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Apostila 20 - Constrangimento ilegal

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CONSTRANGIMENTO ILEGAL
Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda:
        Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
      
  Aumento de pena
        § 1º - As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando, para a execução do crime, se reúnem mais de três pessoas, ou há emprego de armas.
        § 2º - Além das penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência.
        § 3º - Não se compreendem na disposição deste artigo:
        I - a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida;
        II - a coação exercida para impedir suicídio.
     
1– objeto jurídico
Tutela-se a liberdade individual de querer, ou seja, a autodeterminação da vontade e da ação, incluindo-se, assim, a liberdade física e psíquica da vítima;
É o dispositivo corolário do art. 5º, II da CF/88: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei”;
Veda-se, assim, qualquer coação no sentido de obrigar outrem a fazer ou deixar de fazer algo que por lei não está obrigado.
Ex: quando a vítima é obrigada a fazer algo: dizer onde se encontra determinada pessoa; indicar onde se encontram certos documentos; ingerir bebida alcoólica;
Quando a vítima é obrigada a não fazer algo: a não fazer uma viagem; a não ir a determinado local;
“Pratica crime de constrangimento ilegal o a gente que, empunhando arma, obriga moças a entrarem em automóvel, para dar-lhes, contra a vontade delas, uma carona” (Tacrim – SP, Rel. Adauto Suannes – RT 592/351) 
2 – sujeito ativo
Trata-se de crime comum;
Se o agente for funcionário público, e emprega violência ou grave ameça, no exercício de suas funções, ocorrerá o crime de abuso de autoridade descrito na Lei 4898/65.
3 – sujeito passivo
Pessoa física que possui capacidade de autodeterminação, ou seja, capacidade de querer;
Excluídas estão: pessoas inteiramente alienadas mentais, os ébrios totais, as crianças de tenra idade, pessoas inconscientes, pessoas jurídicas;
Quanto às pessoas jurídicas, não podem ser vítimas deste delito, e sim o representante legal que sofre a violência ou grave ameaça e, em nome daquela, realiza ou deixa de realizar algum ato contra a sua vontade.
 A incapacidade física, isto é, a incapacidade operacional (tetraplégicos, paraplégicos) não afasta a possibilidade de ser sujeito passivo do crime de constrangimento ilegal, aliás poderá configurar uma agravante (enfermos ou desgraça particular do ofendido), cf art. 61, II, h e j do CP
Importa ressaltar que se o agente submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância à vexame ou constrangimento, o fato deverá ser enquadrado no art. 232 do ECA;
A conduta de atentar contra a liberdade pessoal do Presidente da República, Presidente do Senado, Presidente da Câmara dos Deputados e Presidente do STF constitui crime contra segurança nacional (art. 28, Lei 7.170/83); pena: 4 a 12 anos de reclusão.
Se o agente coage, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração, pratica crime descrito no Estatuto do Idoso, punido com pena de 2 a 5 anos de reclusão (art. 107 da Lei 10.741/03).
4 - Tipo objetivo
A conduta núcleo é constranger, que significa coagir, compelir, forçar, obrigar;
Há primeiramente a ação de constranger realizada pelo coator, a qual é seguida pela realização ou abstenção de um ato por parte do coagido;
Ex: cometerá o delito aquele que obrigar outrem a mudar de residência; coação para que a vítima venha a ingerir bebida alcoólica ou substância entorpecente; quando a vítima é coagida para que deixe de frequentar lugares permitidos;
A ação de constranger deve ser ilegítima, ou seja, o coator não pode ter o direito de exigir da vítima a realização ou abstenção de determinado comportamento;
Obs: não se pode compreender como ilegítima a ação daquele que impede que outrem pratique um crime, bem como não se pode conceber como ilegítima a ação de impedir o suicídio de outrem;
Obs:se alguém constranger outrem a não praticar ato imoral, p. ex. prostituição, incesto,ocorrerá o crime, porque a ação foi ilegítima;
Obs: se o constrangimento visar pretensão legítima do sujeito ativo, poderá caracterizar exercício arbitrário das próprias razões (art. 345); este crime também poderá ocorrer se o agente atuou com erro, acreditando ser legítima a sua pretensão.
5 – meios de execução
Consistem no emprego de violência, grave ameaça ou qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência do ofendido;
Violência física
Consiste no emprego de força física contra o coagido, a fim de cercear sua liberdade de escolha e obter o comportamento desejado;
Pode ser produzida pela própria energia corporal do agente, que, no entanto, poderá preferir utilizar outros meios como fogo, água, energia elétrica, etc;
A violência pode ser empregada por omissão, p. ex, submeter a vítima à fome e à sede, com finalidade de fazê-la ceder à vontade do agente; 
A violência poderá ser:
Direta ou imediata – aquela empregada diretamente sobre a vítima;
Indireta ou mediata – é aquela empregada sobre 3ª pessoa ou sobre coisa, a que o coagido esteja vinculado diretamente;
Obs: na hipótese em que o coator compele outrem a praticar o crime, sendo a violência física empregada irresistível, não responderá o coagido por crime algum, pela ausência total de vontade de praticar o delito. Porém, o coator responde pelo crime praticado pelo coagido e pela violência aplicada sobre ele; se, no entanto, a força for resistível, o coagido também responderá pelo crime, embora com pena atenuada;
b) Grave ameaça
trata-se de violência moral ou vis compulsiva;
É a promessa, oral ou escrita, dirigida a alguém, da prática de um mal, iminente ou futuro, de forma a exercer poder intimidatório sobre ele;
O mal prometido deve ser relevante, ou seja, deve ser apto a exercer a intimidação, sendo certo que a condição pessoal da vítima deve ser levada em conta para tal aferição;
Não se exige a presença do constrangido, pois ela pode ser feita por meio escrito ou através de interposta pessoa;
Obs: não se deve confundir o crime de constrangimento ilegal (art. 146) com o crime de ameaça (art. 147), pois neste, a finalidade do agente é simplesmente intimidar a vítima, ao passo que no constrangimento ilegal, é o meio de que se serve o agente para obter determinado comportamento da vítima; ao contrário do crime de ameaça, a grave ameaça do crime de constrangimento ilegal não precisa ser um mal injusto (obrigar outrem a se mostrar seu amigo, sob ameaça de denunciá-lo à autoridade policial por crime que tenha praticado).
Qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência do ofendido
Chamado de violência imprória
Esses outros meios devem ser empregado de forma fraudulenta, isto é, sem violência ou grave ameaça, caso contrário, estariam incluídos nas outras duas alternativas;
Tais meios precisam ter a capacidade de reduzir ou diminuir a resistência da vítima;
Ex: hipnose, narcóticos, álcool, pílula da verdade, máquina da verdade, etc;
6 – tipo subjetivo
* É o dolo direto ou eventual, consistente na vontade livre e consciente de constranger a vítima, mediante o emprego de violência ou grave ameaça, ou se utilizando de meios que venham a reduzir a capacidade de resistência da vítima;
* Não basta, entretanto, o dolo consistente na vontade de coagir para que o crime em análise se configure, pois é necessário um fim especial de agir, que se consubstancia na vontade de obter a ação ou omissão indevida, ou seja, que a vítima faça o que a lei não determina ou não faça o que a lei manda;
Ausente esta finalidade especial, o crime poderá ser outro, conforme forempregada a violência física ou a grave ameaça;
Se a pretensão do agente for legítima, pode configurar exercício arbitrário das próprias razões (art. 345);
Não há modalidade culposa deste crime;
7 – consumação
Consuma-se o crime quando a vítima, submetida, toma o comportamento a que foi obrigada, fazendo o que não desejava ou não fazendo o que queria;
O tipo penal exige que a ação ou omissão desejada pelo agente seja realizada pela vítima;
É crime material;
É crime instantâneo;
Para Luiz Regis Prado, ainda que o comportamento desejado seja parcial, e não integralmente realizado pela vítima, tem-se como consumado o delito.
8 – tentativa
Por ser crime material, a tentativa é perfeitamente possível; ocorre na hipótese em que o ofendido não se submete à vontade do agente, apesar da violência, grave ameaça ou qualquer outro meio empregado que reduza a sua capacidade de resistência;
9 – formas:
Simples – caput – pena: detenção de 3 meses a 1 ano ou multa;
Majorada – art. 146, §1º - neste caso, as penas do caput são aplicadas cumulativamente (detenção de 3 meses a 1 ano E multa) e em dobro;
*Quando para a execução do crime, se reúnem mais de 3 pessoas – exige, no mínimo, 4 pessoas; o partícipe não está incluído, pois o próprio tipo fala em “execução do crime”; - crime plurissubjetivo ou de concurso necessário;
*Emprego de armas próprias ou impróprias
O agente deve fazer uso dela, seja para atacar a vítima, seja para incutir-lhe temor, empunhando-a ameaçadoramente ou portando de modo ostensivo;
O porte ostensivo de arma de brinquedo ou descarregada não mais autoriza a incidência da causa de aumento de pena em tela, já que não oferece nenhuma periculosidade.
10 – concurso de crimes (art. 146, §2º)
Concurso material – haverá concurso material de crimes se do emprego da violência para a prática do constrangimento ilegal resultar lesão corporal (leve, grave, gravíssima ou seguida de morte);
Em tese, a regra seria a do concurso formal imperfeito de crimes, mas o legislador optou em estabelecer a regra do cúmulo material;
Obs: há possibilidade de concurso formal quando o agente, mediante o emprego de arma, coage um grupo de pessoas a fazer ou se abster de algum comportamento determinado em lei;
Ex:assalto em ônibus em que os bandidos constrangem as pessoas a ficarem nuas.
11 – subsidiariedade
O delito do art. 146 é subsidiário em relação a todos os delitos em que o constrangimento é meio ou elemento (estupro, extorsão, roubo), ficando absorvido por estes;
Obs: este crime é de menor potencial ofensivo.
12 – causas especiais de exclusão da tipicidade
A intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente, ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida;
Coação exercida para impedir o suicídio de outrem – constitui na realidade, estado de necessidade de 3º.
12 – ação penal
Pública incondicionada.

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