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1 The rise and fall of american growth Robert J. Gordon Princeton, NJ: Princeton University Press, 2017 Desigualdade e Outros Ventos Contrários: o Crescimento Econômico de Longo Prazo dos Estados Unidos Desacelera para um Passo de Tartaruga Capítulo 18 "A família americana está mudando – e as mudanças garantem que a desigualdade será maior na próxima geração. Pela primeira vez, os filhos de uma geração certamente não serão tão bem educados, saudáveis, ou ricos como os seus pais" (June Carbone e Naomi Cahn, 2014) Introdução O impacto das inovações e da mudança tecnológica no capítulo 17 foi mensurado pelo seu efeito na produtividade total dos fatores (PTF). Não existe qualquer garantia de que cada membro da sociedade irá participar igualmente dos frutos do progresso econômico. Esse capítulo olha mais detalhadamente para os resultados muito diferentes que ocorreram no topo da distribuição de renda em comparação com o meio e com a base da distribuição. Quando os ganhos de renda no topo são desconsiderados, o crescimento na renda total disponível para ser dividida entre os 99% de baixo cresce mais lentamente do que a renda nacional como um todo. Assim como 1970 foi um divisor de águas no capítulo 17, o ponto de divisão entre o crescimento rápido e o lento da PTF, assim também houve uma transição paralela e independente entre crescimento igualitário para todos antes de 1970 e crescimento desigual após 1970. Por várias medidas, incluindo o salário real mediano e a renda real tributável dos 90% na base da distribuição de renda, não houve qualquer progresso. Outras medidas do crescimento da renda abaixo do 1% no 2 topo geram crescimento positivo, ao invés de zero –, mas a uma taxa substancialmente mais lenta do que as médias que incluem o 1% no topo. Uma desigualdade crescendo continuamente ao longo das últimas quatro décadas é apenas um dos ventos contrários soprando com força de tempestade para diminuir a taxa de crescimento do padrão de vida nos Estados Unidos. Outros que recebem atenção nesse capítulo são a educação, a demografia, e a dívida governamental. Ventos contrários adicionais como a globalização, o aquecimento global, e a poluição ambiental são tocados mais brevemente. A conclusão geral desse capitulo é que a influência combinada desses ventos contrários constitui um peso adicional que arrasta o crescimento futuro bem abaixo da desaceleração pós-1970. O capítulo começa com um tratamento multifacetado da história da distribuição de renda nos Estados Unidos desde que os primeiros registros de tributação de renda se tornaram disponíveis há cem anos atrás. O ritmo rápido do avanço nas rendas do topo, particularmente dentro do 1% no topo, pode ser explicado por um conjunto de fatores que estimularam as rendas mais altas, incluindo a economia dos superastros, incentivos alterados para o pagamento dos executivos, e ganhos de capital em imóveis ou na bolsa de valores. A estagnação de renda para os 90% na base da distribuição tem um conjunto diferente de causas, incluindo o efeito da automação na destruição dos empregos de classe média, uma erosão na força dos sindicatos, o declínio no poder de compra do salário mínimo, os efeitos das importações na diminuição do setor manufatureiro, e o papel da imigração, tanto de trabalhadores bem qualificados quanto de baixa qualificação. O vento contrário da educação é importante tanto em si mesmo quanto pelo seu efeito como uma fonte da crescente desigualdade. Através dos anos do pós-guerra, começando com a Lei dos Veteranos, os Estados Unidos foi o líder entre as nações na taxa de formação universitária da sua juventude. Mas nas últimas duas décadas, os Estados Unidos tropeçaram, com a taxa de formação universitária abaixo da décima posição. E os jovens norte-americanos que entram na universidade, independente de completarem os estudos, agora enfrentam o ônus combinado de uma dívida total de mais de US $ 1 trilhão. Problemas educacionais são ainda mais graves nas escolas secundárias dos Estados Unidos, que se posicionam na metade inferior dos testes internacionais de leitura, matemática, e ciências administrados a adolescentes de 15 anos. Mais sério é o alto grau de desigualdade na leitura e nas habilidades de vocabulário das crianças na idade de 5 anos, a idade normal de entrada no jardim de infância; as crianças de classe média possuem um vocabulário falado de mais do triplo das crianças criadas em condições de pobreza por um único pai ou mãe. O terceiro vento contrário "demográfico" se refere à população, vista não como uma entidade singular, mas como grupos e subgrupos dentro do total. O aspecto mais importante da demografia dos Estados Unidos é 3 o aumento na taxa de fertilidade entre 1946 e 1964, o chamado "baby boom." Uma vez que o sistema de Seguridade Social permite a aposentadoria em três idades alternativas – atualmente 62, 66 ou 70 – os efeitos da aposentadoria dos nascidos no baby-boom estão espalhados, começando em 2008 e se estendendo até 2034. Outros problemas demográficos incluem a mudança nos padrões de trabalho, à medida em que aumenta a proporção daqueles com 55 anos de idade ou mais que escolhem permanecer trabalhando, ao mesmo tempo em que as taxas de participação na força de trabalho declinaram para todos gêneros nos grupos de idade mais jovens que 55 anos. Considerados conjuntamente, o efeito da aposentadoria dos nascidos no baby-boom e a participação declinante dos mais jovens na força de trabalho reduzem o número médio de horas trabalhadas por pessoa e implicam que o padrão de vida definido como produto per capita deva crescer mais lentamente do que a produtividade do trabalho, que é definida como produto por hora trabalhada. A dívida pública é o quarto vento contrário, por que se prevê que a razão da dívida governamental para o PIB cresça continuamente no futuro. A razão crescente entre o número de aposentados para trabalhadores contribuintes irá requerer em breve mudanças no atual conjunto de alíquotas para as contribuições à Seguridade Social e/ou no valor dos benefícios; atualmente se projeta que o fundo atuarial da Seguridade Social deva declinar até 2034 para um nível abaixo do qual não se poderia pagar as obrigações atualmente contratadas, enquanto se espera que o fundo atuarial do Medicare irá alcançar o nível de exaustão em 2030. Em algum ponto, medidas precisarão ser tomadas para controlar os déficits fiscais persistentes com reformas estruturais que combinem o aumento da receita de impostos e redução dos gastos. Por definição, qualquer aumento nas alíquotas dos impostos e/ou diminuições nas transferências de pagamentos às famílias deve reduzir o crescimento da renda pessoal disponível abaixo da renda antes do pagamento dos impostos. Os efeitos combinados da crescente desigualdade, um sistema educacional vacilante, ventos demográficos adversos, e a forte probabilidade de uma correção fiscal implicam que a renda real disponível mediana irá crescer muito mais lentamente no futuro do que no passado. Quando combinados com as implicações do menor impacto das inovações na produtividade desde 1970, existe pouco espaço mesmo para o fraco crescimento. Quando todos os ventos contrários são levados em consideração, o crescimento futuro da renda real disponível mediana mal será positivo e muito abaixo da taxa aproveitada por gerações de norte-americanos desde o final do século XIX. O efeito combinado dos quatro ventos contrários – desigualdade, educação, demografia, e dívida governamental – pode ser aproximadamente quantificado. Muito mais difíceis de avaliar são os numerosos sinais de ruptura social nos EstadosUnidos. Seja mensurado como a porcentagem de crianças crescendo em lares uniparentais, ou 4 pela desvantagem de vocabulário dos crianças em idade pré-escolar oriundas de famílias com baixa renda, ou pela porcentagem de jovens negros ou brancos aprisionados, sinais de decadência social estão em todos os lugares nos Estados Unidos do início do século XXI. Esses problemas serão examinados neste capítulo, e um conjunto de diretrizes para mudanças de política é apresentado no pós-escrito subsequente. O Primeiro Vento Contrário: Dimensões da Crescente Desigualdade Ao longo desse livro, o progresso foi mensurado pela taxa de avanço da média representada pelo PIB real per capita ou por hora trabalhada. Tais médias, ou valores médios, podem ser equivocados se o ritmo das melhorias beneficia aqueles que possuem altas rendas mais do que aqueles que possuem rendas médias ou baixas. Quando a distribuição de renda, ou de riqueza, ou de qualquer outra quantidade se torna viesada a favor daqueles que estão no topo, então os valores medianos das séries crescem mais lentamente do que o valor médio. E isso é exatamente o que ocorreu nos Estados Unidos ao longo das últimas quatro décadas. Nesta seção, nós examinaremos separadamente três bases de dados separadas, a primeira baseada em registros dos impostos, a segunda sobre dados do U.S. Census Bureau, e a terceira sobre uma combinação de dados censitários e tributários que leva em conta o efeito dos impostos e das transferências de renda do governo para o setor privado na redistribuição da renda após o pagamento dos impostos para as famílias de baixa renda. Thomas Piketty e Emmanuel Saez foram pioneiros no uso dos dados tributários para estudar a evolução das rendas no topo da distribuição comparadas com as rendas daqueles que estão abaixo do topo. Os seus dados para os Estados Unidos voltam até 1917, apenas alguns anos depois da introdução do imposto de renda nos Estados Unidos em 1914. Eles investigaram o problema de que a proporção daqueles que rendas baixas ou médias que pagam impostos varia de ano para ano e de era para era. A sua agora largamente aceita solução é de usar dados macroeconômicos padronizados derivados das contas nacionais para estimar a renda total e então subtrair as rendas do topo, baseadas em registros tributários, para obter o valor das rendas daqueles que estão abaixo do topo. O gráfico 18-1 sumariza os resultados centrais de Pikety-Saez para a maior parte do último século, de 1917 a 2013. As taxas de crescimento são apresentadas em três intervalos divididos em 1948 e 1972 e para três grupos, os 90 por cento de baixo, os 10 por cento no topo, e a média cobrindo todos os grupos de renda. As colunas em branco mostram a 5 taxa de crescimento da renda antes dos impostos (incluídos os ganhos de capital) para os 90 por cento de baixo, as colunas negras para os 10 por cento no topo, e as colunas cinzas para o crescimento da renda média. Cada uma das três eras apresenta resultados distintamente diferentes. Gráfico 18-1. Taxas de Crescimento da Renda Real, 10 Por Cento no Topo, 90 Por Cento Abaixo, e Média, Intervalos Selecionados, 1917-2013 Fonte: Calculado a partir de Alvaredo, Facundo; Anthony B. Atkinson; Thomas Piketty; e Emmanuel Saez, The World Top Incomes Database, http://topincomes.g-monde.parisschoolofeconomics.eu/. Acesso em 25/06/2015. Renda média para cada percentil, incluindo os ganhos de capital. Durante 1917-48, as rendas se tornaram substancialmente mais iguais. Os rendimentos reais daqueles 90 porcento de baixo cresceram a 1,43% ao ano, mais do que o dobro da taxa de crescimento de 0,58% dos 10 porcento no topo, com a média a 1,11%. Esse foi o resultado da influência equalizadora da Grande Depressão, da Segunda Guerra Mundial, e dos vários programas de nivelamento de renda instituídos nos 1930s e 1940s, incluindo o salário mínimo, a legislação encorajando a formação de sindicatos, e a Lei dos Veteranos, que enviou milhões de pessoas pobres às universidades e lhes possibilitou subir das suas origens na classe trabalhadora para o status de classe média. O fato mais notável do período 1948-72 não foi que todas as rendas tenham crescido aproximadamente à mesma taxa dos 90 porcento de baixo, mas que o rendimento real de cada grupo tenha crescido tão rapidamente. A taxa média de crescimento das rendas reais de 2,58% ao ano durante 1948-72 foi mais do que o dobro da taxa de crescimento de 1,11% ao ano do período 1917-48, e mais de cinco vezes a taxa de crescimento de 0,48% do período 1972-2013. As duas décadas e meia após 1948 foram a era dourada para milhões de formados no ensino médio, que sem educação universitária puderam trabalhar continuamente em empregos sindicalizados e fazer uma renda alta o 6 suficiente para comprar uma casa suburbana com quintal, um ou dois carros, e um estilo de vida com que os trabalhadores de renda mediana na maioria dos outros países apenas podiam sonhar. Mas tudo mudou após o início dos 1970s. Uma diferença gigantesca emergiu entre a taxa de crescimento da renda real para os 90 porcento de baixo e os 10 porcento no topo da distribuição de renda. A renda real média para os 90 porcento de baixo foi, na verdade, menor em 2013 do que em 1972. De fato, o pico de renda real para os 90 porcento de baixo foi de US$ 37.053 em 2000, apenas um pouco acima do que os US$ 35.411 alcançados em 1972, e em 2013, a média havia declinado 15% em relação a 2000, para US$ 31.652. Enquanto isso, a renda real média para os 10 porcento no topo dobrou de US$ 161.000 em 1972 para US$ 324.000 em 2007, seguida de uma modesta retração para US$ 273.000 em 2013. Uma segunda base de dados relacionada com a distribuição de renda bem do Census Bureau, que provê dados sobre a renda domiciliar real média e mediana a partir de 1975. A Tabela 18-1 compara as taxas de crescimento do Census Bureau para 1975-2013 e dois subperíodos divididos em 1995, e essas são comparadas na mesma tabela com os dados de Piketty-Saez para o período a partir de 1975. Como demonstrado no quadro superior da Tabela 18-1, o crescimento da renda real média do Census Bureau excedeu o crescimento da renda mediana por um montante substancial – por 0,61 pontos porcentuais durante 1975-95, por 0,33 pontos durante 1995-2012, e por 0,47 pontos para os dois períodos considerados conjuntamente, de 1975 a 2012. Tabela 18-1. Taxas de Crescimento da Renda Real, Medidas Alternativas, 1975-2013 Fonte: Renda Domiciliar Média e Mediana do US Census Bureau, Income and Poverty in the United States: 2013, Table A-1. Percentis da renda dos dados utilizados no Gráfico 18-1. 7 Taxas de crescimento dos dados Piketty-Saez são registrados para o período pós-1975 no quadro inferior da Tabela 18-1. As linhas apresentam, respectivamente, a taxa de crescimento da renda real por unidade tributada para os 10 porcento no topo, os 90 porcento abaixo, a média de toda a distribuição, e a diferença entre o crescimento da média e dos 90 porcento abaixo. A diferença é de 0,70 pontos porcentuais para todos os três períodos considerados. É interessante comparar o crescimento da média da renda nos dados do Census Bureau com o crescimento da renda média da base de dados Piketty-Saez; nós deveríamos esperar que a última fosse um pouco mais rápida, pois o seu conceito inclui os ganhos de capital, que são excluídos nos dados sobre a renda do Census Bureau. A despeito dessa diferença conceitual, para o intervalo completo de 1975 a 2013, o crescimento da renda média do Census Bureau, de 0,77% ao ano, é ligeiramente maior do que o crescimento médio de 0,60% ao ano da base de dados Piketty-Saez.Recentemente, críticos das bases de dados do Census Bureau e do estudo de Piketty-Saez se queixaram de estas refletem apenas a renda de mercado, e ignora o efeito dos impostos e das transferências. De forma não surpreendente, um ajuste para os impostos e as transferências reduz a diferença do crescimento da renda entre a média incluindo a renda do grupo no topo e a média excluindo esse grupo. As taxas de impostos pagas pelos indivíduos com alta renda são substancialmente maiores do que aquelas pagas pela maioria dos contribuintes, e na verdade a maioria das famílias na metade de baixo da distribuição de renda paga pouco ou nenhum imposto federal sobre a renda. As transferências sociais, o Medicare, e os prêmios de seguro-saúde pagos pelos empregadores são pagamentos de transferências que beneficiam aqueles no meio da distribuição de renda, enquanto os vales-alimentação, o crédito de imposto sobre a renda auferida, e os pagamentos de transferências do Medicaid são dirigidos primariamente às famílias na parte de baixo da distribuição de renda. A análise mais completa que ajusta para impostos e transferências é publicada regularmente pelo Congressional Budget Office (CBO). O conceito de renda de mercado antes da tributação é mais completo do que nas bases de dados de Piketty-Saez e do Census Bureau, e cresce mais rapidamente do que os conceitos alternativos. Como demonstrado na coluna (1) da Tabela 18-2, a média da renda de mercado antes da tributação do CBO cresceu durante o período 1979-2011 a 1,16% ao ano, substancialmente mais rapidamente do que as taxas de crescimento médio de 0,70% e o 0,77% ao ano de Piketty-Saez e do Census Bureau ao longo de um período de tempo ligeiramente maior. Após se levar em consideração os impostos e as transferências, a renda média cresce a 1,48% ao ano. Como seria de esperar, a declaração de crescimento da renda após a cobrança dos impostos e o recebimento de transferência tem o maior efeito sobre o menor grupo de renda do percentil 1-20, elevando o crescimento da renda para esse grupo de 0,46% ao ano antes dos impostos e das transferências para 1,23% ao ano após os impostos e as transferências. O 1 por cento no topo da distribuição também ganha 8 com o ajuste para impostos e transferências, embora nem de perto na mesma medida, e tem uma taxa de crescimento anual de 4,05% após os impostos e transferências, comparada a 3,82% sem esses ajustes. Tabela 18-2. Taxa de Crescimento Anual para Dois Conceitos de Renda, por Grupos da Distribuição de Renda, 1979 a 2011 Fonte: CBO, The Distribution of Household Income and Federal Taxes, 2011. Quando consideramos o futuro do crescimento nos Estados Unidos, nós nos preocupamos não somente com o crescimento da renda per capita média, mas também com o crescimento da renda per capita para a família mediana. O Gráfico 18-2 exibe as diferenças entre a taxa de crescimento anual da média e para o grupo dos 90 porcento de baixo da distribuição de Piketty-Saez, assim como diferenças entre o crescimento médio e mediano para os dados do Census Bureau e do CBO com e sem os ajustes para os impostos e transferências. Como os dados do CBO são mais altos do que os das outras fontes de dados, e uma vez que o bem-estar depende da renda disponível após o ajuste para impostos e transferências, consideramos a última coluna do lado direito do gráfico 18-2 como a mais relevante. Ela mostra que a diferença entre o crescimento médio e o mediano nos dados ajustados do CBO foi de 0,43% ao ano entre 1979 e 2011. Se a desigualdade de renda continuar a crescer ao longo das próximas décadas no mesmo ritmo das últimas três décadas, quanto 9 mais lento será o crescimento da renda mediana em relação à renda média? O melhor indicador do que aconteceu no passado vem dos dados ajustados para impostos e transferências do CBO. Se no futuro a diferença entre o crescimento da renda mediana e da renda média continuar à taxa de 0,4% ao ano, isto implica que uma projeção de crescimento futuro na renda per capita de, digamos, 1,0% ao ano, se traduziria numa projeção para o crescimento mediano de 0,6% ao ano. Gráfico 18-2. Diferença entre o Crescimento da Renda Médio e para os 90 Porcento de Baixo (Piketty-Saez) e para o Mediano (Census Bureau e CBO) Fonte: Tabelas 18-1 e 18-2. CBO de 1979 a 2011, demais de 1975 a 2013. Pressões Para Baixo nos Salários dos 90 Porcento de Baixo da Distribuição de Renda Quais fatores têm influenciado a evolução da distribuição de renda abaixo do nonagésimo percentil? Os meados dos 1970s marcam um ponto de inflexão entre uma era de salários continuamente crescentes no meio e na parte inferior da distribuição de renda para uma nova era que durou as últimas quatro décadas, quando os salários cresceram muito pouco na parte de baixo e cresceram muito mais rapidamente no topo da distribuição. A grande estagnação dos salários nos Estados Unidos ao longo das últimas três décadas levou muitos observadores a acreditar que a economia estava danificada de maneira fundamental. O que causou essa virada quarenta anos atrás? 10 Entre 1929 e 1945 as rendas no topo cresceram mais lentamente que as no meio e na base da distribuição, criando uma mudança na direção de maior igualdade que Claudia Goldin e Robert Margo chamaram "a Grande Compressão." Entre a II Guerra Mundial e 1975, as rendas no topo e na base cresceram aproximadamente à mesma taxa, e como resultado, a compressão durou por cerca de três décadas. Três fatores enfatizados Goldin e Margo como suportes da compressão foram o aumento da sindicalização e o declínio tanto do comércio quanto da imigração. Esses três fatores, que datam dos 1930s, explicam convincentemente o baixo nível de desigualdade no período 1945-75, e suas reversões provêm uma parte importante da explicação para a crescente desigualdade após 1975. Nesta seção, examinaremos essa reversão, consistindo do declínio da sindicalização, e o aumento das importações e da imigração, junto com dois outros fatores geralmente aceitos como fontes da crescente desigualdade – quais sejam, a automação e o declínio no valor real do salário mínimo. Subsequentemente, nós nos voltamos para o papel da educação como uma fonte de maior desigualdade na medida em que os ganhos salariais para os trabalhadores com formação universitária contrastaram com a estagnação dos salários para os formados no ensino médio e para os desistentes do ensino médio. A porcentagem de empregados sindicalizados nos Estados Unidos declinou rapidamente de 27% em 1973 para 19% em 1986, e depois mais lentamente para 13% em 2011. A taxa decrescente de sindicalização reduziu os salários, e particularmente o salário mediano. O declínio na taxa de sindicalização se combina com forças de mercado, particularmente o encolhimento dos empregos no setor manufatureiro e a mudança da demanda dos consumidores dos bens para os serviços, junto com uma atitude agressivamente antissindicalista adotada por muitos empregadores. A estagnação ou mesmo declínio nos salários foi exacerbado pela tendência crescente das firmas, particularmente na manufatura e na construção, a contratar trabalhadores de agências de emprego temporário que pagam salários relativamente baixos e oferecem poucos, se algum, benefícios indiretos. As firmas se beneficiam não apenas do menor custo do trabalho, mas da flexibilidade aumentada no ajuste da oferta de horas-trabalho para atender a demanda. A participação das importações no PIB dos Estados Unidos aumentou de 5,4% em 1970 para 16,5% em 2014. O trabalho incorporado nas importações é um substituto para o trabalho local. Por essa ração, o aumento na fração de importaçõesno PIB contribuiu para o declínio nos salários relativos dos trabalhadores não qualificados e semiqualificados. Numa análise particularmente aguda, David Autor e coautores calcularam que as importações da China entre 1990 e 2007 responderam por um quarto do declínio no nível de emprego do setor manufatureiro durante aquele período, e que também baixaram os salários, reduziram a taxa de participação na força de trabalho, e aumentaram os pagamentos de transferências financiadas publicamente. 11 Os caminhos das importações vão além dos bens finais, porque tantos as firmas quanto os países se especializam crescentemente em diferentes estágios da produção. Por exemplo, aumentos da importação de peças de automóveis mais do que dobraram entre 2001 e 2014, de $63 bilhões para $138 bilhões, e provocaram o fechamento de fábricas locais de muitos produtores de autopeças, e em casos a levar a produção de peças para o exterior, particularmente para o México. Tomados conjuntamente, a crescente penetração das importações e o outsourcing representam os efeitos combinados da globalização nos níveis tanto do emprego quanto dos salários na economia local. No caso da indústria de autopeças, os efeitos da globalização incluíram um declínio nos salários medianos de $18,35 por hora em 2003 para $15,83 em 2013. A imigração responde por mais da metade do crescimento total da força de trabalho nos Estados Unidos ao longo da década entre 1995 e 2005. Uma informação complementar é que a fração dos trabalhadores nascidos no exterior na força de trabalho cresceu continuamente de 5,3% em 1970 para 14,7% em 2005. A pesquisa econômica apoia a visão de que os imigrantes reduzem os salários dos trabalhadores locais por um pequeno montante, e que o efeito é maior sobre os trabalhadores locais que não concluíram o ensino médio. Muitos imigrantes com poucas qualificações assumem desproporcionalmente empregos e entram em ocupações já preenchidas por outros trabalhadores nascidos no estrangeiro – por exemplo, trabalhadores em restaurantes e em serviços de pintura – e, portanto, o seu efeito principal é de reduzir os salários dos trabalhadores nascidos no estrangeiro, e não dos trabalhadores nativos. A literatura prévia notou o fato de que entre desistentes do ensino médio, os salários dos trabalhadores nativos e dos nascidos no estrangeiro era quase idêntico até 1980, mas que já em 2004 os trabalhadores nascidos no estrangeiro recebiam 15-20% menos. As pressões baixistas sobre os salários na base dos 90 porcento da distribuição de renda ocorreriam mesmo se não tivesse havido a erosão da sindicalização ou o crescimento das importações e da imigração. O ritmo contínuo da automação - a substituição de empregos por máquinas - teria contribuído para o declínio das rendas relativas daqueles na base dos 90 porcento. Os empregos relativamente bem-pagos na manufatura diminuíram, e a parcela do emprego na manufatura nos Estados Unidos declinou de 30% em 1953 para menos de 10% atualmente. O efeito da automação coincide com a "mudança técnica aviesada para qualificações" que resulta na destruição dos empregos rotineiros que são substitutos próximos dos computadores, e essas perdas de emprego ocorreram não somente na linha de montagem das fábricas manufatureiras, mas também nas ocupações rotineiras de escritório, como datilógrafos, contadores, escreventes, escriturários, balconistas, recepcionistas e outros. A automação não cria um estado permanente de desemprego em massa, como temido pelos pessimistas, e a economia foi capaz de atingir uma taxa de desemprego abaixo de 5% na expansão cíclica que se encerrou em 2007, e a taxa de desemprego em 2015 novamente declinou para próximo de 5%. 12 Ao invés de desemprego em massa, a composição dos empregos mudou, com mais empregos criados no topo e na base da distribuição de ocupações, e uma diminuição no meio. Essa transformação tem sido chamada de "hipótese da polarização" e tem sido extensamente documentada nos anos recentes pelos economistas do trabalho. Os empregos de alto nível, tais como aqueles ocupados por gerentes e profissionais com curso superior, são frequentemente chamados de ocupações "não rotineiras que exigem abstração". Os empregos de nível médio como aqueles ocupados por trabalhadores em linhas de montagem da manufatura, contadores, recepcionistas e funcionários administrativos foram chamados de ocupações “rotineiras”, enquanto aqueles na base foram chamados de empregos “manuais”. Um resultado da perda de empregos rotineiros semiqualificados é que os trabalhadores semiqualificados são forçados a competir pelos empregos manuais de baixa qualificação, portanto elevando a oferta relativa à demanda por trabalhadores manuais. O resultado tem sido um declínio nos salários para aqueles com relativamente poucas qualificações, para os graduados e para os desistentes do ensino médio, como mostrado no gráfico 18-3. O nível geral dos salários é reduzido à medida que a composição do emprego muda dos empregos relativamente bem-pagos da manufatura para o largo intervalo de empregos tipicamente mal pagos no comércio, nos serviços de alimentação, de limpeza e conservação. Gráfico 18-3. Rendimentos Semanais Reais por Nível Educacional, 1963 = 100, 1963-2012 Fonte: Autor (2014b), gráfico 6. Para além dos efeitos do enfraquecimento dos sindicados, das importações crescente, e automação, um quinto fato que produziu a tendência a aumentar a desigualdade na base dos 90 porcento da distribuição de renda foi a erosão do salário mínimo. Calculado em 13 dólares constantes de 2011, o salário mínimo diminuiu de 1979 para 1989 de $ 8,38 para $5,87. Ele alcançou o menor nível de $4,68 em 2006 antes de ser elevado para $7,25 em 2009. Vários autores afirmam que a erosão do salário mínimo real responde por muito do aumento da desigualdade medida como a razão de rendimentos do décimo percentil para o nonagésimo percentil. Parece plausível que o declínio das rendas relativas abaixo do nonagésimo percentil desde o final dos 1970s tenha sido causado, ao menos em parte, pelo poder de barganha e densidade declinantes dos sindicatos, pelo aumento da importância das importações e da imigração, pelos progressos da automação, e pela diminuição no salário mínimo real. Frank Levy e Peter Temin proveram uma interpretação complementar que coloca mais ênfase na mudança da filosofia política do que eles chamaram o “Consenso de Detroit” do final dos 1940s para o “Consenso de Washington” iniciado por Reagan no início dos 1980s. O ponto principal que Levy e Temin adicionam ao nosso sumário anterior é que aqueles impostos altamente progressivos, com taxas de tributação marginal de 90% para os ganhadores de renda no nível máximo nos 1940s e 1950s, enviavam um sinal de que rendas muito elevadas eram inaceitáveis. Começando com os cortes de impostos de Reagan, aquele elemento de apoio político da grande compressão começou a erodir, e os salários dos CEOs aumentaram de vinte vezes o pagamento médio dos trabalhadores em 1973 para 257 vezes em 2013, quando o pagamento médio de um CEO numa empresa de capital aberto alcançou $ 10,5 milhões por ano. A diferença de renda é ainda maior para as aposentadorias, em que é comum para os CEOs que se afastam receber planos de aposentadoria multimilionários. Um exemplo particularmente gritante foi o CEO da Target, que foi substituído em maio de 2014 após uma massiva quebra de dados por hacking de cartões de crédito, e recebeu um pacote de aposentadoria de $ 47 milhões, cerca de mil vezes o saldo médio das poupanças que a Target tinha realizado para os seus trabalhadores no plano complementar 401(k) da empresa. Recentemente,houve substancial publicidade para o requerimento dos trabalhadores nos serviços fast food, a maioria dos quais é pago pouco mais do que o salário mínimo. A base dos 20 porcento dos trabalhadores americanos na distribuição de renda ganha menos do que $ 9,89 por hora, e o seu salário ajustado pela inflação caiu 5% entre 2006 e 2012, enquanto o pagamento para o trabalhador mediano caiu 3,4%. Manter os salários reduzidos é uma estratégia corporativa explícita de muitas firmas do varejo. O Wall Street Journal escreveu: “Mudanças econômicas ao longo da última década levaram a um declínio dos empregos bem-pagos em todo o país, como aqueles na manufatura, e um aumento nos empregos que pagam menos, tais como nos serviços de alojamento e alimentação... Posições são crescentemente preenchidas não por jovens e inexperientes, mas por trabalhadores mais velhos e mais qualificados que não conseguem encontrar outros empregos.” 14 A Caterpillar se tornou a empresa-símbolo para a crescente desigualdade. Ela venceu as greves dos seus trabalhadores e estabeleceu um sistema de salários segmentados, no qual recém-contratados são pagos pela metade dos salários de veteranos, embora ambos os grupos sejam membros do mesmo sindicato. Em contraste, houve um aumento de 80% durante 2011-13 na remuneração do CEO, cujo mantra é "nós nunca fazemos dinheiro o suficiente... nós nunca estaremos satisfeitos com o nosso lucro." Companhias estrangeiras como a Volkswagen continuam a abrir fábricas em estados que não reconhecem o direito à sindicalização. Ao diminuir os salários em comparação aos salários nos estados nortistas com sindicatos fortes, essa realocação de fábricas estrangeiras pode impedir que o nível geral do emprego na manufatura dos Estados Unidos diminua ainda mais. Porém, qualquer progresso em segurar o declínio de décadas no emprego manufatureiro parece estar condicionado em manter os salários dos trabalhadores em cerca da metade do nível que o sindicato do setor automobilístico alcançou para os seus representados antes da falência da General Motors e da Chrysler. Na recuperação de 2009-2013, a manufatura reconquistou apenas 600 mil dos 6 milhões de empregos que foram perdidos desde 2001, e a maioria destes foi condicional à contratação de trabalhadores a taxas salariais que foram substancialmente menores do que se praticava normalmente na manufatura em 2001. Desigualdade Crescente no Topo da Distribuição de Renda A tabela 18-2 enfatizou o hiato entre a taxa de crescimento da renda real média desde 1975 com o crescimento da renda mediana (isto é, do quinquagésimo percentil). Muito do aumento da desigualdade resultou do crescente viés no decil do topo da distribuição de renda. Mesmo dentro do último percentil no topo, os ganhos de renda foram muito mais rápidos no topo do 0,1 percentil ou do 0,01 percentil. É útil identificar as fontes das rendas crescentes no topo usando uma distinção tripla entre superestrelas nos esportes e no entretenimento, outros trabalhadores altamente especializados e remunerados, e a categoria controversa adicional dos CEOs e outros diretores no topo das corporações. A economia das superestrelas é um conceito originalmente inventado por Sherwin Rosen, que explicou a extrema assimetria da distribuição de renda nas categorias ocupacionais dominadas por superestrelas como resultado das características particulares da demanda e da oferta nesse mercado de trabalho. Pelo lado da demanda, as audiências querem ver o melhor talento, não o segundo melhor, e por isso a renda é altamente viesada dada a habilidade das superestrelas no topo em obter uma grande multidão nos locais dos eventos, e vendas recordes numa ordem de magnitude acima do segundo melhor. Pelo lado 15 da oferta, os trabalhadores realizam o mesmo esforço, sejam dez ou dez mil as testemunhas da performance. Os prêmios das superestrelas refletem um tipo particular de mudança tecnológica viesada em qualificações. Rosen sugere que uma sucessão de inovações desde o fonógrafo aumentou o tamanho das audiências que podem ouvir uma dada performance musical e, portanto, aumentou as rendas das superestrelas por muitos múltiplos. O agudo aumento das rendas das superestrelas desde o artigo de Rosen em 1981 reflete o desenvolvimento posterior da tecnologia, incluindo a TV a cabo, videoteipes e DVDs rentáveis, streaming de filmes com base na Internet, vídeos do YouTube, e música downloadable. Um segundo grupo de indivíduos com alta renda também reflete a operação do mercado – isto é, da oferta e da demanda. Profissões importantes, especialmente advogados e banqueiros de investimento ranqueados no topo, recebem rendas que são determinadas pela demanda de mercado pelos serviços prestados por suas firmas, seja uma enorme firma de advogados como a Sidley Austin de Chicado ou um banco de investimentos como o Goldman Sachs. Esses profissionais orientados para o mercado diferem das superestrelas no fato de que os seus produtos não são amplificados pela mídia eletrônica. Eles ainda são restritos pela necessidade de encontrar pessoalmente com os seus clientes, e de atender pessoalmente aos procedimentos legais com os seus adversários. Esse segundo grupo vai além de advogados e banqueiros de investimento, e inclui aqueles nas editoras de livros, no desenho e na moda, na medicina, e mesmo no topo dos rankings da academia. CEOs e outros executivos no topo das corporações formam um terceiro grupo distinto. Uma ampla literatura sugere que o pagamento dos CEOs não é definido puramente no mercado, mas antes é definido por pares (CEOs com assento nos conselhos diretores). Lucian Bebchuk e Yaniv Grinstein apresentam a hipótese do poder gerencial, que direciona o pagamento dos executivos no topo muito acima da solução de mercado. O pagamento dos cinco executivos no topo em 1.500 empresas aumentou por quase o dobro entre 1993 e 2003 do que o seu modelo de regressão poderia explicar. Esses autores reportam o surpreendente fato de que a razão entre os pagamentos aos cinco executivos no topo para o total dos lucros corporativos para essas 1.500 firmas aumentou de 5,0% em 1993-95 para 12,8% em 2001-2002. Está claro na literatura que o aumento do pagamento de executivos é dominado pelo crescimento do papel das opções de ações. Brian Hall e Jeffrey Liebman propuseram duas explicações alternativas; eles justapuseram a explicação baseada no mercado contra a explicação do poder gerencial. Sua primeira explicação proposta é que o uso das opções de ações aumentou tão dramaticamente por que os conselhos diretores querem fortalecer a relação entre pagamento e performance. Sua segunda explicação proposta, complementar à primeira, é que os conselhos querem aumento o pagamento dos CEOs e escolheram a opções pelos 16 prêmios como um método “menos visível” com menor probabilidade de incitar a raiva dos proprietários das ações. Existem, sem dúvidas, sobreposições e interações entre as explicações das superestrelas, dos talentos no topo, e do poder gerencial dos CEOs para a crescente desigualdade. Após se tornar rico por qualquer razão, aqueles no alto da distribuição de renda multiplicam as suas rendas investindo na bolsa de valores e em investimentos mais esotéricos como private equity e fundos hedge. Ganhos de riqueza foram particularmente extremos entre 1983, quando a média da bolsa de valores na S&P 500 foi de 120, e 2000, quando essa média alcançou 1.477 pontos. Isto representa uma taxa de retorno real incluindo dividendos de 14,3% ao ano. Não apenas as famílias abaixo do nonagésimo percentil da distribuição de renda possuem poucas ações (exceto indiretamente através dos seus planos de aposentadoria),mas também estiveram dispostas a um timing de mercado perverso. Um estudo do Federal Reserve mostrou que mais de 5 milhões de famílias venderam suas ações quando a bolsa de valores estava em baixa em 2009-10, e que apenas aqueles no 10 porcento ao topo da distribuição de renda tinham aumentado a posse de ações desde então. Parte dessa tendência das famílias de menor renda compensar o mercado quando este está em baixa pode vir da necessidade de liquidar ativos em face do desemprego causado pela recessão no ciclo de negócios. Um estudo recente do Pew Research Center quantificou a trajetória dos aumentos de riqueza real ao dividir as famílias nos Estados Unidos num grupo superior compreendendo 21% das famílias, num grupo médio compreendendo 46%, e num grupo inferior respondendo pelos 33% remanescentes. Para o grande grupo do meio, o valor da riqueza ajustado pela inflação estagnou ao longo de três décadas, crescendo apenas de $94.300 em 1983 para $96.500 em 2013. Ao longo desse período de trinta anos, a riqueza real no grupo de base na verdade caiu, de $11.400 para $9.300. Em contraste, o grupo no topo gozou de uma exata duplicação da riqueza real, de $318.100 em 1983 para $639.400 em 2013. Embora a ênfase desse livro sobre o padrão de vida se refira primariamente à renda real per capita, a evolução da riqueza real não pode ser ignorada, pois o aspecto de “rede de proteção” da acumulação de riqueza tem um profundo efeito no bem-estar ao prover segurança contra a perda de um emprego, ou um acidente, ou uma doença que reduza a possibilidade de obter renda. A estagnação na riqueza real para os 80 porcento na base da distribuição de renda dos Estados Unidos é um poderoso indicador que apoia a visão de que o crescimento no bem- estar desacelerou nas últimas três décadas. Educação como uma Fonte de Crescente Desigualdade 17 As duas seções precedentes examinaram fontes da pressão para baixo nos salários e nas rendas dos 90 porcento na base e as fontes do aumento das rendas relativos no 1 porcento ao topo da distribuição de renda. Em adição, uma bifurcação ocorreu dentro dos 90 porcento na base, com estagnação salarial e declínio nos percentis de baixo combinados com crescimento mais rápida da renda no octogésimo e nonagésimo percentis, embora nem de perto tão rápida quanto no 1 porcento no topo. Educação é a causa principal desse espalhamento da distribuição de renda, pois o crescimento nos pagamentos àqueles que completam uma graduação de quatro anos superou em muito os daqueles que abandonaram o ensino médio. Os resultados de renda daqueles que possuem graus superiores de dois anos, daqueles que completaram parcialmente a graduação de quatro anos, e daqueles que possuem diplomas de ensino médio apresentam situações intermediárias entre os extremos representados pelos quatro anos completos de graduação no topo e os desistentes do ensino médio na base. A análise das recompensas recebidas pelos trabalhadores que possuem diferentes montantes de frequência educacional começa com a proposição básica de que as rendas dos trabalhadores são determinadas pela sua produtividade – ou seja, quanto eles produzem por hora trabalhada. O valor dessa hora depende da demanda e da oferta – ou seja, o valor para o empregador daquilo que o empregado consegue produzir e o número de trabalhadores que são capazes de completar as tarefas requeridas. Como a proporção de norte-americanos que completam cursos superiores tem aumentado, a oferta de formados nas universidades tem aumentado em relação àqueles com menor resultado educacional. Esse aumento na oferta relativa foi particularmente rápido entre 1964 e 1982 e foi suficientemente rápido em relação ao aumento da demanda relativa por formados em universidades, de forma que o prêmio por completar um curso superior diminuiu ligeiramente nos 1970s. Após 1982, o crescimento na oferta relativa desacelerou e na demanda relativa acelerou, de forma que o prêmio por completar um curso superior aumentou entre 1982 e 2000. O aumento no prêmio salarial universitário foi suficiente para explicar todo o aumento nos rendimentos daqueles no nonagésimo percentil em relação àqueles no décimo percentil entre 1984 e 2004. O gráfico 18-3 mostra a evolução do salário real de trabalhadores masculinos em tempo integral em cinco grupos educacionais expressos como uma razão para o salário real de cada grupo em 1963. As linhas estão dispostas do alto para baixo conforme o montante de educação, com a linha no topo apresentando o salário real daqueles com educação além dos quatros anos do grau de bacharel e a linha de baixo apresentando as mudanças salariais dos desistentes do ensino médio. Cada ponto apresentado representa o salário em relação a 1963, de que forma que o ponto final de 97 porcento indicado em 2012 para os desistentes do ensino médio representa um declínio salarial de 3% entre 1963 e 2012, enquanto o ponto final de 188 porcento para aqueles que estudaram além do grau de bacharel indica um aumento de 88% no 18 salário real desde 1963. O espalhamento das cinco linhas, mostrando maiores ganhos salariais com os maiores resultados educacionais, indica que a demanda relativa por graduados altamente educados cresceu mais rapidamente do que a sua oferta relativa. É importante notar que o aumento dos rendimentos daqueles com grau universitário ou o maior aumento relativo em relação aos formados e aos desistentes do ensino médio não resulta somente do fato de que os graduados universitários estão se dando bem, mas também porque os grupos na base estão com péssimos resultados. O crescimento dos rendimentos nos cinco grupos não procedeu num ritmo uniforme. A elevação dos salários reais dos graduados com curso superior ocorreu em dois períodos de tempo relativamente curtos, primeiro entre 1964 e 1972, e depois entre 1996 e 2000. Entre 1972 e 1996, e depois novamente após 2000, o salário real dos graduados com curso superior estagnou. Para os formados no ensino médio, foram várias fases de evolução do salário real: um aumento durante 1964-72, depois um longo e lento declínio de 1972 a 1990, estagnação até 1996, uma recuperação parcial durante 1996-2000, e depois estagnação novamente entre 2000 e 2012. Os resultados para aqueles com curso superior incompleto ficam numa posição intermediária entre os dos graduados com curso superior e os formados no ensino médio, porém mais próximos dos últimos, enquanto que os desistentes do ensino médio tiveram uma trajetória de salário real que caiu gradualmente, entre 1974 e 2000, para cerca de 10% abaixo do nível dos formados no ensino médio. A erosão dos salários para os formados e para os desistentes do ensino médio é um resultado de todos os fatores já citados – o declínio da sindicalização e do salário mínimo, combinado com o aumento das importações e da imigração, além do papel do progresso da automação. Podemos dividir o salário real dos bacharéis com curso superior pelo dos formados no ensino médio, para descrever a evolução do prêmio salarial do curso superior em relação ao seu valor em 1963, como no gráfico 18-4. O prêmio salarial do curso superior aumentou ao longo do último meio século, mas não a um ritmo uniforme. Depois de uma elevação inicial entre 1964 e 1967, o prêmio estagnou até 1973, e em 1983 havia declinado de volta ao nível de 1963. Então cresceu continuamente de 100% para 128% do nível de 1963 entre 1982 e 2001, seguido de pouco crescimento posterior. O declínio do prêmio nos 1970s pode ser atribuído ao aumento da oferta relativa de formados com curso superior, que ocorreu nos 1960s e 1970s. O aumento do prêmio de 1982 a 2001 coincide com um período de crescimento relativamentelento na oferta relativa de formados com curso superior, e o intenso aumento entre 1996 e 2001 também pode refletir o rápido incremento na demanda por qualificações durante o boom dot-com do final dos 1990s. A acomodação do prêmio após 2005 parece ser o resultado de um renovado aumento na oferta relativa de formados com curso superior, mas também pode refletir um declínio na demanda por trabalhos abstratos não rotineiros que se iniciou após 2000. 19 Gráfico 18-4. Rendimentos Semanais Reais, Razão Percentual dos Formados com Curso Superior em relação aos Formados com Ensino Médio. Fonte: Calculado a partir dos dados utilizados por Autor (2014b), gráfico 6. Como a oferta de trabalhadores com educação superior aumentou, uma fração crescente dos formados com curso superior foi forçada a aceitar empregos que não requerem esse nível educacional. Como demonstrado por Paul Beaudry e coautores, depois de 2000, houve um declínio na proporção de formados com curso superior trabalhando em ocupações abstratas não rotineiras, e um aumento daqueles trabalhando em empregos manuais. Isto representa uma intensa virada em relação aos 1990s, e coloca pressão adicional baixista nos salários pagos pelo trabalho manual rotineiro. Beaudry explica o declínio na demanda por trabalho abstrato não rotineiro como um complemento do declínio do investimento em informação de alta tecnologia e nos equipamentos da tecnologia de comunicação, o que ocorreu na recessão de investimentos que se seguiu ao boom dot-com do final dos 1990s. Até aqui expressamos os salários reais e o prêmio salarial do curso superior em relação aos seus valores de 1963. Qual é o equivalente em dólares atuais para esses valores? O valor monetário do prêmio do curso superior é substancial. A diferença anual dos rendimentos de formados com curso superior em relação aos formados com ensino médio, em 2012, foi de $35.000 para os homens e de $23.000 para as mulheres. Um domicílio com duas fontes de renda, em que ambos os cônjuges tenham curso superior recebe uma renda anual $58.000 dólares maior do que um domicílio com duas fontes de renda em que os cônjuges tenham concluído apenas o ensino médio. O valor presente descontado de obter um grau universitário em relação ao ensino médio, em 2008, tinha alcançado $590.000 para os homens e $370.000 para as mulheres. Essas 20 recompensas substanciais para a conclusão de um curso superior incluem a renda adicional obtida por aqueles com cursos de pós- graduação, para os quais a conclusão de um curso universitário é um pré-requisito. O efeito da educação na desigualdade se entende além do efeito direto da escolarização sobre os rendimentos da geração atual, por que os pais com maior escolarização tendem a prover numerosas vantagens para a próxima geração. Tipicamente, homens e mulheres com curso superior tendem a se casar entre si, ter os filhos após o casamento, leem com mais frequência e habilitam uma vantagem de vocabulário sobre as crianças de pais com menor nível educacional. Pais com maior nível educacional também possuem condições financeiras para enriquecer a vida dos filhos através da exposição a museus, esportes, lições musicais, e uma maior variedade de livros. Tendem a morar em subúrbios onde as escolas locais proveem uma dieta mais rica de escolhas educacionais, incluindo maior treinamento para aprovação em testes de alocação avançada, usados para admissão às universidades ranqueadas no topo. As notas nos testes de admissão universitária SAT tendem a ser altamente correlacionadas com a renda dos pais. Todas essas vantagens reduzem a mobilidade social e estabelecem uma elite educacional que se autoperpetua, pois quase todas as famílias de alta renda enviam os seus filhos para a uma educação universitária de quatro anos, enquanto virtualmente nenhum dos americanos mais pobres o faz. A conclusão de um curso universitário pelos domicílios no quartil superior da distribuição de renda aumentou entre 1970 e 2013 de 40% para 77%, enquanto que para aqueles no primeiro quartil, aumentou apenas de 6% para 9%. Educação como Segundo Vento Contrário Os rendimentos mais elevados daqueles com curso superior ou pós-graduação refletem sua maior produtividade nos empregos. Para a economia como um todo, isto implica que o crescimento da produtividade agregada depende positivamente do crescimento da frequência escolar. Cada desistente do ensino médio se torna um trabalhador que provavelmente não irá ganhar muito mais do que um salário mínimo pelo resto da sua vida. O súbito aumento nas taxas de graduação escolar foi um vetor central do crescimento econômico no século XX. Mas ganhos na frequência escolar em geral se tornaram menores desde 1980, implicando que a educação se tornou um vento contrário no sentido de que sua menor contribuição para o crescimento econômico reduziu a taxa de crescimento da produtividade e da renda per capita. Esta seção examina a desaceleração do avanço da frequência escolar, a evidência de que o sistema educacional dos Estados Unidos está fracassando com os alunos 21 que apresentam níveis de desempenho insatisfatório comparados com os seus pares de outros países, e o papel da inflação de preços da educação superior e da dívida estudantil como um impedimento à conclusão dos cursos superiores, particularmente para aqueles com background familiar de baixa ou média renda. Desde que Edward Denison tentou em 1962 mensurá-la pela primeira vez, a contabilidade do crescimento reconheceu o papel de uma frequência escolar crescente como uma fonte do crescimento econômico. Claudia Goldin e Lawrence Katz estimaram que a frequência escolar aumentou 0,8 anos por década ao longo das oito décadas entre 1890 e 1970. Ao longo desse período, eles também estimaram que a melhoria da frequência escolar contribuiu com 0,35 pontos percentuais ao ano para o crescimento da produtividade e do PIB per capita. Numa pesquisa separada, eu ajustei as estimativas de Denison para 1913-79 à atual metodologia do BLS e encontrei uma contribuição média da educação de 0,38% ao ano, quase idêntica à de Goldin e Katz. O aumento da frequência escolar tem duas partes, uma que se refere à educação secundária, e outra que se refere à educação superior. As taxas de conclusão do ensino médio aumentaram de menos de 10% dos jovens em 1990 para 80% em 1970, e a porcentagem de jovens com dezoito anos recebendo os seus diplomas de ensino médio declinou desde então, para 74% em 2000, de acordo com James Heckman. Ele descobriu que os resultados econômicos daqueles que não obtiveram o diploma de ensino médio, mas o certificado de Desenvolvimento da Educação Geral – General Education Development (GED) –, não tinham um desempenho econômico melhor do que os desistentes do ensino médio, e que a queda nas taxas de conclusão podia ser explicada, em parte, pela elevação da proporção de jovens aprisionados. Os Estados Unidos atualmente se posicionam em décimo-primeiro lugar entre as nações desenvolvidas nas taxas de graduação no ensino médio, e é o único país no qual as taxas de graduação daqueles com idade entre 25-34 anos não é maior do que daqueles com idade entre 55-64 anos. O papel da educação em restringir o crescimento econômico futuro é evidente, dada a baixa qualidade dos resultados educacionais do ensino médio. Os relatórios da UNICEF listam os Estados Unidos na décima- oitava posição em vinte e quatro países na porcentagem de alunos do ensino médio que ficaram abaixo do padrão internacional em leitura e em matemática. Os testes internacionais PISA em 2013, também se referindo ao ensino médio, posicionam os Estados Unidos em décimo-sétimo emleitura, vigésimo em ciência, e vigésimo-sétimo em matemática. A recente avaliação da organização de testes de seleção para a entrada nas universidades revelou que apenas 25% dos alunos do ensino médio estão preparados para frequentar a universidade, como evidenciado pelas notas em leitura, matemática e ciência. No nível da universidade, os problemas combinam uma interação entre o declínio nas tabelas das ligas internacionais de notas na 22 graduação com temas de acessibilidade financeira e dívida estudantil. Durante a maior parte do período do pós-guerra, uma educação de baixo custo estava ao alcance de uma maior fração da população do que em qualquer outro país, graças à educação gratuita possibilitada pela Lei dos Veteranos e às mensalidades mínimas para os alunos locais nas universidades estaduais públicas e nas faculdades locais. Os Estados Unidos lideraram o mundo durante a maior parte do século passado na porcentagem de jovens concluindo um curso superior. A porcentagem do grupo com idade entre 25-34 anos, que obtiveram um grau de bacharel em um curso de quatro anos, aumentou de 25% para 32% nos últimos quinze anos, mas os Estados Unidos agora estão posicionados em vigésimo entre os países desenvolvidos, após ter sido posicionado em segundo em 2000. E o futuro não parece promissor. O custo de uma educação universitária aumentou desde 1972 a mais do que o triplo da taxa geral de inflação. Entre 2001 e 2012, o financiamento pelos estados e prefeituras para a educação superior declinou exatamente um terço quando ajustado pela inflação. Em 1985, o Estado do Colorado proveu 37% do orçamento da Universidade do Colorado, mas em 2013, proveu apenas 9%. Mesmo quando se leva em conta os descontos das mensalidades possibilitados pelas bolsas de estudo, o nível atual de conclusão dos cursos superiores nos Estados Unidos somente é possível com um aumento dramático dos empréstimos estudantis. Os norte- americanos agora devem $1,2 trilhão em dívida estudantil. Embora um curso superior de quatro anos ainda compense, em maior nível de renda e menor risco de desemprego na comparação com formados no ensino médio, ainda mais do que metade dos formados nos cursos superiores não é capaz de encontrar um emprego que requeira a formação universitária. Esta “taxa de subemprego” foi de 56% para os jovens com 22 anos, declinando para cerca de 40% para os de 27 anos, e a dificuldade de tantos formados com graduação universitária para encontrar empregos apropriados é consistente com a evidência, já citada, de Beaudry, Green, e Sand, argumentando que houve uma reversão na demanda por habilidades cognitivas abstratas e não rotineiras, desde 2000. Estudantes que tomam grandes montantes de dívida estudantil enfrentam dois tipos de riscos. Um é que de eles fiquem com renda abaixo da média alcançada pelo típico graduado, devido a uma combinação de desemprego após a formatura e uma dificuldade de encontrar trabalho no seu campo escolhido de estudo. A pesquisa mostra que em média, um estudante universitário tomando $100.000 em dívida estudantil irá liquidar a dívida à idade de 34 anos, com a renda mais elevada possibilitada pela conclusão do curso superior suficiente para compensar o pagamento da dívida. Mas essa idade de break-even se torna maior quando a renda futura fica abaixo da média dos graduados. Existe também o risco de não conclusão. Um estudante que desiste após dois anos nunca consegue renda adicional para compensar a dívida, por que os salários dos desistentes do curso superior são pouco melhores do que 23 os dos concluintes do ensino médio. Esses riscos são particularmente relevantes para estudantes de alto desempenho oriundos de famílias de baixa renda – Caroline Hoxby demonstrou que eles raramente se candidatam para as universidades de elite, que estão preparadas para financiá-los completamente sem dívida, de forma que eles terminam em universidades do segundo escalão, abarrotados com dívida. O baixo desempenho dos formados no ensino médio dos Estados Unidos transborda para o seu desempenho na universidade. Muitos dos menos preparados entram em faculdades comunitárias de dois anos, que atualmente matriculam 39% dos alunos norte-americanos, enquanto os 61% remanescentes se matriculam em cursos de quatro anos. O Center on International Education Benchmarking relata que apenas 13% dos alunos de cursos de dois anos completam os estudos em dois anos, embora essa porcentagem suba para 28% após quatro anos. As baixas taxas de conclusão dos cursos refletem a necessidade da maioria dos alunos de trabalhar em tempo parcial ou integral, além de frequentar as aulas da universidade, assim como a fraca preparação dos formados no ensino médio para ingressar nas faculdades comunitárias. A maioria dos alunos das faculdades comunitárias enfrentam essas duas dificuldades. Assim como os defeitos do ensino médio nos Estados Unidos tornam as carreiras universitárias bem-sucedidas menos prováveis, assim também a grande desigualdade no financiamento do ensino fundamental alimenta o baixo desempenho no ensino médio e uma taxa de desistência excessivamente elevada no ensino médio. O sistema de escolas fundamentais dos Estados Unidos é financiado com a renda dos impostos sobre a propriedade, que permite que os subúrbios ricos provejam instalações suntuosas para alunos que já se posicionam vantajosamente graças à renda dos sua família e ao reforço de conhecimento em casa, enquanto os alunos de famílias pobres frequentemente enfrentam cortes orçamentários agudos e fechamento de escolas como resultado do encolhimento das matrículas nos bairros centrais e provisão inadequada de receita dos impostos sobre propriedade. Os Estados Unidos também estão falhando em acompanhar a liderança dos outros países em ofertar educação pré-escolar gratuita. Entre as nações ricas, uma média de 70% das crianças de 3 anos estão matriculadas em algum tipo de programa educacional, enquanto que nos Estados Unidos essa porcentagem é de 38%. O Terceiro Vento Contrário: Demografia O vento contrário da demografia se refere a um conjunto de forças que mudou o número de horas trabalhadas por pessoa (H/N) e, portanto, cria uma cunha entre o crescimento da produtividade e o crescimento do produto per capita. O princípio organizador para compreender a sua significância é a identidade contábil que relaciona o produto total 24 (Produto Interno Bruto real, ou Y) ao número agregado de horas trabalhadas na economia (H) e o total da população (N): 𝑌 𝑁 = 𝑌 𝐻 ∙ 𝐻 𝑁 (1) A equação (1) afirma o truísmo de que o padrão de vida mensurado pelo produto per capita (Y/N) iguala por definição a produtividade do trabalho ou produto por hora trabalhada (Y/H) vezes o número de horas trabalhadas por pessoa (H/N). Ao decompor o produto per capita em produtividade e horas trabalhadas por pessoa, a equação (1) ajuda a clarear a relação entre os capítulos 17 e 18 desse livro. No capítulo 17, o passado, o presente, e o futuro do crescimento da produtividade (Y/H) são relacionados com a inovação, o motor fundamental do maior produto por trabalhador-hora. O capítulo 18 identifica os ventos contrários econômicos que mudam a produtividade, aqueles que mudam as horas trabalhadas por pessoa, e aqueles que não influenciam diretamente nenhuma dessas duas variáveis, no caso da desigualdade, mas antes reduzem o crescimento da renda real mediana em relação à média da economia como um todo. O termo crucial H/N pode também ser decomposto em horas por empregado (H/E), a taxa de ocupação como uma porcentagem da força de trabalho (E/L), e a taxa de participação na força de trabalho (L/N):𝐻 𝑁 = 𝐻 𝐸 ∙ 𝐸 𝐿 ∙ 𝐿 𝑁 (2) Os eventos demográficos mais importantes nos Estados Unidos no pós-guerra foram o baby boom de 1946 a 1964, o influxo de mulheres na força de trabalho entre 1965 e 1995, e a aposentadoria da geração baby boom iniciando por volta de 2008. A entrada da geração baby boom na força de trabalho nos 1970s impulsionou o número de horas trabalhadas por pessoa, enquanto o influxo de mulheres aumentou permanentemente o nível de horas trabalhadas por pessoa enquanto elevava a sua taxa de crescimento durante o período de transição, aproximadamente 1965-95. O crescimento positivo do número de horas trabalhadas por pessoa permitiu que o produto per capita crescesse mais rápido do que a produtividade, como na equação (1). A aposentadoria dos babyboomers irá reduzir o número de horas trabalhadas por pessoa independentemente de qualquer outro fator ao longo de um período de transição se estendendo da 2008 a 2034. Existe mais para o vento contrário demográfico, contudo, do que a aposentadoria dos babyboomers. A taxa de participação (L/N) caiu de 66,0% em 2007 para 62,6% em junho de 2015. Como a população em idade de trabalhar é de 250 milhões, o declínio em L/N em 3,4 pontos percentuais implica uma perda de 8,5 milhões de empregos, a maioria dos quais permanentemente. 25 A pesquisa econômica concluiu que cerca da metade do declínio na taxa de participação foi causada pela aposentadoria dos babyboomers, e o restante pelo declínio na participação dos mais jovens que 55. Aqueles que pararam de procurar trabalho e, portanto, saíram da força de trabalho, consistem de trabalhadores que perderam os seus empregos num ambiente econômico em que não têm expectativa de serem empregados novamente, e um grande fração destes conseguiu obter os benefícios por incapacidade da seguridade social. Para chamar atenção à luta dessas vítimas da desindustrialização, em julho de 2013 o Presidente Obama visitou várias cidades do Cinturão de Ferro que perderam a sua base de empregos manufatureiros. Cidades como Galesburg, Illinois; Scranton, Pennsylvania; e Syracuse, New York agora dependem principalmente do governo, dos serviços de saúde, e dos empregos no comércio varejista. Em Scranton, 41,3% daqueles com mais de dezoito anos saíram da força de trabalho, e em Syracuse, essa porcentagem é ainda maior, 42,4%. O efeito devastador do fechamento de fábricas manufatureiras através do Meio-Oeste é capturado pelos comentários do recém-indicado cônsul geral britânico em Chicago, que visitou o Meio- Oeste durante o outono de 2013, nos primeiros três meses do seu mandato de quatro anos. Perguntado sobre as impressões de suas viagens, ele disse, “O que mais me surpreendeu foi a deterioração e decadência das pequenas e médias cidades manufatureiras de uma fábrica.” O que a experiência de 2007-2014 implica para o futuro? Nós podemos otimistamente assumir que a saída dos mais jovens que 55 anos já se completou, e que a única fonte de declínio posterior na taxa de participação será a aposentadoria dos babyboomers. Vários estudiosos têm estimado que a aposentadoria da geração baby-boom irá causa um declínio de 0,4% ao ano no número de horas trabalhadas por pessoa, e isso implica que o crescimento futuro do produto médio per capita (Y/N) será 0,4 pontos mais lento do que a produtividade do trabalho (Y/H). Ao final desse capítulo, os efeitos de uma participação declinante na força de trabalho serão combinados com aqueles dos outros ventos contrários para prover uma projeção do crescimento futuro na renda disponível real per capita mediana. O Quarto Vento Contrário: Pagamento da Dívida O futuro ajuste das finanças governamentais irá ocorrer ao longo das próximas décadas. As projeções oficiais do Congressional Budget Office (CBO) atualmente estimam que a razão dívida pública para o PIB irá se estabilizar entre 2014 e 2020 e então crescer continuamente até 100% em 2038. Mas as estimativas do CBO pintam um cenário muito róseo, pois as suas previsões de crescimento futuro no produto e, portanto, na receita de impostos, é muito otimista. O CBO, como 26 resultado, tem subestimado o aumento futuro da razão dívida/PIB. Em 2024, a previsão oficial do CBO é de uma razão de 78%; a minha é de 87%. Para 2038, a do CBO é de 100%, a minha é de aproximadamente 125%. Porém, mesmo o CBO projeta que problemas nos esperam adiante além de 2020. Se prevê que o fundo do Medicar eTrust irá alcançar um saldo zero em 2030, e se projeta que a data para zeragem do saldo da Seguridade Social ocorrerá em 2034. Por definição, qualquer estabilização da razão dívida/PIB, comparada com o seu provável aumento contínuo com as políticas atuais, irá requerer o crescimento mais rápido dos impostos no futuro e/ou um crescimento mais lento dos gastos de transferência no futuro. Esse é o quarto vento contrário, a quase inevitabilidade de que ao longo das próximas décadas, a renda disponível irá declinar em relação à renda real antes dos impostos e das transferências, gerando uma reversão das tendências do último quarto de século. Esta é a consequência inevitável de uma população envelhecendo e da diminuição do crescimento populacional. Um único foco sobre a dívida pública ignora os compromissos não financiados de aposentadoria de muitos governos estaduais e municipais. A falência de Detroit levou os especialistas em títulos de dívida municipais a perguntar se Illinois ou Chicago estariam muito além, para não mencionar outros grandes estados com massivas obrigações não financiadas de aposentadoria. Uma previsão razoável, embora arbitrária, é que o crescimento futuro dos impostos e o menor crescimento das transferências governamentais irá reduzir a taxa de crescimento da renda disponível no futuro em 0,1 ponto percentual por ano, em relação à renda antes dos impostos e das transferências. Mudança Social na Base da Distribuição de Renda A primeira parte desse capítulo discutiu o tema da desigualdade continuamente crescente nos Estados Unidos ao apresentar um conjunto de medidas alternativas para renda média versus mediana. Contudo, o status daqueles no meio e na base da distribuição de renda vai além da falta de crescimento da renda monetária. Há decadência das condições sociais, e claramente existe uma causalidade de duas direções do tipo ovo ou galinha entre rendas estagnadas e disfunção social. Uma falta de oportunidades de emprego pode ser responsável por taxas decrescentes de nupcialidade, e pelo intenso incremento na porcentagem de crianças vivendo com apenas um dos pais. Mas também problemas sociais podem dificultar alguns tipos de emprego, especialmente se um tempo aprisionado estiver envolvido. O declínio do casamento como uma instituição entre os norte- americanos que não obtiveram uma educação universitária é relevante 27 para a taxa de crescimento da produtividade no futuro, porque as crianças – particularmente os meninos – que crescem em domicílios com a ausência do pai têm maior probabilidade de desistir do ensino médio e se engajarem em atividades criminosas. Uma fonte importante dessa mudança sociológica é a evaporação dos empregos de colarinho azul permanentes, com altos pagamentos. Parcialmente porque os homens sem educação universitária perdem os rendimentos e o emprego contínuo são menos atraentes como parceiros conjugais, e parcialmente porque as mulheres se tornaram mais independentes à medida que as oportunidades no mercado de trabalho se abriram para elas, cada vez menos casais são formados. Muito disso reflete a importância que as mulheres dão a ter um esposo empregado, assim como existem apenas sessentae cinco homens empregados para cada 100 mulheres numa dada idade. Entre jovens afro-americanos, existem apenas cinquenta e um homens empregados para cada 100 mulheres, refletindo em grande parte as elevadas taxas de encarceramento de jovens negros. Muitos jovens enxergam a estabilidade financeira como um pré-requisito para o casamento, de modo que a relutância a casar interage com a estagnação salarial das últimas três décadas. Para os brancos com ensino médio completo, a porcentagem de crianças nascidas fora do casamento aumentou de 4% em 1982 para 34% em 2008 e, para os desistentes do ensino médio, de 21% para 42%. Entre os negros, as porcentagens equivalentes aumentam de 48% para 74% para os formados, e de 76% para 96% entre os desistentes. Não apenas a taxa de casamento declina, mas quase metade de todos os casamentos falham. O número de crianças nascidas fora do casamento está igualando o número de crianças nascidas em casamentos. June Carbone e Naomi Cahn sumarizam as implicações para o futuro: “A família norte-americana está mudando – e as mudanças garantem que a desigualdade será maior na próxima geração. Pela primeira vez, os filhos da América quase certamente não serão tão bem educados, saudáveis, ou ricos como os seus pais, e o resultado deriva da crescente desconexão entre os recursos disponíveis para os adultos e aqueles investidos nas crianças.” Charles Murray documentou o declínio de todo indicador social relevante para o terço na base da população branca, que ele chama de “Fishtown” em referência a uma área pobre de Filadélfia. Ele apresenta os seus dados de forma admirável, numa série de gráficos que uniformemente se estendem de 1960 a 2010. Para a população branca de Fishtown, a porcentagem de casais em que ao menos um esposo trabalhou quarenta horas ou mais na semana anterior declinou de 84% em 1960 para 58% em 2010. A dissolução da família é documentada com três indicadores complementares, todos referidos ao grupo etário de 30- 49 anos: a proporção de casados cai de 85% para 48%, a porcentagem que nunca casou de 8% para 25%, e a porcentagem de divorciados de 5% para 33%. 28 A estatística mais devastadora de Murray é a de mães na idade de 40 anos, a proporção de crianças vivendo com ambos os pais biológicos declinou de 95% em 1960 para 34% em 2010. Os ventos contrários educacionais e demográficos interagem, levando à previsão de contínuo resvalamento dos Estados Unidos nas tabelas das ligas internacionais de conclusão do ensino médio e superior. Separadamente, o crescimento da dívida estudantil conduz à predição de defasagens no casamento e no nascimento de crianças e um declínio da taxa de crescimento populacional, o que agrava outras fontes de futura desaceleração do crescimento, particularmente o vento contrário fiscal. Outras fontes apoiam a ênfase de Murray no declínio social do terço inferior da população branca. Um estudo recente mostrou que entre 1979 e 2009, a porcentagem acumulada de desistentes brancos do ensino médio que estiveram na prisão aumentou de 3,8% para 28,0%. Para os negros ao longo do mesmo intervalo de tempo, a porcentagem que esteve na prisão aumentou de 14,7% para 68,0%. Isto é, mais de dois terços dos desistentes negros do ensino médio experimentaram ao menos um período na prisão ao tempo em que completavam quarenta anos de idade. Para os graduados negros do ensino médio (incluindo aqueles com certificados GED), a porcentagem aumentou de 11,0% para 21,4%. Qualquer forma de registro criminal, e especialmente um período na prisão, limita severamente as oportunidades de emprego disponíveis para aqueles que estão completando as suas sentenças de prisão. De acordo com o FBI, não menos de um terço dos norte-americanos adultos tem um registro criminal de algum tipo, incluindo prisões que não levaram a condenações; isso representa uma importante barreira ao emprego. A crescente sofisticação dos registros eletrônicos torna mais fácil para empregadores prospectivos descobrir sobre o passado de candidatos ao emprego. A probabilidade diminuída de emprego, por sua vez, retroalimenta a probabilidade de casamento, pois as mulheres não são atraídas pelos homens sem capacidade de obter renda de uma atividade legal. “Leis estaduais proíbem o emprego de pessoas condenadas em ocupações que vão de cuidadores de crianças ou dependentes a barbeiros e cabelereiros. Alguns estados também cortam o acesso a empregos públicos, que tem sido uma fonte importante de trabalho para minorias dos bairros pobres... Muitos empregadores são temerosos de empregar pessoas condenadas porque existem casos legais crescentes delineando riscos de condenação por ‘contratação negligente’.” Outros Ventos Contrários 29 As discussões sobre ventos contrários frequentemente se voltam para duas barreiras adicionais ao crescimento que são difíceis de quantificar, “globalização” e “energia/meio ambiente.” Essa seção coloca esses ventos contrários em perspectiva sem pretender quantificar a sua importância. A globalização é difícil de separar de outras fontes da crescente desigualdade. O fechamento de fábricas devido à transferência para outros países é responsável por parte dos ventos contrários demográficos que estão levando trabalhadores no auge da idade a deixar a força de trabalho quando suas pequenas cidades de uma fábrica experimentam o fechamento de uma fábrica. Existem grandes perdas de empregos bem- remunerados na manufatura que antecipam de longe a crise financeira de 2008 e a recessão de 2007-2009. Aproximadamente metade das perdas de 7 milhões de empregos manufatureiros entre 2000 e 2011 ocorreram antes de 2008. O período 2000-2007 testemunhou o impacto máximo do crescimento da capacidade manufatureira chinesa que inundou os Estados Unidos com importações, intensificou o déficit comercial, e causou fechamentos de fábricas encerrando a chance de milhões de trabalhadores poderem usufruir dos salários de classe média com não mais do que um diploma de ensino médio. A principal razão pela qual a economia experimentou uma expansão e não uma contração do nível de atividade nos anos que levaram a 2007 foi a bolha imobiliária, que permitiu a muitos dos trabalhadores deslocados da manufatura obter empregos temporários na indústria da construção. A globalização é também responsável pela crescente desigualdade através de outro canal. Os Estados Unidos se beneficiaram do investimento estrangeiro, particularmente na indústria automotiva, mas isto foi direcionado quase exclusivamente aos estados “certos para trabalhar”, a maioria no Sul, onde as firmas estrangeiras são livres para pagar o que quiserem aos trabalhadores. Salários de $15 ou $20 por hora, comparados ao velho padrão de $30 a $40 alcançado em estados sindicalizados como Michigan e Ohio, são recebidos pelos residentes dos estados sulistas como um maná do céu, e as aberturas de novas fábricas são recebidas por longas filas de trabalhadores esperançosos nos portões de contratação. A globalização está operando como na teoria clássica da equalização dos preços dos fatores, elevando os salários nos países em desenvolvimento e reduzindo o seu crescimento nos países avançados. Outro vento contrário potencial diz respeito aos possíveis efeitos do aquecimento global e outros temas ambientais, e um possível vento de popa emergiu na forma de uma produção doméstica de petróleo e gás natural grandemente aumentada nos Estados Unidos como resultado do fracking horizontal. Embora a extensão e os efeitos prováveis do aquecimento global estejam sujeitos a debate, existe pouca dúvida de que eles estão ocorrendo e criarão eventos climáticos – sejam inundações costeiras ou tornados
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