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sua própria natureza, assim como a justa remuneração e iniciativa dos empresários, que se empenham em melhorar o capital técnico, investem seus recursos em novos recursos e na produção, descobrem novas ideias e procuram pô-las em prática para que o desenvolvimento e o crescimento econômico se efetivem cada vez mais em sua plenitude (GÉLÉDAN; BRÉMOND, 1988). Sabe-se que o processo de industrialização e o avanço desenfreado do capitalismo desencadearam inúmeras consequências na área social, evidências e expressões negligenciadas e omitidas pelos liberalistas, visto apenas visualizarem o bem-estar econômico da sociedade – seu crescimento e desenvolvimento do ponto de vista da economia –, deixando à deriva o desenvolvimento social e as consequências desastrosas do sistema capitalista. A questão social e suas expressões, na época designada como problemas ou disfunções sociais, para os liberais estavam dissociadas da questão econômica. Assim, percebiam e consideravam todos os problemas sociais como desvios de conduta que estavam vinculados e relacionados com a cultura, a moral, a religião, a família, a própria pessoa. Dessa forma, a pobreza era relacionada a causas individuais e psicológicas, pensava-se o pauperismo como mendicância e como crime, e assim a repressão se instituía como forma de tentar harmonizar a sociedade da época. [...] a partir de 1834, existem algumas características e problemas dessa concepção de “questão social”, pobreza e tratamentos: a. A “questão social” é separada dos seus fundamentos econômicos (a contradição capital/trabalho, baseada na relação de exploração do trabalho pelo capital, que encontra na indústria moderna seu ápice) e políticos (as lutas de classes). É considerada a “questão social” durkheimianamente como problemas sociais, cujas causas estariam vinculadas a questões culturais, morais e comportamentais dos próprios indivíduos que os padecem. b. A pobreza é atribuída a causas individuais e psicológicas, jamais a aspectos estruturais do sistema social. c. O enfrentamento, seja a pobreza considerada como carência ou déficit (onde a resposta são ações filantrópicas e beneficência social). Ou seja, ela entendida como mendicância e vadiagem (onde a resposta é a criminalização da pobreza, enfrentada com repressão/reclusão), sempre remete à consideração de que as causas da “questão social” e da pobreza encontram-se no próprio indivíduo. Trata-se das manifestações da “questão social” no espaço de quem os padece, no interior dos limites do indivíduo, e não como questão do sistema social. Essa é a perspectiva pós-1835, século XIX — que, a partir da constituição do proletariado como sujeito e de suas lutas desenvolvidas particularmente entre 1830-48, pensa o pauperismo como mendicância TÓPICO 2 | SURGIMENTO DA QUESTÃO SOCIAL E SEU CONTEXTO HISTÓRICO 27 e como crime, tratando assim dela com repressão (MONTÃNO, 2012, p. 274). As inúmeras consequências se evidenciavam com o aumento da pobreza e da exclusão social, das desigualdades sociais, da expansão de situações de risco social, aumento de situações de vulnerabilidade social, precarização do trabalho, baixo salário, diminuição de postos de trabalho, trabalho infantil, crescimento excessivo de imigrações e migrações, explorações diversas. Bottomore (1996, p. 59) especificou o capitalismo como um: Tipo de economia e de sociedade que, em sua forma desenvolvida, surgiu a partir da Revolução Industrial do século XVIII na Europa Ocidental, o capitalismo foi posteriormente conceituado de variadas maneiras por economistas, historiadores e sociólogos (a palavra em si mesma só veio a ser amplamente utilizada no final do século XIX, particularmente por pensadores marxistas). Marx (O Capital, 1867, vol. 1) definiu-a como uma “sociedade produtora de mercadorias”, na qual os principais meios de produção estão nas mãos de uma classe particular, a BURGUESIA, e a força de trabalho também se torna uma mercadoria que é comprada e vendida. Essa concepção foi elaborada no quadro da teoria de Marx sobre a história – sua “interpretação econômica” – e o capitalismo encarado como o mais recente estágio em um novo processo de evolução dos modos de produção e formas de sociedade humanos. Seus aspectos característicos, segundo Marx, eram a capacidade de autoexpansão através da acumulação incessante (a centralização e a concentração de capital), a revolução contínua dos métodos de produção (fortemente enfatizada em O manifesto comunista), intimamente ligada ao avanço da ciência e da tecnologia como uma força produtiva de importância maior, e ainda o caráter cíclico de seu processo de desenvolvimento, marcado por fases de prosperidade e depressão, e também uma divisão mais claramente articulada, ao lado de crescente conflito entre as duas classes mais importantes (ver CLASSE) – a burguesia e o proletariado (ver CLASSE OPERÁRIA). Quando a classe proletária explorada começa a questionar a realidade social e o sistema econômico vigente, sua consciência crítica e de classe social faz surgir e proliferar inúmeros movimentos sociais, revoluções sociais. Dessa forma, os problemas sociais foram politizados, obrigando o Estado a efetivar e garantir os direitos sociais, ou seja, os problemas sociais foram transformados e considerados como expressões sociais da questão social e não mais como resultados do comportamento individual e das instituições sociais. UNI Porém, a questão social, mesmo com o desenvolvimento e crescimento do capitalismo, era considerada alvo de preocupação, pois os “problemas sociais” não deixavam de existir, mas cresciam em diferentes formas e números, sendo alvo de estudo por diversos pensadores. UNIDADE 1 | A GÊNESE DA ASSISTÊNCIA E DA QUESTÃO SOCIAL 28 FIGURA 8 – MOVIMENTOS SOCIAIS FONTE: Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=movimentos+sociais&b iw>. Acesso em: 5 jan. 2015. Os problemas sociais ou disfunções sociais foram politizados pela classe trabalhadora, foram transformados em expressões sociais, em manifestações multifacetadas da questão social. Assim, constatamos que a questão social e suas expressões eram designadas, caracterizadas, conceituadas como: problemas ou disfunções sociais, pois não eram tratadas sob o ponto de vista estrutural da sociedade capitalista. Porém, essa politização e questionamento da classe trabalhadora não ocorreram de forma pacífica, lenta e amigável durante a história, tanto é que as transformações que estavam ocorrendo impulsionaram muitos estudiosos a se debruçarem cientificamente sobre os estudos sociais e, através de pesquisas, mostrassem evidências comparadas e comprovadas da sociedade. Assim, por necessidade, é que a sociologia se caracterizou como uma ciência. A partir da substituição das ferramentas pelas máquinas, da energia humana pela energia motriz e do modo de produção doméstico pelo sistema fabril, se iniciou o processo de industrialização em escala mundial. Consequentemente, o capitalismo começou a emergir e foi alvo de atenção de diversos economistas e sociólogos. IMPORTANT E Podemos entender o significado de expressões ou manifestações multifacetadas da questão social como aquelas que se apresentam na sociedade com várias facetas, muitas faces, múltiplas aparências, características ou atributos. TÓPICO 2 | SURGIMENTO DA QUESTÃO SOCIAL E SEU CONTEXTO HISTÓRICO 29 Alguns teóricos e profissionais estavam preocupados em organizar o processo de produção para obtenção do crescimento do próprio capital, e outros, em analisar os resultados de tal sistema, seu modo de funcionamento e suas consequências. Assim, seguindo as descrições feitas por Oliveira (2002), podemos relatar alguns dos grandes mestres das ciências sociais, que analisaram a sociedade de sua época: QUADRO 1 – OS PENSADORES CLÁSSICOS DA