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Entendeu ou quer que eu fotografe

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Entendeu ou quer que eu fotografe? Um ensaio sobre a teoria da imagem antropológica e seu uso didático.
Taiandir Vaz Penna
Graduando em Ciências Sociais
Universidade Federal de Viçosa
Resumo
Dissertando sobre as propriedades da fotografia e sobre as possibilidades técnicas da mesma, no que condiz à sua composição, procurarei realizar uma breve reflexão sobre a sua utilização na produção de material didático enquanto material antropológico. O que proponho neste Paper é que, dentro de um determinado quadro ético, a imagem pode ser produzida com fins educativos, a muito já se sabe que a comunicação não se trata de um campo restrito a língua de modo que não resta duvida de que a fotografia pode ser usada como ferramenta comunicativa, capaz de prender a atenção humana e causar reflexão, fazendo-se importante criar imagens capazes de gerar sentimentos ou ideias que levem a tal objetivo.
Palavras Chave: Fotografia, Didática, Antropologia
Introdução
Tendo como objetivo trabalhar o uso da fotografia enquanto material antropológico e didático, compõe este Paper uma breve reflexão acerca das possibilidades da fotografia antropológica e da metodologia que envolve a sua produção. Por fim, nossa reflexão nos leva a seu uso didático, tendo enquanto argumento principal a necessidade da imagem não ser uma mera ilustração do texto e sim parte da argumentação em si.
Teoria e Ética da Imagem Antropológica
Inicialmente, com base nos textos de Godolphim e Coolier, gostaria de propor a existência de duas diferentes espécies de fotografia antropológica, a de registro e a de integração, sendo a segunda a mais importante para este ensaio.
Classifico como fotografia de registro às imagens que são produzidas durante o trabalho de campo com intuito de coletar dados, sendo assim um instrumento equivalente ao caderno de campo e ao gravador. A imagem de integração por outro lado, tem como objetivo não a coleta de dados, mas a transmissão destes dados ao leitor, não sendo portanto algo que deve ilustrar o texto mas sim que o compõe, que é capaz de falar por si própria, sendo assim parte integrante da argumentação e do texto em si. 
Sabe-se que faz parte das etnografias o relato de acontecimentos, a utilização de falas de nativos, a descrição de ambientes, tudo isto para servir de evidência de que ás pessoas que estão sendo ali retratas pensam assim, agem assim, se sentem assim, a fotografia também pode ser usada nesse sentido, assim como é dito por Godolphim no seguinte trecho:
As fotos não só podem ajudar na descrição, como podem de fato reconstituir o “clima” das situações vivenciadas nas cores que elas se apresentavam, criar um ambiente de verossimilhança e, por conseguinte, de persuasão. As imagens não se deveriam limitar a “reviver” um estar lá, mas sedimentar os alicerces do caminho da descrição interpretativa e auxiliar na articulação das tramas da indução, ajudar na compreensão das interpretações, e não apenas distrair a atenção do leitor entre o folhear das páginas. (Godolphim, pag. 169)
Até o momento definimos as diferenças dessas duas formas de fotografia antropológica pela função, vamos agora distingui-las pela composição, para isso precisaremos primeiro discorrer sobre uma característica comumente atribuída a fotografia, sua validade como representação fiel do real.
Em seu artigo “Guerra de Imagens: o 11 de setembro na mídia”, Carmen Rial derruba a ideia de que está característica é própria da fotografia ao demonstrar como a mesma pode ser facilmente adequada a uma variedade ampla de discursos e , mais do que isso, que a composição da mesma também pode ser trabalhada de modo a demonstrar uma situação bem diferente da que está ocorrendo, um exemplo trazido por Rial é de que “não é difícil criar o efeito de multidão, quem filma ou fotografa sabe disso” (Pag.10).
Mas afinal, em que essa característica nos diz respeito quanto à diferenciação entre fotografia de registro e fotografia de integração? De certo modo, toda fotografia de registro é uma fotografia de integração em potencial, digo em potencial pois em algumas fotografias a mensagem que às mesmas trazem não está tão clara, e um texto deve sempre buscar-se fazer entender. Ao mesmo tempo, nem toda fotografia de integração é uma fotografia de registro e digo isso porque acredito que a fotografia de integração pode vir a ser composta, e até mesmo encenada, com o proposito exclusivo de compor o texto, o que na fotografia de registro é um problema já que se pretende utilizar a mesma para obtenção de dados quanto a realidade retratada. 
De certo modo, o que digo é que, se a fotografia já não é mais aquela ferramenta que mostra a verdade, assim como o texto não o é, sendo portanto o seu caráter de verdadeiro assegurado apenas por uma determinada ética, porque não compor imagens e situações que representem a realidade, tendo como fim auxiliar na transmissão de determinados conhecimentos, desde que limitados por essa mesma ética?
Uma vez feitos os devidos estudos e tendo a segurança de que se compreende a comunidade, sociedade ou grupo escolhido como objeto de estudo, defendo ser possível através do auxílio dos sujeitos integrantes do objeto, e das técnicas e equipamentos fotográficos adequados, compor fotografias que contribuam para entendimento do texto, É essa a principal diferença entre e fotografia de registro fotografia de integração, o que nos leva a nosso próximo ponto, a utilização didática da imagem antropológica.
A Imagem Antropológica enquanto Material Didático
A respeito da fotografia enquanto material didático, já dissemos até agora que, a fotografia pode ser utilizada na transmissão de mensagens, não apenas como maneira de ilustrar o que está sendo dito textualmente, mas também como parte da argumentação em si ou como gatilho para uma determinada reflexão. Dissemos também que a fotografia pode ser composta a fim de atingir tal objetivo, o que pode ser feito através dos equipamentos, da técnica e do auxilio de pessoas ligadas à situação retratada, sendo este ultimo ponto fundamental no que condiz a fotografia de cunho antropológico. Sabemos que a antropologia contemporânea trabalha a partir da ideia de que uma cultura deve sempre ser entendida a partir da perspectiva de quem está nela inserida, sendo assim, no que diz respeito ao auxilio de pessoas ligadas às manifestações culturais a serem estudadas, pode-se tanto buscar a interpretação das mesmas sobre as imagens produzidas quanto a sua ajuda na identificação de situações cuja retratação possa ser importante. 
A respeito do equipamento e da técnica, lentes ou filtros podem criar efeitos capazes de mudar completamente o entendimento da imagem, desviando o foco de atenção para um ou outro componente da mesma, outro modo de se alcançar tal efeito é através de ângulos diferentes ou de uma iluminação adequada. 
Sabendo por fim que a educação se trata de um processo, chegamos também à necessidade de se planejar esse processo, afim de que o mesmo seja efetivo e tenha seus objetivos alcançados. Cabe-nos, portanto, inserir a produção da imagem dentro desde contexto de planejamento, pensando a intencionalidade a partir do publico a que a imagem se direciona, do que desejamos que esse publico aprenda ou reflita a partir da imagem, e qual caminho seguiremos para isso. Temos a partir deste ponto uma ampla gama de possibilidades de composição, imagens que geram compaixão pela beleza, que geram identificação com o outro através de um sentimento ou situação, que geram reflexão a partir de uma situação não usual, que fazem com que o observador se sinta presente na cena, e tantos outros modos que não convêm tentar identifica-las agora.
Certas imagens necessitam de um cuidado maior para serem trabalhadas, imagens que evocam preconceitos podem ser um problema se utilizadas sem auxilio de algo que faça com que o publico alvo reflita sobre isto, imagens que chocam podem causar repulsa, o que pode ser benéfico se a imagem retratar, por exemplo, uma cena de abuso e a repulsa causadapela imagem se dirigir ao abuso. Podemos ver assim que não nos faltam possibilidades, basta que pensemos o processo educativo e coloquemos nossa criatividade em prática. 
Conclusão
Múltiplos são os meios pelos quais pode ser efetuado o processo educativo, independentemente de qual se escolha é sempre importante manter em mente a ideia de que trata de um processo e que, portanto necessita de Planejamento. Desde que se leve em consideração esta necessidade, é certo que a fotografia só tem a acrescentar a educação, fazendo-se, porém, necessário que sejam produzidas ou selecionadas imagens cuja composição se adeque ao objetivo do processo educativo. De certo modo, após vermos ao longo deste ensaio as diversas possibilidades que nos traz a fotografia, utilizar a mesma meramente como recurso ilustrativo chega a ser um desperdício do potencial que a mesma possui enquanto instrumento didático. Além disso, em uma sociedade na qual imagens são produzidas com uma intensidade cada vez maior, saber interpretar tais imagens com um olhar crítico torna-se fundamental para a formação de indivíduos que o, idealizados, devem ser capazes de analisar criticamente mundo a sua volta, tornando-se assim não meros espectadores deste, mas agentes de sua transformação.
Referencias
RIAL, Carmen. Guerra de Imagens: o 11 de setembro na mídia. Antropologia em primeira mão, Florianópolis, 2003.
COLLIER Jr., John. Antropologia Visual: a fotografia como método de pesquisa. São Paulo: EPU, 1973 [Cap. I, V, VII]
GODOLPHIM, Nuno. A fotografia como recurso narrativo: problemas sobre a apropriação da imagem enquanto mensagem antropológica. Horizontes Antropológicos, Por alegre, ano 1, n. 2, p. 161-185, jul./set. 1995.

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