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Cristiane Brandão. Emerj, fev/2016 “O erro relevante em Direito Penal é aquele que vicia a vontade, causando uma falsa percepção da realidade, e também aquele que vicia o conhecimento da ilicitude. Nesses termos, o erro tanto pode incidir sobre os elementos estruturais do delito – erro de tipo – quanto sobre a ilicitude da ação – erro de proibição” (Bitencourt) “O erro, em termos jurídico-penais, inclui a ignorância. Portanto, é tão relevante para o Direito Penal ter compreendido uma situação equivocadamente quanto não tê-la, absolutamente, compreendido ou percebido “ (Busato) “O erro é a falsa representação da realidade ou o falso conhecimento de um objetivo (trata-se de um estado positivo); a ignorância é a falta de representação da realidade ou o desconhecimento total do objeto (trata-se de um estado negativo) (...). No terreno jurídico, prevalece a unidade dos dois conceitos (teoria unitária). Portanto, tanto faz errar quanto ignorar, pois a consequência poderá ser a configuração do erro de tipo ou de proibição” (Nucci) Erro de tipo: sobre os elementos constitutivos do tipo penal (art. 20) de tipo incriminador (essencial) – Caput de tipo permissivo – Par. 1º. Erro de proibição: sobre a ilicitude do fato (art. 21) Direto Indireto Mandamental Obs. Outras espécies de erro: error in objecto, error in persona (art. 20, par.3º), aberratio ictus (art. 73), aberratio criminis (art. 74), aberratio causae. São erros acidentais. Erro sobre elementos do tipo Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. Descriminantes putativas § 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo. Erro determinado por terceiro § 2º - Responde pelo crime o terceiro que determina o erro. Erro sobre a pessoa § 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. Erro sobre a ilicitude do fato Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência. “Descriminantes são excludentes de ilicitude; putativo significa imaginário, suposto, aquilo que aparenta ser verdadeiro. Portanto, as descriminantes putativas são as excludentes de ilicitude que aparentam estar presentes em uma determinada situação, quando, na realidade, não estão” (Nucci) “São várias as possibilidades de que o erro incida sobre a situação de justificação. Como bem alertava Assis Toledo, ‘o erro sobre uma causa de justificação pode recair sobre os pressupostos fáticos dessa mesma causa (‘supor situação de fato’), mas pode também – isto é inegável e aceito em doutrina – recair não sobre tais pressupostos fáticos, mas sobre os limites, ou a própria existência, da causa de justificação (‘supor estar autorizado’)’. Nesses casos, aparece o que a doutrina denomina de erro de permissão – que incide sobre a existência ou os limites jurídicos da causa de justificação – e o erro de tipo permissivo, incidente sobre os pressupostos fáticos da causa de justificação” (Busato) Erro quanto aos pressupostos fáticos de uma causa de justificação Erro quanto à existência de uma causa de justificação Erro quanto aos limites de uma causa de justificação “Quanto às duas últimas situações (erro quanto à existência ou quanto aos limites da excludente), é pacífica a doutrina, admitindo tratar-se de uma hipótese de erro de proibição. Entretanto, em relação à primeira situação (erro quanto aos pressupostos fáticos da excludente), não chega a doutrina a um consenso, havendo nítida divisão entre os defensores da teoria limitada da culpabilidade, que considera o caso um típico erro de tipo permissivo, permitindo a exclusão do dolo, tal como se faz com o autêntico erro de tipo, e os que adotam a teoria extremada da culpabilidade, que considera o caso um erro de proibição, logo, sem exclusão do dolo” (Nucci) “Sob a denominação de descriminantes putativas”, a doutrina identifica as hipóteses em que o indivíduo orienta sua conduta conforme falsa representação da realidade sobre a ocorrência de uma causa justificante. A importância do problema está relacionada com as consequências que se devem atribuir à conduta que se orienta por essa espécie de erro. (...)A solução do problema exige tomar uma posição política quanto aos efeitos práticos a serem impostos no caso de erro. Para tanto, a doutrina concebeu várias teorias, entre as quais duas obtiveram posição de destaque pelos efeitos diametralmente opostos que propõem: a teoria extremada (ou estrita) da culpabilidade e a teoria limitada da culpabilidade” (Galvão, grifo nosso) “A teoria estrita da culpabilidade (strenge Schuldtheorie) entende que todas as formas de erro incidente sobre a valoração a respeito do injusto devem afetar a culpabilidade. A exclusão ou não da culpabilidade por erro quanto à consciência da ilicitude fica condicionada à escusabilidade ou não do erro. Assim, tanto o erro de proibição direto quanto o erro de proibição indireto, que é nada mais do que a descriminante putativa, devem igualmente ser tratados como erros de proibição” (Busato) A teoria limitada da culpabilidade (eingeschränkte Schuldtheorie) “propõe a adoção de diferentes soluções conforme o erro diga respeito a avaliação jurídica ou fática (recuperando, nessa medida, em caráter interno, a dicotomia erro de fato/erro de direito)” (Busato) Teoria dos elementos negativos do tipo: “considera as causas de justificação como integrantes do tipo e, consequentemente, seus pressupostos como características negativas do tipo. Assim, qualquer erro sobre elas constitui erro de tipo” Teoria da culpabilidade que orienta às consequências: “O erro de tipo permissivo, segundo a moderna visão da culpabilidade, não é um erro de tipo incriminador excludente do dolo nem pode ser tratado como erro de proibição: é um erro sui generis”. Exclui-se a culpabilidade dolosa, mas permite a culpabilidade culposa, se prevista em lei, em caso de erro vencível. (LFG) “(...)Definiu-se a evitabilidade do erro em função da consciência potencial da ilicitude (parágrafo único do art. 21), mantendo-se no tocante às descriminantes putativas a tradição brasileira, que admite a forma culposa, em sintonia com a denominada ‘teoria limitada da culpabilidade’” Repete o Projeto as normas do Código de 1940, pertinentes às denominadas ‘descriminantes putativas’. Ajusta-se, assim, o Projeto à teoria limitada da culpabilidade, que distingue o erro incidente sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação do que incide sobre a norma permissiva. Tal como no Código vigente, admite-se nesta área a figura culposa (art. 17, §1º.) “(...)RECURSO DEFENSIVO REQUERENDO A ABSOLVIÇÃO DO RÉU, EM VIRTUDE DO RECONHECIMENTO DE TER AGIDO O MESMO EM LEGITIMA DEFESA PUTATIVA POR ERRO ESCUSÁVEL, AO ARGUMENTO DE QUE O DISPARO DE ARMA DE FOGO QUE ATINGIU A VÍTIMA NA SUA PERNA ESQUERDA SE DEU EM VIRTUDE DO COMPORTAMENTO DO PRÓPRIO OFENDIDO, EIS QUE O MESMO DESOBEDECEU A ORDEM DE PARADA, EMPREENDENDO FUGA DO LOCAL DAABORDAGEM, E AINDA PROCEDEU A MOVIMENTO SUSPEITO, CONSISTENTE EM COLOCAR A MÃO POR DEBAIXO DE SUA BLUSA, DANDO AZO A ESCUSÁVEL SUPOSIÇÃO DE SITUAÇÃO DE IMINENTE RISCO DE AGRESSÃO INJUSTA EM RELAÇÃO AO APELANTE(...)A CONTROVÉRSIA PRINCIPAL INCIDE SOBRE O RECONHECIMENTO DE LEGITIMA DEFESA PUTATIVA (ERRO DE FATO). DIANTE DA NARRATIVA DE COMO SE DEU A OCORRÊNCIA POLICIAL, E AO SE DAR CREDIBILIDADE A TESE DE DEFESA DO ACUSADO, NO QUE DIZ RESPEITO A ATITUDE ADOTADA PELA VITIMA AO SUPOSTAMENTE REALIZAR O MOVIMENTO DE LEVAR A MÃO À CINTURA DURANTE A FUGA EMPREENDIDA, INDICANDO ESTAR POSSIVELMENTE ARMADO, EFETIVAMENTE ESTARÍAMOS DIANTE DO QUE A DOUTRINA DENOMINA COMO DESCRIMINANTE PUTATIVA, OU LEGITIMA DEFESA PUTATIVA(...) NÃO SE PODE DEIXAR DE CONSIDERAR QUE DIANTE DAS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS EM QUE SE ENCONTRAVA O ACUSADO NAQUELE MOMENTO, USOU O MESMO DOS MEIOS QUE DISPUNHA PARA REPELIR O QUE LHE PARECIA INJUSTA AGRESSÃO. ASSIM NÃO VEJO COMO PUNIR, CRIMINALMENTE, QUEM SUPÕE, RAZOAVELMENTE DIANTE DAS CIRCUNSTÂNCIAS, AGIR DE ACORDO COM A LEI. CONSTATA-SE, POIS, QUE O DELITO DE LESÃO CORPORAL NÃO RESTOU TIPIFICADO NO CASO DOS AUTOS, POIS TEMOS COMO CERTO O ERRO PLENAMENTE ESCUSÁVEL DO ACUSADO QUANTO AO FATO QUE TORNARIA SUA AÇÃO LEGÍTIMA, CIRCUNSTÂNCIA QUE AFASTA SUA CULPABILIDADE, E A INCIDÊNCIA DO ART. 209, CAPUT DO CPM. EM SÍNTESE, A PROVA COLIGIDA AOS AUTOS REVELA, INAPELAVELMENTE, QUE O ACUSADO SUPUNHA SER SUA AÇÃO LEGITIMA. E, AINDA QUE HOUVESSE DÚVIDA A ESSE RESPEITO, ELA SE DECIDIRIA EM FAVOR DO ACUSADO EM HOMENAGEM AO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO DA D. PROCURADORIA DE JUSTIÇA, NO SENTIDO DE SER ABSOLVIDO O APELANTE. DÚVIDA QUE NÃO DEVE AMPARAR A CONDENAÇÃO E SIM BENEFICIAR O RÉU/APELANTE. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO QUE FUNCIONA COMO CRITÉRIO DE RESOLUÇÃO DA INCERTEZA, IMPONDO-SE COMO EXPRESSÃO DO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA”. TJRJ, Apelação 0006979-58.2009.8.19.0001, 7ª Câm. Crim., 28/08/2012 (grifo nosso) “APELAÇÃO CRIMINAL. DISPARO DE ARMA DE FOGO. RÉU CONDENADO COMO INCURSO NO ART. 15 DA LEI 10.826/03 A 02 (DOIS) ANOS DE RECLUSÃO E 24 DIAS- MULTA, EM REGIME ABERTO, CONVERTIDA A SANÇÃO PRIVATIVA EM PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. IRRESIGNAÇÃO RECURSAL PRETENDENDO VER RECONHECIDA A LEGÍTIMA DEFESA REAL OU A DESCRIMINANTE PUTATIVA DO ART. 20, § 1º, DO CP POR ERRO DE TIPO PERMISSIVO. IMPOSSIBILIDADE. A PROVA DOS AUTOS, EM NENHUM MOMENTO, AUTORIZA RECONHECER AS TESES DEFENSIVAS QUE PRECISARIAM ESTAR DESMONSTRADAS POR FORÇA DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA QUANTO A QUE O RÉU SE DEFENDIA DA AGRESSÃO INJUSTA ATUAL, OU PUDESSE SUPOR SITUAÇÃO DE FATO QUE SE EXISTISSE TORNARIA A SUA AÇÃO LEGÍTIMA. RÉU QUE EFETUOU DISPAROS NA DIREÇÃO DE UM CASAL DE VIZINHOS E QUE ALEGOU A PRESENÇA DE DOIS MOTOQUEIROS QUE ESTARIAM VINDO ROUBÁ-LO, PERSONAGENS EM NENHUM MOMENTO OBSERVADOS PELAS VÍTIMAS E CUJA EXISTÊNCIA SÓ FOI MENCIONADA NO DEPOIMENTO DA COMPANHEIRA DO APELANTE. AUSÊNCIA DE CONJUNTO FÁTICO SUFICIENTE A AUTORIZAR O ERRO SUI GENERIS CONSEQUÊNCIA JURÍDICA DA ISENÇÃO DE PENA. LEGÍTIMA DEFESA REAL TAMBÉM INDEMONSTRADA”. TJRJ, Apelação 0280946-55.2009.8.19.0001, 1ª. Câm. Crim., 28/02/2012 (grifo nosso) STJ: Recurso de Habeas Corpus nº 2.300-8 - Relator Ministro Assis Toledo: Erro de tipo permissivo. Vítima que, ao tentar abrir, por equívoco, porta de carro alheio, induziu o proprietário, com auxílio de outrem, a reagir violentamente, supondo tratar-se de furto. Legítima defesa putativa do patrimônio, excludente do dolo, em relação à acusação de lesão corporal (art. 20, § 1º do CP). Ausência de resíduo culposo. Recurso de habeas corpus a que se dá provimento para conceder a ordem e trancar a ação penal. (grifo nosso) CRISTINALDO e ADINALDO foram denunciados pelo Ministério Público porque agrediram fisicamente RONALDO, produzindo- lhe lesões corporais graves. O fato se deu da seguinte forma: RONALDO se dirigiu ao veículo VW/Fusca a pedido do proprietário, Sr. JOÃO, para pegar um pacote que lá se encontrava. Ao aproximar-se de um veículo com as mesmas características que lhe foram fornecidas e tentar abri-lo, foi surpreendido pelos denunciados (reais proprietários do veículo violado), os quais passaram a agredir a vítima com socos e pontapés, só sendo interrompidos pela chegada de JOÃO, que esclareceu o ocorrido. A defesa dos acusados pleiteia a absolvição, alegando que os réus agiram na legítima defesa do patrimônio. Decida a questão. STJ: Recurso de Habeas Corpus nº 2.300-8 - Relator Ministro Assis Toledo: Erro de tipo permissivo. Vítima que, ao tentar abrir, por equívoco, porta de carro alheio, induziu o proprietário, com auxílio de outrem, a reagir violentamente, supondo tratar-se de furto. Legítima defesa putativa do patrimônio, excludente do dolo, em relação à acusação de lesão corporal (art. 20, § 1º do CP). Ausência de resíduo culposo. Recurso de habeas corpus a que se dá provimento para conceder a ordem e trancar a ação penal. O tema da descriminante putativa é um dos mais relevantes em matéria de erro penal. Nesta senda costuma-se falar em "erro de tipo permissivo" e "erro de permissão". Diante do tema apresentado, discorra sobre a natureza dos erros citados, suas consequências, as teorias sobre o tema e aquela que foi adotada pelo Código Penal.
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