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Inadimissibilidade de corte no fornecimento de saneamento básico à luz do princípio da dignidade da pessoa humana - TCC

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Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE 
ESTADUAL DE LONDRINA 
 
 
JOÃO LUCAS BUENO DALE VEDOVE 
 
 
 
 
 
 
DA INADMISSIBILIDADE DO CORTE NO FORNECIMENTO DE 
ÁGUA POTÁVEL, FRENTE AO INADIMPLEMENTO DO USUÁRIO, À 
LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA 
PESSOA HUMANA E O DIREITO À VIDA. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Londrina 
2005 
 
 
 
JOÃO LUCAS BUENO DALE VEDOVE 
 
 
 
 
 
 
 
 
DA INADMISSIBILIDADE DO CORTE NO FORNECIMENTO DE 
ÁGUA POTÁVEL, FRENTE AO INADIMPLEMENTO DO USUÁRIO, À 
LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA 
PESSOA HUMANA E O DIREITO À VIDA. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Londrina 
2005 
 
 
JOÃO LUCAS BUENO DALE VEDOVE 
 
 
 
 
 
DA INADMISSIBILIDADE DO CORTE NO FORNECIMENTO DE 
ÁGUA POTÁVEL, FRENTE AO INADIMPLEMENTO DO USUÁRIO, À 
LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA 
PESSOA HUMANA E O DIREITO À VIDA. 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Curso de 
graduação em Direito, da Universidade 
Estadual de Londrina, como requisito à 
conclusão do curso e obtenção do título 
de Bacharel. 
 
Orientador: Prof. João Luiz Martins 
Esteves 
 
 
 
Londrina 
2005 
 
 
JOÃO LUCAS BUENO DALE VEDOVE 
 
 
 
 
DA INADMISSIBILIDADE DO CORTE NO FORNECIMENTO DE 
ÁGUA POTÁVEL, FRENTE AO INADIMPLEMENTO DO USUÁRIO, À 
LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA 
PESSOA HUMANA E O DIREITO À VIDA. 
 
 
Dissertação apresentada ao Curso de 
Graduação em Direito, da Universidade 
Estadual de Londrina, como requisito à 
conclusão do curso e obtenção do título 
de Bacharel. 
 
 
COMISSÃO EXAMINADORA 
 
 
_____________________________________ 
Prof. João Luiz Esteves. 
Universidade Estadual de Londrina 
 
______________________________________ 
Prof. Vilma Aparecida do Amaral 
 
 
______________________________________ 
Prof. Marcos Veltrini Ticianelli 
 
 
 
Londrina, 10 de junho de 2005 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 DEDICATÓRIA 
 
À mãe natureza, à minha família, à 
Santos Dumond e aos meus bons 
amigos que sempre presentes ajudaram 
na realização e conclusão deste 
trabalho. 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
Ao Cosmo, que iluminou cada instante de realização deste trabalho, sendo alicerce 
para os momentos mais difíceis. 
Aos seres humanos, que possibilitam a todo o momento a criação de algo inovador e 
modificador para a construção de uma cultura. 
Ao Cmte. Hastar Xehá, que com sua influência telepática forneceu-me energia o 
suficiente para a realização deste. 
Ao Professor Orientador que, com idéias e conselhos, esteve presente em todas as 
fases. 
À minha família, pelo carinho, dedicação e compreensão em todos os momentos. 
À minha futura esposa Luciane Colonheze Coelho, que com sua paciência e carinho 
soube contornar os momentos difíceis até a construção final desta obra. 
Aos meus grandes amigos, que se mostraram fortes e unidos, auxiliando-se uns aos 
outros nesta difícil etapa de nossas vidas. 
A todos que, de qualquer forma, ajudaram para a concretização de mais uma etapa 
da vida acadêmica. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
VEDOVE, João Lucas Bueno Dale. Da Inadmissibilidade do Corte no 
Fornecimento de Água Potável, frente ao Inadimplemento do Usuário, à Luz do 
Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana e o Direito à Vida. 
2005. Monografia – Universidade Estadual de Londrina. 
 
 
RESUMO 
Trata de um conflito entre ser ou não admissível a realização do corte no 
fornecimento de água potável, frente ao inadimplemento do usuário. Apresenta 
premissas, conceito, natureza jurídica, fato gerador e analisa os permissivos, o 
aspecto econômico que norteia a matéria, demonstrando a maneira de como se 
efetua a cobrança pela utilização dos recursos hídricos, bem como, da água potável. 
Pondera, o acesso a água potável, frente ao princípio Constitucional da dignidade da 
pessoa humana e o direito à vida, como condição de existência. Demonstra a 
continuidade do serviço público essencial à luz do Código de Defesa do 
Consumidor. Apresenta a análise de dois casos práticos com posicionamentos 
antagônicos, em que há o referido conflito principiológico, no qual se verificará se a 
decisão judicial proferida foi correta, ou seja, se ela utilizou-se de todos os métodos 
doutrinários aqui apresentados. 
 
 
Palavras-chave: cobrança; inadimplemento; conflito; princípios constitucionais; 
serviço público; essencialidade; ponderação de interesses; princípio da dignidade da 
pessoa humana; direito à vida; Judiciário. 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 01 
 
1. O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À VIDA .. 03 
1.1 Condições do exercício do direito à vida: a Água .............................................. 03 
 
2. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A ÁGUA DOCE NO BRASIL ................... 22 
 
3. VALOR ECONÔMICO DA ÁGUA. ....................................................................... 33 
 
4. PREMISSAS DO ESTUDO DA COBRANÇA PELA UTILIZAÇÃO DOS 
RECURSOS HÍDRICOS ......................................................................................... 33 
4.1 Fundamentos da cobrança pela utilização da água ......................................... 33 
4.2 Conceito e objetivos da cobrança ..................................................................... 36 
4.3 Fato gerador e critérios da cobrança ................................................................. 39 
4.4 Natureza jurídica do produto da cobrança......................................................... 42 
 
5. A CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL................................. 42 
 
6. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ........................................................................... 42 
 
CONCLUSÃO .......................................................................................................... 44 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 46 
ANEXOS ................................................................................................................. 48 
 
ANEXO I .................................................................................................................. 49 
ANEXO II ................................................................................................................. 49 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Introdução 
 
A água, além de ser um elemento fundamental para a sobrevivência 
humana, proporciona dignidade à vida dos indivíduos, pois atende às necessidades 
básicas como a higiene e saneamento. Entretanto, ainda hoje, em pleno século XXI, 
água limpa é um direito que está fora do alcance de muitos. 
Em todo o globo, mais de um bilhão de pessoas não têm acesso à 
água tratada, e quase 2,5 bilhões vivem sem saneamento básico.1 
De acordo com as estimativas da Organização das Nações Unidas 
(ONU), a falta de abastecimento de água potável é responsável por 80% das 
doenças e das mortes no chamado mundo em desenvolvimento. 
Outro problema que agrava ainda mais essa situação é a crise da 
água doce, que preocupa autoridades domundo todo. Vários fatores mostram que, 
em um futuro muito próximo, a escassez de água para consumo será uma realidade. 
Dentre esses fatores podemos citar o aumento desenfreado da 
demanda devido a expansão industrial e agrícola, o crescimento populacional, a 
degradação dos mananciais e a alteração do ciclo hidrológico devido à urbanização 
e ao desmatamento. 
Por ser indispensável para a manutenção da vida, a água é um 
direito de todos, que deve ser mantida como um bem público. Dessa forma, ela não 
pode ser submetida a uma lógica de mercado, na qual empresas lucram às custas 
de um recurso natural. 
O acesso à água é condição de sobrevivência do homem. 
 
 
1
 Fonte: Planeta Água. Sanepar. Ano VI, n.°: 71, março de 2005. 
 
À medida que houve mudanças na organização social do ser 
humano, tornou-se necessário o estabelecimento de determinadas regras para o uso 
desse recurso. Essas regras foram incorporadas nas legislações dos vários povos, 
ao longo do tempo. 
As profundas alterações havidas na sociedade, na economia e no 
meio ambiente, no século XX, ensejaram a ocorrência de modificações nos direitos 
das águas, em vários países. 
No Brasil, o tema teve um forte impulso com a edição do Código das 
Águas de 1934, mas, com exceção da energia elétrica, permaneceu praticamente 
inerte em face da evolução e do surgimento dos problemas de poluição e escassez, 
até a década de 90. 
A base do trabalho consiste na análise jurisprudencial e da 
legislação brasileira sobre recursos hídricos, mais especificamente, confrontá-la com 
o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, bem como com o direito 
à vida, analisando a inadmissibilidade do corte no fornecimento de água potável. 
O objeto deste trabalho são as águas doces, ou seja, as águas 
interiores brasileiras, no que tange ao abastecimento de água potável, sua cobrança, 
a essencialidade deste serviço público e a impossibilidade de se realizar o corte no 
fornecimento de água potável, frente ao seu inadimplemento. 
O presente ensaio visa elaborar reflexões acerca do princípio 
constitucional da dignidade da pessoa humana e o direito à vida, em face da 
utilização dos recursos hídricos; conceito, natureza jurídica e valor econômico da 
água potável, bem como analisar a jurisprudência existente. 
Reflexões estas que devem ser encaradas sob um novo enfoque 
constitucional e social, visando, assim, uma sociedade justa, livre, fraterna e 
 
democrática, já que a palavra de ordem deste novo milênio é a cidadania e 
desenvolvimento sustentável. 
Assim sendo, o princípio constitucional da dignidade da pessoa 
humana encontra-se presente em tudo que guarde relação com a essência do ser 
humano, estando, assim, vinculada de forma indissociável com os direitos 
fundamentais, postulado no qual se assenta o direito constitucional contemporâneo, 
apesar desse liame praticamente se limitar ao reconhecimento da sua existência e 
da sua importância. 
Portanto, embora a previsão no texto constitucional seja 
imprescindível, por si só não tem o condão de assegurar o devido respeito e 
proteção à dignidade; restando, assim, uma perspectiva de efetivação dessa 
segurança por meio dos órgãos jurisdicionais. 
Entretanto, aqueles, hoje, sofrem ameaças no que diz com o 
exercício efetivo e independente da sua missão de proteger e realizar 
concretamente a dignidade da pessoa e os direitos fundamentais. 
Em relação ao conteúdo e significado da dignidade da pessoa 
humana na e para a ordem jurídica, tanto em nível doutrinário quanto no 
jurisprudencial, há grande divergência. 
Percebe-se, todavia, que a dignidade vem sendo considerada, pela 
grande maioria, uma qualidade intrínseca e indissociável de todo e qualquer ser 
humano, e o respeito e a proteção da dignidade da pessoa – de cada uma e de 
todas as pessoas – constituem-se em meta permanente da humanidade, do Estado 
e do Direito. 
 
 
 
1. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Direito à Vida. 
 
A Constituição, na óptica de um anseio da vida Comunitária, 
estabelece os principais valores da organização da vida em sociedade; “fixa as 
normas de organização, investidura e exercício de poder; determina as formas e 
meios de defesa dos direitos e interesses tuteláveis dos cidadãos”.2 
Esses valores, traduzidos em forma de princípios e regras 
constitucionais, revelam os valores éticos, políticos e jurídicos de um Povo. 
Conforme entendimento do Prof. Canotilho, os valores 
constitucionais podem ser captados em três níveis de racionalidade. Estes níveis 
compõem o consenso geral da comunidade sobre o que seja razoável em termos de 
proteção aos direitos humanos. Dentre eles, encontra-se o nível da racionalidade 
ética. “A racionalidade ética consagra os principais valores éticos da convivência 
humana, como a vida, a dignidade da pessoa humana”3, dentre outros. 
Como exemplos de valores éticos positivados, dentre os princípios 
constitucionais, que conformam os objetivos a serem realizados pela democracia 
brasileira, destaca-se o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, 
estampado pelo art. 1°., inciso III da Constituição da República Federativa do Brasil. 
Do mesmo modo, o princípio constitucional garantidor da vida, como valor supremo 
do homem, estabelecido pelo caput do art. 5°. da Carta Magna, o direito à vida. 
A inviolabilidade do direito à vida é uma garantia Constitucional4, 
reservada aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País. Este é o mais 
 
2
 ESPÍNOLA, Ruy Samuel. A Constituição como Garantia da Democracia: O papel dos princípios 
Constitucionais. Texto de exposição ocorrida em 30 de outubro de 1999, no auditório da Faculdade 
de Direito de Caruaru. 
3
 CANOTILHO, Gomes apud Espínola, op. cit. 
4
 Art. 5°., caput, Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo I. Constituição Federal da 
República Federativa do Brasil: “Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, 
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, 
à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:”. 
 
fundamental de todos os direitos, uma vez que constitui “pré-requisito à existência e 
exercício de todos os demais direitos”.5 
O direito à vida, conforme entendimento do Prof. Alexandre de 
Moraes6, possui uma dupla acepção: a primeira relacionada aos direitos de continuar 
vivo, e um segundo entendimento que é o de viver dignamente. Para tanto, entende 
o sentido de dignidade como a base de subsistência do ser humano. 
Neste contexto, a Constituição Federal de 1988 assegura, como 
fundamento do Estado democrático de direito, a dignidade da pessoa humana.7 
Por “dignidade da pessoa humana” desprende-se diversos 
entendimentos, dos quais veremos alguns, imprescindíveis para o bom 
encaminhamento do trabalho. 
Para o Prof. Alexandre de Moraes, 
a dignidade da pessoa humana concede unidade aos direitos e garantias 
fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse 
fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas 
de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é 
um valor espiritual, e moral inerente à pessoa, que se manifesta 
singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria 
vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais 
pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo o estatuto 
jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam 
ser feitas limitações ao exercício dos direitosfundamentais, mas sempre 
sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas 
enquanto seres humanos
8
. 
 
A idéia de valor intrínseco da pessoa humana possui raízes já no 
pensamento clássico e no ideário cristão. Foi a religião cristã, pelo fato de encontrar-
se no Antigo e no Novo Testamento, referência de ser, o ser humano, criado à 
 
5
 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 6ª edição, ed. Atlas, 1999, São Paulo – p. 60. 
6
 Op. cit.. – p. 61. 
7
 Art. 1°., inc. III, Título I – Dos Princípios Fundamentais. Constituição Federal da República 
Federativa do Brasil: “A República Federativa do Brasil, formada pela União indissolúvel dos Estados 
e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como 
fundamentos: III- a dignidade da pessoa humana;”. 
8
 Moraes, Alexandre. Op. cit. – p. 47. 
 
imagem e semelhança de Deus9, que trouxe o entendimento de que o ser humano, e 
não apenas os cristãos, são dotados de um valor próprio, que lhe é intrínseco, não 
podendo ser transformado em mero objeto ou instrumento. 
Para tanto, na ótica de Ingo Sarlet, 
a dignidade é o valor de uma tal disposição de espírito, e está infinitamente 
acima de todo o preço. Nunca ela poderia ser posta em cálculo ou confronto 
com qualquer coisa que tivesse um preço, sem de qualquer modo ferir a sua 
santidade.
10 
 
Atualmente, diante das modificações da sociedade, da economia e 
do direito, é notável a proteção que se dá à dignidade da própria vida de um modo 
geral, ainda mais numa época de reconhecimento da proteção ao meio ambiente 
como valor fundamental. 
A concepção jusnaturalista, tendo seu apogeu no séc. XVIII, 
remanesce a constatação de que a ordem constitucional parte do pressuposto de 
ser, o homem, em virtude de sua condição humana; homem este titular de direitos 
que devem ser reconhecidos e respeitados por seus semelhantes, posto que, a 
dignidade da pessoa humana permanece a ocupar lugar central no pensamento 
filosófico, político e jurídico, sendo valor fundamental da ordem jurídica, pelo menos 
para as ordens constitucionais que nutrem a pretensão de constituírem um Estado 
Democrático de Direito. 
Por se tratar de conceitos de contornos vagos e imprecisos, 
caracterizado por sua ambigüidade, há uma grande dificuldade de conceituação da 
expressão "dignidade da pessoa humana", sendo mais fácil dizer o que a dignidade 
não é, do que expressar o que ela significa. 
 
9
 AURENCHE, Guy. A Atualidade dos Direitos Humanos. Edições Loyola, São Paulo, 1984, p. 29 – 
37. 
10
 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição 
de 1988, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 34. 
 
Contudo, apesar dessa dificuldade, a doutrina e a jurisprudência 
tentam estabelecer alguns contornos basilares para sua conceituação e, também, 
para uma possível concretização de seu conteúdo, ainda que não se possa falar 
aqui de uma definição genérica e abstrata consensualmente aceita. 
Cabe salientar que o conceito da dignidade da pessoa humana está 
em permanente processo de construção e desenvolvimento, pois se trata de 
categoria axiológica aberta, ainda mais devido à existência de pluralismo e 
diversidade de valores que se manifestam nas sociedades democráticas 
contemporâneas. 
Neste contexto, consoante Zipellius, 
o conteúdo da noção de dignidade da pessoa humana, na sua condição de 
conceito jurídico-normativo, reclama uma constante concretização e 
delimitação pela práxis constitucional, tarefa cometida a todos os órgãos 
estatais. 
11
 
 
Por ser irrenunciável e inalienável, a dignidade é uma qualidade 
intrínseca da pessoa humana, pois qualifica o ser humano como tal e dele não pode 
ser destacado. 
Advém daí a exigência de seu reconhecimento, respeito, promoção 
e proteção, não podendo, assim, ser criada, concedida ou retirada, já que existe em 
cada ser humano como algo que lhe é inerente. 
Portanto, a dignidade, evidentemente, não existe só onde é 
reconhecida, positivada, já que constitui dado prévio, sendo valor próprio da 
natureza do ser humano. 
Assim, pode-se observar sua influência no preceituado do art. 1º da 
Declaração Universal da Onu (1948), segundo o qual "todos os seres humanos 
 
11
 ZIPELLIUS, apud Ingo Sarlet, op. cit. p. 40. 
 
nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, 
devem agir uns para com os outros em espírito e fraternidade". 
Evidente, pode-se inferir desta leitura, que o elemento nuclear da 
noção de dignidade da pessoa humana parece continuar centrando-se na autonomia 
e no direito de autodeterminação da pessoa, ou seja, de cada pessoa. 
O ilustre constitucionalista lusitano, Canotilho, compartilha da idéia 
acima exposta, referindo-se que 
o princípio material que subjaz à noção de dignidade da pessoa humana 
consubstancia-se no princípio antrópico que acolhe a idéia pré-moderna da 
dignitas-hominis, ou seja, do indivíduo conformador de si próprio e da sua 
vida, segundo o seu próprio projeto espiritual
12
. 
 
Dessa forma, a liberdade, aqui defendida, significa a capacidade 
potencial que cada ser humano tem de auto determinar sua conduta. 
Diante das considerações feitas, fica evidenciada a intrínseca 
ligação entre as noções de vida e dignidade, isso porque o direito à vida, bem como 
as garantias dos direitos fundamentais em geral, constituem uma das principais 
exigências da dignidade da pessoa humana. 
Ainda na tentativa de se estabelecer uma noção a respeito da 
dignidade da pessoa humana é importante destacar que os autores se referem a ela 
como sendo, simultaneamente, limite e tarefa dos poderes estatais, não só deles, na 
verdade, apontando esta condição dúplice para uma simultânea dimensão defensiva 
e prestacional da dignidade. 
Tudo isso, por decorrer da expressão da autonomia da pessoa 
humana, ligada à idéia de autodeterminação em relação às decisões a respeito de 
sua existência. 
 
12
 CANOTILHO, apud Ingo Sarlet, op. cit. p. 44 
 
A dimensão tarefa do principio resulta na imposição ao Estado, e 
também à comunidade, de preservar a dignidade existente, promovendo e criando 
condições que possibilitem o pleno exercício e fruição da mesma. 
Portanto, o principio da dignidade como tarefa, impõe como 
obrigação do Estado a função de promover as condições que viabilizem e removam 
toda a sorte de obstáculos que estejam impedindo pessoas de viverem com 
dignidade; assim, impõe a promoção e realização concreta de uma vida com 
dignidade para todos. 
Em relação à dimensão limite da dignidade da pessoa humana, e no 
âmbito de uma perspectiva intersubjetiva, destaca Gonçalves Loureiro que 
a dignidade da pessoa humana implica uma obrigação geral de respeito 
pela pessoa, traduzida num feixe de deveres e direitos correlativos, de 
natureza não meramente instrumental, mas sim, relativos a um conjunto de 
bens indispensáveis ao florescimento humano.
13 
 
Os limites impostos, pelo princípio ora estudado, à atuação do poder 
público, objetivam impedir uma possível violação da dignidade pessoal, resultando 
num comando ao Estado, qual seja, de ter como meta constante o dever de respeito 
e proteção. 
Disto resulta que todos os órgãos, funções e atividades estatais 
ficam vinculados ao princípio da dignidade da pessoa humana. 
Desta forma, todos devem respeito e proteção, explicitados na 
obrigação de abstenção, por parte do Estado,de ingerências na esfera individual 
que sejam contrárias à dignidade pessoal, e de proteção desta contra possíveis 
agressões oriundas de terceiros. 
 
13
 LOUREIRO, apud Ingo Sarlet, op. cit. p. 54 
 
 
Importante, também, é que haja uma maior consciência por parte 
das entidades privadas e dos particulares, pois se encontram diretamente vinculados 
a esse principio, posto que este também vincula as relações existentes entre os 
particulares. Assim sendo, ressalta-se que a eficácia dos direitos fundamentais tem 
encontrado fundamento justamente no principio da dignidade da pessoa humana. 
Cumpre salientar, ainda, que relativamente ao âmbito da 
hierarquização de valores, tem-se aqui a dignidade como limite. Caso haja conflito 
entre princípios constitucionais, o princípio da dignidade justifica a imposição de 
restrições, utilizando-se do principio da proporcionalidade, do qual não entraremos 
no mérito, a outros bens protegidos constitucionalmente. 
A dupla função defensiva e prestacional da dignidade da pessoa 
humana, portanto, refere-se tanto aos direitos de defesa, quanto às prestações 
fáticas ou jurídicas que correspondem às exigências e constituem concretizações da 
dignidade da pessoa humana. Assim, são estipuladas, simultaneamente, obrigações 
de respeito e consideração, e, também, deveres em face da sua promoção e 
proteção. 
Por apresentar, cada sociedade civilizada, padrões e convenções 
próprios a respeito do que constitui a dignidade, haveria conflitos, caso houvesse a 
estipulação de um conceito de dignidade como universal, ainda que isso fosse 
possível. 
Assim, por mostrar-se mais coeso e completo, guardando relação 
com o que foi disposto nestas linhas, utilizaremos o conceito apresentado pelo 
professor Ingo Sarlet, sobre a dignidade da pessoa humana, a saber: 
é a qualidade intrínseca e distintiva da cada ser humano que o faz 
merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da 
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres 
fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de 
cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições 
 
existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover 
sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e 
da vida em comunhão com os demais seres humanos.
14
 
 
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 1º, III, bem como o art. 
60, § 4º, inciso III, ao dispor sobre a dignidade da pessoa humana e os direitos e 
garantias individuais, como fundamento do nosso Estado Democrático de Direito, 
reconheceu que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não o 
contrário, uma vez que a finalidade precípua da atividade estatal é o ser humano, 
não constituindo este meio da mesma atividade. 
Entretanto, o Constituinte considerou-a de maneira concreta e 
individualmente, e, como salienta J. Miranda 15, relembrando, assim, a idéia de que a 
dignidade constitui atributo da pessoa individualmente considerada, e não de um ser 
ideal ou abstrato, chama atenção, o doutrinador, de que não se deve confundir as 
noções de dignidade da pessoa e de dignidade humana, quando esta for referida à 
humanidade como um todo. 
A dignidade da pessoa humana como principio fundamental, e, 
também, norma jurídico-positiva, carregada de eficácia, alcançando a condição de 
valor jurídico fundamental de nossa comunidade, é um valor que não se restringe a 
guiar os direitos fundamentais, mas sim, rege toda a ordem jurídica constitucional e 
infraconstitucional. 
Ressalta-se, ainda, que o referido princípio é de grande valia para a 
interpretação constitucional em face às normas constitucionais apresentarem caráter 
aberto e amplo, principalmente aquelas atinentes aos direitos fundamentais, pois 
 
14
 Ingo Sarlet, op. cit. p. 60. 
15
 MIRANDA, apud Ingo Sarlet, op. cit. p. 52 
 
 
sua utilização como premissa da argumentação jurídica torna o procedimento da 
interpretação constitucional racional e controlável. 
No Brasil, a Constituição de 1988, em seu art. 1º, inciso III, assevera 
que a dignidade da pessoa humana é fundamento da República. Ela serve de 
fundamento para todo o ordenamento jurídico. Na ótica de Ferreira dos Santos16, 
além da dignidade ser tomada como princípio, deve ser, também, tomada como 
paradigma avaliativo de cada ação do Poder Público e um dos elementos 
imprescindíveis de atuação do Estado brasileiro. 
Apesar da afirmativa de que a dignidade preexiste ao direito, para 
que a ordem jurídica seja legítima, ou seja, para a legitimação da atuação do 
Estado, faz-se necessário que a dignidade seja reconhecida e protegida pelo 
ordenamento jurídico. São, dessa maneira, que os direitos e garantias fundamentais, 
de alguma forma, possam ser reconduzidos à noção de dignidade da pessoa 
humana, pois todos remontam à idéia de proteção e desenvolvimento das pessoas 
em nível social, democrático, cultural, econômico e jurídico. 
O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana cumpre 
relevante papel na arquitetura constitucional, posto que é fonte jurídico-positiva dos 
direitos fundamentais. É, assim, valor que dá unidade e coerência ao conjunto dos 
direitos fundamentais. 
O principio da dignidade serve, portanto, como parâmetro para 
aplicação, interpretação e integração dos direitos fundamentais, mas não só deles e 
das normas constitucionais, como de todo o ordenamento jurídico. É, assim, um 
referencial inarredável para a hierarquização axiológica inerente ao processo 
 
16
 SANTOS, apud Gláucia Barcelos Alves, Sobre a dignidade da pessoa in A Reconstrução do 
Direito Privado, p. 227. 
 
hermenêutico – sistemático17, ou seja, é considerado como principio de maior 
hierarquia do ordenamento jurídico, ressaltando sua função hermenêutica. 
Vale, ainda, dizer que os direitos fundamentais e a dignidade da 
pessoa humana à qual se referem, convivem de forma indissociável, posto que 
aqueles constituem explicitações e concretização desta. Assim, ao menos em 
princípio, em cada direito fundamental se faz presente um conteúdo ou, alguma 
projeção da dignidade da pessoa. 
Na condição de valor, e principio fundamental, a dignidade da 
pessoa humana exige e pressupõe o reconhecimento e proteção de todos os direitos 
fundamentais, pois, do contrário, resultará em negativa da própria dignidade o não 
reconhecimento à pessoa humana dos direitos fundamentais que lhes são inerentes. 
Portanto, é inquestionável que a liberdade, a garantia de isonomia 
de todos os seres humanos e os direitos fundamentais são pressupostos e 
concretização da dignidade da pessoa. Pois a dignidade possui respaldo na 
autonomia pessoal, na autonomia que tem o homem de formatar sua própria 
existência, ser sujeito de direitos; há reconhecimento geral ao livre desenvolvimento 
da personalidade. 
Paulo Mota Pinto18 sustenta que da garantia da dignidade humana 
decorre o reconhecimento de personalidade jurídica a todos os seres humanos, bem 
como a previsão de instrumentos jurídicos destinados à defesa das refrações 
essenciais da personalidade humana, e necessidade de proteção desses direitos por 
parte do Estado; sendo, ainda, para o jurista supra citado, a afirmação da liberdade 
de desenvolvimento da personalidade humana e o imperativo de promoção das 
condições possibilitadoras desse livre desenvolvimento, sendo os corolários do 
 
17
 FREITAS, Juarez. A interpretaçãosistemática do direito, 2ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 83. 
18
 PINTO, apud Ingo Sarlet, op. cit. p. 88. 
 
reconhecimento da dignidade da pessoa humana como valor no qual se baseia o 
Estado. 
Diante da forte relação existente entre a dignidade e os direitos 
fundamentais, posto que aquela assume função de elemento e medida destes, a 
violação de um direito fundamental importará em ofensa à dignidade da pessoa. 
Defendem a maior parte dos doutrinadores que diante de um caso concreto, deve-se 
buscar primeiro verificar a existência de uma ofensa a determinado direito 
fundamental em espécie, para, assim, se reduzir a margem de arbítrio do interprete, 
pois mostra-se explícito o conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana 
naquela dimensão especifica. 
Sendo parte integrante dos direitos fundamentais, o principio da 
dignidade serve como elemento de proteção dos direitos contra medidas restritivas; 
todavia, por servir também de justificativa para a imposição de restrições a direitos 
fundamentais, acaba atuando como elemento limitador destes. Assim, sempre se 
poderá afirmar que a dignidade da pessoa atua tanto como limite dos direitos e 
como limite dos limites. Ou seja, como barreira contra a atividade restritiva dos 
direitos. 
Há, na doutrina e na jurisprudência, consenso de que nenhuma 
restrição, em princípio, de direito fundamental poderá se mostrar desproporcional, ou 
resultar na afetação de seu núcleo essencial, pois do contrário, haveria o 
esvaziamento do referido direito. Como para alguns doutrinadores o núcleo 
essencial dos direitos fundamentais é o conteúdo em dignidade da pessoa humana, 
está, portanto, este, imune às restrições; e, qualquer caso de violação desse núcleo 
essencial será sempre desproporcional. Não se está sustentando a inviabilidade de 
impor certas restrições aos direitos fundamentais, desde que reste intacto o núcleo 
 
em dignidade destes direitos. É, portanto, desse entendimento que resulta a 
proteção dos direitos fundamentais, por meio da dignidade da pessoa. 
Mesmo sendo a dignidade um valor supremo do ordenamento 
jurídico, mesmo diante de sua prevalência no confronto com outros princípios e 
regras constitucionais, não se pode deixar de reconhecer uma possível relativização 
deste princípio, v.g. de levar-se em conta que alguém, um juiz, o legislador, irá 
decidir qual seu conteúdo e se houve, ou não, sua violação no caso concreto. 
Assim, o princípio da dignidade da pessoa humana, na condição de 
direito de defesa, não aceita qualquer violação à dignidade pessoal, mesmo em 
função de outra dignidade, impondo aos órgãos estatais, a missão não só de 
respeito e proteção da dignidade de todas as pessoas, mas de promoção e 
efetivação das condições de vidas dignas para todos. 
Assim sendo, somente haverá espaço para a dignidade da pessoa 
humana, não passando o homem, de mero objeto de arbítrio e injustiças, quando a 
liberdade e a autonomia, a igualdade e os direitos fundamentais forem, além de 
reconhecidos, assegurados, demonstrando-se verdadeiro respeito pela vida e pela 
integridade física e moral do ser humano, assegurando-se, sobretudo, as condições 
mínimas para uma existência digna. 
Assim, para que se possa ver o respeito à pessoa humana, com 
relação à sua dignidade, o direito à vida deve ser assegurado de qualquer maneira, 
cabendo ao Estado viabilizar condições aos cidadãos para a concretização e 
exercício deste direito fundamental. 
 
 
 
 
1.1. Condição do Exercício do Direito à Vida: a Água. 
 
Uma das condições que assegura a existência da vida é a água. 
Logo, podemos dizer que a água é um meio de concretização do direito à vida e, 
conseqüentemente, respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana. 
Quando se fala em água, logo nos vêm à mente o seu estado 
liqüefeito. Contudo, ela não existe só em estado líquido, sólido ou gasoso. Existe 
também em estado vivo, onde atravessa o corpo do ser humano, possibilitando a 
sua sobrevivência. Mais que isso, a água está presente em tudo que consumimos: 
comida, roupa, carro, computador. E em grande quantidade. 
À título ilustrativo, para se produzir 1 litro de cerveja, são gastos 7 
litros de água; cada quilo de alumínio gasta 100.000 litros de água para ser 
produzido; e a cada carro são usados 400.000 litros de água.19 
Apesar de se utilizar a água para a produção de uma infinidade de 
objetos, não podemos descartar a utilização desta para a produção agrícola e muito 
menos, a água potável, produto este essencial para qualquer existência de vida. 
É a água potável que viabilizará, dentre outros fatores, a realização 
do direito à vida. 
Neste contexto, pode-se dizer que a água, é fonte de vida. Ter a 
água limpa saindo da torneira é coisa rara entre as populações mais pobres do 
mundo. Segundo a Organização das Nações Unidas – ONU20 – 1.1 Bilhão de 
pessoas, no mundo, não tem acesso à água potável e 2.4 bilhões não tem 
saneamento básico. 
 
19
 fonte: Revista Caros Amigos, edição especial “Terra em Transe”, número 23, abril de 2005, p.16 
20
 fonte: Revista Caros Amigos, edição especial “Terra em Transe”, número 23, abril de 2005, p.16. 
 
O acesso à água é um direito humano fundamental. O 
abastecimento de água e o saneamento devem ser serviços públicos prestados pelo 
Estado. 
Água. Bem comum, garantia de dignidade, dom da natureza. 
Dizer que a água é um meio vital é obvio. Mas, em tempos de 
desencantamento, é de se destacar nosso vínculo e o concernimento com a vida, a 
de cada um dos seis bilhões e meios de humanos e a dos que estão chegando a 
cada dia; e, com a vida em geral, já que o ciclo da água e a existência da vida no 
planeta são indissociáveis. 
Assim, caracterizar a água como insumo produtivo, de amplo uso na 
economia, é também evidente, basta registrar o uso e a destinação das águas nas 
atividades hoje praticadas em grande escala: 
- irrigação de hortas, pomares e de culturas comerciais; 
- interceptação das minas d’água e bombeamento dos aqüíferos profundos 
e dos rios subterrâneos para uso geral, para coletividades como hotéis, 
hospitais, clubes, presídios, shoppings, e para venda engarrafada como 
água potável; 
- represamento de rios para uso de água na atividade mineradora e na 
concentração de minérios, e para a formação de bacias de rejeitos, incluindo 
o acréscimo de águas extraídas do subsolo durante a lavra; 
- represamento ou derivação da correnteza dos rios para aproveitamento ou 
construção de queda d’água com a finalidade de turbinar e produzir 
eletricidade; 
- captação de grandes vazões dos rios e de aqüíferos freáticos e semi-
artesianos para lavagem de cana e de outras safras, para fabricação de 
 
açúcar, álcool, de celulose, papel e papelão, para indústria cerâmica, para o 
refino de petróleo, para o uso em toda a indústria química e toda a indústria 
de alimentos industrializados e de derivados de carne e de leite, em quase 
toda a indústria têxtil e assim por diante. 
Problemas que advém destes usos são variados, como a 
subseqüente geração de grandes vazões de efluentes que serão, de um modo ou 
outro, devolvidos para os rios e mares ou, em muitos casos, a perda evaporativa por 
causa da geração e utilização de vapor, dos sistemas de resfriamento e das 
emanações das bacias e tanques. 
Segundo o Prof. Alexandre de Moraes21, o direito fundamental à vida 
deve ser compreendido como direito de se ter um nível de vida adequado com a 
condição humana. Ou melhor dizendo, direito à alimentação, vestuário, assistência 
médico-odontológica, educação, cultura, lazer e demais condiçõesque possibilite ao 
ser humano viver. Que supra suas condições vitais. 
Contudo, conforme o doutrinador supra, a promoção daqueles 
caberá ao Estado, que deverá garanti-los a um nível adequado com as condições 
humanas, respeitando 
os princípios fundamentais da cidadania, dignidade da pessoa humana e 
valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e, ainda, os objetivos 
fundamentais da República Federativa do Brasil de construção de uma 
sociedade livre, justa e solidária, garantindo o desenvolvimento nacional e 
erradicando-se a pobreza e a marginalização, reduzindo, portanto, as 
desigualdades sociais e regionais
22
. 
 
Dessa forma, para Moraes, 
ao Estado cria-se uma dupla obrigação: obrigação de cuidado a toda 
pessoa humana que não disponha de recursos suficientes e que seja 
incapaz de obtê-los por seus próprios meios; 
efetivação de órgãos competentes públicos ou privados, por meio de 
permissões, concessões ou convênios, para prestação de serviços públicos 
 
21
 MORAES, Alexandre. Comentários à Constituição da República. Ed. p. 176. 
22
 Op. cit. p. 176. 
 
adequados que pretendam prevenir, diminuir ou extinguir as deficiências 
existentes para um nível mínimo de vida digna da pessoa humana
23
. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
23
 Op. cit. p. 176. 
 
 
2. Considerações Gerais Sobre a Água Doce no Brasil. 
 
O planeta pode ficar sem água muito antes do que se imagina. 
A Organização Mundial da Saúde (OMS) prevê que em algumas 
décadas a água doce será o recurso natural mais escasso e disputado pela maioria 
dos países. Em condições de uso fácil, não haveria mas que 0.01% do total de água 
do planeta. Uma previsão pessimista da Organização das Nações Unidas anuncia 
que já em 2005 faltaria água para dois terços da população mundial. 
O Brasil possui a maior reserva de água do planeta, cerca de 8% da 
água doce disponível. Mas 80% destas águas estão na Amazônia, onde a população 
representa somente 5% da população brasileira. Os 20% restantes respondem pelo 
abastecimento de 95% da população. Esta água que abastece os grandes centros 
urbanos é cada vez mais poluída, devido ao grande desmatamento das florestas e 
da ocupação irregular das margens dos rios.24 
As ocupações irregulares clandestinas, os loteamentos, atividades 
industriais, e agrícolas desencadeiam uma série de problemas: lançam esgoto e lixo 
nos rios, causam doenças e aumentam a poluição. A água poluída aumenta os 
custos da produção no abastecimento, exigindo mais produtos químicos para o 
tratamento. A contaminação dos mananciais leva a buscar fontes mais distantes dos 
centros consumidores. 
Os mananciais situados em áreas de maior concentração da 
população são os que estão em pior estado de conservação. Um estudo do 
pesquisador Cleverson Andreoli, da Cia. de Saneamento do Paraná (Sanepar), 
revela que em poucas décadas os mananciais das Regiões Metropolitanas, não só 
 
24
 Fonte: Revista CREA/PARANÁ. Água Doce. Ano 7, n.°: 28, abril/maio de 2004. 
 
 
no Estado do Paraná, mas nos demais onde a concentração populacional é 
numerosa, podem estar esgotados se mantida a tendência de consumo, o aumento 
da população e a devastação ambiental. 
Na previsão mais pessimista, sem nenhuma ação de preservação dos 
mananciais de consumo ou construção de barragens, em 2030 não haveria 
mais uma gota nas represas da região. Na previsão mais otimista, com 
preservação total do abastecimento, haveria água até 2050. Na previsão 
intermediária as reservas de água estariam esgotadas em 2040. Para suprir 
a demanda, as empresas responsáveis pelo ramo, estão realizando a 
captação da água com até 50 Km de distância do local onde a mesma é 
destinada ao consumo. Por isso, é mais interessante promover ações de 
preservação de mananciais, explica Andreoli.
25
 
 
Cada vez mais se torna difícil a tarefa de se captar água, tratá-la, 
distribuí-la e reintegrá-la ao meio ambiente. Este serviço é geralmente executado por 
empresas estatais, mas não se exclui a possibilidade de que empresas de iniciativa 
privada gerenciem o sistema da saneamento. 
Nesse panorama, é natural a indagação sobre a cobrança pela 
utilização dos recursos hídricos. No entanto, em primeiro plano, o pensamento de 
que a água é um produto da natureza e que todos tem direito ao seu acesso, 
poderia nos conduzir ao pensamento errôneo de que a distribuição da mesma 
deveria ser gratuita ou, quanto no mínimo, ser custeada pelo Estado. 
Contudo, faz-se necessário atentar ao fato de que, desde o 
momento da captação, tratamento e distribuição da água, bem como a receptação 
do esgoto e seu tratamento, devolvendo, o efluente, o mais límpido possível para o 
leito dos rios, gera custos. E, a cada dia estes custos aumentam devido a dificuldade 
de extração da água e tratamento, tanto desta, como do efluente. 
 
 
 
25
 Pesquisa de Campo realizada com o Pesquisador da Cia. de Saneamento do Paraná, Sr. 
Cleverson Andreoli. Londrina, 20 de março de 2005. 
 
3. Valor Econômico da Água 
 
Recurso hídrico é bem de valor, à medida que há interesse sobre 
ele. Tornando-se escasso, esse valor passa a ter caráter econômico. 
Contudo, conforme expresso na Carta Européia da Água, a água é 
um patrimônio comum, cujo o valor deve ser reconhecido por todos; cada um tem o 
dever de economizar e de a utilizar com cuidado e a gestão dos recursos hídricos 
deve inserir-se no âmbito da bacia hidrográfica natural e não das fronteiras 
administrativas e políticas. 
Nesse contexto, a Declaração de Dublin dispõe da matéria, inserindo 
em seu Princípio 4.° que 
a água tem valor econômico em todos os seus usos e deve ser reconhecida 
como um bem econômico. De acordo com esse princípio, é vital reconhecer 
como prioritário o direito básico de todo ser humano a ter acesso à água 
potável e ao saneamento, a um preço acessível. No passado, o não-
reconhecimento do valor econômico da água conduziu ao seu desperdício e 
a danos ambientais decorrentes de seu uso. A gestão da água, como bem 
econômico, é uma importante forma de atingir a eficiência e eqüidade no 
seu uso e de promover a sua conservação e proteção
26
. 
 
Conforme estabeleceu a Lei da Águas, expresso em seu art. 1.°, 
inciso II, como um dos fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, que 
a água é um recurso natural e limitado, dotado de valor econômico. 
 
 
 
 
 
 
26
 Qualidade e Gestão da Água. São Paulo: MRE, ILAM, PNUD, 1993, p.51. 
 
4. Premissas do Estudo da Cobrança pela utilização dos 
recursos hídricos 
 
O direito de se utilizar privativamente os recursos hídricos, seja qual 
for o interessado, pessoa de direito público ou privado, a outorga do direito de uso 
da água é o instrumento inerente ao Poder Público, conforme dispõe o art. 5.°, inciso 
III, da Lei n.°: 9.433/9727, assim como as várias políticas estaduais. 
A necessidade de se realizar um controle rigoroso sobre o uso da 
água, está intrinsecamente relacionada com a escassez desta. À medida que a água 
é entendida como um bem escasso e finito, logo, passível da valoração econômica, 
controlar o seu uso proporciona garantia de sobrevivência. 
Em sendo as águas bens públicos de uso comum, logo, a 
inalienabilidade é uma de suas propriedades. Esse entendimento, já fixado 
anteriormente pelo Códigodas Águas28, em seu art. 46, foi repetido na Lei n.°: 
9.433/97, conforme disposto no art. 18 desta. Seja a que título for, ninguém poderá 
apropriar-se das águas, pois a lei apenas confere o direito de seu uso por meio da 
outorga, cujos instrumentos jurídicos, no direito em vigor, são a autorização e a 
concessão. E ainda, sustenta que o pagamento pelo uso tampouco implica a criação 
de direito sobre a água. 
Atualmente, o que se paga aos prestadores de serviços públicos de 
saneamento, são quantias correspondentes à remuneração pela prestação dos 
mesmos, que incluem captação da água, tratamento, adução e distribuição de água 
potável, assim como coleta e afastamento de esgotos, podendo aí ser incluído o 
respectivo tratamento e ainda a disposição final dos lodos. A fatura que se recebe é, 
 
27
 Vide anexo I. Lei 9.433/97, Lei de Águas – Íntegra. 
28
 Vide anexo II, Código das Águas, Decreto n.°: 24.643/34 – Íntegra. 
 
portanto, relativa à prestação de serviços de saneamento e nada tem a ver com a 
cobrança pelo uso da água, instrumento da política de recursos hídricos. 
 
 
4.1. Fundamentos da Cobrança pela utilização da Água. 
 
No direito brasileiro existia previsão da cobrança, pela utilização de 
bens públicos, porém de forma genérica. 
O Código Civil de 1916, em seu art. 68, estabelecia que o uso 
comum pode ser gratuito ou retribuído, conforme leis da União, dos Estados, ou 
Municípios, a cuja administração pertencem. 
O art. 103, do atual Código Civil, inspirado pelo art. 68 do Código 
anterior, dispõe que o uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, 
conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração 
pertencerem. Sendo os recursos hídricos bens públicos de uso comum, verifica-se 
que o art. 68 do Código de 1916 foi primeira manifestação, ainda que indireta, no 
Direito Brasileiro, da possibilidade de cobrança pelo uso da água. Embora prevista 
legalmente, essa cobrança nunca ocorreu, de fato. 
O Código das Águas, alterado em parte pela Lei de Águas, garantia, 
em seu art. 34, “o uso gratuito de qualquer corrente ou nascente de água, para as 
primeiras necessidades da vida, se houver caminho público que a torne acessível”. 
Neste contexto, o art. 36 estabelecia que é permitido a todos usar de quaisquer 
águas públicas, desde que em conformidade com os regulamentos administrativos. 
Contudo, o mesmo art. 36, se esse uso depender de derivação, terá 
preferência a derivação para o abastecimento das populações; e o uso comum das 
águas pode ser gratuito ou retribuído, conforme leis e regulamentos da circunscrição 
administrativa a que pertencerem. 
 
O legislador utilizou o termo derivar, que “significa desviar, no caso, 
as águas de seu curso, ou seja, desviar-se de seu leito, com relação à corrente de 
água, mudar sua direção”29. Já nos termos do inciso VIII do art. 2.°, da Instrução 
Normativa MMA 04/2000, “Derivação ou Captação de Água de Curso Natural ou 
Depósito Superficial é toda retirada de água, proveniente de qualquer corpo hídrico”. 
Para tanto, as derivações para aplicação na agricultura, indústria e 
higiene consistem na captação ou na retirada do recurso para tais usos, o que 
implica o consumo do mesmo, ou sua simples utilização, para posterior devolução 
no mesmo corpo hídrico em que houve a captação ou ainda em outro corpo 
receptor. 
Contudo, leis, regulamentos ou entidades públicas legalmente 
autorizadas podem arbitrar um pagamento pela utilização da água, com exceção do 
uso para as primeiras necessidades da vida, assim entendido “o uso destinado ao 
preparo da comida, lavagem de casas e utensílios, lavar roupa no próprio leito ou 
alvéolo, para aí beber ou dar de beber aos animais e regar plantas que tenham em 
casa”.30 
A Lei n.°: 9.433/97, na mesma ordem de idéias, dispõe, no § 1.° do 
art. 12, que independe de outorga o uso dos recursos hídricos para a satisfação de 
necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural, para 
as derivações, captações, lançamentos e também para acumulação de volumes de 
água considerados insignificantes. 
A Lei de Águas repete o entendimento semelhante ao que vigorava 
no Código das Águas, no que se refere aos usos que não interferem no regime dos 
 
29
 FREIRE, Laudelino. Grande e novíssimo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: A noite, 
1940 a 1943. 5 v. 
30
 NUNES, Antônio de Pádua. Código das Águas. São Paulo: Saraiva, 1975, p.134. 
 
 
recursos hídricos, nem em sua quantidade e qualidade, eximindo-se os mesmos da 
outorga e, conseqüentemente, por força do art. 20 da Lei 9.433/97, do pagamento 
por seu uso. 
À parte disso, o recurso hídrico constitui um recurso ambiental, de 
acordo com o disposto no art. 3.°, V, da Lei n.°: 6.938/81. Essa norma estabelece, 
em seu art. 4.°, VII, que a Política visará à imposição, ao poluidor e ao predador, de 
recuperar e indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela 
utilização dos recursos ambientais para fins econômicos. Com esse diploma legal 
foram introduzidos os princípios “poluidor-pagador” e usuário-pagador”. 
O Código de Águas, já em 1934 declarou, em seus arts. 109 e 110, 
que a ninguém é lícito conspurcar ou contaminar as águas que consome, em 
prejuízo de terceiros, sendo os trabalhos para a salubridade das águas executados 
às custas dos infratores, os quais, além da responsabilidade criminal, se houver, 
respondem pelas perdas e danos que causarem e pelas multas previstas que lhes 
forem impostas nos regulamentos administrativos. O Código de Águas já previa a 
responsabilidade civil, administrativa e criminal pelo dano ambiental, no tocante à 
água, o que foi incorporado à Lei n.°: 6.938/81 e à Constituição Federal, em seu art. 
225, § 3.°. 
Em conformidade ao disposto no art. 111 do Código de Águas, se os 
relevantes interesses da agricultura ou da indústria o exigirem, e mediante expressa 
autorização administrativa, as águas podem ser inquinadas, mas os agricultores ou 
industriais deverão providenciar para que elas se purifiquem, por qualquer processo, 
ou sigam seu esgoto natural. 
 
Contudo, já havia, dessa forma, no direito brasileiro, mesmo que 
indiretamente, a possibilidade jurídica de cobrar-se pela utilização dos recursos 
hídricos, incluindo aí a diluição de efluentes. 
A Lei n.°: 9.433/97 efetuou a ligação entre a utilização e pagamento 
por esse uso. À parte disso, vigora a legislação ambiental que fixou padrões de 
qualidade e emissão de efluentes e que devem ser obrigatoriamente observados. 
Daí ter sido tacitamente revogado o art. 111 do Código de Águas, pois, de acordo 
com a norma ambiental em vigor, a ocorrência de poluição implica a 
responsabilidade do autor. 
 
4.2. Conceito e Objetivos da Cobrança 
“Cobrar”, do latim recuperare, tem o sentido de “fazer ser pago; 
exigir o valor de”31. “Cobrança” significa “arrecadação de quantias”.32 
A cobrança pelo uso da água consiste no instrumento econômico da 
política de recursos hídricos. 
Quanto ao aspecto econômico, para a Professora Maria Luiza 
Machado, 
É econômico em dois sentidos: o primeiro, relativo ao financiamento de 
obras contidas no plano de recursos hídricos; o segundo, no que tange ao 
entendimento da água como bem de valor econômico, cuja utilização deve 
ser cobrada
33
. 
 
Nos termos do art. 19 da Lei n.°: 9.433/97, constituem objetivos da 
cobrança: 
I – reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação 
de seu real valor; 
II – incentivar a racionalização do uso da água;31
 FREIRE, Laudelino. Grande... Op. cit. P. 1439. 
32
 Idem, ibidem. P. 1941. 
33
 GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito das Águas, 2. ed, São Paulo, Atlas, 2003, p. 207. 
 
 
III – obter recursos financeiros para o financiamento dos programas de 
intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos. 
 
A cobrança encontra-se na outra extremidade da política de recursos 
hídricos: de um lado, estão os planos, que fixam metas e prioridades a serem 
cumpridas. A cobrança tem por objetivo, entre outros, arrecadar recursos financeiros 
necessários ao desenvolvimento de atividades relativas ao alcance das metas 
propostas no Plano. Entre esses dois extremos, encontram-se os instrumentos de 
controle administrativo – outorga de direito de uso da água e licenciamento 
ambiental. 
 
4.3. Fato Gerador e Critérios da Cobrança 
O art. 20 da Lei n.°: 9.433/97 dispõe que “serão cobrados os usos 
dos recursos hídricos sujeitos à outorga”. O conteúdo do citado art. 20 remete a 
cobrança pelo uso da água a todos os usos passíveis de autorização ou concessão 
do poder público – União ou Estados. 
No rol apresentado pelo art. 12 da Lei n.°: 9.433/97 encontra-se 
vários tipos de uso, cada qual com caraterísticas próprias e conseqüências jurídicas 
especificadas. 
Assim, os usos podem causar alteração na qualidade e na 
quantidade da água, ou referir-se a uma atividade que simplesmente utiliza o rio, 
como, por exemplo, para uma simples passagem, como se fosse uma estrada. Daí a 
menção a dois princípios correlatos: “poluidor-pagador” e “usuário-pagador”. 
No que tange aos critérios, a Lei das Águas estabelece em seu art. 
21 que, na fixação de valores a serem cobrados, devem ser observados, entre 
outros, nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu 
regime de variação e, nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou 
 
gasosos, o volume lançado e seu regime de variação e as características físico-
químicas, biológicas e de toxidade do efluente. 
 
4.4. Natureza Jurídica do Produto da Cobrança 
O produto da cobrança pelo uso da água constitui uma receita 
pública, sendo necessário estabelecer-se o tipo de relação jurídica entre o Estado e 
o particular, uma vez que este é o fornecedor e aquele quem recebe. 
Conforme entendimento de Rubens Gomes de Souza34, o ponto de 
partida do estudo de finanças públicas é que toda atividade financeira do Estado se 
traduz por um conflito entre interesse público e interesse particular. 
Em sede de recursos hídricos, o conflito de interesse sobre o uso da 
água, em razão do risco de escassez, e da crescente demanda torna-a um bem de 
valor econômico, cujo uso é passível de ser cobrado. 
Contudo, essa receita cobrada pelo Estado, visa, principalmente, o 
interesse dos particulares na atividade desempenhada pelo governo, mas atendendo 
também, embora secundariamente, à existência de um interesse público geral e 
coletivo, nessa atividade. Também, aqui se trata de desempenho, pelo Estado, de 
atividades tipicamente privadas; porém a existência de um interesse público 
secundário justifica que o Estado se reserve a exclusividade do seu exercício, 
eliminado a concorrência por meio de monopólio legal. 
Por meio destas palavras, é perfeitamente perceptível que a receita 
pública em questão figura-se na modalidade de Preço Público. 
Distinção merecedora, é de que, portando, não há que se falar em 
Taxa, mas sim, Preço Público. A Taxa, imposto previsto na forma do inciso II do art. 
 
34
 SOUZA, apud Granziera, Maria Luiza Machado. Op. cit., p. 209. 
 
145 da Constituição Federal, tem a finalidade de remunerar serviços públicos e o 
exercício do poder de polícia. 
O fato gerador da cobrança é a utilização do recurso hídrico para os 
fins mencionados no art. 12 da Lei 9.433/97, e que basicamente são aqueles que 
alteram o regime, a quantidade ou a qualidade das águas. Não se configura, assim, 
exercício de polícia, uma vez que o controle administrativo encontra-se no âmbito da 
outorga do direito de uso da água e no licenciamento ambiental. 
Essa taxa é cobrada para remunerar os serviços de controle, 
prestados pela Administração Pública. Portanto, na modalidade em questão não se 
vislumbra, na cobrança, uma remuneração pelo exercício de poder de polícia. 
E, para espancar de vez qualquer confusão, tampou há que se falar 
em Tarifa. Esta é a remuneração pela prestação de serviço público, conforme 
disposição do art. 175 da Constituição Federal. Contudo, o serviço Público possui 
características muito distintas da concessão de uso de bem público, ou de sua 
outorga. 
Portanto, paga-se pelo uso privativo da água, em detrimento dos 
demais. O exemplo mais próximo da hipótese em questão encontra-se em sistemas 
similares à chamada Zona Azul, em que se utiliza um pedaço da via pública por 
determinado período, pagando por isso. Para Maria Luiza Machado, o efeito dessa 
utilização é que, “nesse interregno, o espaço da via pública, bem de uso comum, 
destina-se exclusivamente ao usuário, em detrimento do interesse dos demais”35. 
Neste sentido, é o que ocorre com a derivação e a captação para 
consumo final, como o abastecimento público, ou o abastecimento industrial, a 
extração de água de aqüífero subterrâneo, o lançamento de esgotos e demais 
 
35
 MACHADO, Op. cit., p. 211. 
 
resíduos, com o fim de diluição, transporte ou disposição final, conforme dispõe o 
art. 12 da Lei 9.433/97. 
Portanto, a natureza do produto da cobrança é, pois, a de preço 
público, pois se trata de fonte de exploração de bem de domínio público. Sua 
natureza é negocial, cabendo ao detentor do domínio estabelecer o respectivo valor. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5. A Continuidade do Serviço Público Essencial 
 
O que nos cabe analisar, por ora, é a Continuidade do Serviço 
Público Essencial. 
Quanto ao fornecimento de água e o serviço público essencial, antes 
de qualquer coisa, é válido lembrarmos ao leitor que este serviço também se 
configura como uma relação de consumo, tendo em um dos pólos a prestadora de 
serviços ou concessionária e de outro o consumidor ou beneficiado. 
A despeito disto, encontramos o dispositivo do Código de Defesa do 
Consumidor, em seu art. 22, regulando a matéria em questão. 
Assim, pode-se conceituar serviço público, nos exatos termos do 
magistério de Celso Antônio Bandeira de Mello, como 
toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade fruível 
diretamente pelos administrados, prestados pelo Estado ou por quem lhe 
faça as vezes, sob regime de Direito Público – portanto, consagrador de 
prerrogativas de supremacias e de restrições especiais –, instituído pelo 
Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios no 
sistema normativo
36
. 
 
Ultrapassada a questão conceitual atinente ao serviço público, resta 
o entendimento da expressão essencial. 
A definição do que vem a ser essencial vincula-se à idéia de 
indispensabilidade; necessidade imperiosa e inafastável. 
Referência para a caracterização dos serviços públicos essenciais é 
a Lei n.°: 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve, estabelecendo 
serviços e atividades essenciais, destacando dentre muitos, o tratamento e 
abastecimento de água. 
 
36
 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 11. ed., São Paulo, 
Malheiros, p. 477. 
 
Assim sendo, o cerne da discussão reside noscasos de 
inadimplemento da obrigação por parte do beneficiado pelos serviços. Há, pois, 
divergências doutrinárias e jurisprudencial. 
Alguns autores defendem a possibilidade de solução da continuidade em 
face do inadimplemento do usuário, sustentando, genericamente, o 
entendimento no princípio da igualdade; na impossibilidade de o Poder 
Público arcar com a gratuidade do serviço ara alguns; na Lei n.°: 8.987/95, § 
3°., do art. 6.°, que disciplina a concessão do serviço público e autoriza o 
corte desde que haja prévio aviso, o que descaracterizaria a 
descontinuidade etc.
37
 
 
Infere-se, contudo, uma grande divergência na jurisprudência quanto 
a ser admissível ou não o corte no fornecimento de água. Obviamente, cada 
posicionamento busca determinada fundamentação. 
Para tanto, passaremos a analisar dois posicionamentos 
jurisprudenciais conflitantes, o que nos permitirá entender a fundamentação das 
mesmas, em relação ao entendimento de poder judiciário, quanto à admissibilidade 
ou não do corte, frente ao inadimplemento do usuário do serviço. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
37
 NUNES JUNIOR, Vidal Sarrano. Código de Defesa do Consumidor Interpretado. São Paulo, 
Saraiva, 2003, p. 85. 
 
 
6. Análise Jurisprudencial 
 
“SERVIÇO PÚBLICO – Água – Corte do fornecimento diante 
inadimplemento do consumidor – Admissibilidade – Essencialidade do 
serviço que não autoriza o usuário, por simples dificuldade financeira, 
deixar de arcar com a contraprestação devida. 
 
Emenda da Redação: o não pagamento de consumo de água enseja o corte 
no fornecimento do serviço, uma vez que, embora considerado serviço de 
natureza essencial, tal característica não permite que o consumidor, por 
simples dificuldade financeira, deixe de arcar com a contraprestação do 
serviço público. (Agln 1.218.232-2 – 1.ª Câm. – j. 24.11.2003. – rel. Juiz 
Edgard Jorge Lauand.). 
 
ACÓRDÃO – Ementa Oficial: Prestação de serviços – Corte no 
fornecimento de água ante o não pagamento da conta referente ao 
consumo – Possibilidade – Serviço de utilidade pública de prestação 
contínua condicionada ao pagamento – Acordo de parcelamento não 
cumprido – Liminar cassada – Recurso provido.”.
38
 
 
Neste caso, foi concedida a medida liminar de natureza satisfativa 
com o objetivo de se restabelecer o fornecimento de água, sob fundamento de ser 
serviço público e essencial e não poder ser interrompido. 
Contudo, o entendimento deste relator, O Juiz Edgard Jorge Lauand, 
é o de que, não sendo efetuado o pagamento referente ao consumo, objeto do 
acordo não cumprido, a concessionária está habilitada em efetuar a suspensão do 
fornecimento de água. 
Para ele, a regra determinante do fornecimento contínuo, quanto aos 
serviços e bens essenciais, deve ceder, diante do rompimento, pela ausência de 
retribuição, por parte do consumidor. 
Segundo o r. Relator, na fundamentação desta decisão, 
este tipo de serviço não pode ser considerado de natureza essencial, mas 
sim, serviços de utilidade pública, pois, por sua conveniência, para os 
membros da sociedade, é prestado ou pela administração ou por terceiros 
como concessionárias
39
. 
 
 
 
38
 RT 825 – Julho de 2004 – ano 93.°, p. 265. 
39
 RT 825 – Julho de 2004 – ano 93.°, p. 266. 
 
Contudo, destaca ainda que não são serviços gratuitos, devendo 
existir uma contraprestação aos mesmos, conforme o respectivo consumo. 
Enfim, em conformidade ao entendimento deste relator, por se tratar 
de um serviço de natureza essencial e contínuo, não se poderia interromper o 
fornecimento por falta de pagamento, devendo a concessionária remeter-se ao 
judiciário a fim de cobrar a dívida. 
Contudo, adverte que, esta atitude se revelaria como estímulo à 
utilização do expediente por todo e qualquer consumidor, o que certamente levaria a 
empresa concessionária a difícil situação econômica, dificultando a sua prestação de 
serviços. 
Embora se trate de serviço essencial, não se pode compatibilizar o 
dever de prestação contínua pela concessionária com o não pagamento do consumo 
pelo usuário, entende o Relator. 
De qualquer modo, se por um lado se exige a prestação do serviço, 
de outro, se exige por parte do consumidor o pagamento referente ao serviços 
prestados. 
Por isso, entendo não ser possível, pela simples dificuldade financeira e 
sem qualquer outro motivo aparente, deixar a agravada (consumidor) de 
pagar pelo consumo de água, se escudando na essencialidade do serviço e 
numa interpretação equivocada de que não pode ser interrompido pela 
concessionária. A visão do contrato deve ser ampla prevendo direitos e 
deveres da concessionária com a contrapartida do consumidor, explica 
Edgard Jorge Lauand
 40
. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
40
 RT 825 – Julho de 2004 – ano 93.°, p. 267. 
 
“PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – Água – Suspensão no fornecimento por 
falta de pagamento – Inadimissibilidade – Serviço que possui caráter 
essencial, sujeitando-se ao princípio da continuidade da prestação – 
Inteligência do art. 22 da Lei 8.078/90. 
 
Ementa da Redação: Não se admite seja suspenso o fornecimento de água 
ao consumidor sob o fundamento de estar esse em mora no pagamento, 
uma vez que trata-se de serviço público essencial que se sujeita, destarte, 
ao princípio da continuidade de sua prestação, nos termos do art. 22 da Lei 
8.078/90. (Agln 1.083.910-8 – 11.ª Câm. – j. 06.06.2002 – rel. Juiz Melo 
Colombi).”
41
. 
 
Sustenta este relator, Juiz Melo Colombi42, via de regra, a 
impossibilidade do corte no fornecimento de serviços essenciais por ausência de 
pagamento. 
Neste sentido, entende, o relator que, para tanto, deve-se observar o 
princípio do Direito Administrativo pátrio, da continuidade da prestação dos serviços 
públicos e, ainda, atentar-se ao fato de que tal prestação é regulada pelo Código de 
Defesa do Consumidor. 
Neste contexto, destacamos que a Lei consumerista, em seu art. 22, 
dispõe que os órgãos públicos, por si ou por suas empresas, concessionárias, 
permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigadas a 
fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, 
contínuos. 
“O fornecimento de água potável é, na atualidade, um bem essencial à 
população, constituindo-se serviço público indispensável, subordinado ao 
princípio da continuidade de sua prestação, pelo que se torna impossível a 
sua interrupção”, explica Colombi em sua fundamentação da r. decisão. 
 
O direito do cidadão de se utilizar dos serviços essenciais para a sua 
vida em sociedade, deve ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se 
utiliza. 
 
41
 RT 809 – Março de 2003 – ano 92.°, p. 262. 
42
 RT 809 – Março de 2003 – ano 92.°, p. 262 e 263. 
 
A palavra essencialidade, conforme entendimento de Deocleciano 
Torrieri Guimarães43, revela um estado ou ausência de algo que deve ser satisfeito. 
As necessidades podem ser individuais ou coletivas, como 
alimentos, água, luz, habitação, a defesa do território, a segurança pública, etc. Para 
tanto, o direito do cidadão de se utilizar dos serviços públicos essenciais para a sua 
vida em sociedade, deve ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se 
utiliza, cabendo ao Estado garanti-los e mantê-los.43
 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico, São Paulo, Rideel, 1995, p. 414. 
 
 
Conclusão 
 
Diante de todo o exposto, pode-se inferir que, o corte no 
fornecimento de água potável não deve ser permitido. 
O que não se quer, com a presente exposição, é fazer apologia ao 
inadimplemento quanto aos serviços essenciais utilizados. O que se quer sim, é 
fazer valer o ideal de democracia que deveria ser exercido por este Estado de 
Direito. 
Atenta-se ao fato de que os valores cobrados, pela utilização dos 
serviços, são investidos em estudos, programas, projetos e obras previstas nos 
planos de recursos hídricos, conforme exigência do art. 22, I da Lei 9.433/97, bem 
como no pagamento de despesas e implantação e custeio administrativo nos órgãos 
e entidades do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, conforme 
inciso II do artigo acima referido. 
O simples gesto de abrir uma torneira e encher um copo d’água, 
nem de perto lembra a complexidade do trabalho necessário para que ela chegue 
pura, cristalina e pronta para o consumo da pessoas. Tornar a água bruta em água 
potável exige a dedicação de vários profissionais, como engenheiros, químicos, 
biólogos, farmacêuticos, e um rigoroso processo de tratamento, como 
monitoramento permanente de técnicos. Tudo isso sem levar em consideração do 
destino da água após consumida. 
Em se tratando de relação de consumo de serviços essenciais, está 
obrigado o Poder Público a manter o fornecimento de água compulsoriamente, até 
mesmo a título gratuito, a quem não pode pagar. 
 
A cessação de serviços essenciais, tal como o de fornecimento de 
água potável, deve ser considerado ilegal, à luz do princípio da dignidade da pessoa 
humana e do direito à vida. Obviamente que não se exclui a possibilidade das 
concessionárias cobrarem as contas em atrasos pelo meios judiciais, porém sem 
deixar de prestar o devido serviço. 
A interrupção no fornecimento da água, não só deste, bem como de 
qualquer dos serviços essenciais, assim considerados, tem o escopo de compelir o 
consumidor ao pagamento dos atrasados. Assim, o exercício arbitrário da próprias 
razões não pode substituir a ação de cobrança. 
O corte, como forma de compelir o usuário ao pagamento, extrapola 
os limites da legalidade. 
Evidentemente que, o não pagamento pela utilização dos serviços 
levaria a concessionária às minguas, por falta de recursos. 
Compartilha-se da opinião dos que são contra a interrupção do 
fornecimento dos serviços essenciais, dentre os quais encontra-se o de fornecimento 
de água potável, uma vez que os direitos atinentes à dignidade da pessoa humana 
serão sempre atingidos pela interrupção dos serviços, por isso mesmo são ditos 
essenciais. 
Como viver com salubridade mínima sem serviço de fornecimento de 
água, sabido que é a água tratada e corrente a responsável pelo afastamento de 
diversos males à saúde? 
E, para combater o inadimplemento, oferece a legislação brasileira 
substrato suficiente, como a execução forçada atingindo o patrimônio do devedor. 
Contudo, a relação que existe entre homem e água antecede o 
direito. A água é elemento intrínseco a sua sobrevivência. É a partir dela que as 
 
funções vitais do ser humano se realizam, viabilizando sua existência, premissa 
básica para que o ser humano exerça o seu direito à vida. 
Evidente que, não basta ter vida, mas sim, viver com dignidade. 
Esta, por sua vez, se realiza com a intervenção estatal, proporcionando ao cidadão o 
fornecimento de serviços essenciais, necessários para a subsistência do ser 
humano. 
Não se pode deixar de citar, aqui, o fato de que a erradicação da 
pobreza é condição sine qua non da efetividade dessa política, assegurando o 
desenvolvimento cultural, social e econômico destes cidadãos e dos futuros – 
Desenvolvimento Sustentável. Por isso a necessidade de se implementar uma 
educação ambiental, voltados aos recursos hídricos. 
Suprir a água para beber, obsta ao homem o exercício do direito 
mais básico: o direito à vida. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional, Coimbra: 
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ESPÍNOLA, Ruy Samuel. A Constituição como Garantia da 
Democracia: O papel dos princípios Constitucionais. Texto de exposição ocorrida em 
30 de outubro de 1999, no auditório da Faculdade de Direito de Caruaru; 
 
FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do direito, 2ª ed., São 
Paulo: Malheiros, 1998; 
 
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 12ª ed., São Paulo: 
Atlas, 2002; 
 
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos 
Fundamentais na Constituição de 1988, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. 
 
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 13ª 
edição, São Paulo: Malheiros, 1997;

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