Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Ciência Política DEMOCRACIA DELIBERATIVA 1 Sumário Introdução ...........................................................................................................................................2 Objetivos ..............................................................................................................................................2 1. Democracia e Deliberação.........................................................................................................2 1.1. Democracia, Liberalismo e Republicanismo .......................................................................3 1.2. Democracia Deliberativa .......................................................................................................5 Exercícios .............................................................................................................................................7 Gabarito ...............................................................................................................................................8 Resumo ................................................................................................................................................9 2 Introdução A democracia é o regime político em que os cidadãos participam na proposição, desenvolvimento e criação de leis, exercendo o poder de governo, diretamente ou através de representantes eleitos. A evolução conceitual da democracia fez com que, na modernidade, ela tenha ganhado uma forma no modelo de "democracia deliberativa", tal como é descrita por Jürgen Habermas. Esse pensador descreve seu modelo como um processo de deliberação política de caráter democrático, que tem como característica pressupostos teórico-normativos que incorporam a participação da sociedade civil na regulação das relações coletivas. SAIBA MAIS! Objetivos • Conhecer os conceitos de democracia liberal e republicana; • Compreender como funciona a democracia deliberativa. 1. Democracia e Deliberação Existem diversas linhas interpretativas acerca das formas de composição e funcionamento dos regimes políticos democráticos. Atualmente, uma das mais importantes interpretações é a realizada por Jürgen Habermas, que examina a democracia a partir de duas premissas de caráter político, uma de procedência liberal e outra de base conceitual republicana. No pensamento habermasiano, destaca-se o conceito de ação comunicativa enquanto instrumento de análise teórica e epistêmica da ação racional, como sistema que opera a sociedade. A ação comunicativa tem como objetivo propor uma alternativa racional à noção de razão instrumental como fundamento da modernidade, por meio da ampliação e refinamento da ideia de razão. 3 1.1. Democracia, Liberalismo e Republicanismo Na perspectiva de Habermas, a democracia é um sistema político em que forças sociais disputam o poder e em que, numa concepção liberal, a política é percebida como processo democrático de programação do Estado, conforme o interesse da sociedade. Isto é, o ato de fazer o aparato da administração pública atender aos anseios do sistema social. Por sua vez, em uma concepção republicana, a política é formadora da sociedade como um todo. Nesse sentido, ela auxilia os membros da comunidade, para que, agindo em solidariedade, percebam sua dependência recíproca e, conscientes disso, se associem, portando direitos de liberdade e igualdade, a partir de onde exerçam uma força integradora na busca de entendimento entre os cidadãos. FIQUE ATENTO! EXEMPLO! A aplicação da teoria da ação comunicativa de Habermas encontra limitações quando aplicada a sociedades profundamente desiguais. Isso porque a comunicação e perfeita inteligibilidade dos comunicantes pressupõe condições de igualdade que permitam a compreensão de símbolos e significados. Em sociedades desiguais, as diferentes referências materiais e simbólicas dificultam essa comunicação e subsequente compreensão. A teoria que embasa a noção de “democracia deliberativa” é de fácil aplicação quando consideradas sociedades como as europeias, em que o caráter menos heterogêneo da vida social permite uma maior compreensão nas relações de comunicação e uma maior confiança nas instituições públicas. Nas sociedades menos desenvolvidas economicamente, a profunda desigualdade coloca os indivíduos em diferentes posições sociais, o que dificulta a sua comunicação e percepção sobre as instituições, por conseguinte, limitando o alcance da teoria. 4 Consequentemente, a análise de conceitos como “cidadão”, “direito” e “processo político” são centrais. a) Cidadão. Na concepção liberal de cidadão, o status dos indivíduos é definido pelo conjunto de direitos subjetivos que eles dispõem diante do Estado e dos demais cidadãos. São direitos subjetivos: o direito à proteção do Estado, a liberdade de agir por interesses próprios, nos limites da lei. Nesse sentido, os direitos políticos permitem a mediação de interesses privados, por meio de eleições, a fim de compor o parlamento ou o governo, em posição capaz de exercer influência sobre a administração. Por sua vez, na concepção republicana, os direitos dos cidadãos são uma liberdade positiva na participação comum, como sujeitos políticos responsáveis, em uma comunidade de pessoas livres e iguais. b) Direito. Enquanto a concepção republicana de direito faz referência a uma personalidade jurídica portadora de direitos subjetivos, a concepção liberal é de que a ordem jurídica assegure integridade, igualdade de direitos, autonomia e respeito mútuo entre os cidadãos. Enquanto na primeira prevalece uma concepção subjetiva, a segunda se apoia em uma concepção objetiva do direito. Na concepção republicana, a integridade do indivíduo está condicionada à integridade da comunidade. É o que se depreende da constituição democrática da lei, que se impõe ao que é pessoal. Enquanto, pelo ponto de vista republicano, o direito é a manifestação da vontade política prevalecente, o viés liberal sustenta que o direito é fundado em uma lei superior, estrutural e transcendental, que limita e viabiliza a satisfação de interesses diferentes e conflitantes. c) Processo político. Conforme o ponto de vista liberal, a política é a luta por posições e pela capacidade de dispor do poder administrativo. É a formação de opinião e de vontade, na esfera pública e no parlamento, por meio da disputa por aquisição e conservação de poder. O êxito é mensurado pelo desempenho eleitoral, que orienta as atitudes dos partidos políticos. Tem como meio a barganha, não o argumento, tendo por instrumento de persuasão a oferta condicional de serviços ou abstenções. 5 IMPORTANTE! Do ponto de vista republicano, a formação da vontade política no espaço público e no parlamento tem estruturas específicas, diferentes das que se verificam no mercado. "São elas as estruturas de uma comunicação pública orientada para o entendimento." (Habermas, J., 1993), isto é, uma política de autodeterminação cidadão orientada para o diálogo. 1.2. Democracia Deliberativa Pela perspectiva ora abordada, a democracia deliberativa é uma alternativa que incorpora algumasdas vantagens da democracia republicana: a) a auto-organização por cidadãos unidos comunicativamente, orientados para fins coletivos e a superação de interesses individuais conflitantes; b) valorização da compreensão dos diferentes grupos que compõem a nação, ocultando interesses e orientações valorativas de formas de vida compartilhadas intersubjetivamente; c) atribui grande importância aos compromissos entre partidos, que pressupõe disponibilidade e cooperação, de modo que o resultado do jogo político possa ser aceito por todas as partes. Assim, afirma-se a justiça, na medida em que se guarda conformismo com princípios morais de validade geral, além da comunidade jurídica concreta. A política deliberativa somente existe na medida em que reconhece a pluralidade nas formas de comunicação, em que a vontade comum se forma pelo equilíbrio de interesses e compromissos, mediante a escolha racional de meios em relação a um fim. Em bibliografia complementar, uma importante distinção é apontada por Leonardo Avritzer em “Teoria Democrática e Deliberação Pública” (2000), que identifica, nos modelos democráticos deliberativos, um duplo significado da noção de deliberação, pois inclui a reflexão sobre a melhor forma de agir e a tomada de decisão em si. 6 Para a análise comparativa dos modelos descritos a partir dos pressupostos apresentados, apresentam-se concepções normativas do Estado e da sociedade. Na concepção republicana, a formação da opinião e da vontade política dos cidadãos é o meio para que a sociedade se constitua como um todo politicamente organizado. A autodeterminação política do cidadão conjuntamente com sua comunidade, constitui uma vontade coletiva que age sobre si mesma. CAI NA PROVA! Por sua vez, a democracia deliberativa também incorpora elementos da concepção democrática liberal, que permite a transposição da relação que a sociedade tem com o aparato estatal, pois o equilíbrio de poderes requer uma representação no Estado de direito. A formação democrática da vontade comum, por cidadãos preocupados com interesses próprios, são um elemento da constituição que deve disciplinar o poder do Estado, mediante dispositivos normativos como os direitos fundamentais, a separação de poderes e subordinação da administração pública à lei. Logo, a perspectiva liberal não se apoia na autodeterminação democrática dos cidadãos, mas na normatização da sociedade centrada na economia, a fim de atender à expectativa de pessoas privadas empreendedoras, assegurando um bem comum que é apolítico. PRATIQUE! Escolha um país que se define como “democracia” e descreva algumas características desse sistema de organização política. Por exemplo: Para quais dos poderes são eleitos representantes? Como funciona e é organizado o Poder Legislativo? Como os poderes Legislativo e Executivo se relacionam, a fim de governar? A partir da bibliografia examinada, fique atento à noção de “razão” em Habermas. Para esse pensador, a razão é construída de maneira dialógica, na qual cada interlocutor levanta uma pretensão de validade dos seus enunciados sobre fatos, normas e vivências, na expectativa de que o outro possa contestá-lo com argumentos. 7 Exercícios 1 – Leia o fragmento de texto, e responda a alternativa correta, conforme a reflexão proposta pelo enunciado. "A primeira metade do século XX foi um momento de crise profunda da democracia. Max Weber foi o teórico social cuja obra melhor expressou o ceticismo de início do século em relação à democracia. Weber antecipou, na sua obra, duas questões que se tornariam, ao longo da primeira metade do século XX, elementos de uma concepção decisionista de deliberação". (AVRITZER, Leonardo. Teoria Democrática e Deliberação Pública. 2000. p. 3). A partir do fragmento de texto e da reflexão sobre as democracias deliberativas, assinale a alternativa que melhor expressa a crise das democracias Europeias na primeira metade do século XX. a) Na primeira metade do século XX, a crise do modelo democrático ficou marcada pelo enfraquecimento político das agremiações partidárias; b) Foi um período de ceticismo em relação ao debate envolvendo tradições culturais distintas, e de descrença na solução democrática das diferenças; c) Na primeira metade do século XX, as democracias liberais entraram em crise em razão do acirramento e fortalecimento dos debates parlamentares, representando uma elevação de diferenças e conflitos na própria sociedade; d) Foi um período de confiança em relação ao potencial das democracias parlamentares de resolver, pela via democrática, seus conflitos. 2 – Lei o fragmento de texto, e responda a alternativa correta, conforme a reflexão proposta pelo enunciado. "O ceticismo em relação às formas argumentativas de deliberação, que tem sua origem em Weber, irá se acentuar ao longo da primeira metade do século XX, na medida em que a democracia como forma de organização política entra em crise na Europa." (AVRITZER, Leonardo. Teoria Democrática e Deliberação Pública. 2000. p. 6). Assinale a alternativa que melhor descreve como a noção contemporânea de “democracia deliberativa” supera a ideia de ceticismo, na perspectiva de Max Weber. a) As democracias deliberativas incorporam elementos liberais e republicanos, como a liberdade de expressão e a pedagogia cívica que permite que os indivíduos atuem na vida política tendo por premissa a racionalidade política. b) As democracias deliberativas incorporam elementos apenas da perspectiva republicana, sobretudo a noção de agentes cujos interesses são voltados para a comunidade e o interesse público. 8 c) As democracias deliberativas incorporam elementos liberais e republicanos, como a formação da vontade por interesses próprios que auxiliam a construção do poder disciplinas do Estado, e a auto- organização dos cidadãos que se orientam para fins coletivos resolvendo interesses pessoais conflitantes. d) As democracias deliberativas incorporam elementos apenas da perspectiva liberal, sobretudo a valorização das liberdades individuais, cujos conflitos são facilmente administrados pelo sistema democrático. 3 – No que se refere ao entendimento de democracias deliberativas, o conceito de processo político é central. A partir da abordagem proposta por de J. Habermas em “Três modelos normativos de democracia” (1993), assinale a alternativa que melhor descreve a noção de processo político nas democracias deliberativas. a) O processo político é a luta por posições e pela capacidade de dispor do poder administrativo. O êxito é mensurado pelo desempenho eleitoral, que orienta as atitudes dos partidos políticos. b) O processo político é consequência das ações dos indivíduos que na esfera pública coordenam suas ações a fim de alcançar benefícios coletivos. c) O processo político é a luta por posições e pela capacidade de dispor do poder democrático. O êxito é mensurado pelo desempenho político, que orienta as atitudes dos indivíduos em sua atuação política. d) O processo político é a resultante das ações dos indivíduos, tendo em vista atender interesses públicos e privados que são desejados coletivamente. Gabarito 1 – Reposta correta: B – Em Weber, nas sociedades europeias da primeira metade do século XX, ficaram marcadas pelo acirramento das diferenças culturais, dificultando a solução democrática das diferenças sociais. 2 – Reposta correta: C – A alternativa é a que melhor descreve elementos liberais e republicanos constituintes das democracias deliberativas contemporâneas,a partir da perspectiva de Jürgen Habermas. 3 – Reposta correta: A – A incorporação de elementos liberais e republicanos ao modelo democrático deliberativo favoreceu a formação de um sistema em que os indivíduos disputam posições no poder administrativo governamental, o êxito nessa disputa é mensurado pelo desempenho dos partidos na disputa eleitoral. 9 Resumo Esta apostila abordou a noção de democracia deliberativa pela perspectiva de Jürgen Habermas. Para tanto, ele orienta sua argumentação pela oposição entre as perspectivas democráticas de república e de liberalismo. Nesse sentido, delimita, por meio desta oposição, os conceitos de cidadania, direito e processo político. Por conseguinte, apresenta como características de seu modelo de democracia a auto-organização comunicativa dos cidadãos, a auto compreensão intersubjetiva e a cooperação entre partidos e forças políticas. Os regimes democráticos podem funcionar de diversas formas, dependendo do país. Para Habermas, a democracia é um sistema em que há disputa de forças com base no conceito liberal, ou seja, faz parte do funcionamento do Estado. Já a concepção republicana diz respeito à sociedade como um todo. É importante lembrar que a noção de república está baseada nos ideais da Revolução Francesa: igualdade, liberdade e fraternidade. São estes valores que orientam o funcionamento dos países que adotam o sistema republicano. Nesta concepção, todos são membros do Estado e devem colaborar com os outros, portanto existe uma interdependência entre os cidadãos. 10 Referências bibliográficas HABERMAS, J. Três modelos normativos de democracia, Lua Nova, n. 36, 1995, pp. 39-53. AVRITZER, L. Teoria democrática e deliberação pública, Lua Nova, n. 49, 2000, p. 25-46.
Compartilhar