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0389
PAULO NADER
Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora. Expositor da Escola 
da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Juiz de Direito aposentado 
do Estado do Rio de Janeiro. Membro da Association Internationale 
de Philosophie du Droit et de Philosophie Sociale. Membro 
da Association Internationale de Methodologie Juridique. Membro 
do Instituto Brasileiro de Filosofia. Membro Correspondente 
da Academia Brasileira de Letras Jurídicas.
Endereço eletrônico: pnader@powerline.com.br
CURSO DE DIREITO CIVIL
PARTE GERAL
E D I T O R A
FOR E N S E
Rio de Janeiro 
2003
Curso de Direito Civil - Parte Geral 509
139. Simulação
139.1. Considerações prévias. Não obstante a nova Lei Civil haver 
retirado o instituto da simulação do capítulo afeto aos defeitos dos negócios 
jurídicos, trasladando-o para o da invalidade, o seu estudo mais adequado 
deve fazer-se ao lado dos demais vícios, porque aprendizado se faz medi­
ante comparações e distinções.
Simulação e dissimulação são formas diversificadas de engodo. São 
fugas da realidade que visam a ludibriar, a fim de se tirar algum tipo de pro­
veito. Ambas atentam contra a moral e são repelidas pelo jus positum. 
Enquanto que na simulação a malícia atua dando aparência ao que não 
existe, na dissimulação dá-se o oposto: o objetivo é o de esconder o que 
existe. Na abordagem de José Beleza dos Santos, antigo professor da Fa­
culdade de Direito de Coimbra, “Finge-se muitas vezes uma aparência que 
não oculta realidade alguma, outras vezes desfigura-se a realidade e os­
tenta-se uma ficção com que se procura encobrir alguma coisa que existe, 
mas que se não quer revelar. No primeiro caso apenas se simula, no segun-
9 9 97 • • • ^do simula-se para se dissimular No campo doutrinário a dissimulação é
denominada por simulação relativa. O instituto está regulado em nosso 
Código Civil pelo art. 167, que prevê a nulidade do ato simulado.
139.2. Conceito. Na simulação há desacordo intencional entre a von­
tade real e a declaração de consentimento. Dá-se o ato simulado quando 
duas ou mais pessoas, de conluio e visando a burlar terceiros ou a fraudar a 
lei, realizam negócio com o propósito de alcançar resultado jurídico diver­
so do aparentado. Na definição de Nicolas Coviello “consiste em querer 
uma coisa diversa da contida na declaração, conscientemente e com o 
acordo da parte à que a declaração se dirige ”, Configura um verdadeiro 
"abuso da função instrumental do negócio ”, conforme declara Emílio Bet- 
ti.99 Não se confunde com a reserva mental, pois nesta a intenção diversa é 
apenas do declarante e não provoca nulidade do ato, sendo possível tam­
bém nos atos unilaterais (V. § 116.6), enquanto que no ato simulado con­
corre a vontade de ambas as partes e o negócio jurídico é nulo. Esta 
modalidade de vício se manifesta apenas nos contratos.
97 In A Simulação em Direito Civil, São Paulo, Lejus, 1999, p. 49.
98 Nicolas Coviello, op. cit. , p. 402.
Paulo Nader
Coviello adverte para a necessidade de se distinguir, na prática, os 
S simulados, onde a verdadeira intenção não coincide com a declarada, 
i atos verdadeiramente intencionais onde se pretende unicamente burlar 
ú ou fraudar os credores, tendo em vista os efeitos diversificados que 
duzem* Os simulados e os que contrariam a lei são negócios nulos, en- 
mto que os praticados em fraude contra credores são, no Brasil, anuláveis, 
[uanto que na Itália são plenamente válidos entre as partes e ineficazes 
relação aos credores.
Não se confundem, também, os atos simulados com os fiduciários. 
Os primeiros, as partes encobrem a realidade, agindo fraudulentamente; 
l os segundos, as partes apenas se valem do negócio jurídico para obter 
snninado efeito que não é típico e que lhes aproveitem. No casamento 
iciário as partes não visam a estabelecer uma vida em comum, mas 
•somente a alcançar algum dos favores da lei. O indivíduo que, não ten- 
para quem deixar pensão por sua morte, casa-se com alguém apenas 
\ esse fim, é outro exemplo. Conforme anota Vicente Ráo, o casamento 
içiário não é aceito pela doutrina e nem pela jurisprudência, que se valia 
regras da simulação para anulá-lo.101 Com o Código Civil de 2002, po- 
i, há previsão legal a respeito, contida no art. 166, III, que considera 
) o negócio jurídico quando “o motivo determinante, comum a ambas 
wrtes, fo r ilícito ” (§144.2). A opinião de Ennccccrus é contrastante, 
obstante denomine dissimulado o casamento realizado nestas condi- 
V "O matrimônio contraído na forma pertinente ê plenamente válido, 
fà que ambas as partes o tenham contraído de comum acordo somente 
tparência, pois não é nulo, nem anulável”.
Do conceito de ato simulado depreendem os seguintes requisitos: a) 
uio entre os figurantes do negócio jurídico; b) divórcio entre a vontade 
c st declarada; c) objetivo de burlar a lei ou de enganar a terceiros, al- 
fando algum proveito. Na hipótese de um litígio futuro entre os agentes 
imulação, nenhum deles poderá valer-se da própria torpeza para obter 
são judicial que lhe seja favorável.103 Todavia, em se tratando de viola-
Op. cit., p. 402.
fn Ato Jurídico, ed. cit., p. 217.
Op. cit., p. 179.
tfeste sentido julgou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: “Negócio jurídico si- 
liulado - Embuste efetivado entre as partes com o intuito de prejudicar terceiros - 
Torpeza que não pode ser argüida por nenhum dos figurantes, em litígio um com o ou-
cf. acórdão divulgado por Revista dos Tribunais, verbete simulação.
Gurio de Direito Civil Parto Geral Sll
çâo de norma de ordem pública, as partes possuem legitimidade para a pro- 
positura de ação. Neste sentido, decidiu a 3a Turma do Superior Tribunal de 
Justiça, ao apreciar pedido de nulidade de contrato de compra e venda, que 
dissimulava doação entre nubentes, que se casaram pelo regime de separa­
ção obrigatória de bens em face de idade: “Viola o art. 258, inciso IIdo Có­
digo C iv i l(art. 1.641, II, pelo Código Civil de 2002) a disposição 
patrimonial gratuita (simulação de contrato de compra e venda, encobrin­
do doação) que importe comunicação de bensnão adquiridos por esforço 
comum, independente da natureza do negócio jurídico que importou em al­
teração na titularidade do bem, porque è obrigatório, no casamento do 
maior de sessenta anos, o regime obrigatório de separação quanto aos 
bens entre os cônjuges. Tratando-se de ato simulado malicioso, com infra­
ção de ordem pública, de natureza protetiva de uma das partes, esta - que 
pretendeu contornar a norma protetiva, instituída em seu favor, buscando 
renunciar o favor legal por via transversa - tem legitimidade para reque­
rer sua declaração de nulidade”
A doutrina registra a chamada simulação inocente ou benigna, que é 
praticada, conforme Amoldo Wald, por motivo de afetividade, com animus 
decipiendi, diferentemente da simulação fraudulenta, em que os agentes 
atuam com a intenção de burlar a lei ou de prejudicar terceiros, revelando 
animus nocendi.10 As partes agem com dissimulação, dando ao verdadeiro 
negócio jurídico uma aparência diversa. Assim, quem decide vender um 
objeto que recebeu de presente, e a fím de não magoar a quem o presenteou, 
dá ao negócio a aparência de comodato, pratica na verdade um ato negociai 
inquinado de simulação, mas de natureza benigna, pois não burla a lei e 
nem prejudica terceiros, sendo válido, portanto.
139.3. A simulação no Direito Romano. As mais diferentes espécies 
de simulação eram praticadas entre os romanos, seja para burlar a lei, seja 
para prejudicar terceiros. Como as leis Júlia e Papia Poppaea impunham 
algumas restrições ao solteiro para a aquisição de direitos, era comum va- 
ler-se da simulação a fim de se obter certas vantagens, recorrendo, depois 
de alcançado o proveito, ao libellus repudii. Os atos que caíam nas malhas da 
lei eram declarados nulos e o fisco recolhiaos legados. Como as doações en­
tre os cônjuges eram proibidas em nome da paz e do amor, recorriam-se a
104 REsp. 260462/PR, rei. Min. Nancy Andrighi, julgamento de 17.04.2001, DJ 
11.06.2001, p. 00205.
105 Op. cit.y p. 206.
512 Paulo Nader
todos os tipos de expedientes possíveis a fim de se burlar a lei, além de ve­
ladas liberalidades: vendas simuladas, sociedades falsas, locações só de 
aparência, entre outros.
Não havia, em Roma, regras sistematizadas sobre a simulação. Impe­
rou o casuísmo, não obstante alguns critérios gerais, como o de se negar va­
lor jurídico para o ato aparente (simulatus, fictus, imaginarius). Quando a 
simulação não escondia um negócio jurídico concreto o ato era nulo, toda­
via, em se tratando de dissimulação, hoje tratada por simulação relativa, os 
romanos, embora rejeitassem a pretensão dos declarantes, admitiam a vali­
dade do ato escondido desde que seus elementos essenciais estivessem 
configurados. Mas dificilmente tal fato ocorria, pois quase sempre se ocul­
tava o negócio proibido em lei.106
139.4. Simulação absoluta e relativa. Na primeira, os declarantes 
dão aparência a um fato que na realidade não existe. A vontade real não é a 
de praticar algum negócio jurídico subjacente. Alguém emite uma nota 
promissória em favor de outrem, apenas para figurar como dívida em outra 
relação. A simulação se diz relativa quando visa a esconder o verdadeiro 
nexo existente, como na hipótese de se firmar contrato de mútuo, para en­
cobrir a dívida de jogo. Assim, há dois negócios, um fictício e outro real.
139.5. Regras do Direito Civil sobre simulação. A exemplo do Di­
reito Romano, a Lei Civil distingue a simulação absoluta da relativa, fixan­
do conseqüências distintas para ambas. O ato simulado (simulação 
absoluta) —o que não ocultava outro negócio jurídico — é considerado nulo, 
enquanto que o dissimulado (simulação relativa) - o que encobre o verda­
deiro ato negociai —, embora nulo admite que se aproveite a real intenção 
das partes na hipótese de todos os seus elementos básicos se encontrarem 
caracterizados. A validade do negócio subjacente fica condicionado tam­
bém à forma, ou seja, os elementos essenciais aos atos negociais em geral 
devem ser atendidos e os específicos da modalidade ocultada. É a disposi­
ção do caput do art. 167 do Código Civil: “É nulo o negócio jurídico simu­
lado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido fo r na substância e na 
forma Conforme Manuel A. Domingues de Andrade, aplica-se o princí­
pio i{plus valet quod agitur quam quod simulate concipitur” (mais vale o 
ato que na verdade se quis praticar do que aquele que foi simulado). Ou
1A7
seja, prevalece o que se fez sobre o que se disse.
106 V. in José Beleza dos Santos, op. cit., p. 177.
107 Op. cit., vol. II, p. 189.
Curso de Direito C ivil - Parte Ocrai 513
Em seu § Io, o art. 167 enuncia três hipóteses de simulação, o que não 
impede, todavia, a caracterização de outras possíveis, uma vez que a mente 
humana é fértil em criações. Eis as modalidades previstas:
139.5.1. Simulação por interposta pessoa. Para a realização de fins 
ilegais, é comum o agente valer-se de conluio com outra pessoa, utilizan­
do-se de negócio jurídico simulado. A pessoa casada é impedida de efetuar 
doações à amante, conforme prevê o art. 550 do Código Civil. A fim de 
burlar a lei, o cônjuge adúltero simula uma venda para alguém de sua con­
fiança, para que faça a doação à determinada pessoa. Parte legítima para 
propor a ação é o outro cônjuge.
139.5.2. Simulação por declaração não verdadeira. A segunda mo­
dalidade de simulação definida refere-se à declaração, confissão, condição 
ou cláusula não verdadeira. Tal modalidade pode dizer respeito à própria 
natureza do contrato ou apenas a alguns de seus itens. Se o negócio jurídico 
é de doação e as partes, a fim de se valerem de alíquota inferior do imposto 
de transmissão, declaram compra e venda, tem-se declaração não verdadei­
ra, caracterizando simulação relativa (dissimulação). Se as partes celebra­
ram contrato de compra e venda por determinado valor e declaram na 
escritura um outro inferior, ter-se-á também configurada a hipótese legal. 
As vezes atribui-se valor bastante superior a fim de se desestimular o direi­
to de preferência.
139.5.3. Simulação por data fictícia. Visando a fraudar a lei ou a tercei­
ros, a aposição de data em documento particular não se faz regularmente, 
seja antedatando ou pós-datando. É a terceira hipótese definida na Lei Civil.
139.5.4. Terceiros de boa-fé. Com a nulidade dos negócios celebrados 
por simulação, a lei visa a coibir que a fraude prevaleça e que terceiros de 
boa-fé sejam penalizados pela manobra ilícita. O § 2o do art. 167 ressalva, 
expressamente, os direitos de terceiros de boa-fé. Vale dizer, a sentença judi­
cial deverá salvaguardar os direitos tanto quanto faticamente for possível. 
Declarada a nulidade do ato negociai a situação jurídica deve retomar ao sta­
tu quo ante e se isto não for possível, deve-se recorrer à indenização para se 
chegar ao devido ponto de equilíbrio. Não obstante as medidas judiciais dis­
poníveis, nem sempre se consegue impedir o prejuízo de terceiros de boa-fé.
140. Fraude contra credores
140.1. Conceito. Nos defeitos jurídicos anteriormente estudados, a 
vítima participa como agente do ato negociai, cabendo-lhe a iniciativa da
514 Paulo Nader
propositura da ação anulatória. Na figura que ora se nos apresenta para es­
tudo, diferentemente, a tutela legal recai naqueles que não participaram do 
ato: os credores de uma das partes. Tal defeito é considerado vicio social, 
uma vez que o ato negociai se contrapõe aos interesses de uma ou mais pes­
soas que dele não participam. Não há vício de vontade, pois a declaração se 
faz em consonância com o propósito do agente. O divórcio existente é entre 
a vontade declarada c o ordenamento jurídico.
Tendo em vista que a fraude contra credores não se apresenta com 
uma única modalidade, não há como defini-la senão recorrendo a alguns de 
seus traços mais gerais e abstratos, daí Washington de Barros Monteiro ha- 
ver-se limitado a defini-la como “artificio malicioso empregado para pre-
1 AO
judicar a terceiros A idéia-base que a caracteriza consiste no fato de o 
devedor transferir bens de seu domínio para terceiros, onerá-los, ou remir 
dívidas, desfalcando o seu patrimônio de forma tal, que coloque em risco a 
posição de seus credores. Fraude é ação que prejudica terceiro mediante a 
burla da lei. A fim de escapar dos tentáculos da lei, o fraudador pratica atos 
negociais, dispondo de seus bens e procurando inviabilizar, futuramente, a 
força do Direito. Todavia, como se verá, o dolo não integra todas as modali­
dades deste vício social.
O que a lei visa é combater a fraude, consciente ou não, impedindo-a 
de se concretizar. Para tanto, não se contenta com as disposições do Código 
Civil e cria, via lei instrumental, a figura complementar da fraude ci execu­
ção. Os bens que integram o patrimônio do devedor constituem garantia de 
seus credores, daí a lei estabelecer normas que visem a neutralizar mano­
bras irregulares de disposição de bens.
Via de regra quem pratica atos de fraude contra credores age de 
má-fé, dolosamente, consciente do risco criado para os seus credores. 
Pode, todavia, faltar tal propósito nos atos de disposição de bens, o que é 
pouco provável, todavia. Caio Mário da Silva Pereira anota que, moderna­
mente, já não se exige a intenção de prejudicar o credor, bastando que o de­
vedor “tenha a consciência de produzir o dano ”.m Com a redação do art. 
158 do Código Civil de 2002, dúvida não há de que o presente defeito, na 
modalidade de atos gratuitos, não requer dolo, dado o destaque referente ao 
devedor na prática dos atos ilegais: "ainda quando o ignore”.
108 Op. ctt., p. 216.
109 In Instituições de Direito Civil, vol I, ed.cit., p. 371.
Curso de Direito Civil - Parte Geral 515
Tradicionalmente, a doutrina assinala dois elementos na formação da 
fraude contra credores: a) consilium fraudis (conluio fraudulento); b) even- 
tus damni (prejuízo ao credor).110 Tais componentes, todavia, não são in­
dispensáveis em todas modalidades deste vício. Quanto ao segundo 
elemento - eventus damni o que é essencial não é o prejuízo em ato, mas 
em potência. Teoricamente os atos de disposição de bens nem sempre pro­
vocam o prejuízo, mas este se toma potencial. Assim, a potencialidade do 
prejuízo é que se apresenta como elemento configurador do defeito ora em 
estudo, uma vez que a lei não exige a consumação do prejuízo. O Direito, 
aliás, revela o seu poder não apenas quando estabelece conseqüências para 
a ilicitude das ações, mas principalmente quando a previne.
140.2. A fraude contra credores no Código Civil de 2002. Diversas 
são as hipóteses de configuração do vício ora em estudo, à luz de nosso or­
denamento, podendo-se apontar, como denominador comum, a proteção ao 
credor em face de atos negociais do devedor comprometedores de seu pa­
trimônio e capazes de inviabilizarem a satisfação do crédito. Examinemos 
cada uma das espécies e seus corolários.
140.2.1. Atos de doação e de remissão de dívida. Os atos negociais 
suscetíveis de anulação, previstos no art. 158 da Lei Civil, são os de doação 
e os perdões de dívida. Tais atos são anuláveis desde que o benfeitor, ao 
praticá-los, já esteja ou fique em estado de insolvência. Esta se caracteriza 
quando o passivo se toma superior ao ativo, não sendo necessária a declara­
ção judicial. A vista do que dispõe o art. 748 do Código de Processo Civil, 
basta que as dívidas excedam o valor dos bens.111 Conforme Sílvio Rodri­
110 Os tribunais também operam sob tal fundamento, conforme se pode constatar da se­
guinte ementa de acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da Ia Região: 
“Ementa: /. São requisitos da fraude contra credores nos contratos onerosos: even­
tus damni que se define pela lesão causada aos credores; consilium fraudis, que con­
siste na intenção comum do devedor e de terceiro de ilidir os efeitos da cobrança; 
insolvência notória ou conhecida pelo outro contraente e contemporaneidade da 
condição de credor quirografário à prática da fraude; II. Não caracterização na es­
pécie, de vez que não restou provado, nos autos, que os alienantes e o adquirente agi­
ram em conluio com a intenção de fraude... Ap. Cív. 93.01.33796-7/MG — 4a T. - 
TRF Ia Reg. - D JU 07.12.1999, Revista de Direito Privado, Editora Revista dos Tri­
bunais, n° 4, 2000.
111 O art. 748 do Código de Processo Civil define a insolvência: "Dá-se a insolvência toda 
vez que as dividas excederem à importância dos bens do devedor
516 Paulo Nader
gues observa, quanto à doação: “O ato é anulávelporque o devedor, na 
verdade, está doando coisa que indiretamente pertence a seus credo­
res”} 12 Como o patrimônio, que é garantia dos credores, se compõe tam­
bém de haveres, os negócios jurídicos que tenham por conteúdo o perdão 
de dívidas podem caracterizar a fraude, desde que não restem recursos sufi­
cientes para o pagamento das obrigações pendentes. Na forma do disposto 
no art. 385 da Lei Civil, a remissão de dívida somente extingue a obrigação 
quando não implicar prejuízo a terceiro.
Para a configuração do vício não é necessário qualquer elemento sub­
jetivo, uma vez que os atos de benemerência podem ter sido praticados 
pelo devedor até com desconhecimento dos riscos criados para os credores.
Possui legitimidade para pleitear a anulação de tais atos apenas os 
credores quirografários, que são aqueles cujos créditos não são privilegia­
dos. O credor hipotecário, por exemplo, não pode propor a ação, pois care­
ce de interesse de agir uma vez que o seu crédito já se acha protegido pelo 
objeto do penhor ou da hipoteca, salvo se este for de valor insuficiente, 
conforme ressalva o § Io do art. 158 do Código Civil.
140.2.2. Disposição de bens em atos onerosos. Encontrando-se o de­
vedor em estado de insolvência e sendo esta notória ou suscetível de conhe­
cimento por parte de quem com ele venha a praticar negócio jurídico 
oneroso, este pode ser anulado por iniciativa de seus credores quirografários, 
observada a exceção do art. 158, § Io da Lei Civil. Se a presença do vício 
nos atos gratuitos dispensa o elemento consilium fraudis, este é necessário 
na modalidade dos atos onerosos.
Embora a lei vise a proteger os credores, não deve deixar a descoberto 
o interesse daqueles que, de boa-fé, praticam atos negociais com pessoa in­
solvente. O negócio jurídico será passível de anulação, tratando-se de atos 
onerosos, tão-somente quando a insolvência do devedor for notória ou sus­
cetível de ser conhecida pela outra parte. A notoriedade se revela pelos pro­
testos de títulos, execuções judiciais, falta de crédito no comércio e perante 
as instituições financeiras, entre outros. A jurisprudência tem presumido o 
conhecimento da insolvência quando a outra parte possui vínculos estreitos 
com o insolvente, decorrentes, sobretudo, de parentesco próximo.
Realizado o ato negociai, o adquirente de bens do devedor insolvente, 
a fim de desobrigar-se, poderá depositar em juízo o valor correspondente
112 Op. cit. , p. 231
Curso de Direito Civil - Parte Geral 517
ao negócio, citando os credores. Quanto ao valor, se este for inferior ao pre­
ço de mercado, o adquirente poderá depositar o valor real. É de se admitir 
que, na hipótese de o preço superar o de mercado, o adquirente deverá de- 
positá-lo integralmente. É a que leva a interpretação teleológica, embora o 
art. 160 não faça menção a respeito.
Não se incluem entre os atos negociais passíveis de anulação os indis­
pensáveis ao custeio do lar e à manutenção das atividades empresariais, 
conforme prevê o art. 164 do Código Civil, que os presume praticados de 
boa-fé. Tal preceito se funda, de um lado, em princípio humanitário, pois 
visa a não dificultar a própria sobrevivência do devedor insolvente e a de 
sua família. Esta inovação, prevê Sílvio Rodrigues, deverá "ampliar o 
campo da controvérsia 3 De outro lado, o objetivo é o de não agravar as 
condições econômicas do devedor, inviabilizando a sua atividade profis­
sional. Não obstante, a lei abre um flanco à burla.
140.2.3. Outras disposições. As espécies de fraude abordadas se refe­
rem a atos negociais praticados com terceiros. Nos artigos 162 e 163 da Lei 
Civil a previsão é a de ações do devedor insolvente com credores separa­
dos. Se algum dos credores quirografários receber o seu crédito do devedor 
insolvente antes do vencimento, será obrigado a reverter em proveito do 
acervo de bens a ser partilhado no concurso de credores. Aplicando-se o 
raciocínio a contrario sensu, tem-se por regular o recebimento se no venci­
mento ou posterior a este. Tal conclusão, todavia, se coloca em contradição 
com a teleologia da própria norma, pois não impede que um credor seja be­
neficiado em detrimento dos demais. Carvalho Santos, todavia, não vislum­
bra qualquer contra-senso na permissão legal: “A fraude contra credores só 
aparece com o pagamento antecipado. Se a divida está vencida, não ê possí­
vel se vislumbrar má-fé por parte do credor, o que exclui a possibilidade da 
ação pauliana. Ele recebeu apenas o que era seu, em virtude de um título le­
gítimo...”}™ Se o pagamento antecipado for a credor privilegiado não estará 
caracterizada a fraude contra credores. Esta é a inteligência do artigo, apli- 
cando-se também o raciocínio a contrario sensu.
Outra modalidade do vício social, ora em estudo, consiste na garantia 
de dívida concedida pelo devedor insolvente (penhor, hipoteca, anticrese) a 
algum dos credores. O art. 163 do Codex presume essa garantia uma fraude
113 //j Direito C ivil-Parte Geral, ed. cit., vol. 1, p. 236.
114/zi Código CivilBrasileiro Interpretado, ed. cit., vol. II, p. 442.
518 Paulo Nader
e tal presunção é juris et de jure> não admitindo prova em contrário. A úni­
ca conseqüência jurídica prevista para esta modalidade de fraude é a anula­
ção do ato.
140.2.4. Ação revocatória. A ação anulatória de atos praticados em 
fraude contra credores é a revocatória, também chamada ação pauliana, 
que leva o nome do pretor Paulo, que a instituiu no Direito Romano, ao fi­
nal da República.115 Enquanto que a fraude de execução não anula o ato ne­
gociai, mas apenas o toma ineficaz em face do credor, a fraude contra 
credores produz aquele efeito. Conforme análise de Carlos Roberto Gon­
çalves,11 o Código Civil de 2002 não acolheu o entendimento de grande 
parte da doutrina, que defende a validade do ato entre as partes e a sua inefi­
cácia relativa, tendo Humberto Theodoro Júnior reputado um retrocesso a 
posição do atual Código, uma vez que, sob a vigência do Código revogado, 
já se reconheciam aqueles efeitos no campo do Direito Falimentar e do Pro­
cesso Civil. Para este jurista a anulação do ato não se justifica, pois sendo o 
credor o alvo da proteção jurídica, bastaria o efeito de ineficácia relativa 
quanto a ele, critério este adotado pelos Códigos mais modernos, como o 
italiano e o português.117
Os proveitos obtidos na ação serão convertidos em favor do acervo 
geral. Os requisitos para a anulação e a legitimidade para o ingresso em juí­
zo variam de acordo com o fundamento do pedido. O prazo para ajuiza- 
mento da ação é de quatro anos e decadencial, contado a partir da data de 
realização do negócio jurídico que se pretende anular. Examinemos tais 
elementos de per si:
140.2.4.1. Anulação com fundamento em atos de doação e de remis­
são de divida (art. 158, CC). Requisitos: a) anterior estado de insolvência
115 Embargos de terceiro não são via processual própria para combater fraude contra cre­
dores, conforme a súmula n° 195 do Superior Tribunal de Justiça: “Em embargos de 
terceiro não se anula ato jurídico por fraude contra credores ".
116 Op. cit.f p. 147.
117 In Fraude Contra Credores, 2a ed., Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2001, p. 125. 
Humberto Theodoro Júnior preconiza o entendimento ajustado à índole do instituto ju­
rídico e não conforme a regra legal: “...a circunstância de o Projeto repetir ipsis verbis 
o rótulo de anulabilidade aplicado ao negócio em fraude de credores, não impede que 
sua natureza jurídica e seus efeitos práticos sejam, na verdade, os da ineficácia relati­
va, como antes já demonstramos perante igual texto do vigente Código Civil". Op. cit., 
p. 202.
Curso de Direito Civil - Parte Geral 519
ou insolvência decorrente de tais atos; b) transmissão gratuita de bens ou
perdão de dívida. Legitimidade para requerer: a) credores quirografários;
b) credor cuja garantia for insuficiente. Em ambos casos os créditos devem
ser anteriores aos atos que se pretende anular. Legitimidade passiva : a ação
deverá ser ajuizada contra aqueles que foram partes no negócio jurídico e
• 118 ainda contra terceiros adquirentes de má-fé.
140.2.4.2. Anulação com fundamento em atos onerosos (art. 159). 
Requisitos: a) estado de insolvência; b) atos negociais onerosos praticados 
pelo devedor insolvente; c) notório estado de insolvência ou situação pre- 
sumidamente conhecida da outra parte. Legitimidade ativa e passiva igual 
à da anulação com fundamento em atos de doação e de remissão de dívida.
140.2.4.3. Ação de desobrigação do adquirente. Na hipótese do art. 
160 do Código Civil, são requisitos: a) em estado de insolvência o devedor 
alienou algum bem; b) o adquirente não efetuou o pagamento ao aliénante; c) 
depósito em favor dos credores pelo valor do contrato ou, se este for inferior 
ao preço de mercado, o valor real. Legitimidade ativa: o adquirente. Legiti­
midade passiva: todos os interessados, inclusive o devedor insolvente.
140.2.4.4. Pagamento antecipado de dívida (art. 162). Se o devedor 
insolvente pagou antecipadamente a dívida ao credor quirografário, este 
poderá ser compelido a depositar o valor correspondente em proveito dos 
demais credores. Requisitos: a) insolvência do devedor à época do ato ne­
gociai inquinado de vício; b) pagamento antecipado de dívida; c) credor 
quirografário como beneficiado. Legitimidade ativa: os demais credores 
quirografários. Legitimidade passiva: os figurantes no ato defeituoso.
140.2.4.5. Garantias de dívida conferidas em estado de insolvência 
(art. 163). Requisitos: a) estado de insolvência do devedor; b) concessão de 
garantia de dívida a um dos credores à época da insolvência. Legitimidade 
ativa: os demais credores quirografários. Legitimidade passiva: os partici­
pantes do ato negociai.
140.3. Fraude de execução. Além da tutela que o Código Civil ofe­
rece aos credores de devedor insolvente, a ordem jurídica considera fraude 
de execução, ex vi do disposto no art. 593 Código de Processo Civil, os atos
118 Os mais novos na advocacia devem ter o cuidado de não incidirem no erro freqüente de 
ajuizamento de ação apenas contra uma das partes, quando se trata de anulação de escri-
520 Paulo Nader
de alienação ou oneração de bens, quando: a) sobre eles pender ação fu n ­
dada em direito real; b) ao tempo da alienação ou oneração, corria contra 
o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; c) nos demais casos 
expressos em lei. Observe-se que apenas a segunda hipótese cogita de in­
solvência do devedor. Os negócios jurídicos realizados em qualquer destas 
situações é considerado ineficaz em relação ao credor.119 A fraude de exe­
cução pressupõe que, ao tempo do ato negociai, o devedor já tenha sido ci­
tado na ação. Não importa se posterior à distribuição do feito e antes da
• ion • •citação. Na fase que antecede à citação pode ter ocorrido fraude contra
credores, não fraude de execução.
Enquanto que a anulação de negócio jurídico em razão do vício de 
fraude contra credores requer a ação revocatória ou pauliana para produzir 
efeitos, a fraude de execução pode ser declarada incidentalmente no proce­
dimento de execução, desde que a parte interessada comprove a alienação 
ou oneração de bens, quando então tais atos serão julgados ineficazes.
A consilium fraudis não figura como requisito na fraude de execução, 
conforme acórdão do Superior Tribunal de Justiça: "... Não se exige a de­
monstração do intuito de fraudar — circunstância de que não se cogita em 
se tratando de fraude de execução, mas apenas em fraude contra credores, 
que reclama ação própria (revocatória/pauliana). Na fraude de execução, 
dispensável é a prova de m á-fé”.121
119 Neste sentido é o acórdão da 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, relator Min. 
Sálvio de Figueiredo Teixeira: “Na fraude de execução o ato de alienação do bem 
constrito não é nulo ou inválido, mas ineficaz em relação ao credor e ao processo exe­
cutivo, permanecendo válida entre as partes alienante e adquirente" - REsp. 
150430/MG, julgamento de 29.02.2000, D J de 10.04.2000, p. 00093.
120 Citação é o ato processual pelo qual, dando-se ciência a alguém do teor de uma ação 
contra ela ajuizada, convoca-a para se defender dentro de determinado prazo.
121 REsp. 333161/MS, 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, relator Min. Sálvio de 
Figueiredo Teixeira, julgamento de 07.02.2002, D J de 15.04.2002, p. 00225.

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