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TRABALHO ESCRITO - VERSÃO FINAL

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO OESTE DO PARÁ – UFOPA
INSTITUTO DE ENGENHARIA E GEOCIÊNCIAS – IEG
PROGRAMA CIÊNCIAS DA TERRA – PCDT
BACHARELADO PROFISSIONAL EM GEOLOGIA
A GEOQUÍMICA DAS TERRAS PRETAS AMAZÔNICAS 
Santarém – Pará
2019
ANELISE ROBERTA PRATA DE OLIVEIRA, CLAUDIONOR DE BARROS DA MOTA, GILVANDRO VITOR LOPES SOUSA, MATHEUS CAVALCANTE SILVA E STELLA KAROLAYNE DAMASIO RIBEIRO
A GEOQUÍMICA DAS TERRAS PRETAS AMAZÔNICAS 
Este trabalho apresenta-se como requisito parcial para a conclusão da disciplina Pedologia (GEOL201640), ministrada pela Prof. Dr. Christiane do Nascimento Monte, ofertada à turma T01, no semestre 2019.1.
Santarém – Pará
2019
1. INTRODUÇÃO
	Este estudo apresenta reflexões acerca da geoquímica das terras pretas da Amazônia. O objetivo do trabalho pauta-se na elucidação dos diversos fatores que fomentam tal discussão no meio acadêmico. O estudo foi desenvolvido como atividade prática de ensino referente à disciplina Pedologia, ofertada pelo Bacharelado Profissional em Geologia, vinculado ao Instituto de Engenharia e Geociências da Universidade Federal do Oeste do Pará (IEG/UFOPA).
À princípio, deve-se conceber que a origem das terras mulatas está relacionada com a ocupação territorial e, essencialmente, com o manejo dos solos. Sabe-se que desde a transição do Pleistoceno tardio ao Holoceno antigo o homem passou a ocupar distintos ambientes amazônicos (ROOSEVELT, 2002 apud MADARI, el al, 2009). Certamente transformações expressivas foram realizadas nestes habitats, de modo que até mesmo as paisagens tidas previamente como “naturais” podem ser decorrentes dessa ação antrópica (NEVES et al., 2004). 
Em segundo plano, enfatiza-se que muitas localidades foram manejadas como depósitos de resíduos que iniciaram a alteração na composição do solo (LEHMANN et al., 2003). No decorrer de anos, originaram-se manchas no solo de cor negra, as quais foram estudadas e, posteriormente, denominadas por Terra Preta Antropológica (TPA), Terra Preta de Índio (TPI), ou mesmo Arqueo-Antrossolo, cujas características apontam para a presença notória de matéria orgânica, fragmentos de artefatos cerâmicos e material lítico (KERN & KÄMPF, 1989; KÄMPF et al., 2003; KÄMPF & KERN, 2005).
De fato, ocorrem dessemelhantes concepções acerca da origem das Terras Pretas de Índio. Hartt (1985) denominou-as de solos vegetais de elevada fertilidade natural, os quais forneciam subsídios para a fixação indígena. Para Cunha Franco (1962) tratavam-se de solos de origem antiga, gerados em ambientes lacustres, cujas margens eram habitadas por civilizações indígenas. Estudos mais recentes e mais aceitos atualmente pelo meio científico, amparados em pesquisas de Gourou (1950) a Kern & Kampf (1989), aclaram que os Arqueo-Antrossolos são antigos assentamentos indígenas, resultantes da ocupação pré-histórica na Amazônia. 
As relações geoquímicas tornam-se indispensáveis para a classificação taxonômica das Terras Pretas (TPs). Os elementos Ca, Mg, P, Zn, Cu, Mn e C orgânico (carvão), que, em relação aos solos convizinhos, tornam-se determinantes nessa etapa. De modo geral, ocorrem ainda a saturação de bases elevadas, diversidade microbiológica e dispõem-se de modo estruturado e sobrepostos a várias classes de solos, especialmente os Latossolos. Para tanto, os procedimentos geoarqueológicos possibilitam a interpretação dos processos originários do solo abordado (MADARI, et al., 2009). 
2. RESULTADOS E DISCUSSÃO 
	Este capítulo abordará discussões acerca da Geoquímica das Terras Pretas de Índio (TPI) na Amazônia. Para tal, serão enfatizadas as Técnicas e procedimentos analíticos em sítios arqueológicos, os Aspectos físicos e morfológicos e a Pedogeoquímica das TPs amazônicas. 
2.1 Técnicas analíticas em sítios arqueológicos
	Decerto, muitos procedimentos oriundos das Geociências podem ser aplicados em sítios arqueológicos, sendo denominadas de Geoarqueologia. Nesse âmbito as informações geológicas tornam-se indispensáveis para o entendimento da formação das TPs, para a verificação dos componentes inorgânicos do solo e para a determinação da área fonte de materiais geológicos usados na produção cerâmica (COSTA, et al, 2004). Portanto, mencionam-se as seguintes técnicas: 
	O microscópio óptico identifica a fonte mineral ou orgânica presente na Terra Preta e utiliza-se em materiais cerâmicos e líticos. Durante a aplicação desse método podem ser contemplados alguns aspectos do solo, tais como a microestrutura, a cor, tamanho do grão, morfologia cristalina, minerais e tecidos orgânicos (MADARI, et al., 2009). 
	Aplica-se também a difratometria de raio-x e a micro difratometria, as quais possibilita a identificação de minerais cristalinos ou localizados em frações muito pequenas, visto que geralmente consistem no intercrescimento de argila e matéria orgânica (MADARI, et al., 2009).
	Ainda sob essa discussão, mencionam-se análises térmicas – tidas como técnica complementar, todavia útil para a caracterização de argilominerais – realizadas de acordo com a queima (SMYKATZ-KLOSS, 1974 apud MADARI, et al, 2009); a Espectrometria de infravermelho faz utilização da difração de raio-x para determinar substâncias amorfas e de baixa cristalinidade (MADARI, et al., 2009).
	Emprega-se também o Microscópio de Varredura Eletrônica (MEV), útil na caracterização de materiais inorgânicos fino-granulados como materiais orgânicos presentes em abundância em solos de TPs e, por vezes, trata-se do único método capaz de capturar imagens precisas da fração fina, além de que, combinado a outros métodos pode fornecer informações detalhadas (MADARI, et al., 2009).
	Outra técnica operada é a Análise química, eficiente na determinação de elementos-traço e elementos maiores e garantem maior detalhamento do conhecimento químico desses solos por meio de técnicas, a exemplo da fluorescência de raio-x. Por fim, as análises de fase ou Microanálises enfocam na micro-difração de raios-x para caracterização química de fases minerais (MADARI, et al., 2009).
2.2 Aspectos Físicos e Morfológicos das Terras Pretas
As Terras Pretas de Índio (TPI) são encontradas na Amazônia e são classificadas como horizonte A antrópico. Eles não possuem uma classificação especifica no Sistema Brasileiro de Classificação de Solo, sendo encontradas frequentemente soterrados pela deposição de sedimentos das cheias dos rios e tais receberam a denominação de Gleissolos (Teixeira et al., 2006, apud MADARI, et al., 2009). Podem ser identificadas e diferenciadas dos solos adjacentes por propriedades particulares que são observadas em campo como por exemplo cor, espessura de camada escura, fragmentos de cerâmica, materiais líticos e fragmentos de carvão e textura. Esses solos apresentam cor escura, restos de material arqueológico (fragmentos cerâmicos e de artefatos líticos) e altos teores de carbono orgânico, fósforo, cálcio, magnésio, zinco e manganês contrastando com os solos naturais.  Eles apresentam alta fertilidade química apresentando elevado teor de C orgânico, Mg, P e microoelementos (Kern & Kämpf, 1989, apud MADARI, et al., 2009). 
A coloração das terras pretas em geral é preta a bruno acinzentada muito escura, isso ocorre pela grande quantidade de matéria orgânica presente nesse solos, principalmente pela elevada razão de carbono total, outra característica notável desse tipo de solo é a quantidade de artefatos de cerâmica arqueológicos, condicionando características físicas e hídricas nos respectivos locais de ocorrências. Num estudo realizado para verificar o efeito da concentração de fragmentos cerâmicos na disponibilidade de água foi verificado que em solos cujas partículas predominantes na matriz são da fração areia (mais arenosos), uma elevada concentração de fragmentos cerâmicos pode aumentar a retenção de água em potenciais elevados (menores que 3,0). Os poros existentes nas cerâmicas podem ser preenchidos de águanos períodos de chuva e com o secamento do solo esta água por diferença de potencial vai para a matriz do solo. Em relação ao carvão, este material é na maioria encontrado em solos tropicais, e são resultados de queimas naturais ou da ação do homem, estes fragmentos quando encontrados de tamanho pequeno acabam influenciando na absorção de compostos orgânicos solúveis, retêm água e serve como abrigo de microrganismos. 
2.3 Pedogeoquímica das Terras Pretas de Índio na Amazônia
As Terras Pretas de índio se caracterizam por possuírem teores elevados de Ca, Mg, P, Zn, Mn, Cu e C orgânico, bem como valores mais altos de pH. Este fato é atribuído à grande quantidade de resíduos orgânicos depositados durante o processo de formação dos solos antropogênicos. Segundo Falesi (1970), Smith (1980), Eden et al. (1984) e Kern (1989), essa característica é atribuída à alta fertilidade as TPI. Elas contém elevado teor de carbono pirogênico ou carvão, em comparação à média dos solos não antrópicos, porém a quantidade de carbono orgânico é diferente entre as Terras Pretas Indígenas. Na TPI da Ilha de Terra, Caxiuanã -PA, por exemplo, a variação nos níveis dos micronutrientes Cu, Mn e Zn, foram elevadas na ordem de 0,09 a 12,61; 4,99 a 415,02; e 0,70 a 48,05 mg kg-1 respectivamente (COSTA, 2003). 
Na maioria das TPI os teores de Ca são mais elevados que Mg, K e Na, pela sua maior disponibilidade advinda dos materiais introduzidos nas áreas de descarte e por sua maior afinidade com as superfícies de troca do solo. Diversos trabalhos de caracterização química das TPI tem mostrado que o K apresenta valores inferiores em relação aos níveis de P. Desta forma, Vieira (1988) encontrou um teor médio de K trocável, na profundidade de 0-63 cm, 0,046 mg kg-1. Dentre os elementos diagnósticos das TPI, o P total e o disponível se destacam como mais importantes. Deste modo, um valor elevado de P total (P2O5) na ordem de 7.455 mg kg-1 no horizonte A, foi observado em Itaituba-PA (OLIVEIRA Jr et al., 2002). Uma contribuição dada por Smith (1980), em estudos realizados nas TPI de Itapiranga e Paraná de Silves revelou um conteúdo de P disponível em torno de 610 a 670 mg kg-1.
Os Sítios Manduquinha e Ilha de Terra, ambos em Caxiuanã, são exemplos de estudos químicos sistemáticos em sítios que apresentam solo de Terra Preta. Uma análise do solo de TP evidenciou anomalias de Zn, Mn e Cu, as quais podem estar relacionadas com a matéria orgânica vegetal utilizada nas coberturas e paredes das casas.
Imagem 1 - Distribuição areal de MgO, CaOe P2O2 no Sítio Arqueológico Manduquinha, Caxiunã-PA (Kern, 1996)
Fonte: Kern, 1986. 
Locais com baixos teores de elementos que indicam as TPs também foram apontados nesse estudo, podendo ser uma praça de circulação, acesso para a mata e para as principais fontes de água para abastecimento de grupos que ali habitavam, deixado limpo intencionalmente (Kern, 1996; Meireles, 2004). 
Amostras de solo que foram coletadas nesta região, identificaram que modificações sofridas pelo solo, por conta de atividade antropogênica e a constante ação pedogenética, não se limitam a uma camada superficial, mas podem atingir grandes profundidades.
Imagem 2 - Distribuição vertical dos teores de Ca, P, Mn e Zn em Terra Preta e Adjacências, Caxiuanã-PA.
Fonte: Kern, 1996 (adaptado por Oliveira, 2000).
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
	Em síntese, o processo de pedogênese das Terras Pretas Amazônicas está intrinsecamente interligado à manutenção do solo exercida pelas populações paleoindígenas. Essa relação solo-homem, marcada por depósitos residuais, possibilitou o enriquecimento de cálcio, magnésio, zinco, manganês, fósforo e carbono no solo, os quais alteraram a físico-química e ocasionaram a perda da coesão e da plasticidade. 
	Certamente, a geoquímica faz-se mister para aplicações Geoarqueológicas, que visam o entendimento da formação desse solo, da área-fonte dos materiais e da composição química. Em suma, esse trabalho desperta reflexões abrangentes que fomentam o intenso debate pela comunidade científica. 
4. REFERÊNCIAS 
COSTA, F. S., et al. Calagem e as propriedades eletroquímicas e físicas de um latossolo em plantio direto. Ciência Rural [S.I.], v.34, n. 1, 2004, p. 281-284.
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DEZORDI, C. Seminário de pós -graduação na Embrapa Amazônia ocidental; intergrando esforços para o desenvolvimento da Amazônia. Manaus, Amazonas; Embrapa, 2008.
EDEN, M. J.; BRAY, W.; HERRERA, L. MC EVAN, C. Terra Preta soils and their archaeological context in the Caquetá basin of south-east Colombia. American Antiquity, v. 49, n. 1, p. 125-140, 1984.
FALESI, I. Solos de Monte Alegre. Belém: IPEAN, 1970.
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MEIRELES, A. R. O. Determinação de P, Ca, Mg, Cu, Mn e Zn em terra preta arqueológica no sítio Ilha de Terra em Caxiuanã. (2004). Dissertação de Mestrado - Deeaprtamento de Química, Universidade Federal do Pará, Belém, PA, 2004.
 
VIEIRA, L. S. Manual da ciência do solo - Com ênfase aos solos tropicais
. 2. ed. São Paulo: Editora Agronômica Ceres, 1988.
NEVES, E. G. et al. The timing of terra preta formation in the Central Amazon: Archaeological data from three sites. In: GLASER, B.; WOODS, W. I. (Ed.). Amazonian Dark Earths: explorations in space and time. Berlim: Springer, 2004. p. 125-134.
SANTOS, H. G. dos et al. Sistema brasileiro de classificação de solos. 2. ed. Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2006. 306 p.
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OLIVEIRA JÚNIOR, R. C; CORREA, J. R. V.;RODRIGUES, T. E. Caracterização dos solos da Folha Itapacurá-Mirim, município de Trairão, Estado do Pará
. Belém: Embrapa Amazônia Oriental, 2002