judiciário, pois, sempre que uma 
 
27
 Vide artigo 345 do Código Penal, que tem a seguinte 
redação: Art. 345. Fazer justiça pelas próprias mãos para 
satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o 
permite: Pena – detenção, de 15 dias a 1 mês, ou multa, além 
da pena correspondente à violência. 
28
 Neste trabalho é empregado o termo Magistratura (com 
inicial maiúscula) como sinônimo de Poder Judiciário. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 26 
questão de repercussão nacional é levada ao crivo do 
Poder Judiciário e existe a possibilidade de a decisão 
proferida ser contrária à opinião pública majoritária, é 
feita a seguinte indagação: é legítimo o julgamento por 
11 juízes
29
, não eleitos por meio do escrutínio popular, 
sobre a validade ou não de uma lei aprovada por 513 
deputados e 81 senadores, parlamentares estes eleitos 
diretamente pelo povo de forma democrática por meio do 
voto? 
A resposta é afirmativa. Não poderia ser 
diferente. Há uma confusão, ou mesmo um 
desconhecimento, muito comum sobre quais as funções 
da Magistratura em um Estado Democrático de Direito e 
sobre o fundamento da legitimidade democrática de sua 
atuação. 
Quanto às funções, continuaremos adiante. No 
que pertine à legitimidade democrática, cabe um corte 
epistemológico, sendo esclarecedora a lição de Luiz 
Flávio Gomes:
30
 
 
 
29
 Este número se refere à composição do Pleno do Supremo 
Tribunal Federal, que no Brasil é a instância máxima a que 
pode chegar um processo judicial, seja por sua competência 
originária, nos casos elencados na Constituição; seja pela via 
difusa do controle de constitucionalidade, por meio do recurso 
extraordinário; seja pela via concentrada do citado controle, 
por meio das ações que buscam a validação ou invalidação de 
normas infraconstitucionais. 
30
 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura: no 
estado constitucional e democrático de direito. São Paulo: 
Editora Revista dos Tribunais, 1997. p. 120. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 27 
“O Poder Constituinte (soberano) concebeu duas formas 
de legitimação democrática: a representativa (típica doa 
altos cargos políticos) e a legal (inerente à função 
jurisdicional). A legitimação legal, racional ou formal dos 
juízes, portanto, em nada se confunde com a legitimação 
democrática representativa. Aquela reside na vinculação 
do juiz à lei e à Constituição, que são elaboradas pelo 
Poder Político (...) Os juízes, portanto, de acordo com o 
sistema adotado pelos Constituintes, não só não serão 
eleitos diretamente pelo povo, senão que estão proibidos 
de exercer qualquer atividade partidária, o que significa 
que não podem sequer desejar sua eleição direta.” 
 
A legitimidade democrática da Magistratura, 
portanto, não reside em sua eleição diretamente pelo 
povo, pois, para o ingresso nas carreiras da Magistratura, 
o poder constituinte originário previu o processo do 
concurso público.
31
 Se a Assembléia Nacional 
Constituinte – expressão máxima da vontade do povo –, 
ao elaborar a Constituição, previu determinada forma de 
investidura para se tornar membro do Poder Judiciário, o 
respeito a esta forma é inafastável. Entretanto, além da 
forma de ingresso, necessária seja desempenhada a 
função de controle dos demais poderes pela Magistratura 
obedecendo-se à Constituição e às leis, desde que estas 
sejam compatíveis com aquela, o que lhes confere 
 
31
 Artigo 93, I da CRFB/88. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 28 
validade.
32
 A função jurisdicional é exercida sempre 
vinculada e em obediência à Constituição e às leis 
válidas, sendo vedado o uso alternativo do Direito, “no 
sentido de que o juiz está desvinculado da lei”.33 
Outra função da Magistratura relevante para o 
presente estudo é a de tutela dos direitos e garantias 
fundamentais. É o Poder Judiciário o responsável direto 
pela tutela dos direitos e garantias fundamentais dos 
homens. O respeito ao ordenamento jurídico é 
característica fundamental do Estado Democrático de 
Direito, e “só quem pode assegurá-lo em sua plenitude é 
o Poder Judiciário, por meio da tutela judicial efetiva”.34 
A expressão direitos fundamentais é sinônima, 
aqui, dos termos direitos naturais, direitos humanos, 
direitos do homem, direitos individuais, liberdades 
fundamentais, liberdades públicas e direitos fundamentais 
do homem.
35
 No dizer de José Afonso da Silva,
36
 a 
expressão designa 
 
“...no nível do direito positivo, aquelas prerrogativas e 
instituições que ele concretiza em garantias de uma 
convivência digna, livre e igual de todas aspessoas. No 
qualificativo fundamentais, acha-se a indicação de que se 
 
32
 GOMES, Luiz Flávio. Estado constitucional de direito e a 
nova pirâmide jurídica. São Paulo: Premier Máxima, 2008. p. 
75. 
33
 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura: no 
estado constitucional e democrático de direito. São Paulo: 
Editora Revista dos Tribunais, 1997. p. 123. 
34
 Ibidem, p. 96 
35
 SILVA, José Afonso da. Op. Cit. p. 179. 
36
 Ibidem, p. 12. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 29 
trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana 
não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo 
sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a 
todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente 
reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados.” 
 
À Magistratura, então, é dada a missão de 
proteger e fazer serem respeitados os direitos e garantias 
fundamentais, tão caras ao homem e cujo respeito é traço 
fundamental para a caracterização do Estado 
Democrático de Direito. Luigi Ferrajoli,
37
 com maestria, 
sintetiza afirmando que a legitimação substancial 
“consiste na função e capacidade da jurisdição de tutelar 
os direitos fundamentais dos cidadãos”. E continua 
asseverando que “na sujeição do juiz à Constituição e no 
seu papel de garante dos direitos fundamentais está o 
principal fundamento de legitimação democrática da 
jurisdição”.38 
Por derradeiro, merece destaque a função de 
garante do Estado Constitucional e Democrático de 
Direito. Como dito acima, Estado Constitucional e 
Democrático de Direito é, para o presente trabalho, 
considerado sinônimo de Estado Democrático de Direito. 
Foi dito também anteriormente que o Estado 
Democrático de Direito é uma evolução do Estado de 
Direito. 
 
37
 FERRAJOLI, Luigi. Justitia pena y democracia. In: Jueces 
para La Democracia, nº 4, Madrid, p.5 apud GOMES, Luiz 
Flávio. Op. Cit. p. 120. 
38
Loc. Cit.. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 30 
O Estado de Direito liberal, que se desenvolveu 
no século XIX, culminou nas atrocidades perpetradas 
pelo Estado Nazista de Adolf Hitler durante a Segunda 
Guerra Mundial (1939-45). O Estado Alemão fez tudo o 
que fez sob a égide da lei. A doutrina filosófica 
juspositivista, que dominava o cenário jurídico à época, 
deu guarida a tudo isso, seguindo a racionalidade do 
seguinte axioma: “se o legislador é justo, portanto, só 
pode produzir normas justas
”
.
39
 Para superar este marco 
filosófico, surge o pós-positivismo, “confluência das duas 
grandes correntes de pensamento que oferecem 
paradigmas opostos para o Direito: o jusnaturalismo e o 
positivismo”.40 Os direitos naturais agora estão, se não 
em sua totalidade, em sua maioria, positivados nas 
Constituições elaboradas do fim da Segunda Guerra até 
os dias atuais. A dualidade direito natural versus direito 
positivo já não mais subsiste, uma vez que o direito 
natural, agora, como dito, está positivado. O problema foi 
transferido do campo da normatividade para o campo da 
efetividade. Esta é a questão a ser resolvida dentro de um 
Estado Democrático de Direito, já que seu marco 
filosófico o levou a tal situação. 
O Poder Judiciário, neste contexto, exerce o 
papel de garantidor da eficácia dos direitos fundamentais; 
do controle da constitucionalidade das leis; da aferição da 
validade das normas infraconstitucionais 
(compatibilidade formal e substancial com a 
Constituição). Estado de Direito em que não há esse tipo 
 
39
 GOMES, Luiz Flávio. Op. Cit. p. 113. 
40
 BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit. p. 247. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 31 
de garantia, não pode ser chamado qualificado como 
democrático. 
Outrossim, a Magistratura exerce seu mister de 
solucionar os litígios que lhe são levados com 
independência e imparcialidade, tutelando sempre os 
direitos e garantias fundamentais dos indivíduos, 
mormente para conter os abusos do Poder Público no 
exercício de seu papel no sistema de freios e contrapesos, 
característico da tripartição dos poderes, garantindo, 
assim, a permanência do Estado Democrático de Direito. 
Além disso, em função eminentemente administrativa de 
autogestão, exerce ainda o Poder Judiciário seu 
autogoverno, o que lhe garante a independência da qual 
necessita para ser imparcial.
41
 
A contenção dos abusos do exercício do Poder 
Público deve ser realizada em todas as esferas. Uma, 
todavia, merece atenção especial, porquanto se trata da 
intervenção estatal legítima mais gravosa do Estado na 
esfera do indivíduo: o processo penal – meio pelo qual se 
aplica o Direito Penal. 
 
 
41
 GOMES, Luiz Flávio. Op. Cit. p. 80-94. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 32 
2. PROCESSO PENAL 
2.1 Breve Escorço Histórico do Processo Penal 
 
A história do Direito Penal é dividida, de forma 
bastante singela, em três generalizadas etapas: vingança 
divina, vingança privada e vingança pública.
42
 Para fins 
de relato histórico do processo penal, será levada em 
consideração somente a terceira etapa, vingança pública, 
vez que anteriormente a isso não havia verdadeiramente 
um direito penal, senão um sistema de retribuições não 
institucionalizado. E, tendo o processo penal a finalidade 
de “verificar a existência ou não da violação do próprio 
direito estatal de proibir e a incidência ou não do próprio 
direito estatal de punir”,43 será tomada como marco 
referencial inicial a fase em que o jus puniendi é avocado 
pelo Estado. 
A Grécia Antiga já conhecia o processo penal do 
tipo acusatório. No berço da democracia, o processo 
penal, segundo as lições de Tourinho Filho,
44
 tinha 
“participação direta dos cidadãos no exercício da 
acusação e da jurisdição”, e era caracterizado pela 
“oralidade e publicidade dos debates”. 
 
42
 BITENCOURT, Cezar Robeto. Tratado de Direito Penal. 
Parte Geral 1. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 28. 
43
 SANTORO, Antonio Eduardo Ramires. A legitimação do 
direito penal: origem político-axiológica do sistema penal. 
Dissertação de Mestrado apresentada ao programa de pós-
graduação do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da 
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2005, 
p.101. 
44
 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal 1. 
25ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 77. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 33 
Em Roma, houve variação dos sistemas. Na Alta 
República, o processo penal, assim como na Grécia, era 
acusatório, cedendo espaço para o que se tornaria o 
modelo inquisitório conforme se passava do período 
republicano para o período do Império.
45
 
Com o avançar dos tempos, ganhou força no 
mundo ocidental a Igreja Católica, força tamanha que em 
determinado momento Estado, moral e religião se tornam 
conceitos entrelaçados de forma inseparáveis. Com isso, 
o Estado ganhou contornosmísticos, transcendentais, e o 
fundamento de o poder estar nas mãos de um monarca 
absolutista era a vontade divina. 
Até o século XII, ainda não havia no seio da 
jurisdição secular processo sem acusação. Do século XIII 
em diante, todavia, tendo por referência simbólica o IV 
Concílio de Latrão, a Igreja, sob o comando o Papa 
Inocêncio III, altera profundamente o processo e, com o 
mote de se buscar a verdade real, é abolida a figura do 
acusador. O processo a partir deste momento é iniciado 
ex officio pelo juiz inquisidor.
46
 
Neste momento, em busca da propalada verdade 
real dos fatos, é admitida largamente a tortura, visando à 
confissão. Nas sábias palavras do referido Tourinho 
Filho,
47
 “baseado no interesse superior de defender a fé, 
fomentavam-se a indignidade e a covardia”. 
Este modelo perpetuou-se pela Europa por toda a 
Idade Média e Idade Moderna. A ruptura, no entanto, 
 
45
 Ibidem, p. 79. 
 
46
 Ibidem, p. 82. 
47
 Ibidem, p.83. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 34 
teve início com o Iluminismo, no final do século XVIII. 
Pensadores, dentre eles o expoente Cesare Beccaria, 
começaram a se insurgir contra o modelo de Estado da 
época. Tal movimento culminou na Revolução Francesa 
– revolução burguesa que colocou, literalmente, a baixo o 
Antigo Regime.
48
 
Após a revolução, ascendeu ao poder Napoleão 
Bonaparte, inicialmente como primeiro-cônsul e, 
posteriormente, em 1804, como Imperador. Para servir a 
este Império foi criado o sistema processual penal misto, 
composto por elementos caracterizadores do sistema 
acusatório e inquisitório. Este sistema foi perpetuado por 
todo o mundo (cada Estado moldando-o com suas 
nuanças e idiossincrasias), sendo hoje o mais encontrado 
na parte ocidental do globo. Nele a primeira fase, pré-
processual, é inquisitória, não havendo direito a 
contraditório ou a ampla defesa; e a segunda fase, 
processual, acusatória, havendo, aqui, o contraditório e a 
ampla defesa. 
Para uma compreensão sobre o processo penal, 
necessária uma passagem pelos elementos históricos e 
conceituais de cada sistema. 
 
 
 
 
 
 
48
 A referência literal se faz pelo fato de o símbolo da citada 
revolução ser a Queda da Bastilha, prisão que abrigou diversos 
personagens que se opunham ao absolutismo do rei Luis XVI 
da França. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 35 
2.2 Sistemas Processuais 
 
No dizer de Tourinho Filho,
49
 “levando-se em 
conta os princípios que o informam, o Processo Penal 
pode ser acusatório, inquisitivo e misto”. Vejam-se a 
característica de cada um destes tipos. 
 
2.2.1 Sistema Acusatório 
 
O sistema acusatório tem os seguintes traços 
marcantes:
50
 
 
“a) há separação entre as funções de acusar, defender e 
julgar, com três personagens distintos: o autor, o réu e o 
juiz (ne procedat iudex ex officio); 
b) o processo é regido pelo princípio da publicidade dos 
atos processuais, admitindo-se, como exceção, o sigilo na 
prática de determinados atos; 
c) os princípios do contraditório e da ampla defesa 
informam todo o processo. O réu é sujeito de direitos, 
gozando de todas as garantias constitucionais que lhe são 
outorgadas; 
d) o sistema de provas adotado é do livre convencimento, 
ou seja, a sentença deve ser motivada com base nas 
provas carreadas para os autos. O juiz está livre na sua 
apreciação, porém não pode se afastar do que consta no 
processo; 
 
49
 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Op. Cit. p. 88. 
50
 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 14ª ed. ver. 
ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 48-49. 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 36 
e) imparcialidade do órgão julgador, pois o juiz está 
distante do conflito de interesse de alta relevância social 
instaurado entre as partes, mantendo seu equilíbrio, 
porém dirigindo o processo adotando as providências 
necessárias à instrução do feito, indeferindo as 
diligências inúteis ou meramente protelatórias;” 
 
Desta forma, no sistema acusatório o processo 
penal é um processo de partes, caracterizado “pela 
atuação de partes contrapostas – acusador e acusado –, 
que duelam em igualdade de posições e direitos, 
apresentando-se um juiz sobre posto a ambas”.51 Sua 
adoção se dá em Estados de cariz democrático, por sua 
estrutura dialética, sendo o sistema “mais aplicado nos 
países que privilegiam a liberdade do cidadão”. 52 
A origem do sistema acusatório remonta à Grécia 
Antiga, onde o processo penal tinha participação direta 
do povo. No direito romano também se praticou um 
processo penal inspirado em ditames democráticos, mais 
precisamente no período final da Alta República. Com a 
superação do período da República pelo Império, os 
traços democráticos cederam espaço, em Roma, para o 
que mais tarde se desenharia como sistema inquisitório.
53
 
 
51
 SILVA, Danielle Souza de Andrade e. A atuação do juiz no 
processo penal acusatório: incongruências dno sistema 
brasileiro em decorrência do modelo constitucional de 1988. 
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005, p. 41. 
52
 Ibidem, p. 45 
53
 LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua 
conformidade constitucional. Vol. I. 3ª ed. Rio de Janeiro: 
Lumen Juris, 2009, p.56-58. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 37 
Foi no século XIII, entretanto, que o sistema 
acusatório surge como tal na Inglaterra, comandada pelo 
Rei Henrique II, que, com o intuito de desonerar a 
jurisdição real da imensa quantidade de processos que a 
abarrotava, criou o sistema Trial by Jury, modelo em que, 
nos casos de admissão da acusação, um Jury formado por 
12 cidadãos julgava as questões de direito material, 
enquanto o representante real cuidava do respeito às 
questões processuais, às regras do jogo.
54
 
Diferentemente do que ocorreu na Inglaterra – 
país adotante do sistema jurídico do Common Law – nos 
países da Europa Continental – de tradição jurídica do 
Civil Law –, o sistema processual penal desenvolvido no 
mesmo período foi inquisitório, em razão da força 
política exercida pela Igreja Católica. 
 
2.2.2 Sistema Inquisitório 
 
Como características do sistema inquisitório, 
Paulo Rangel assim aponta: 
55
 
 
“a) As três funções (acusar, defender e julgar) 
concentram-se nas mãos de uma só pessoa, iniciando o 
juiz, ex officio, a acusação, quebrando, assim, sua 
imparcialidade; 
 
54
 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Sistema 
acusatório: cada parte no lugar constitucionalmente demarcado. 
In: O novo processo penal à luz da Constituição: análise 
crítica do Projeto de Lei nº 156/2009, do Senado Federal. Rio 
de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 5. 
55
 RANGEL, Paulo. Op. Cit., p. 47. 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 38 
b) O processo é regido pelo sigilo, de forma secreta, 
longe dos olhos do povo;c) Não há o contraditório nem a ampla defesa, pois o 
acusado é mero objeto do processo e não sujeito de 
direitos, não se lhe conferindo nenhuma garantia; 
d) O sistema de provas é o da prova tarifada ou prova 
legal e, conseqüentemente, a confissão é a rainha das 
provas.” 
 
O processo penal no sistema inquisitório, 
portanto, ao reverso do sistema acusatório, não é um 
processo de partes, não tem estrutura dialética, havendo a 
concentração das funções de acusar, defender e julgar em 
um só sujeito, o juiz-inquisidor.
56
 Sua adoção se dá em 
países de cariz autoritário, tendo sido o sistema adotado 
por excelência durante os regimes absolutistas medievais 
e modernos.
57
 
O sistema inquisitório começou a se delinear já 
na fase do Império na Roma Antiga. Seu surgimento 
como sistema, todavia, se deu nos regimes monárquicos 
medievais como superação do sistema acusatório 
privado.
58
 Assim como o sistema acusatório, o 
inquisitório somente aparece como sistema no século 
XIII, mais especificamente em 1215 com o IV Concílio 
de Latrão, no seio da Igreja Católica. Tal aparecimento se 
deu em razão da perda de prestígio e poder da Igreja 
 
56
 SILVA, Danielle Souza de Andrade e. Op. Cit. p. 46. 
57
 O termo moderno, aqui, refere-se, especificamente, ao 
período compreendido entre o Descobrimento das Américas 
(1492) e a Revolução Francesa (1789) – Idade Moderna. 
58
 RANGEL, Paulo. Op. Cit. p. 46. 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 39 
Católica na sociedade, sociedade esta que passava por 
uma transformação na transição dos feudos para os 
burgos.
59
 
Após vigorar por quase toda a Europa 
Continental durante as Idades Média e Moderna, tal 
sistema caiu junto com os regimes absolutistas da época, 
surgindo na França, comandada por Napoleão Bonaparte, 
um novo modelo. 
 
2.2.3 Sistema Misto 
 
O chamado sistema misto surgiu na França com o 
Code d’Instruction Criminalle de 1808. Tal modelo foi 
pensado por Jean-Jacques-Régis de Cambacérès para 
servir a Napoleão Bonaparte, Imperador da França e, 
como tal, um tirano.
60
 
 O sistema misto é composto por elementos 
caracterizadores de ambos os sistemas 
supramencionados, quais sejam, acusatório e inquisitório. 
O sistema misto, concebido na França e cuja espinha 
dorsal serve a boa parte dos sistemas processuais dos 
países ocidentais, tem a primeira fase inquisitória e a 
segunda, acusatória. Na primeira, que no Brasil 
corresponde ao Inquérito Policial, não há direito ao 
contraditório nem à ampla defesa, sendo esta uma fase 
administrativa, cujo objetivo é apurar e colher indícios de 
autoria e materialidade de determinado fato delituoso 
com o escopo de dar subsídios para o exercício da ação 
 
59
 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Op. Cit. p. 2. 
60
 LOPES JR., Aury. Op. Cit. p. 67. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 40 
penal por seu titular (no Brasil, em regra, o Ministério 
Público). 
Na segunda fase, após provocação da parte 
acusadora, é iniciada a etapa judicial da persecução 
penal, dirigida por um juiz e na qual, diferentemente da 
primeira, se aplicam os direitos ao contraditório e à 
ampla defesa, sendo o processo um jogo equilibrado entre 
as partes. 
Os sistemas puros, como concebidos, não 
existem mais na atualidade.
61
 Hodiernamente, o que há 
são sistemas possuidores de elementos característicos do 
sistema acusatório e do sistema inquisitório, sendo 
comum a afirmação de que a conceituação de um sistema 
se dá em razão da existência ou não da separação das 
funções de acusar, julgar e defender. Acusatório é o 
sistema em há tal separação; e inquisitório, o sistema em 
que tal separação não há. 
Este modo simplório de caracterizar o sistema 
processual foi um engodo criado pelo mencionado 
Napoleão, Imperador da França, como arremedo de 
processo penal seguidor dos ditames democráticos, 
escamoteando-se, assim, a verdadeira essência 
inquisitória daquele sistema processual com o 
reducionismo do conceito de sistema misto. 
 
 
 
 
 
61
 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Op. Cit, p. 7. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 41 
2.2.4 A Superação do Reducionismo do Conceito de 
Sistema Misto 
 
Hoje em dia não há mais sistemas puros, ficando 
estes modelos, assim como concebidos, na história. 
Hodiernamente, “todos os sistemas processuais penais 
conhecidos mundo afora são mistos”,62 vez que, 
reafirmando o que foi dito anteriormente, os sistemas 
processuais, assim como concebidos, ficaram na história, 
não existindo mais sistemas puros.
63
 
Jacinto Coutinho,
64
 tomando o conceito Kantiano 
de sistema como conjunto de elementos colocados em 
relação sob uma idéia única, afirma que a identificação 
de um sistema se dá pelo princípio unificador (idéia 
única) que faz a ligação entre os seus elementos. E, sendo 
idéia única, o princípio unificador, como tal, não pode ser 
misto. 
Assentada esta conceituação de sistema, para 
uma análise dos sistemas processuais penais, necessária a 
identificação do princípio unificador que os caracteriza, e 
não apenas a análise da separação inicial das funções de 
acusar, defender e julgar (actum trium personarum). Ao 
sistema acusatório corresponde o princípio dispositivo; e 
ao sistema inquisitório, o princípio inquisitivo.
65
 
O processo é o meio pelo qual se exerce a 
jurisdição (jurisdictio – dizer o Direito). Para dizer o 
Direito, é necessário o conhecimento dos fatos pretéritos 
 
62
 Ibidem, p. 1. 
63
 Ibidem, p. 7. 
64
 Ibidem, p. 7-8. 
65
 Loc. Cit. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 42 
– no caso do processo penal, o fato criminoso objeto de 
investigação e todas as suas circunstâncias –, o que se dá 
por meio da prova. É justamente na gestão da prova, 
portanto, que reside o núcleo fundante do sistema 
processual penal, caracterizando-se o sistema pela a 
opção política de ser dar “a função de aportar as provas 
ao processo seja ao juiz (como no Sistema Inquisitório), 
seja às partes, como no Sistema Acusatório”.66 
Todos os sistemas atualmente são mistos, no 
sentido de que possuem invariavelmente elementos 
(secundários) tanto do sistema acusatório quanto do 
sistema inquisitório. A caracterização de um sistema 
como tal, entretanto, não se dá pela presença de 
elementos secundários, senão por seu princípio 
unificador, que será Dispositivo (sistema acusatório) ou 
Inquisitivo (sistema inquisitório), não cabendo mais o 
reducionismo do conceito de sistema misto ou o engodo 
de que, presente a separação das funções de acusar, 
defender e julgar, caracterizado estaria o sistema como 
acusatório. 
No seio da Igreja Católica, antes do IV Concílio 
de Latrão, existia a figura do acusador, que não se 
confundia com o juiz-inquisidor. No entanto, apesar de 
sua existência, após realizada a acusação, o processo 
ficava a cargo do juiz-inquisidor, que ia à cata de provas, 
provas estas que depois serviriam de base para o seu 
convencimento.Portanto, não é, única e exclusivamente (não 
obstante se reconheça sua vital importância para a 
 
66
 Loc. Cit. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 43 
existência de um sistema acusatório), a separação das 
funções de acusar, julgar e defender que caracteriza um 
sistema como acusatório; que torna o processo penal 
conforme aos ditames democráticos. 
 
2.3 Processo Penal Democrático 
 
O processo penal é reflexo da opção política de 
um Estado. O projeto democrático implica 
necessariamente na valorização do homem e do valor da 
dignidade da pessoa humana, valores que são 
pressupostos básicos do sistema acusatório, tendo 
democracia e sistema acusatório a mesma base 
epistemológica. Afora isso, é de bom alvitre rememorar 
que “a transição do sistema inquisitório para o acusatório 
é, antes de tudo, uma transição de um sistema político 
autoritário para o modelo democrático”. 67 
A Constituição da República de 1988, de maneira 
coerente com sua opção política por um modelo de 
Estado Democrático de Direito, realizou a opção pelo 
sistema acusatório. Apesar de “não prever nossa 
Constituição – expressamente – a garantia de um 
processo penal orientado pelo sistema acusatório”,68 tal 
opção é resultante de uma interpretação sistemática da 
Carta Política, vez que a determinação do Ministério 
Público como titular exclusivo da ação penal pública (art. 
129, I), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV), 
do devido processo legal (art. 5º, LIV), da presunção de 
 
67
 LOPES JR., Aury. Op. Cit. p. 176. 
68
 Loc. Cit. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 44 
inocência (art. 5º, LVII) e da exigência de publicidade e 
motivação das decisões judiciais (ar. 93, IX) são 
características que, apesar de secundárias (pois fundante 
é a gestão da prova), indicam a opção pelo sistema 
acusatório. Mais que isso: os citados elementos 
secundários são inconciliáveis com o sistema inquisitório. 
No sistema acusatório a imparcialidade é o 
“princípio supremo do processo”,69 tendo todos os 
direitos e garantias existência em prol da manutenção 
deste princípio, com a finalidade de ser realizado um 
julgamento justo. Assim como o Direito Penal 
democrático, o processo penal com mesmo matiz tem a 
função de proteção do indivíduo ante as arbitrariedades 
do Estado. Como dito, a adoção do sistema acusatório, 
mormente nos países de tradição jurídica romano-
germânica, se deu em razão da superação de um Estado 
autoritário por um democrático, alterando-se, assim, o 
seu fundamento do eficientismo antigarantista para a 
instrumentalidade constitucional.
70
 
Desta feita, tem-se que o processo penal de matiz 
democrático tem como fundamento a instrumentalidade 
constitucional, o que significa dizer que é o instrumento 
de realização do Direito Penal (leia-se: do exercício do 
direito de penar – aplicação da pena), sob o enfoque do 
Princípio da Necessidade, mas também, e tão importante 
quanto, é o instrumento de garantia da observância 
máxima dos direitos fundamentais insculpidos na 
Constituição, visando assim não só à observância das 
 
69
 LOPES JR. Aury. Op. Cit. p. 122. 
70
 Ibidem, p. 24. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 45 
regras do jogo, mas “um respeito real e profundo dos 
valores em jogo, com os que – agora – já não cabe mais 
jogar”.71 
É esse instrumento de garantia o meio pelo qual 
se exerce a jurisdição, que, por sua vez, apesar de una, é 
exercida individualmente por cada indivíduo que é 
investido daquele poder: o juiz. 
Para que um processo penal seja tido como 
democrático, portanto, necessário se faz o cumprimento 
pelo juiz, que exerce a jurisdição, do papel que lhe é 
atribuído no Estado Democrático de Direito. 
 
2.4 O Papel do Juiz no Processo Penal Democrático 
 
As funções do Poder Judiciário dentro de um 
Estado Democrático de Direito já foram suficientemente 
alinhavadas no item 1.1.4 deste trabalho. Cumpre agora 
reforçar o já citado anteriormente, chamando especial 
atenção para a função do juiz de garantidor dos direitos 
fundamentais. 
Nas palavras de Aury Lopes Jr.,
72
 
 
“o juiz assume uma nova posição no Estado Democrático 
de Direito, e a legitimidade de sua atuação não é política, 
mas constitucional, consubstanciada na função de 
proteção dos direitos fundamentais de todos e de cada 
um, ainda que para isso tenha que adotar uma posição 
contrária à opinião da maioria.” 
 
71
 Ibidem, Op. Cit. p. 109. 
72
 Ibidem, Op. Cit. p. 110-111. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 46 
 
Reafirmando a posição acima, o Ministro do 
Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes asseverou que 
a posição do juiz no Estado Democrático é, por vezes, 
contramajoritária, devendo o magistrado zelar pela 
observância dos direitos fundamentais ainda que esta 
observância se dê em desacordo com a vontade da 
maioria.
73
 
O Ministro Celso de Mello, também do Supremo 
Tribunal Federal, assenta que o juiz “representa o órgão 
estatal incumbido de concretizar as liberdades públicas 
proclamadas pela declaração constitucional de direitos”, e 
continua, assentindo que é dever do magistrado “atuar 
como instrumento da Constituição – e garante de sua 
supremacia – na defesa incondicional e na garantia real 
das liberdades fundamentais da pessoa humana”. 74 
Desta forma, verificamos que o papel do juiz em 
um processo penal que se quer democrático é o de 
julgador imparcial e garantidor dos direitos 
fundamentais dos indivíduos (investigado/acusado e 
vítima), ainda que para isso tenha que tomar decisões que 
contrariem a vontade da maioria. Sua legitimação 
democrática não é política, afirma Aury Lopes Jr. acima, 
mas constitucional; ele não é investido em sua função por 
vontade da maioria para atender aos seus ditames e 
reclamos, mas é investido, sim, na forma insculpida na 
 
73
 Opinião versada em voto proferido no recurso extraordinário 
630.147/DF, que julgava a aplicabilidade da cognominada Lei 
da Ficha Limpa. 
74
 Trecos do voto proferido no recurso extraordinário nº 
466.343/SP. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 47 
Constituição da República, para garantir, por meio do 
exercício de sua função jurisdicional, o respeito aos 
direitos fundamentais de todos, inclusive da minoria 
(normalmente representada na pessoa do acusado, que 
sofre, em muitas das vezes, verdadeira execração 
pública), ainda que para fazê-lo seja necessário estar 
contra a vontade da maioria. 
Foi pensando em possibilitar ao magistrado que 
atua na será criminal o pleno cumprimento do papel que 
lhe é atribuído em um processo penal de matiz 
democrático, que o legislador ordinário elaborou o 
Projeto de Lei do Senado nº 156/2009, buscando-se, 
assim, atender aos reclamos da Constituição da República 
de 1988. 
 
3 O PLS Nº 156/2009 E O JUIZ DAS GARANTIAS 
 
3.1 A Compatibilizaçãodo Processo Penal com a 
Constituição da República 
 
Entre os estudiosos do Direito Processual Penal, 
é consenso a necessidade de uma reforma global visando 
à compatibilização deste ramo do Direito com a 
Constituição da República vigente. No Brasil, há “uma 
convergência quase absoluta: a necessidade de 
elaboração de um novo Código, sobretudo a partir da 
ordem constitucional da Carta da República de 1988”.75 
 
75
 Trecho retirado da Exposição de Motivos do PLS nº 
156/2009, projeto de Código de Processo Penal. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 48 
O processo penal é um importante termômetro 
político. Aury Lopes Jr.,
76
 fazendo menção a James 
Goldschmidt, assevera que 
 
“os princípios de política processual de uma nação não 
são outra coisa do que o segmento de sua política estatal 
em geral; e o processo penal de uma nação não é senão 
um termômetro dos elementos autoritários ou 
democráticos da sua Constituição. A uma Constituição 
autoritária vai corresponder um processo penal 
autoritário, utilitarista (eficiência antigarantista). 
Contudo, a uma Constituição democrática, como a nossa, 
necessariamente deve corresponder um processo penal 
democrático, visto como um instrumento a serviço da 
máxima eficácia do sistema de garantias constitucionais 
do indivíduo.” 
 
Tomando nota da premissa de que o processo 
penal é termômetro do regime político estatal, constata-se 
facilmente que um Código de Processo Penal elaborado 
em 1941, sob a égide do Estado Novo, não pode ser 
compatível com a Constituição elaborada em 1988, sob 
os auspícios do rompimento com o regime ditatorial 
militar da época, sob ares democráticos intensos. Daí a 
urgente necessidade de reforma, mas uma reforma global, 
uma reforma de todo o sistema, e não uma reforma 
pontual, como de há muito se faz no país. É preciso 
superar o ultrapassado e autoritário Código de Processo 
Penal de 1941. 
 
76
 LOPES JR., Aury. Op. Cit. p. 7. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
Rodolfo Santos Correia da Silva 
 
Coleção Monografias Jurídicas nº 2 49 
A Comissão de Juristas responsável pela 
elaboração de anteprojeto de reforma do Código de 
Processo Penal instalada no âmbito da Presidência do 
Senado Federal do Brasil cumpriu seu mister, tendo 
elaborado um anteprojeto e entregado-o à Presidência do 
Senado. Tal anteprojeto passou a tramitar no Senado 
Federal como Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 
156/2009, já tendo sido aprovado pelo plenário daquela 
Casa Legislativa em primeiro turno, estando na ordem do 
dia 23 de novembro de 2010 para votação em segundo 
turno.
77
 
A missão de elaborar um anteprojeto de Código 
de Processo Penal para substituir o Código vigente e 
todas as leis esparsas que tratam sobre o processo penal, 
ao que parece, foi cumprida com êxito. A Comissão 
conseguiu elaborar um texto que dá nova sistemática a 
todo o processo penal, tornando-o compatível com a Lei 
Fundamental, indicando a superação de um sistema 
processual ainda com viés inquisitório.
78
 A exposição de 
 
77
 Informação fornecida em 17 de novembro de 2010 pelo site 
do Senado por meio do push de acompanhamento de matérias 
legislativas. 
78
 Para Jacinto Coutinho, o sistema processual brasileiro não é 
acusatório, mas inquisitório, em razão de seu núcleo fundante, 
que na visão do referido autor é a gestão da prova. Logo, 
estando ela, no caso brasileiro (vide artigo 156, CPP), nas mãos 
do juiz, tem-se caracterizado o sistema como inquisitório, 
porquanto funções atinentes ao exercício da acusação estariam 
nas mãos do órgão julgador, gerando-se assim a confusão das 
funções de acusar e julgar na mesma pessoa (COUTINHO, 
Jacinto Nelson de Miranda. Op. Cit. p. 8-9) 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 50 
motivos já demonstra esta superação ao alinhavar as 
diretrizes que permeiam todo o projeto: 
 
“Nesse passo, cumpre esclarecer que a eficácia de 
qualquer intervenção penal não pode estar atrelada à 
diminuição das garantias individuais. É de ver e de se 
compreender que a redução das aludidas garantias, por si 
só, não garante nada; no que se refere à sua observância, 
ao contrário, é exigência indeclinável para o Estado. Nas 
mais variadas concepções teóricas a respeito do Estado 
Democrático de Direito, o reconhecimento e a afirmação 
dos direitos fundamentais aparecem como um verdadeiro 
núcleo dogmático. O garantismo, quando conseqüente, 
surge como pauta mínima de tal modelo de Estado.” 
 
Outrossim, ao que parece, o PLS 156/2009 tem 
tudo para se transformar no Novo Código de Processo 
Penal, dando início a um movimento necessário que já 
tarda 22 anos: a constitucionalização do processo penal 
brasileiro. 
Importante passo para se chegar a tal desiderato, 
é a previsão do juiz das garantias, instituto que visa a 
garantir o cumprimento das mais importantes funções do 
juiz que exerce a função jurisdicional por meio de um 
processo penal: julgar de maneira imparcial e garantir os 
direitos fundamentais daqueles que participam do 
processo penal, mormente daqueles sobre os quais 
recaem a ameaça de ser aplicada uma pena. 
 
 
 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 51 
3.2 O Instituto do Juiz das Garantias 
 
No Livro I, Título I, Capítulo II do PLS nº 
156/2009 – compreendido entre os artigos 14, inclusive, e 
17, inclusive – está disciplinado o instituto do Juiz das 
Garantias, inovação trazida nesta proposta de reforma 
global do processo penal brasileiro. 
Versa da seguinte maneira o artigo 14 do 
mencionado projeto: 
 
“Art. 14. O juiz das garantias é responsável pelo controle 
da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda 
dos direitos individuais cuja franquia tenha sido 
reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, 
competindo-lhe especialmente:” 
 
Adiante, o artigo 15 define a competência do juiz 
das garantias, que abrange todas as infrações penais, com 
exceção daquelas definidas como de menor potencial 
ofensivo, definindo como termo final a propositura da 
ação penal; finda a sua competência com o oferecimento 
da denúncia ou queixa, portanto. 
O artigo 16 prevê o impedimento de o magistrado 
que atuou como juiz das garantias em determinado 
processo exercer a atividade jurisdicional na fase 
processual, ao reverso do ocorre hodiernamente, com a 
prevenção do juízo (e, com isso, do juiz) que atuou na 
fase pré-processual.
79
 E o artigo 17 apenas estipula que as 
 
79
 Artigo 75, parágrafo único do CPP. 
A Constitucionalização do Processo Penal Brasileiro 
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Coleção Monografias Jurídicas nº 2 52 
normas de organização judiciária de cada ente federativo 
é que designarão o juiz das garantias. 
Por juiz das garantias, no dizer de Rubens 
Casara,
80
 
 
“...entende-se o ator jurídico criado pela Reforma o 
Código de Processo Penal que passa a ser responsável 
pelo exercício das funções jurisdicionais alusivas à tutela 
das liberdades públicas, ou seja, das inviolabilidades 
pessoais/liberdades individuais frente à

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