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OS DESDOBRAMENTOS DO CONSUMISMO NAS RELAÇÕES AFETIVAS Anaíli Dias Franco Rodrigues Cintia Fernandes de Andrade Tavares Cleiton Aparecido Brito Alves Solange Germano Ramos Resumo O presente artigo acadêmico tem por objetivo um objetivo fazer uma análise teórica sobre a sociedade de consumo e as ligações negativas com a afetividade., considerando-se especialmente as consequências que o consumo e a virtualidade, tão característicos dessa época, promovem na vida cotidiana das pessoas serão expostos analises relação entre o consumismo e o vazio existencial embasada nas ideias de autores como Pierre Lévy, e Zygmunt Bauman. Palavra Chave: Consumismo; afetividade; sociedade. 2 INTRODUÇÃO Este artigo é fruto de temáticas abordadas e discutidas durante o curso de Convivência no Século XXI – Diálogo sobre Solidão e Autonomia na Faculdade Paulus de Comunicação em São Paulo, e nos levou à busca por aprofundar o conhecimento sobre a relação entre consumismo e afetividade. Este artigo pretende apresentar a análise sobre uma sociedade de consumidores, da qual podemos observar claramente uma inversão de valores. Ou seja, na obstinada busca pela felicidade, o sentimento humano tem sido substituído pelo exacerbado consumo de mercadorias. O presente estudo caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfica, que faz um levantamento do conhecimento atual presente na literatura especializada acerca de vínculos afetivos e a sociedade de consumo, bem como as relações implícitas com advento da evolução tecnológica. A pesquisa de caráter bibliográfico onde buscamos realiza-las por meio da análise de fontes secundárias, reunindo informações que auxiliaram na construção da investigação proposta, através de resultados qualitativos. Cabe ressaltar que foi de grande valia a análise estatística para compreensão das mudanças quanto ao acesso e uso de dispositivos móveis nos núcleos familiares. A medida em que a tecnologia avança, podemos observar grandes alterações na sociedade de consumo. Na era da informatização e com a expansão das relações sociais virtuais somados com a influência da mídia, a vida e o contato humano têm sido substituídos facilmente por coisas materiais. Nesse sentido, buscamos através da pesquisa bibliográfica apontar a natureza teórica e os pressupostos do conhecimento a respeito do objeto de análise com a realidade do contexto investigado. Para isso articulamos bibliografias como o livro “Vida para Consumo” de Zygmunt Bauman, “Cibercultura” de Pierre Lévy, além das teorias e conceitos, como de Henri Wallon. É notório que os autores analisam o funcionamento das relações sociais mediadas pela grande inserção da internet na vida das pessoas e a facilidade que ela possibilita para obter informações e serviços (sites de compra de mercadorias, agências de encontro, jornais pela internet), bem como o grande número de redes sociais existentes às quais prendem o indivíduo. Bauman é enfático ao abordar negativamente as novas formas de socialização “on line”. Ao substituírem os relacionamentos sociais reais pelas formas virtuais, as pessoas perdem a habilidade 3 e capacidade de socialização. Enfim, ao decorrer deste artigo buscaremos entender as associações entre consumismo, tecnologia e afetividade, associar os conceitos de consumo e afetividade na sociedade contemporânea; analisar a inserção das novas tecnologias e os vínculos no núcleo familiar; avaliar de que forma se dá a relação entre tecnologia e afetividade. AFETIVIDADE E CONSUMO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA O termo afetividade deriva da palavra afetivo e afeto. Está, grosso modo, relacionado aos sentimentos de carinho, ternura, aos vínculos. Diz respeito a todos os fenômenos afetivos. Na psicologia a afetividade é justamente a capacidade individual do sujeito em experimentar o conjunto de fenômenos afetivos. Piaget reconhece a afetividade como agente motivador da atividade cognitiva, se relacionando complementarmente com a razão. Seria (afetividade) “a energia, o que move a ação, enquanto a razão seria o que possibilitaria ao sujeito identificar desejos, sentimentos variados, e obter êxito nas ações” (LA TAILLE, 1992, p. 55). Esta afetividade possibilita a criação de laços durante o desenvolvimento humano. Segundo Wallon (1879-1962), neste desenvolvimento há três vertentes essenciais: motora, afetiva e a cognitiva. Isso leva ao entendimento de que as dimensões biológicas e sociais são complementares e indissociáveis. É assim, construído pela vivência, pela interação das partes envolvidas. São pelas influências recíprocas entre as pessoas através de diferentes aspectos interacionais afetivos que os seres humanos se relacionam (LA TAILLE, 1992). O consumo em seu sentido literal está associado a ideia de possuir e usufruir, fazer desaparecer pelo uso ou gasto, sendo o efeito de consumir. Na estrutura atual da sociedade o ato do consumo é inerente ao sujeito desse núcleo. Vive-se o momento em que ela passa a ser conhecida como a Sociedade de Consumo, retratando um estilo de vida consumista, o qual é associado a era contemporânea do capitalismo, sendo o crescimento e a geração de lucro intrinsicamente relacionado a atividade comercial, na qual todo o fruto do trabalho humano é investido na satisfação de consumir. No consumismo, a necessidade do bem a se consumir não é obrigatória. Pelo contrário, é justamente isso que o diferencia entre consumo, que acontece pela 4 necessidade, uma vez que o consumismo é o ensejo desenfreado pelo possuir, pelo ter, a despeito da ausência de utilidade essencial do bem ou serviço. Zygmunt Bauman em seu livro “Vida para Consumo”, afirma que as pessoas são convertidas em produto, citando que “na sociedade de consumidores, ninguém pode se tornar sujeito sem primeiro virar mercadoria [...]” (2008, p. 20). Disso discorre inúmeras reflexões, entre elas sobre as transformações impostas pelo mercado quanto as próprias pessoas. Há uma sociedade na qual seu valor mais importante é a busca pela vida feliz, no entanto se busca tal felicidade através do consumo. Sendo esse consumismo uma ação que não promove tal estado, o desejo segue pela insatisfação. Acaba sendo um modelo apressado e artificial que se apresenta na forma da sociedade de consumidores. Muitas vezes esse contexto acarreta a sensação de inadequação, de não pertencimento, levando a crise de identidade do ser que, de tantas facetas, perdeu-se em si mesmo e luta para encontrar-se. Na obra “Vida para Consumo” o homem contemporâneo não vive imerso em certezas, mas sim no seu extremo oposto. A busca do indivíduo é por si em si mesmo, e essa busca impulsiona o consumo seja do outro, das religiões, do trabalho excessivo, nas relações líquidas, de toda uma forma de consumo exacerbado. É o ser humano a estrutura flexível e programável para o consumo dentro desta sociedade. Essa forma de organização acarreta em mudanças nas interações sociais e nos vínculos afetivos. A percepção é que isso os torna mais fracos. O conceito criado a partir dessa mudança de relações, o de modernidade líquida, sugere que não são fundamentados de forma duradoura, é tudo mais líquido, passageiro. A afetividade sofre então a influência do modelo de vida consumista, uma vez que este implica na criação de uma sociedade que vivencia a época líquido-moderna. As existências individuais estão repartidas e mal ajustadas, assim como seus vínculos acabam sendo fragilmente conectados. A maneira como as relações afetivas e o consumo vem se desenvolvendo na sociedade contemporâneanão são os mesmos que se observavam algumas décadas atrás. As relações de compra se alteraram, bem como a dinâmica dos relacionamentos e as relações afetivas no geral. A ausência temporal no núcleo familiar passa a ser suprida, e em muitos casos, alimentadas pelo consumo. Considerando que nos dias atuais, os membros familiares passam a maior parte do tempo fora de casa, seja no trabalho, na escola, ou na faculdade, os vínculos afetivos 5 acabam por se tornar escassos. Sendo assim, grande parte da sociedade tem encontrado no consumo a satisfação da alma, e ao mesmo tempo o anseio por mais, uma vez que a satisfação encontrada no consumo é um sentimento relâmpago que ao mesmo tempo que satisfaz a alma, também instiga, tornando o consumista carente dependente por consumir mais. Assim, tanto os hábitos de consumo como os vínculos interpessoais se modificaram, passando a incluir novos elementos, tal qual a maior interatividade. Esta, por sua vez, pode ser explicada a seguir, com advento das novas tecnologias. Os vínculos formam arranjos sociais e também arranjos afetivos. A própria cultura é edificada sob uma base afetiva. É por meio deles que os indivíduos expressam a cultura e a sociedade de sua subjetividade, pois toda ação humana é ação da cultura internalizada dentro de cada um. Nesse atual momento onde a tecnologia digital está radicada, nota-se como as diversas mudanças despontam das relações afetivas com a cibercultura. A sociedade encontra-se dependente dos aparatos tecnológicos e agrega a marca da cultura digital em seu desenvolvimento (SOUZA, 2015). Pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no último censo realizado em 2010 junto a pesquisas do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.Br) em 2014, apontam para dados que deixam explícito como esta cibercultura está presente no dia-a-dia. Segundo os resultados, um conjunto de 34,1 milhões de pessoas entre 10 e 19 anos de idade no país acessam a internet todos os dias, o que representa cerca de 81%, evidenciando como a internet está inserida nos lares brasileiros. De acordo com Levy “as tecnologias são produtos de uma sociedade e de uma cultura” (1999, p. 22) e as relações não acontecem simplesmente entre elas, mas com atores humanos que são os responsáveis pela invenção, produção e interpretação de diferentes técnicas. Transformados pelas mudanças na cultura e envolvidos no contexto da internet as relações afetivas e os hábitos de consumo se misturam gerando novas características, adaptando as relações ao mundo da Cibercultura (SOUZA, 2015). Nas relações de consumo contemporâneas, o desejo é o próprio afeto. A cultura, segundo Freud é o processo de dominação da natureza pelo homem e a busca humana por seu aperfeiçoamento, o que possibilita a vida em sociedade e amparo material para condição da existência dos homens. 6 CONCLUSÃO Dentre as transformações, a interatividade tem sido umas das principais. A internet promove essa interatividade. E as relações afetivas estão se adaptando as mudanças na sociedade. Das adaptações de afetividade que se estabelecem, há o vínculo de dependência do indivíduo para com o aparato tecnológico e o conteúdo nele armazenado, como o caso de aparelhos celulares. Nesse sentido, possuir e usar, por exemplo um smartphone, torna-se uma maneira de ser parte da sociedade contemporânea. As novas tecnologias, através de sua linguagem própria, reorganizam a sociedade e alteram as suas práticas. Os smartphones adquirirem na vida cotidiana certa importância que aponta para sua consolidação como uma forma importante de inclusão simbólica dos atores sociais (KOHN; MORAES, 2007). Décadas atrás não se imaginava que tablets e celulares seriam usados por crianças e adolescentes da forma que são atualmente. Há uma inegável função recreativa e educativa que se encontra através destas novas tecnologias, no entanto estudos indicam que seu uso deve ser estabelecido conforme regras e limites esclarecidos pelos responsáveis. Ansiedade e agressividade são também geradas pela ausência de arranjos que estabeleçam limites aos filhos. Já se sabe que o uso exagerado desses aparelhos leva a comprometimento escolar, distúrbios de sono, desestrutura das relações interpessoais e debilita a saúde física e psicológica da criança ao longo de seu desenvolvimento (PAIVA; COSTA, 2015). Há também este mesmo efeito com relação ao uso exagerado por parte dos pais. Algumas pesquisas apontam para os celulares como vilões na afetividade e atenção no núcleo familiar. Uma pesquisa realizada com 1.521 crianças de 6 a 12 anos pela Highlights, uma revista infantil norte-americana, mostrou que 62% das crianças reclamam que os pais estão distraídos demais para estarem com eles, sendo em 515 dos casos os smartphones os principais responsáveis por isso, junto aos aparelhos de TV’s, computadores e tablets a causa desse distanciamento entre filhos e pais. 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAUMAN, Z. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008. FREUD, S. El malestar en la cultura. In J. Ruiz-Castillo (Ed.), Obras completas de Sigmund Freud (4a ed., Vol. 3, pp. 3018-3067). Madrid, España: Biblioteca Nueva. 1981. (Originalmente publicado em 1930). IBGE. Censo de 2010. Disponível em: https://ww2.ibge.gov.br/home/ KOHN, K.; MORAES, C. H. de. O impacto das novas tecnologias na sociedade: conceitos e características da Sociedade da Informação e da Sociedade Digital. XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Santos, SP, ago./set. 2007. LA TAILLE, Y. Desenvolvimento do juízo moral e a afetividade na teoria de Jean Piaget. In: LA TAILLE, Y. (Org.) Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992. p. 47-73. LEVY, P. Cibercultura. Tradução Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 1999. PAIVA, N. M. N. COSTA, J. S. A influência da tecnologia na infância: desenvolvimento ou ameaça? O portal dos Psic. INSS 1646-6977. 2015. SOUZA, R. S. Influências das relações afetivas para os atos de consumo na cibercultura. 2015. 111 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2015.