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INÊS PAULA PEREIRA DA SILVA R.A: 5280410580 O PROCESSO HISTÓRICO DE CONSTRUÇÃO DO ESTADO LAICO NO BRASIL E NOS PAÍSES LATINO-AMERICANOS Mogi das Cruzes - SP 2019 CENTRO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA 1 Mogi das Cruzes - SP 2019 O PROCESSO HISTÓRICO DE CONSTRUÇÃO DO ESTADO LAICO NO BRASIL E NOS PAÍSES LATINO-AMERICANOS Desafio profissional apresentado à Anhanguera como requisito parcial para o aproveitamento das disciplinas do Curso de Licenciatura em História. Tutor a Distância: Prof. Ailton Salgado Rosendo INÊS PAULA PEREIRA DA SILVA 2 Sumário 1. Introdução ............................................................................................................................... 3 2. Conceito de Laicidade ............................................................................................................ 4 3. A aliança política entre Império e Papado na Alta Idade Média ............................................ 5 4. Observações sobre a imagem da coroação de Carlos Magno como imperador do Novo Império romano do Ocidente ...................................................................................................... 7 5. As relações entre Igreja e Estado no Brasil e a construção do Estado Laico ......................... 8 6. A influência política do catolicismo nos países latino-americanos ...................................... 10 7. Conclusão ............................................................................................................................. 12 8. Referências Bibliográficas .................................................................................................... 13 3 1) Introdução O objetivo deste desafio profissional é elucidar acerca de como se desenvolveu o processo histórico de construção do estado laico no Brasil e nos países latino-americanos. Apresenta-se o conceito e a origem da palavra laicidade e também noções de como se desencadearam as questões relativas à aliança política entre Império Romano no ocidente e o Papado na Alta Idade Média. Conforme proposto também pelo desafio, houve a realização de uma análise crítica sobre a imagem da coroação de Carlos Magno como imperador do Novo Império romano do Ocidente e quais foram os pontos históricos mais importantes para a história da civilização ocidental neste evento. Por fim, apresenta-se quais foram as relações históricas entre a Igreja Católica e Estado no Brasil, apontando os fatores que incentivaram a construção do Estado Laico, com uma análise do momento presente no cenário brasileiro, apontando também a influência política do catolicismo nos países latino-americanos. 4 2) Conceito de Laicidade A expressão deriva do termo grego laico, originada do termo laós, que significa povo ou gente do povo. Desta, por conseguinte, deriva a palavra laikós, que dá origem a palavra latina laicus, significando oposição ao religioso, àquilo que é clerical, conforme explica Catroga (2006). O Dicionário Houaiss define Laicidade como “a separação da instituição religiosa da governamental em uma sociedade”. Ranquetat Jr (2008) afirma que a laicidade procura extirpar a religião da vida social, sendo então um fenômeno que deriva do Estado com o objetivo de excluir a religião da esfera pública ou fomentar a ausência desta nas decisões públicas; a imparcialidade do Estado frente às religiões, tratando-as todas iguais, sem tomar o ponto de vista de nenhuma como norte na direção da sociedade civil. Deve ser entendida conforme o contexto histórico e cultural de cada nação na qual se manifesta. Sua origem é diversa na história, manifestando-se junto ao fenômeno de declínio da religião que perde sua soberania centralizadora na sociedade moderna, neste caso nas relações políticas, passando a estabelecer uma ordem social baseada na razão e na ciência, não é legitimada por um poder religioso (Ranquetat Jr 2008). São diversas as formas que a laicidade se desenrolou, observando-se peculiaridades em cada país, pois o fenômeno depende de um conjunto de características e circunstâncias sociais e culturais, de acordo com Barbier (2005). Na França, por exemplo, tal processo iniciou-se com a Revolução Francesa em 1789, concedendo a liberdade de consciência e de cultos em 1791. Em 1905, ocorre finalmente a separação total dos vínculos entre o Estado e as religiões (Bracho 2005). O Brasil passa por um processo de laicização crescente. Não consta na redação da Constituição Federal de 1988 o termo “Estado Laico”, no entanto a legislação confere a proteção aos cultos religiosos e não tem uma crença como oficial do Estado. Infelizmente, observa-se no meio político a ascensão das chamadas “bancadas evangélicas”, que tentam legalizar ideais religiosos através do legislativo e assim impor de alguma forma sua ideologia particular sobre o restante da sociedade. A Laicidade garante a imparcialidade do Estado frente as crenças religiosas e não toma nenhuma delas como oficial e parâmetro do Governo. A liberdade religiosa, todavia, trata-se da garantia de que cada indivíduo ponha em prática sua fé, garantido o direito de exercê-la e ter suas expressões e cultos protegidos. 5 3) A Aliança política entre Império e Papado na Alta Idade Média Segundo Barros (2009) marcaram o curso da Idade Média desde os seus primórdios a ascensão de dois projetos universais, concorrentes e interdependentes diante de um conjunto de circunstâncias e necessidades políticas para a cristandade ocidental: Papado e Império. Um complexo jogo político, às vezes reduzido ao nível imaginário da época, feito de confrontos e alianças. A palavra império quase sempre esteve associada a um poder a ser exercido, particularmente de um poder sobre vários povos e territórios (...) associado a “expansão”, “domínio absoluto” sobre determinado conjunto de territórios, ou “um poder” que é reconhecido por outros poderes, daí a relação possível entre império e Reino (Barros, 2009). A ideia de um império universal remonta ao Império Romano Ocidental, inexistente desde a deposição de Rômulo Augusto em 476 d.C., e à constituição do Império Carolíngio por Carlos Magno, que caminhava na contramão do pensamento predominante na época; se apresentava alicerçado na diversidade e na exploração às vezes brutal. Tal ideal movimentava o imaginário político dos diversos reinos do ocidente que o império romano se originou, aspirava estender sobre seu senhorio e seus eleitos uma proteção universal. Situamos o Papado, todavia, já inserido em meio a divisões das numerosas instituições eclesiásticas espalhadas no ambiente cristão ocidental, que limitou suas bases forçadamente quanto às iniciais ambições universalistas que a motivavam a princípio. É marcante o momento histórico em que o Império Romano adotou o Cristianismo como religião oficial no governo de Constantino, reforçando o projeto político totalizador com uma religião que se considerava a única capaz de conduzir à salvação, fomentando as nuances da universalidade, no contextono qual Roma já tinha perdido a influência política para Constantinopla, nova capital do Império. A Igreja Romana era detentora de vários territórios na parte central da Itália, mas se sentia ameaçada pelos povos lombardos e pelo Império Bizantino, dominador da Igreja Cristã Oriental. Por isso, a Igreja se sentia ameaçada, tanto territorial como doutrinalmente, e assim iniciou-se a aproximação com o reino franco em ascensão, para constituírem o plano de expansão e fortalecimento conjunto das instituições. Fatos curiosos ocorreram na aliança entre o reino franco e o papado, como a Carta de Doação de Constantino, que segundo Barros (2009) foi um documento forjado pelo Papa Adriano I, supostamente uma antiga carta do Imperador doando terras da Itália Central ao 6 Papa Silvestre. Houve também a Carta de Pepino de 754, marcando a primeira aliança franca com a Igreja Romana, que fundamentou a assinatura de um terceiro documento estabelecendo a aliança de Carlos Magno com Adriano I, fomentando a expansão do Reino Franco e do universalismo espiritual da Igreja Romana sobre as populações cristãs do Ocidente. Concluiu- se na coroação de Carlos Magno no ano 800, que passa a ser visto como depositário de um poder universal e o responsável pelo destino terreno da Igreja, expresso na capitular de Aix-la- Chapelle, conforme Favier (2004). A partir da morte de Carlos Magno, surgem outros documentos que passam a delinear os rumos do império, como a sucessão por um único herdeiro, o recebimento da unção pontifícia e o uso da Lei para demarcar os símbolos que já havia na prática com o consentimento dos religiosos. Em 1030, surge o Livro de cerimônias da corte imperial, dando forma ao imaginário imperial com ritualística baseada na pompa imperial bizantina. Surgem conflitos entre o poder espiritual e temporal. A Igreja passa em 1059 por uma reforma determinando a instituição dos papas pelos cardeais, e tenta resolver a situação do Clero nos reinos, pois os reis e o imperador tentavam interferir na escolha das autoridades eclesiásticas inseridos nos territórios dos reinos. Surge a simonia, o tráfico de coisas santas, a compra de funções eclesiásticas por parte daqueles que controlavam a sociedade, que passaram também a comercializar cargos menores, a venda de sacramentos, indulgências, relíquias. O nicolaísmo também marca com o caso dos padres que viviam amancebados e geravam filhos e recebiam assim a possibilidade de requerer direitos e privilégios. Fliche (1964) define os confrontos da época entre papado e império como Querela das Investiduras, sendo solucionadas em 1122 com a Concordata de Worms, assinada por Henrique V e Calixto II, dando novo significado aos papéis de cada poder. Ao papa a investidura espiritual, simbolizada pelo anel e cruz, e ao imperador a investidura temporal, o báculo. Os mecanismos de escolha do Imperador, por fim, provinham da decisão dos príncipes dos vários territórios do império Teutônico, para que a escolha não tivesse interferência do poder religioso, ao mesmo tempo que a Igreja se empenhava numa reforma para garantir e conservar sua própria autonomia. 7 4) Observações sobre a imagem da Coroação de Carlos Magno como imperador do Novo Império Romano do Ocidente Este acontecimento histórico inserido no contexto medieval marcou a relação entre a Igreja Católica Romana e o Estado, representado pelo Reino Franco, que a partir desse momento passa a ser nomeado, no ano 800, como “Imperador dos Romanos” pelo papa Leão III, legitimando o domínio franco, que se estendia através de muitas campanhas militares e favorecia também a expansão das fronteiras da Cristandade. Passou a ser reconhecido como sucessor do Império Romano do Ocidente, até então extinto desde a queda do mesmo e da ascensão do Império Romano do Oriente (Bizantino), com sede em Constantinopla. Tal coroação ocorreu no dia 25 de dezembro de 800 pelas mãos do Papa Leão III, como podemos observar na imagem, sendo a figura que sustenta a coroa em suas mãos para colocá-la sob a cabeça de Carlos Magno, o homem representado de joelhos em sua frente. Nesta cena também se observa a presença de religiosos, como um bispo, dois cardeais e outros três religiosos ao fundo assistindo a cerimônia. Jacques Le Goff, no livro A civilização do Ocidente Medieval relata: "O restabelecimento do Império [o Romano] no Ocidente parece ter sido ideia do Pontífice [Papa Leão III] e não do carolíngio [Carlos Magno]. (...) Mas em 799 o Papa Leão III viu uma tripla vantagem em dar a Carlos Magno a coroa imperial. Preso e perseguido pelos seus inimigos de Roma, necessitava de ver a sua autonomia restaurada, de facto e de direito, por alguém cuja autoridade a todas se impusesse sem contestação: por um imperador. Chefe de um Estado temporal, o património de S. Pedro, queria que o reconhecimento dessa soberania temporal fosse confirmado por um rei superior a todos os outros - tanto no título como nos factos. Finalmente, tanto ele como uma parte do clero romano pensavam fazer de Carlos Magno imperador de todo o mundo cristão, incluindo Bizâncio, a fim de lutar contra a heresia iconoclasta e de estabelecer a supremacia do Pontífice romano sobre toda a Igreja." Em dezembro de 800, Carlos Magno recebe então uma recompensa da Igreja, e através deste acontecimento é revestido de grande importância política com a suposta condição de legítimo herdeiro dos imperadores romanos. Restabelece-se o Império Romano do Ocidente, dando-se a dignidade imperial para o rei dos francos, unificando também o ocidente com o mesmo poder político e religioso papal. 8 5) As relações entre Igreja e Estado no Brasil e a construção do Estado Laico A construção da laicidade no Brasil, segundo Mainwaring (1989) foi uma das menos conflituosas, quando comparada à realidade de outros países. Percebe-se os primeiros esforços nesta empreitada a partir da Constituição Imperial de 1824, na qual se abriu espaço aos cultos não-católicos, especialmente protestantes, mas restritos ao ambiente doméstico. Somente com o início da República, quando houve a separação entre Igreja e Estado, garantiu-se a liberdade religiosa a todos os cultos. A promulgação republicana teve contribuição importante por parte dos republicanos junto aos positivistas e protestantes, além dos maçons influentes nestes grupos todos. Todavia não houve a retirada total de privilégios da igreja Católica, segundo Oro (2011). A pressão católica, por exemplo, conseguiu impedir na Assembleia Constituinte de 1890 a aprovação da lei da mão-morta, a qual privaria os bens materiais da Igreja. As instituições religiosas continuaram com seus trabalhos sendo subsidiados pelo Estado, e através dos religiosos ainda eram emitidos em certas partes do país documentos. Apesar da separação republicana “a Igreja ainda ocupava espaços consideráveis nas áreas da saúde, educação, lazer e cultura (Mariano 2001). Mais a frente, em 1930, o catolicismo dizia estar ao lado da nação, como garante Giumbelli (2006) e tal papel discursivo culminou na introdução do “princípio da colaboração recíproca” entre Estado e Religião na redação da Constituição de 1934, pressupondo-se a Igreja Católica. Esta espécie de reconciliação e boa relação entre Igreja e Estado se deve ao presidente Getúlio Vargas, ocupante do poder entre 1930 a 1945 durante o conhecido Estado Novo. Segundo Mariano (2001) foi em tal período histórico que a Igreja garantiu sua retomada como privilegiada junto ao Estado e que atingiu o status de religião “quase oficial”. O Estado Novo foi um período conturbado para outras religiões, como o Espiritismo e principalmente às religiõesafro-brasileiras, ocorrendo repressão policial e também invasões aos terreiros, pois afirmava-se que estes templos escondiam comunistas, dando assim justificativa para a invasão (Correa, 1998). Tal discriminação e perseguição marcou a época devido a políticas que se baseavam na ideologia do embranquecimento e da modernização, além também do discurso médico na época, fortalecido por movimentos como o sanitarismo. O Código Penal da época corroborava para justificar a perseguição religiosa, pois o artigo 156 previa o exercício ilegal da medicina, e o 157 condenava a prática do espiritismo e do charlatanismo, e por fim o 158 a prática do curandeirismo. Assim “intensificaram-se os processos criminais contra feiticeiros e aqueles 9 que fazem mal à saúde pública e à nacionalidade” (Maggie, 1992). Assim seguiu-se o curso da história do Brasil, “o Estado brasileiro continuou privilegiando a Igreja Católica em detrimento dos demais grupos religiosos, demograficamente ínfimos, formados por minorias protestantes, espíritas, indígenas e por praticantes dos rituais afro-brasileiros”. (Mariano e oro, 2011). Foi mais privilegiada que outras religiões ao receber auxílios e cooperações diversas, inclusive financeiras e de isenção de impostos (Oro, 2011). Atualmente temos um exemplo de tal favoritismo diante do acordo bilateral firmado entre Brasil e Vaticano em 2009, durante uma audiência na Santa Sé entre o Papa Bento XVI e o presidente Lula, que fora aprovado pela Câmara dos Deputados em 26 de agosto de 2009, e no Senado Federal em 8 de outubro de 2009. Houve diversas críticas da sociedade em geral acerca disso: ... 1) seu estabelecimento viola o artigo 19 da Constituição brasileira, que veda ao Estado manter relações de dependência ou aliança com cultos religiosos e igrejas e subvencioná-los; 2) confessionaliza a disciplina de ensino religioso facultativo, ministrada em escolas públicas de nível fundamental, contrariando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação; 3) implica a concessão de subvenção estatal à Igreja Católica e a privilegia em detrimento das demais agremiações religiosas (Mariano e Oro, 2011, no prelo). O acordo católico foi estendido pela “bancada evangélica” no Congresso Nacional através da conhecida “Lei Geral das Religiões”, ampliando a todos os grupos religiosos, tornando mais evidente ainda a relação juridicamente privilegiada do catolicismo no Brasil e também violando o dispositivo legal que veda as relações de dependência ou aliança do Estado com as Igrejas (Ranquetat Junior, 2010). Por fim, o cenário brasileiro aponta ao longo de toda a história republicana uma visão suspeita e preconceituosa das religiões afro-brasileiras, que corroboraram na construção de representações depreciativas sobre as etnias e as culturas africanas, consideradas primitivas e arcaicas. Tanto intelectuais, como a Igreja e o Estado cooperaram para moldar o imaginário social negativo do negro e das religiões, conforme aponta Ari Pedro Oro (2011). 10 6) A influência política do catolicismo nos países latino-americanos Neste contexto muitos países adotaram legalmente o catolicismo como religião oficial, tendo como resultado a ausência ou limitação da liberdade religiosa (Oro e Ureta, 2007). Trata-se de uma região intensamente cristã, em que 13 dos 20 países fazem referência a Deus no preâmbulo de suas constituições. Percebe-se a importância da Catolicismo na maioria dos países, numérica, política e socialmente. A forte presença cristã explica o porquê da reduzida diversidade religiosa. Oro e Ureta (2007) apontam algumas observações após análise de dados estatísticos de um duplo fenômeno religioso: o declínio variável de pessoas que se declaram católicos, junto ao crescimento das filiações religiosas à corrente evangélica, principalmente pentecostal, oscilando de país para país. Tais religiosos estão bastante envolvidos na política como Venezuela, Brasil, Peru, Guatemala, Argentina e Chile (Cleary; Steward-Gambino, 1997). Há o aumento de indivíduos que se consideram sem religião, não necessariamente descrentes de doutrinas e princípios religiosos. Há três distinções observáveis nos diversos países, sendo os regimes de Igreja de Estado, regimes de separação Igreja-Estado com dispositivos particulares em relação à Igreja Católica e, por fim, regimes de separação Igreja-Estado. O regime de Igrejas de Estado vigora na Argentina, Bolívia e Costa Rica. Segundo Mallimaci (1997) o monopólio católico argentino foi criado, consolidado e desenvolvido desde 1930 até 1980, não sendo mais a única privilegiada na relação. O mundo católico prossegue como majoritário, aferindo-se muitos conflitos, cada vez mais graves, entre os líderes católicos e os membros do governo que caminhavam para a reformulação dos dispositivos constitucionais. Na Bolívia, é evidente a opção nacional pelo catolicismo, mas sem interferir no livre exercício dos outros cultos religiosos, formado por uma minoria evangélica. Na Costa Rica há um dispositivo constitucional que declara a vinculação do Estado com a Igreja Católica, mas que faculta também a possibilidade de expressões de outras religiões, frente a algumas condições, como a propaganda política de clérigos. Os regimes de separação Igreja-Estado com dispositivos particulares encontram-se na Guatemala, El Salvador, Panamá, República Dominicana, Peru e Paraguai. Na Guatemala as concessões ao clero católico derivam principalmente do apoio dado aos militares nos golpes de Estado (Brett, 1993, Kauffer, 1999), reconhecem a personalidade jurídica da Igreja, 11 dessemelhante a outras que precisam solicitar e obter este reconhecimento. Há doação por parte do Estado de títulos de propriedade, sem custo algum, dos bens imóveis da Igreja Católica. O Panamá assegura a liberdade religiosa, mas reconhece a maioria católica entre seus cidadãos. Na República Dominicana o catolicismo se beneficia de privilégios exclusivos devidos a acordos estabelecidos com o governo, como reformas de instalações para culto e a exoneração de total de taxas alfandegárias para a importação de bens. O Peru reconhece a importância da Igreja Católica em sua formação histórica, cultural e moral, e por isso colabora com ela. O Paraguai assegura a liberdade religiosa a todos os cultos, mas com tratamento especial à Igreja Católica. Nos países de regime de separação Igreja-Estado, formados pela maioria dos países latino-americanos, sustenta legalmente a separação e assegura a liberdade e igualdade de culto aos cidadãos, além da educação laica. México e Honduras, por exemplo, proíbem o exercício de cargos públicos por parte de ministros religiosos. Nicarágua e Cuba defendem inexistência de uma religião de Estado, assegurando a liberdade de consciência, de pensamento e de religião. O Uruguai se destaca como o país que passou pelo processo mais radical de secularização/laicização da América Latina e do mundo ocidental devido a concepção de uma religião civil por parte do Estado e privatização de outras manifestações religiosas, conforme afirma Guigou (2006). Por fim, assim sintetiza Oro e Ureta (2007): reiteramos que a maioria dos países latino-americanos tende a se apresentar legalmente como Estados laicos, modernos e liberais, caracterizados pela separação entre Igreja e Estado, este último se mantendo neutro em relação às religiões e aquelas não interferindo nos assuntos públicos. Segundo esse paradigma, o Estado atribui um mesmo status jurídico a todos os grupos religiosos, dando um tratamento isonômico às organizações religiosas e assegurando a liberdade religiosa aos cidadãos.Mariano (2006) destaca que “nas mais diferentes experiências históricas, tal neutralidade inexiste”, pois o Estado tende a desempenhar um tratamento discriminativo, positiva ou negativamente, com as religiões, ou seja, um tratamento desigual. Além do mais, os dispositivos jurídicos de liberdade religiosa não asseguram o fim da discriminação religiosa, como também não ocorre em outras formas de liberdade reservadas aos cidadãos (Oro e Ureta, 2007). 12 7) Conclusão Infere-se que há ainda um grande desafio no Brasil com relação ao estabelecimento do Estado Laico, principalmente no tocante ao respeito às minorias religiosas, apesar da Constituição Federal garantir a liberdade religiosa e de culto a todos os cidadãos. O Brasil, como também muitas nações latino-americanas, em meio a tais dificuldades devido a questões culturais de países de exploração e que sofre da carência de qualidade nas questões básicas, especialmente Educação, Saúde e saneamento básico, apresentam de forma positiva um grande esforço para garantir os direitos de todos e estabelecer a laicidade do Estado, nos diferentes níveis apresentados neste desafio profissional. O país é ainda uma democracia jovem, fruto da luta popular na garantia de direitos e deveres básicos. Em meio a tanta diversidade religiosa, percebe-se paulatina mudança e êxito no combate da violência, todavia percebe-se o quanto políticas públicas são ainda necessárias para que possa garantir mais efetivamente a aplicação dos princípios básicos constitucionais. Há também uma linha tênue entre a laicidade do Estado, expressa na ausência de influência direta da religião católica nas decisões públicas, e os acordos firmados pelo governo com o Vaticano. Há de se revisitar tais pontos, levando em consideração que a liberdade de culto está diretamente ligada também à liberdade individual de consciência, na qual pontos de vista específicos de uma crença ou ideologia não podem ser impostas ao restante da sociedade, independentemente desta ser ainda majoritariamente católica/cristã, pois o Brasil é um Estado Democrático de Direito. 13 8) Referências Bibliográficas BARBIER, Maurice. 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