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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA FELIPE ALEXANDRE DA SILVA HIPÓTESES DE CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA (ART.966 CPC/2015) PONTA GROSSA 2018 FELIPE ALEXANDRE DA SILVA HIPÓTESES DE CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA (ART.966 CPC/2015) PONTA GROSSA 2018 3 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 4 2 NATUREZA JURÍDICA............................................................................... 5 3 HIPÓTESES DE CABIMENTO.................................................................... 6 3.1 PREVARICAÇÃO, CONCUSSÃO, CORRUPÇÃO PASSIVA DO JUIZ...... 6 3.2 IMPEDIMENTO DO JUIZ E INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO.... 6 3.3 DOLO OU COAÇÃO DA PARTE VENCEDORA E SIMULAÇÃO OU COLUSÃO ENTRE AS PARTES PARA FRAUDAR A LEI.......................... 7 3.4 OFENSA À COISA JULGADA..................................................................... 8 3.5 VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA....................................... 8 3.6 PROVA FALSA............................................................................................ 10 3.7 PROVA NOVA............................................................................................. 10 3.8 ERRO DE FATO.......................................................................................... 11 7 CONCLUSÃO.............................................................................................. 13 REFERÊNCIAS...................................................................................................... 15 4 1. INTRODUÇÃO Este trabalho tem por escopo desenvolver um estudo das oito hipóteses cabíveis para ajuizar uma ação rescisória, baseado no Artigo 966 do CPC/2015. No início da obra, busca-se conceituar a natureza jurídica desta ação autônoma do direito processual civil pátrio, sempre com o embasamento de renomados doutrinadores da seara processual, como Fredie Didier Jr, Leonardo Carneiro da Cunha, Daniel Amorim Assumpção Neves e Cassio Scarpinella Bueno. A pesquisa utilizou um método sistemático de explanação de cada inciso e suas particularidades, bem como pontuações sobre as distinções do diploma processual antigo de 1973 e o código hodierno de 2015. A obra traz opiniões do autor de forma concisa, aliadas à inserção de pensamentos dos renomados autores supracitados e entendimentos jurisprudenciais das cortes superiores do Brasil (STF e STJ), tendo por objetivo demostrar na prática o conhecimento teórico sobre cada hipótese. Nesta empreitada, automaticamente se observa a evolução desse instituto processual conhecido como ação rescisória e pela sua grande importância na correção de injustiças que tenham ocorrido eventualmente nas decisões, utilizando as palavras do professor Daniel Amorim Assumpção Neves1: “É possível tratar a ação rescisória como o último suspiro de justiça do sistema processual pátrio”. 1 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. São Paulo: Método, 2014, p. 1464. 5 2. NATUREZA JURÍDICA O Código de Processo Civil2 traz, no capítulo VII do livro III (Dos Processos nos Tribunais e dos meios de impugnação das decisões judiciais), a figura da ação rescisória, no dispositivo do art. 966. Trata-se basicamente de uma ação autônoma, que visa desconstituir uma decisão judicial que tenha gerado coisa julgada material, diante da presença de ao menos um dos oito incisos do artigo em estudo. É um mecanismo processual que se configura como uma excepcionalidade legalmente prevista, relativizando a coisa julgada material. A ação rescisória expõe a seguinte dicotomia, conforme o pensamento do renomado professor Daniel Amorim Assunção Neves: O eterno conflito entre dois essenciais valores de nosso sistema processual, o legislador, ao prever, ainda que de forma excepcional, a ação rescisória, dá uma derradeira chance à justiça em detrimento da segurança jurídica. É possível tratar a ação rescisória como o último suspiro de justiça do sistema processual pátrio3. O objeto da rescisão engloba não apenas decisões de mérito, mas também decisões interlocutórias, conforme o Enunciado 336 do Fórum Permanente de Processualistas Civis4, bem como decisões monocráticas e acórdãos. Interessante ressalva é no tocante às ações que visam a rescisão somente de alguma parte da decisão, sendo que o STJ já havia mitigado esta questão, conforme jurisprudência do STJ5. Com a entrada em vigor do CPC 15, positivou-se tal emanamento jurisprudencial no P2º, inciso I e II do art.966 do corrente código. 2 BRASIL. Código de Processo Civil. Livro III – Dos Processos nos Tribunais e dos meios de impugnação das decisões. Capítulo VII – Da Ação Rescisória. 2015. 3 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. São Paulo: Método, 2014, p. 1464. 4 Enunciado n.º 336 do FPPC: Cabe ação rescisória contra decisão interlocutória de mérito 5 STJ: 1ª Turma, AgRg no Ag 1.308.6011/BA, Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, j. 21.08.2012. Dje 27.08.2012; 1ª Seção, AgRg nos EREsp 1.111.092/MG, Relator: Ministro Herman Benjamim, j. 27.06.2012, Dje 22.08.2012. 6 Na obra do professor Daniel Amorim Assumpção Neves6, o autor elenca importante rol de decisões que não são impugnáveis por meio de ação rescisória em razão de expressa vedação legal: (i) acórdão proferido em ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) ou em ação declaratória de constitucionalidade (ADECON) (art. 26 da Lei 9.868/1999); (ii) acórdão proferido em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) (art. 12 da Lei 9.882/1999); e (iii) decisões proferidas nos Juizados Especiais (art. 59 da Lei 9.099/1995). 3. HIPÓTESES DE CABIMENTO Os vícios de rescindibilidade existentes no Artigo nº 966 do Código de Processo Civil são de natureza restritiva, ou seja, rol taxativo, de forma que não se admita alguma rescisória fundada em qualquer outro vício que não esteja presente no corrente dispositivo, como pontua Neves7. As oito hipóteses previstas para dar azo a uma ação rescisória correspondem em rigor a “causas de pedir” daquela postulação, como discorre o professor Cassio Scarpinella Bueno8, em seu manual de direito processual civil. 3.1. PREVARICAÇÃO, CONCUSSÃO, CORRUPÇÃO PASSIVA DO JUIZ Está prevista no inciso I do Art. 966 a possibilidade de cometimento de crimes relacionados ao favorecimento do magistrado, dando determinada decisão por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz, tipos penais dos artigos 319, 316 e 317 do Código Penaç, respectivamente, que significam a obtenção de alguma vantagem ilícita pelo magistrado em detrimento do exercício de sua função jurisdicional. 3.2. IMPEDIMENTO DO JUIZ E INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO 6 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. São Paulo: Método, 2014, p. 1466. 7 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. São Paulo: Método, 2014, p. 1468. 8 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p.691. 7 O inciso II do artigo 966 assinala a situação de impedimento do juiz e incompetência absoluta do juízo. É de bom grado relembrar o Art.144 do CPC159, que discorre sobre as causas de impedimento do magistrado, frisando que para a ação ser impetrada é necessário o impedimento, não se confundindo com as causas de suspeição. Acerca da incompetência absoluta, doutrina e jurisprudência fluem no mesmo sentido, assinalando a ocorrência de ofensa à matéria de ordem pública. Por isso, há a possibilidade de ingressar com a ação rescisória mesmo que percorrida todaa marcha processual, culminando no trânsito em julgado. Como suscitado acima, a incompetência absoluta do juízo que proferiu a sentença de mérito acarreta em nulidade da decisão, insanável com o trânsito em julgado. Nas palavras da Professora Adriana Donadel10, em sua tese de mestrado no estudo da ação rescisória, “[...] o vício sobrevive e torna a decisão passível de desconstituição via ação rescisória”. Concluindo o raciocínio sobre este inciso, utiliza-se a obra do professor Barbosa Moreira, que aponta: “sendo absoluta a incompetência, a sentença é nula até o trânsito em julgado, sendo rescindível após este”11. 3.3. DOLO OU COAÇÃO DA PARTE VENCEDORA E SIMULAÇÃO OU COLUSÃO ENTRE AS PARTES PARA FRAUDAR A LEI No inciso III, verifica-se que pode ser rescindível a decisão de mérito quando resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, com fim de fraudar a lei. Em relação ao disposto no inciso III do Art. 485 do antigo CPC de 1973, percebe-se que ocorreu uma extensão quando comparado com o inciso III do Art. 966 do código atual. Bueno explica acerca da atualização do diploma atual: 9 BRASIL. Código de Processo Civil. Livro III – Dos Processos nos Tribunais e dos meios de impugnação das decisões. Capítulo VII – Da Ação Rescisória. 2015. 10 DONADEL, Adriane. A ação rescisória no Direito Processual Civil brasileiro. 2003. 316 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Curso de Pós-Graduação em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003, p. 119. 11 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código do Processo Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. 8 A situação traz à mente, até mesmo, o disposto no art. 142 CPC/15. Se, a despeito daquela previsão, a decisão acabar transitando em julgado, a rescisória é o caminho para extirpá-la do ordenamento jurídico. Destaco que, nesse caso, têm legitimidade, além do terceiro prejudicado (art. 967, II), o Ministério Público (art. 967, II, b). O prazo para a rescisória é também alterado, como demonstro, a propósito do § 3º do art. 975, no n. 8.7, infra12. 3.4 OFENSA À COISA JULGADA No inciso IV, verifica-se a situação de um processo se desenvolver apesar de ocorrer coisa julgada anterior ou, até mesmo, relacionada a litispendência e, com isso, ocorrer conflito de coisas julgadas. Para Bueno, a ação rescisória é válida quando ocorre “com objetivo de cancelar a coisa julgada que tenha se formado em segundo lugar, ainda que proveniente do processo iniciado anteriormente, prestigiando, com isso, a proteção constitucional do inciso XXXVI do art. 5º da CF” 13. Em suma, protege-se o preceito fundamental da coisa julgada e ato jurídico perfeito. 3.5 VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA Na quinta possibilidade, pode-se entender que: cabe a ação rescisória prevista pelo art.966, inciso V, do Novo CPC, no fundamento de erro crasso do juízo na aplicação de caso concreto, de acordo com os estudos de Neves, considerando- se que a decisão que violar manifestamente uma norma jurídica deve ser desconstituída. O termo “norma” é abrangente e engloba, além de normas gerais, precedentes e princípios não escritos. Ainda no entendimento do autor: Entendo que a amplitude desse entendimento inclui até mesmo os princípios escritos, entendimento corroborado pela redação do dispositivo se comparada com a redação revogada do art. 485, V, do CPC/1973. Enquanto a norma revogai_lá mencionava violação à "lei" a nova norma prevê violação à "norma jurídica: conhecendo que a lei não é a única fonte do Direito que pode ser violada para ensejar ação rescisória. Apesar da correta lição no sentido de que decisão proferida contra jurisprudência ou súmula não pode ser objeto de rescisão, tratando-se de Súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal, caberá ação rescisória, havendo entendimento doutrinário de que o mesmo deva ocorrer na hipótese de violação a precedentes vinculantes14. 12 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. 13 Idem. 14 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. São Paulo: Método, 2014, p. 1468 9 Para configurar a manifesta violação, deve-se observar que não basta uma colisão versus interpretação literal de algum dispositivo, mas sim uma afronta ao ordenamento jurídico, algo de maior complexidade que o conceito de lei. O grande doutrinador pátrio na esfera de direito processual civil, o professor Didier Jr, traz em sua obra o pensamento explanado acima sobre a macro análise necessária para avaliação de afronta a norma jurídica como um sistema: Nesse mesmo sentido, não é mais cabível ação rescisória por violação à "literal disposição da lei", mas por violação à "norma jurídica". Quando o art. 8° alude a "princípio da legalidade", está a exigir, em verdade, que o juiz julgue em conformidade com o Direito, com o ordenamento jurídico, com o sistema normativo aplicável ao caso, devendo realizar o controle de constitucionalidade, e não aplicar lei inconstitucional. A observância ao princípio da legalidade não significa que a intepretação do texto normativo deva ser literal. Muitas vezes, a interpretação literal é a menos adequada ou a que não satisfaz a situação. Aliás, o art. 8°, ao determinar que o juiz atenda aos fins sociais e às exigências do bem comum, observando a proporcionalidade e a razoabilidade, impõe a intepretação teleológica ou finalística. Ademais, há normas sem texto; texto e norma não se confundem 15. É de grande valia relacionar a súmula 343 do STF com o corrente inciso. O professor Didier Jr. alerta quanto à problemática que a cerceia: A aplicação desse enunciado deve ser examinado em quatro exemplos ora aventados: a) Divergência na interpretação do Direito entre tribunais, sem que existisse, ao tempo da prolação da decisão rescindenda, precedente vinculante do STF ou STJ (art. 927, CPC) sobre o tema: não há direito à rescisão, pois não se configura a manifesta violação de norma jurídica. Aplica-se o n. 343 da súmula do STF. b) Divergência na interpretação do Direito entre tribunais, sem que existisse, ao tempo da prolação da decisão rescindenda, precedente vinculante do STF ou STJ (art. 927, CPC) sobre o tema; após o trânsito em julgado, sobrevém precedente obrigatório do tribunal superior: observado o prazo da ação rescisória, há direito à rescisão, com base nesse novo precedente, para concretizar o principio da unidade do Direito e a igualdade. Note que o §-15 do art. 525, examinado mais à frente, reforça a tese de que cabe ação rescisória para fazer prevalecer posicionamento de tribunal superior formado após a coisa julgada. c) Divergência na interpretação do Direito entre tribunais, havendo, ao tempo da prolação da decisão rescindenda, precedente vinculante do STF ou do STJ sobre o tema: se a decisão rescindenda contrariar 15 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 491. 10 o precedente vinculante, há direito à rescisão, pois se configura a manifesta violação de norma jurídica. Violam-se, a um só tempo, a norma do precedente e a norma que decorre do art. 927, CPC. d) Divergência na interpretação do Direito entre tribunais, havendo, ao tempo da prolação da decisão rescindenda, precedente vinculante do STF ou STJ; após o trânsito em julgado, sobrevém novo precedente do tribunal superior, alterando o seu entendimento: não há direito à rescisão, fundado nesse novo precedente, tendo em vista a segurança jurídica, tal como decidido pelo STF, noRE n. 590.809, rel. Min. Marco Aurélio, j. em 22.10.2014. 16 3.6 PROVA FALSA O inciso VI do Art. 966 do CPC/15 disciplina a sexta hipótese que dá azo à ação rescisória. Sumariamente, quando uma decisão for pautada estritamente em uma prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou tenha sido provada na própria ação rescisória, existirá a possibilidade de rescindir esse vício. Interessa ao debate a contribuição do Professor Didier sobre a especificidade da decisão com base somente em prova falsa versus a decisão com provas falsas em adição com outras de lastro legal: É preciso notar que somente cabe a rescisão caso a decisão se funde apenas na prova falsa. Se a decisão rescindenda funda-se em outra prova, além daquela que se reputa falsa, não há o direito à rescisão, pois, afinal, a decisão pode manter-se com base em outro lastro probatório. Somente cabe a rescisão em razão da prova falsa se ela for a "base" que sustenta a decisão rescindenda. "O que importa é averiguar se a conclusão a que chegou o órgão judicial, ao sentenciar, se sustentaria ou não sem a base que lhe ministrara a prova falsa. A sentença não será rescindível se havia outro fundamento bastante para a conclusão 17. Outra questão que vem à baila quando se analisa a prova falsa é a possibilidade de uma prova que tenha sido obtida por meio ilícito ter o condão de fluir a ação rescisória. Segundo Didier, ele pode sim dar fluência a ação. Contudo, como explica o professor, deverá acontecer o pedido abarcado pelo inciso V e não pelo inciso VI. O fundamento da rescisória, nesse caso, é o art. 966, V, do CPC, porquanto terá havido ofensa manifesta a norma jurídica. Realmente, utilizada uma prova ilícita no processo, restou violada a norma que a proíbe. Tudo está a 16 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 495-496. 17 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 498-499. 11 indicar, portanto, que a prova não falsa, obtida por meio ilícito, autoriza ação rescisória, fundada no art. 966, V, do CPC. A conclusão é a de que cabe a ação rescisória, não com fundamento no inciso VI do art. 966 do CPC, pois a prova não é falsa, mas com fundamento, isto sim, no inciso V do art. 966 do CPC, haja vista a violação manifesta à norma jurídica18. 3.7 PROVA NOVA O CPC/15, em seu inciso VII, pontua sobre a prova nova. Isso acontece quando, após o término do processo, a parte obtiver novo elemento probatório que lhe poderia assegurar resultado favorável. Nesses casos, admite-se a rescisão da decisão judicial. Entende-se que a prova nova não é aquela surgida após o encerramento do processo, mas aquela prova que já existia ao tempo do julgamento do mérito que a parte ignorava ou tenha ficado impossibilitado de utilizar. Abaixo alguns trechos de julgados que substanciam o emanamento do corrente inciso em análise: JULGADO 01: “ação rescisória. previdenciário. documento novo. aposentadoria por idade. trabalhador rural. prova material. existência. I – Esta Seção, considerando as condições desiguais vivenciadas pelo trabalhador rural e adotando a solução pro misero, entende que a prova, ainda que preexistente à propositura da ação, deve ser considerada para efeitos do art. 485 VII, do CPC. Precedentes. II – Certidão de nascimento do filho da autora, em que o cônjuge desta está qualificado como lavrador, é apta à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Ação rescisória procedente”. 19 JULGADO 02: “(…) No caso dos trabalhadores rurais, a jurisprudência tem abrandado os rigores processuais do art. 485, VII, do Código de Processo Civil, admitindo o uso do documento novo ainda que o mesmo seja preexistente, encontrando-se em poder do rurícola quando do ajuizamento da ação originária. Tem-se entendido que, nestes casos, a situação de dificuldade do trabalhador rural, em geral pessoas simples, de baixo grau de instrução, com poucos recursos financeiros e com restrito acesso a informações precisas sobre seus direitos, torna justa a aplicação da solução pro misero, possibilitando o uso de documentos aos quais poderia ter acesso, mas que não foram oportunamente utilizados em razão de sua condição desigual (…)”. 20 3.8 ERRO DE FATO 18 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 500. 19 STJ. AR 3.520/SP, 3.ª Seção, j. 27.02.0. Relator Ministro Felix Fischer, DJe 30.06.2008. 20 TRF3. AR 00692511320054030000, 3.ª Seção, j. 28.04.11. Desembargador Federal Newton De Lucca, DJe 04.05.2011. 12 A oitava hipótese de incisão da ação rescisória consubstancia quando o magistrado executar uma sentença baseada em fato inexistente ou quando considerar inexistente fato concreto ocorrido, conforme o Artigo 966, Parágrafo 1º, do CPC. Em síntese, é uma suposição equivocada, um erro de percepção, que não se confunde com algum critério interpretativo do juiz. Está conectado ao fato, e não a aspectos de cunho subjetivo. Alvim discorre sobre o conceito de erro de fato "pois, caso contrário emprestará consequências jurídicas que não ocorreram, pois deu como existentes fatos que não se verificaram, ou, em outras palavras, aplicará uma lei que não incidiu, tendo havido erro de fato"21. Assim, para dar causa à ação é necessário: a) Erro de fato com nexo causal com a decisão , utilizando o método hipotético de Thyrén22, oriundo dos estudos doutrinários do direito penal, para exemplificar a técnica de aferição dessa primeira situação; b) Deve ser verificável no exame dos autos, inovação oriunda do CPC/15; c) Fato não pode ser controvertido e não pode gerar dúvidas entre as partes, caso contrário, não pode ser impetrada a ação rescisória. Em relação à apuração de controvérsias, é de bom grado observar a sistematização de Barbosa Moreira: Na primeira hipótese (fato não alegado), o motivo de rescindibilidade só pode configurar-se, é claro, se se tratava de fato que o órgão judicial era licito levar em conta ex officio"200; logo, fato que, nada obstante não aportado ao processo pela parte, pudesse ser conhecido de oficio pelo juiz. A segunda hipótese (fato admitido) - continua Barbosa Moreira201 - compreende duas possibilidades: ou as partes concordaram quanto à existência do fato, e o juiz, em decisão, ainda assim o supôs inexistente, ou, ao revés, as partes concordaram com a inexistência do fato e o juiz o supôs existente. Terceira, e última, hipótese consiste no fato não contestado (não impugnado), mas, mesmo assim, por análise dos autos, é verificável sua inexistência. A ação rescisória por erro de fato pode ser um bom instrumento de proteção do revel, no caso de a revelia ter produzido o seu efeito material (art. 344, CPC) e a decisão rescindenda fundar-se exatamente nessa presunção23. 21 ALVIM, José Manoel Arruda. Sentença no processo civil. Revista de Processo, São Paulo, 1976, p. 71 apud DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. 22 Em 1894, o Professor Thyrén desenvolveu o chamado processo de eliminação hipotética, sendo que, segundo este método, para saber se uma ação é causa do resultado, basta, mentalmente, excluí-la da série de acontecimentos causais, e se, com a exclusão desta ação, perceber-se que o resultado teria deixado de acontecer, ela pode ser considerada causa. 13 No trecho abaixo, foi inserida uma ementa do STJ sobre uma ação rescisória que obteve êxito no fulcro do inciso VIII. Não obstante a decisão estar baseada no CPC/73, adotado em razão da data do ajuizamento da ação,a argumentação é atual pelo fato de que o Art. 485, inciso IX, P1° do CPC/73 permanecer com efeito normativo similar ao do Art. 966, inciso VIII do atual diploma processual civil pátrio: AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO DO DE CUJUS. TRABALHADORA RURAL. ERRO DE FATO. OCORRÊNCIA. DOCUMENTOS QUE INDICAM O TRABALHO CAMPESINO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. EXISTÊNCIA. INFORMAÇÕES CONFIRMADAS POR TESTEMUNHAS. PEDIDO PROCEDENTE. 1. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando fundada em erro de fato resultante de atos ou de documentos da causa, ou seja, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido (artigo 485, inciso IX e § 1º, do CPC/73). 2. Diante da árdua tarefa encontrada pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das dificuldades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência assente nesta Seção tem adotado a solução pro misero, pela qual se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de agricultor, desde que acompanhada de início de prova material. 3. O decisum rescindendo considerou que não haveria início de prova material para a demonstração do labor rural da falecida. Todavia, colhe-se dos autos que foram juntados documentos em que consta a falecida como agricultora. Portanto, o julgado impugnado considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido, ensejador do erro de fato apto para desconstituir o trânsito em julgado. 4. Essa circunstância, aliada à assertiva da sentença de que as testemunhas corroboraram a participação da falecida no trabalho campesino, caracteriza a qualidade de rurícola e, por conseguinte, de segurada perante o Regime Geral da Previdência Social, implicando, com isso, o direito do viúvo em perceber a pensão por morte. 5. Pedido procedente, para rescindir o decisum guerreado e restabelecer a sentença que concedeu a pensão por morte ao requerente24. 4. CONCLUSÃO Ao findar desta obra, preenchida com as opiniões de diversos autores clássicos do direito processual civil pátrio, bem como jurisprudências de tribunais superiores, vem à tona a importância do que foi concebido como ação rescisória. 23 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao código de processo civil, 12 ed., p. 149 apud DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 507. 24 STJ. AR: 4041 SP 2008/0179925-1. Relator: Ministro Jorge Mussi, Data de Julgamento: 26/09/2018, S3 – 3ª Seção, DJe 05/10/2018. 14 Um verdadeiro meio de corrigir sentenças que, por algum dos motivos supracitados nos incisos do art.966 do CPC/15, poderiam levar ao trânsito em julgado definitivo de inúmeras injustiças que muitas das vezes podem passar despercebidas pelo órgão julgador. A pesquisa realizada apresenta a evolução desse instituto e as consequências ínsitas no novo diploma processual de 2015. A marca dessa inovação é exposta principalmente na hipótese do inciso V, quando se analisa a questão da norma jurídica. Diga-se norma no sentido amplo, com as novas perspectivas, evitando entendimentos equivocados à restrição a lei em sentido apenas literal. Este remédio processual tem genuína finalidade de desconstituir decisões injustas ou viciosas que tenham transitado em julgado, sendo um direito acessível a todos que pleiteiam justiça e direitos por intermédio do processo civil. Por término deste estudo, conclui-se a pesquisa com a reflexão do exímio processualista Uruguaio, o jurista Eduardo Juan Couture: “Teu dever é lutar pelo Direito, mas se um dia encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça”. 15 REFERÊNCIAS BRASIL. Código de Processo Civil. Livro III – Dos Processos nos Tribunais e dos meios de impugnação das decisões. Capítulo VII – Da Ação Rescisória. 2015. BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p.691. DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. DONADEL, Adriane. A ação rescisória no Direito Processual Civil brasileiro. 2003. 316 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Curso de Pós-Graduação em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código do Processo Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. São Paulo: Método, 2014.
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