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em 5 minutos eu certamente saio correndo da sala. Mas se um Matema´tico me disser que a laje vai cair no tempo 5 · I := 5√−1, que fazer ? Essa utilidade dos Reais, por corresponder a` linha do tempo (passado = nu´mero negativo, presente = 0, futuro = nu´mero positvo), tem como oˆnus o fato que as func¸o˜es Reais nem sempre esta˜o definidas. Veremos duas restric¸o˜es, uma sobre quocientes e outra sobre a ra´ız quadrada. A primeira afeta na˜o so´ os Reais, mas qualquer sistema de nu´meros. A segunda, da Ra´ız, e´ t´ıpica dos nu´meros que podem ser ordenados. 1. Os Reais como sistema de nu´meros: na˜o dividira´s por zero ! Todo professor passa aulas e aulas repetindo que na˜o se pode dividir por zero. E infelizmente muitos alunos de Ca´lculo dividem por zero, pois confundem o fato de um nu´mero ser pequeno com um nu´mero ser zero ! Mas a final, por queˆ na˜o se pode dividir por zero ? No que podemos nos apoiar para provar que na˜o existe o nu´mero 1 0 ? Nos bastara´ algumas das propriedades mais gerais dos R (por sinal compartilhadas com outros sistemas de nu´mros, como Q ou C), que sa˜o: • existe um elemento neutro aditivo, 0, tal que 0 + x = x, ∀x ∈ R. • ∀x ∈ R existe o inverso aditivo −x tal que x+ (−x) = 0. • existe um elemento neutro multiplicativo, 1, tal que 1 · x = x, ∀x ∈ R. • ∀x ∈ R, x 6= 0, existe o inverso multiplicativo 1 x tal que x · 1 x = 1. • 1 6= 0 • as operac¸o˜es de soma e produto sa˜o distributivas, associativas e comutativas. De posse dessas propriedades, que sa˜o assumidas como verdades, posso provar : Afirmac¸a˜o 1.1. i) −x = −1 · x, ∀x ∈ R, ii) 0 · x = 0, ∀x ∈ R. iii) na˜o existe 1 0 . Demonstrac¸a˜o. De i): 0 = (1− 1) · x⇔ x− x = (1− 1) · x⇔ 31 2. ORDEM NOS REAIS: NA˜O TIRARA´S A RAI´Z QUADRADA DE NU´MEROS NEGATIVOS ! 32 ⇔ x− x = 1 · x− 1 · x⇔ x− x = x− 1 · x⇔ −x = −1 · x. De ii): 0 · x = 0 ⇔ (1− 1) · x = 0 ⇔ ⇔ x− 1 · x = 0 ⇔ x− x = 0, e este u´ltimo fato e´ verdade: x = x. De iii): Suponhamos por absurdo que exista o nu´mero 1 0 . Enta˜o 0 · 1 0 = 1, pois o sentido de 1 x e´ ser o inverso multiplicativo de x. Mas o item ii) da´ que: 0 · 1 0 = 0. Logo 0 = 1: contradic¸a˜o. � 2. Ordem nos Reais: na˜o tirara´s a ra´ız quadrada de nu´meros negativos ! Um aspecto bonito da matema´tica e´ que, apo´s assumir a verdade de certos fatos simples, podemos deduzir fatos novos, a`s vezes na˜o ta˜o simples. Vamos assumir a validade dos seguinte Princ´ıpios (Axiomas): • Princ´ıpio 0: Existe um subconjunto P dos Reais chamado de conjunto dos nu´meros positivos. Vale para todo x ∈ R apenas uma das 3 possibilidades: ou x ∈ P ou x = 0 ou −x ∈ P . O elemento neutro multiplicativo 1 e´ positivo. • Princ´ıpio 1: A soma de quaisquer dois nu´meros positivos e´ um nu´mero positivo. • Princ´ıpio 2: o produto de um nu´mero positivo por um nu´mero positivo e´ positivo. Um nu´mero e´ chamado na˜o-negativo se x ∈ P ∪ {0}. Denotamos os positivos usualmente com x > 0 e os na˜o-negativos com x ≥ 0. Os negativos, por x < 0. Podemos agora provar : Afirmac¸a˜o 2.1. i) (Regra de multiplicac¸a˜o de sinais) (−x) · (−x) = x · x, ∀x ∈ R. ii) x2 := x · x ≥ 0 ∀x ∈ R. iii) √ x na˜o e´ um nu´mero Real, se x < 0. Demonstrac¸a˜o. De i): De fato, pelo item i) da Afirmac¸a˜o 1.1 (−1) · x = −x. Pela comutatividade e associatividade do produto: (−x) · (−x) = (−1) · x · (−1) · x = (−1) · (−1) · x · x. CAPI´TULO 3. PROPRIEDADE BA´SICAS DOS NU´MEROS REAIS 33 So´ resta provar que −1 · (−1) = 1, ou seja, nos reduzimos a provar apenas a Regra dos Sinais para o −1. Ora, −1 · (−1 + 1) = 0⇔ −1 · (−1)− 1 · 1 = 0⇔ ⇔ −1 · (−1)− 1 = 0⇔ −1 · (−1) = 1, como quer´ıamos. De ii): Se x = 0 enta˜o x · x = 0, pelo item ii) da Afirmac¸a˜o 1.1. Se x > 0 enta˜o x · x > 0 (Pr. 2). Se, por outro lado, x < 0 enta˜o −x > 0 (Pr. 0). E enta˜o x · x = (−x) · (−x) > 0 (Pr. 3 e 2). De iii): Suponha agora por absurdo que y := √ x ∈ R para x < 0. Enta˜o y2 ≥ 0 pelo item ii). Mas enta˜o chegamos em 0 ≤ y2 = (√x)2 = x < 0, em contradic¸a˜o com o Princ´ıpio 0. � 3. Propriedades gerais das desigualdades Usando os Princ´ıpios 0 , 1, 2 e a Regra de Multiplicac¸a˜o de Sinais podemos provar as propriedades a seguir, que sa˜o fundamentais. Alerta: se o estudante na˜o manejar bem essas propriedades tera´ problemas no Curso. Afirmac¸a˜o 3.1. i) Se x ≥ y e z ≥ w enta˜o x+ z ≥ y + w, ∀x, y, z, w ∈ R. ii) Se x > 0 e y ≥ z enta˜o x · y ≥ x · z. iii) Se x < 0 e y ≥ z enta˜o x · y ≤ x · z. iv) se x > 0 enta˜o 1 x > 0 v) se x > 1 enta˜o 1 x < 1. vi) 0 < x1 < x2 ⇒ 0 < 1x2 < 1x1 . vii) 0 < x < 1 ⇒ 0 < x2 < x < 1. viii) 1 < x ⇒ 1 < x < x2 ix) 0 < x1 < x2 < 1 ⇒ 1 < 1x2 < 1x1 . x) 1 < x1 < x2 ⇒ 1x2 < 1x1 < 1. xi): 0 < x < 1 ⇒ 1 < 1 x < 1 x2 . xii): 1 < x ⇒ 1 x2 < 1 x < 1. xiii): 0 ≤ x ≤ y e 0 ≤ z ≤ w enta˜o 0 ≤ x · z ≤ y · w. 3. PROPRIEDADES GERAIS DAS DESIGUALDADES 34 Demonstrac¸a˜o. i) Dados x, y, z, w ∈ R com x ≥ y e z ≥ w, podemos traduzir isso em: (x− y) ≥ 0 e (z − w) ≥ 0. Queremos provar que x+ z ≥ y + w, que se traduz em (x+ z)− (y + w) ≥ 0, ou, o que diz o mesmo: (x− y) + (z − w) ≥ 0. Isso e´ o que queremos. Para termos isso, podemos usar o Princ´ıpio 1, pois enta˜o com esse princ´ıpio: (x− y) ≥ 0 e (z − w) ≥ 0 ⇒ (x− y) + (z − w) ≥ 0. ii) Temos que x > 0. Caso y = z enta˜o x · y = x · z. Por isso supomos que y > z, ou seja, y − z > 0. Queremos provar que x · y > x · z, ou seja, que x · y − x · z > 0, o que e´ o mesmo que dizer que x · (y − z) > 0. Isso e´ o que queremos. Enta˜o podemos usar o Princ´ıpio 2, que da´: x > 0 e y − z > 0 ⇒ x · (y − z) > 0. iii) Temos agora −x > 0 pelo Princ´ıpio 0. Caso y = z enta˜o x · y = x · z. Por isso supomos y > z, ou seja, y − z > 0. Enta˜o o Princ´ıpio 2 da´: (−x) · (y − z) > 0, ou seja −x · y + x · z > 0, ou seja, x · y − x · z < 0, que e´ o que busca´vamos provar: x · y < x · z. iv) Temos x > 0 e suponhamos por absurdo que 1 x < 0. Enta˜o − 1 x > 0 e pelo Princ´ıpio 2: x · (−1 x ) > 0. Mas x · (− 1 x ) = −1. Logo obtemos −1 > 0 ou seja 1 < 0, que contradiz o Princ´ıpio 0. v) Seja x > 1. Suponhamos por absurdo que 1 x ≥ 1. Se 1 x = 1 enta˜o chegamos na contradic¸a˜o: 1 = x. CAPI´TULO 3. PROPRIEDADE BA´SICAS DOS NU´MEROS REAIS 35 Se 1 x > 1 enta˜o multiplicando esta desigualdade por x > 1 > 0, temos x · 1 x > x · 1 (pelo item ii) ja´ provado). Como x · 1 x = 1 pela pro´pria definic¸a˜o de 1 x e como x · 1 pela definic¸a˜o do neutro 1, obtemos 1 > x, que contradiz x > 1. Deixo para o leitor a prova das propriedades vi-xii, onde pode usar as propriedades i) - v) que ja´ foram provadas. Fac¸o a prova de xiii): Como 0 ≤ x ≤ y e 0 ≤ z ≤ w enta˜o sai primeiro que 0 ≤ x · z. Agora, para ver que x · z ≤ y · w, note que x · z ≤ y · z, pois 0 ≤ (y − x) · z. Do mesmo jeito sai que: y · z ≤ y · w, e portanto x · z ≤ y · w. � Proponho agora ao leitor o seguinte Exerc´ıcio: explicar com itens da Afirmac¸a˜o 3.1 algumas propriedades dos Gra´ficos das func¸o˜es a seguir, a saber: • por queˆ em determinado intervalo um esta´ acima ou abaixo do outro, • por queˆ isso se inverte ao passar de x = 1, 2 1 1,5 0,5 0 x 1,210,4 0,6 0,80,20 4. INTERVALOS E SUAS UTILIDADES 36 y = x em vermelho, y = x2 em verde, y = x3 em amarelo e y = x4 em azul, para x ∈ [0, 1.2] 2 1 1,5 0,8 0,5 x 1,61,41,21 1,8 y = 1 x em vermelho, y = 1 x2 em verde, para x ∈ [2 3 , 2] 4. Intervalos e suas utilidades Um intervalo I ⊂ R e´ definido como o conjunto de todos os nu´meros Reais maiores (ou iguais) a um certo nu´mero a e menores (ou iguais) que um certo b.1 Se impomos que sejam estritamente maiores que a e estritamente menores que b temos um intervalo aberto I = {x ∈ R;