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AULA 2 DIDÁTICA DO ENSINO E AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM EM LÍNGUA ESTRANGEIRA Profª Edna Marta 02 CONVERSA INICIAL Olá! Esta é nossa segunda aula da disciplina Didática do ensino e avaliação da aprendizagem em língua estrangeira e, para darmos continuidade aos nossos estudos, hoje abordaremos os movimentos pós-comunicativos e a sala de aula de língua estrangeira. Dentro desse tema guarda-chuva, inicialmente serão apresentados alguns dos movimentos pós-comunicativos na área de ensino e aprendizagem de língua estrangeira. Vale ressaltar que o objetivo aqui não é priorizar algumas abordagens citadas, mas fazer com que você, professor ou professora de língua estrangeira, faça uma reflexão e perceba o trabalho que tem desenvolvido com seus alunos. Na sequência, discutiremos a respeito dos aspectos mais relevantes que se fazem presentes na sala de aula de língua estrangeira, como o ensino das quatro habilidades: escrita, leitura, compreensão auditiva e produção oral. Por fim, vamos falar sobre algumas questões que influenciam o ensino e aprendizagem em língua estrangeira. Está pronto? Então, vamos lá! CONTEXTUALIZANDO As discussões trazidas para o âmbito do ensino e aprendizagem de língua estrangeira ganharam força por meio da abordagem comunicativa (AC) do início da década de 1980. Conforme vimos, ao longo da história, o ensino de uma língua estrangeira teve seu foco, durante muito tempo, na concepção de língua como código, estrutura. Acreditava-se que o domínio da gramática seria a garantia para que a aprendizagem de uma língua estrangeira se concretizasse de fato. Com as pesquisas de Hymes, Widdowson e Wilkins, introduziu-se uma nova concepção de o quem vem a ser comunicativo. O resultado disso é que outras preocupações foram trazidas para dentro da sala de aula de língua estrangeira, e o foco passou a ser, efetivamente, o aluno, na interação ou nas suas necessidades individuais de acordo com seu estilo de aprendizagem. Isso também acabou por acarretar outros desdobramentos em se tratando de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras, especialmente com relação aos cursos e aos materiais didáticos utilizados, que passaram a ser revistos. Com isso, surgiram outros tipos de abordagens, as abordagens por conteúdo ou tarefas, as participativas, a centralização dos cursos no aluno, o ensino de gramática lexicalizada, atividades 03 que envolvem o trabalho colaborativo, o interesse pelas inteligências múltiplas, o ensino temático, a interculturalidade e o desenvolvimento de projetos na escola. Em termos acadêmicos, esse movimento, trazido com os movimentos pós- comunicativos, fez surgir o ensino reflexivo e um maior interesse pelo desenvolvimento de pesquisas em sala de aula. Em vez de se tentar comprovar a eficácia de um método ou uma abordagem, a preocupação agora é compreender os ambientes escolares e os sujeitos envolvidos nos processos de ensino e aprendizagem de língua estrangeira. Também passou a ser considerada a heterogeneidade da linguagem, da cultura e do conhecimento nos ambientes de ensino de língua. Aí temos, em traços gerais, o panorama formado na era pós-comunicativa, cujos frutos puderam ser observados nas abordagens que sucederam a AC. Vamos ver quais são? TEMA 1 – ALGUMAS ABORDAGENS DE ENSINO DE LE E TREINAMENTO DAS ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM Começaremos pela primeira abordagem: aquela que é baseada em conteúdos (task-based approach) variados para o ensino de língua estrangeira. A proposta desta abordagem é utilizar as outras áreas de conhecimento para o ensino de línguas. Pode parecer uma inovação, mas esse não é um conceito novo. Um exemplo clássico disso são os cursos de línguas organizados em torno do desenvolvimento de certas características, tais como para uma profissão em específico (inglês para advogados, para secretários) ou para uma disciplina acadêmica. A contribuição desta abordagem reside no fato de integrar o ensino simultâneo de língua estrangeira a outra área do conhecimento. Aqui, o foco da aula não é mais o ensino da linguagem de forma isolada. A língua passa a ser o meio de expressão de ideias relevantes e de interesse dos aprendizes. Há um envolvimento dos aprendizes, no sentido de que devem ser capazes e ter autonomia para dar conta de certos assuntos que são expostos e discutidos na língua-alvo. Nesse sentido, a abordagem baseada em tarefas não fica muito distante da proposta baseada no conteúdo. A diferença está no fato de que é apresentada ao aluno uma tarefa que deverá ser executada, e, para atingir o objetivo proposto, o aluno deverá executar uma série de atividades. Na abordagem por tarefas, o processo de aprendizagem é visto como um conjunto de tarefas comunicativas 04 ligadas aos objetivos curriculares de um curso. Tal como a abordagem por tarefas, pretende-se aqui dar ao aluno um contexto natural de aprendizagem, uma vez que há grandes possibilidades de interação. Para realizar a tarefa, parte-se da premissa de que o aluno precisa trabalhar com o outro para se compreenderem mutuamente e também para que possam se expressar. A próxima abordagem que vamos tratar é conhecida como abordagem participativa. Apesar de ter sido mais amplamente utilizada na década de 1980, faz-se necessário lembrar que suas origens estão na década de 1960, com a proposta de Paulo Freire para a educação. Ao propor a participação efetiva do aluno no ensino de primeira língua, Freire tinha, como objetivo, engajar o aluno em problemas relacionados ao seu cotidiano e à sua vida. Desta forma, ao refletir sobre seus próprios problemas, Freire espera que os alunos encontrem condições de melhorar suas vidas, por meio de mudanças e atitudes e tomada de decisões. Isso promoveria, no aluno, maior controle sobre sua própria vida. Sendo assim, podemos perceber que a abordagem participativa se aproxima em muito da abordagem baseada em conteúdo, pois surge a partir de um interesse específico do aluno, ou seja, o tema tratado deve ser significativo para ele. Essas três abordagens, ainda que sejam diferentes em alguns aspectos em termos de ensino, tinham em comum a preocupação com o desenvolvimento da comunicação. Em vez de os alunos aprenderem a usar a língua estrangeira, eles usam a língua estrangeira para aprender alguma coisa. Uma consequência natural disso seria, portanto, a aprendizagem de língua. Quando pensamos na abordagem comunicativa, as abordagens por conteúdo e tarefas são as mais utilizadas, o que obriga o professor a pensar, com muito cuidado, sobre as técnicas que vai aplicar em sala de aula e que estejam de acordo com os seus propósitos pedagógicos. A próxima abordagem que vamos tratar é a abordagem lexical, e, nessa abordagem, Michel Lewis é um nome de referência. Para esse pesquisador, o léxico, o vocabulário, tem um papel central no ensino de língua estrangeira, a ponto de questionar as bases sólidas do ensino de gramática. Sob seu ponto de vista, a língua é um ‘léxico gramaticalizado’, e não uma ‘gramática lexicalizada’. Lewis critica as demais abordagens por ensinarem a estrutura, a gramática da língua com o vocabulário de forma descontextualizada, como se fosse suficiente para desenvolver habilidades orais e fluência em língua estrangeira. Para Lewis, por outro lado, a sua abordagem lexical não deve substituir outra abordagem que seja utilizada pelo professor: ela deve ser utilizada como uma abordagem auxiliar 05 para o professor. Com isso, Lewis pretendia tornar a aprendizagem de vocabulário mais prazerosa, dinâmica e significativa para os envolvidos. Nessa abordagem, a proficiência podeser desenvolvida com ênfase no ensino e aprendizagem de novas palavras, combinações de palavras e expressões em língua estrangeira. Seguindo em nossa conversa, você vai perceber que, em meio a tantas abordagens pós-comunicativas, há uma que não podemos dizer que se trata de uma abordagem propriamente dita, mas sim uma preocupação em relação ao aprendiz de língua estrangeira: como esse sujeito aprende uma língua estrangeira? Algumas das pesquisadoras que têm se dedicado a responder essa questão são Larsen-Freeman. Tomando como referência os estudos de Rubin, sobre o que os aprendizes fazem para facilitar seu processo de aprendizagem de língua estrangeira, bons aprendizes têm grande desejo de se comunicar e não têm medo de cometer erros nas suas tentativas de aprender a língua-alvo. Além disso, estão atentos para a construção de sentido e estrutura da mensagem e praticam e monitoram sua própria fala e a de outros. Apesar de essas pesquisadoras identificarem as estratégias de aprendizes de sucesso como forma de ajudar outros com maiores dificuldades, elas também apontam que tais estratégias devem ser ensinadas e que se faz necessário desenvolver um treinamento para seu uso efetivo. Assim como a ajuda do professor para o treinamento de estratégias de aprendizagem é importante, em outro tipo de abordagem – a cooperativa, também conhecida como colaborativa – o professor também deve ajudar os estudantes a aprenderem a língua estrangeira de forma mais efetiva, uma vez que não basta somente a formação de grupos para que haja aprendizagem cooperativa. Esse tipo de abordagem prevê uma aula que, além da colaboração, também tenha foco nas características dos aprendizes. Ao trabalhar em pares ou grupos, há o compartilhamento de informações pessoais e a descoberta de soluções para as necessidades de cada participante. Larsen-Freeman, por exemplo, ressaltam que, nesta abordagem – mais do que o ensino de língua –, professores acabam também por ensinar habilidades sociais que podem culminar em uma aprendizagem efetiva. Agora que você conhece algumas abordagens e estratégias de aprendizagem, vamos refletir sobre o que você estudou. Vejamos um exemplo apresentado por Larsen-Freeman (2000). Uma professora em Taipei tem, em sala de aula, alunos chineses que estudam geografia. Antes de iniciar a atividade (uma atividade de leitura na qual os alunos deverão preencher lacunas enquanto 06 assistem a um vídeo sobre o tema da aula: latitudes e longitudes), a professora pergunta aos alunos sobre o que sabem a respeito do globo terrestre. À medida que os alunos vão dando suas respostas, a professora vai escrevendo no quadro. Na sequência, alunos são convidados a mostrar no globo terrestre algumas localizações. De tarefa de casa, eles deverão achá-las num mapa o local, com base num texto descritivo. Toda a comunicação entre professora e alunos é feita em língua inglesa. Qual foi a abordagem utilizada pela professora em sua aula? Você saberia dizer, com base nas estratégias utilizadas pela professora? TEMA 2 – AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS / A PEDAGOGIA DE PROJETOS / ABORDAGEM INTERCULTURAL Não podemos começar a falar de inteligências múltiplas sem citar Gardner e Hatch. Segundo esses pesquisadores, aprendizes acessam determinados ‘canais’ durante o momento em que ocorre a aprendizagem. Esses ‘canais’ aos quais eles se referem dependem das habilidades individuais e das atividades propostas. Mesmo reconhecendo em seus alunos as inteligências múltiplas, professores sabem que eles trazem consigo formas individuais de aprender, que não são levadas em consideração nos ambientes educacionais. O impacto dos estudos das inteligências múltiplas fez com que começássemos a nos questionar, como professores, sobre as nossas atitudes quando estamos em sala de aula. Quais seriam essas inteligências? Gardner e Hatch apresentaram, num primeiro momento, sete tipos de inteligências distintas, cada qual relacionada a habilidades em específico. Vamos ver quais são? Lógico-matemática: usar números, entender modelos abstratos, analisar problemas, operações matemáticas e questões científicas e racionalizar; Verbal-linguística: usar a linguagem de maneira efetiva e criativa, sendo ela escrita e falada; Espacial-visual: orientar-se, criar imagens mentais, perceber formas, cores e tamanhos, perceber o mundo visual de maneira detalhada; Musical: tocar, compor, apreciar e reconhecer padrões musicais, ter sensibilidade para ritmo e melodia; Corporal/físico – cinestésica: usar o corpo para a prática de dança e esportes, expressar-se e solucionar problemas; 07 Interpessoal: entender o humor, as intenções, as motivações e os desejos dos outros; Intrapessoal : conhecer-se, entender-se e desenvolver disciplina. Mesmo que todos tenham as setes inteligências apontadas por Gardner e Hatch, nem todas estão igualmente desenvolvidas nas pessoas. Para alguns professores, em uma sala de aula de língua estrangeira, é importante desenvolver atividades que contemplem as sete inteligências, pois, dessa forma, auxiliariam os alunos a identificar seu potencial presente em cada uma delas. Nesse sentido, Larsen-Freeman aponta para a necessidade de revermos as atividades que estão sendo feitas em sala de aula e categorizá-las de acordo com o quadro de Gardner e Hatch. Assim, torna-se possível para o professor identificar quais das inteligências estão recebendo mais ênfase e aquelas que acabam por serem deixadas de lado. Os estudos das inteligências múltiplas tiveram outros desdobramentos, e hoje já temos estudos que envolvem outros tipos, tais como a inteligência social, a ecológica e a espiritual. Outro tipo de abordagem e que, aos moldes das inteligências múltiplas, também tem crescido na área educacional trata do uso do desenvolvimento de trabalhos com projetos. Por outro lado, observa-se também que há docentes que atribuem significados diferentes quando falam de ‘projetos’. Enquanto para uns isso diz respeito a um simples trabalho de pesquisa, para outros é uma proposta de trabalho construída em conjunto com seus alunos. Aqui, entendemos a pedagogia de projetos como sendo este último conceito. Em muitas escolas, a pedagogia de projetos tem sido vista como uma alternativa para enfrentar problemas disciplinares, evasão escolar, repetência e falta de motivação, tão recorrentes em várias disciplinas dentro do ambiente escolar. Este tipo de trabalho considera o aluno como parte ativa na construção de seu próprio saber, e não somente um receptor, um ouvinte de conteúdo. O resultado é que a aprendizagem acaba por ter significado para o aluno. Muitos autores atribuem a John Dewey a idealização da pedagogia de projetos, a qual, no Brasil, encontra eco nos trabalhos de Paulo Freire e de Miguel Arroyo. Para Dewey, educar não significa dar respostas prontas para os alunos, mas sim orientá-los a investigar e descobrir as soluções para seus problemas por meio de pesquisa. Tomando isso como base, é premissa da pedagogia de projetos o desenvolvimento de um trabalho que considere o conhecimento prévio dos 08 participantes envolvidos, deixando para o professor o papel de condutor do processo de aprender. Pazello (2005, p. 42) nos aponta oito características para definição do termo projeto para que um trabalho seguisse os pressupostos da pedagogia de projetos. Vejamos quais são: articulação entre teoria e prática, considerando- as como dois momentos importantes no processo de ensino-aprendizagem; ligação entre presente e futuro, o que caracteriza a aplicabilidade do saber em questão; noção de lançar para frentevinculada à dificuldade crescente; clareza de objetivos, que devem ser preestabelecidos; influência dos contextos, posto que aspectos socioculturais interagem e funcionam como variáveis na fase de elaboração, aplicação e resultado; processo composto de etapas e sequência organizada em fases, mecanismo de mudança e ação; proposição de situação- problema, a qual envolve desafio, foco no interesse discente; preocupação com a diversidade e o potencial do aprendiz e incentivo à cooperação e à interação durante o processo de ensino e aprendizagem através de trabalho em grupo. Passando, então, para a próxima abordagem, vamos estudar a intercultural. No cenário de ensino e aprendizagem de língua estrangeira, não podemos deixar à parte os aspectos culturais implícitos quando estudamos outra língua. A abordagem intercultural já podia ser observada no contexto da abordagem comunicativa, uma vez que esta abordagem partia da premissa de se trabalhar com materiais autênticos na língua-alvo. Apesar de o uso desses materiais ter trazido, para dentro da sala de aula, as questões culturais, nenhum trabalho sistemático de conscientização cultural foi desenvolvido pela AC. Com isso, pode-se perceber que começou a haver tentativas de integrar as discussões sobre cultura dentro do currículo de ensino de língua estrangeira. A abordagem intercultural, portanto, surge como a abordagem que não somente trata a língua como objetivo para a comunicação, mas também promove a reflexão sobre suas funções sociais e a maneira como a linguagem é utilizada, tanto oralmente quanto por escrito, para negociar sua posição social em grupos diferentes. Portanto, em uma aula de língua estrangeira na qual o professor adota a abordagem intercultural, ele deverá ter em mente que, além de trabalhar as quatro habilidades linguísticas (escrever, ler, ouvir e falar), ele também terá que ajudar seus alunos a adquirir habilidades culturais em língua estrangeira, tais como 09 aprender a observar e compreender modelos de comportamento em diferentes comunidades. O objetivo da abordagem intercultural, como pode ser inferido, não tem como foco a competência comunicativa, de modo que os alunos cheguem o mais próximo possível de um falante nativo. Aqui, a ênfase recai no desenvolvimento da competência intercultural comunicativa. Ou seja, o aprendiz deverá ter a capacidade de entender uma língua, além do comportamento dos indivíduos daquela cultura que está sendo estudada. Além disso, deverá também estar apto a saber explicar, para outras culturas, características de sua própria comunidade. Saiba mais Vídeo 01: assista a um vídeo com Howard Gardner que fala sobre inteligências múltiplas e como ele chegou às suas conclusões. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=tLHrC1ISPXE>. Acesso em: 18 dez. 2017. Vídeo 02: assista ao vídeo Perspectivas da interculturalidade dentro do ensino da língua estrangeira com a profª Juliana Alves. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-Fdu2l-QBz4>. Acesso em: 18 dez. 2017. TEMA 3 – LETRAMENTOS E MULTILETRAMENTOS Uma das discussões que têm sido feitas na área de ensino e aprendizagem trata dos conceitos de letramento e multiletramentos. Mas do que tratam esses conceitos? Em primeiro lugar, três conceitos são repensados a partir de uma perspectiva diferente quando tratamos de um projeto de letramento: o conceito de linguagem, de cultura e de conhecimento. O conceito de linguagem está relacionado profundamente às diferentes maneiras culturais de usá-la. A antiga noção de letramento tratava da simples aquisição de uma ferramenta como a escrita, deixando à parte a língua e a cultura do processo de aprendizagem. Passou-se a entender que as ferramentas utilizadas na comunicação não são nem universais nem globais e, portanto, não podem estar desconectadas de seu contexto. Em uma mesma cultura, pode haver práticas de linguagem diversificadas. Ao entendermos a língua como um processo heterogêneo, passamos então a questionar o conceito de cultura. Cada língua é composta por variantes socioculturais que vão se modificando dependendo do falante e do contexto. Se cada língua é heterogênea, cada cultura é, provavelmente, também composta por um conjunto de grupos, sendo que cada grupo tem seus valores e 010 crenças. Assim como linguagem e cultura, o conhecimento também havia sido, até então, entendido como imutável e determinado. Entretanto, o trabalho com letramento nos fez entender que, assim como cada grupo social em comunidades diferentes tem sua linguagem e sua cultura próprias, o conhecimento também será formulado por esses grupos, não sendo possível atribuirmos ao conhecimento um caráter totalitário. Em suma, os estudos sobre letramento trouxeram à tona que esses três conceitos – língua, cultura e conhecimento – serviam para reforçar a exclusão social, promover os valores dos grupos dominantes da comunidade e silenciar os demais. Abrir a sala de aula para essas discussões em prol da construção e do entendimento da heterogeneidade pode ser um modo real de vivermos a inclusão e retirarmos a característica de exclusão ainda arraigada na escola. Por isso, a perspectiva de letramento e multiletramento – sendo este último baseado nos múltiplos e heterogêneos letramentos – visa preparar nossos alunos para um futuro desconhecido, para agir em situações novas, imprevisíveis e incertas. Saiba mais Leia o capítulo do livro Multiletramentos na escola, de Roxane Rojo e Eduardo Moura. Disponível em: <http://pt.calameo.com/books/003498113d7497fcbd68a>. Acesso em: 18 dez. 2017.Assista a uma entrevista com a prof. Roxane Rojo sobre o mesmo tema. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=q1OpzwOPGyY>. Acesso em: Acesso em: 18 dez. 2017. TEMA 4 – A SALA DE AULA DE LÍNGUA ESTRANGEIRA / ENSINO DAS QUATRO HABILIDADES / ENSINO DA GRAMÁTICA, DO VOCABULÁRIO E DA PRONÚNCIA Até agora, estudamos sobre métodos e abordagens no ensino de língua estrangeira e outras questões pertinentes. Entretanto, não podemos deixar de lado outros aspectos que estão diretamente relacionados ao tema que tratamos nesta disciplina. Professores de línguas estrangeiras devem levar em consideração as questões relacionadas ao ensino das quatro habilidades, da gramática, do vocabulário e da pronúncia, além de outras que influenciam tanto a aprendizagem quanto o ensino de língua estrangeira. 011 4.1 O ensino das quatro habilidades Quando estamos em sala de aula, fazemos escolhas o tempo todo, dependendo dos princípios e das crenças que temos como professores de língua estrangeira, além, é claro, do contexto e das condições de aprendizagem em que estamos inseridos. Portanto, falar do ensino das quatro habilidades é muito particular para cada professor, pois, além das questões metodológicas envolvidas, isso também diz respeito ao entendimento que temos de nossos alunos e de suas necessidades específicas. Observe um material didático ou a estrutura de um curso: você vai perceber que, em sua maioria, tanto um quanto outro vai apresentar essa divisão do ensino das habilidades, sendo que uma habilidade poderá ter maior ênfase do que outra, dependendo dos propósitos do curso e das necessidades dos alunos. Entretanto, especialmente após os estudos oriundos da AC, começou a ser traçada uma tendência de abranger o ensino das quatro habilidades de forma mais eficaz, a partir da integração entre elas. Ou seja, os currículos têm privilegiado o trabalho com a inter-relação entre as habilidades, até mesmo porque a língua não pode ser entendida como compartimentos estanques e segmentados. Uma aula cujaênfase seja no ensino das quatro habilidades será com base em situações semelhantes à da vida real, de modo a propiciar aos alunos possibilidades de vivenciá-las em sala de aula. Além disso, confere ao professor a possibilidade de tornar a sua aula mais flexível e criativa, de modo a deixá-la mais atrativa para o seu aluno. Agora, vamos tratar de cada uma das habilidades em separado. Começamos pela compreensão oral. 4.1.1 Compreensão oral Pensando na exposição do aluno à língua estrangeira em sala de aula, vamos observar que é solicitado a esse aluno mais atividades de compreensão oral do que de produção propriamente dita. A sala de aula é o contexto no qual a habilidade de compreensão oral será a mais utilizada, mas o que pode ser observado é que, por muitos anos, tem sido exigido do aluno muito mais a produção oral. Vamos pegar como exemplo o método audiolingual, quando o aluno, por meio de drills, deveria repetir sentenças oralmente, mesmo sem entender ao certo o que estava falando. A compreensão oral só passa a ganhar certo destaque com Asher e o método de resposta física total, pois, nesse caso, 012 os aprendizes deveriam primeiro compreender o que ouviam para, então, realizar uma ação. Num segundo momento, a abordagem natural de Krashen passou a respeitar o período de silêncio dos alunos, ou seja, aquele período no qual eles podem ouvir e tentar entender sem serem obrigados a falar antes de se sentirem preparados para a produção oral. Ouvir é muito mais que um processo de receber símbolos auditivos: é um processo psicomotor de receber ondas sonoras por meio da audição que transmitem impulsos nervosos ao cérebro. Há um processo de interação entre mecanismos cognitivos e afetivos associados aos impulsos recebidos pelo nosso cérebro. A compreensão auditiva trata, portanto, de conseguirmos entender uma mensagem e, ao mesmo tempo, compreendermos a intenção da fala por meio da mensagem. Portanto, ao prepararmos uma atividade de compreensão auditiva, devemos levar em conta as possíveis dificuldades que os alunos vão encontrar, utilizar estratégias de ensino e variar as formas de aplicação das atividades, levando em conta o nível linguístico do grupo. 4.1.2 Produção oral Esta habilidade está intimamente relacionada à compreensão oral. Um bom exemplo disso é uma situação de conversa entre duas pessoas, na qual uma pessoa fala e outra ouve e vice-versa. Um ato de fala pode parecer muito simples, a princípio, mas não podemos nos enganar com isso. Você já parou para pensar o que envolve o nosso falar? Esse ato envolve uma série de características, como fluência, acuidade, fatores afetivos e efeitos causados pela interação. Assim como a compreensão oral recebe influências de quebras e junções de palavras, de redundâncias, do uso de formas reduzidas, a produção oral também vai sofrer influências de variáveis que a caracterizam, tais como hesitações, falsos inícios de conversa, pausas e correções durante a própria fala, além do uso da própria linguagem mais coloquial. Isso sem mencionarmos o ritmo e a entonação que o falante imprime à sua fala. Outra discussão no âmbito da produção oral diz respeito ao entendimento que se dá ao significado de ‘produção oral’. Se você se lembrar da nossa aula sobre métodos e abordagens no ensino de língua estrangeira, vai perceber que a produção oral foi trabalhada de formas muito diferentes, pois cada pressuposto teórico tinha a sua própria visão de produção oral: como imitação e repetição, por meio dos drills; produção de diálogos e uso de perguntas e respostas; ou então atividades que envolvem monólogo e apresentações orais, contação de histórias e reporte de fatos e acontecimentos para grupos de alunos mais avançados. 013 4.1.3 Leitura Esta talvez seja a habilidade com a qual temos contato com mais frequência. Basta olharmos ao nosso redor: vivemos imersos num mundo cheio de coisas escritas, como jornais, revistas, propagandas, materiais de estudo, e- mails, informações na internet, folheto de igreja, receituário de médico, só para citar alguns. A forma como nossa sociedade está organizada faz da leitura um exercício do nosso cotidiano. Dominar esta habilidade garante o nosso sentimento de pertencimento a uma comunidade. Quando tratamos dessa habilidade em relação ao ensino e aprendizagem de língua estrangeira, vamos perceber que as pesquisas sobre esse tema remontam à década de 1970 com o ML, pois, para esse método, saber ler em uma língua estrangeira era a necessidade daquele momento. Assim como as outras habilidades, a de leitura tem suas especificidades e dificuldades, que, por vezes, os alunos encontram. Uma vantagem da leitura é que o aluno pode retomar o assunto sempre que quiser para dar conta de entendê-lo. Outra questão é que o aluno pode ter seu próprio ritmo de compreensão, ao contrário da compreensão auditiva ou da produção oral. Além disso, a leitura pode estar distante do aluno tanto física quanto temporalmente. Isso faz com que o aluno, ao ler um texto, tenha que interpretar os sentidos de contextos muito diversos dos seus. Outra característica que distingue o texto escrito do oral é que o escrito possui maior complexidade. Enquanto o texto oral tem uma característica mais prática, o escrito pode apresentar produções escritas que dificultam o entendimento pela complexidade do uso da linguagem, tais como o vocabulário empregado ou o registro de língua. 4.1.4 Escrita Esta talvez seja a habilidade mais distante da maioria dos aprendizes de uma língua estrangeira. Talvez isso ocorra porque a maioria dos nossos alunos quer aprender a falar, ouvir e ler. Isso pode ser atribuído à questão que citamos anteriormente, sobre como a nossa sociedade está organizada. Entretanto, a produção escrita pode se tornar essencial, dependendo do objetivo que se quer alcançar em um determinado curso, dependendo da necessidade dos alunos, como um curso de escrita acadêmica em língua estrangeira. Outro aspecto que tem ocasionado o aumento da produção escrita é o uso das novas tecnologias. Pensando nas possibilidades de comunicação e interação proporcionadas pela 014 internet, a linguagem escrita tem sido usada, por vezes, como substituta da linguagem oral em nossa forma de comunicação. Assim como acontece com as atividades de leitura, a produção escrita tem suas características que podem ser entendidas como consequências das dificuldades de nossos alunos, tais como o tempo de produção, que é mais longo do que o do texto oral. Além disso, o aluno precisa dar conta de usar vocabulário específico de acordo com o assunto tratado e saber fazer a distinção entre as formalidades da língua, usadas em situações diferentes (como escrever para um amigo ou redigir um texto acadêmico). 4.2 O ensino da gramática, do vocabulário e da pronúncia Ensinar gramática e vocabulário tem sido alvo de debates na área de ensino de língua estrangeira. Conforme pudemos observar, quando tratamos dos métodos e abordagens utilizados, em vários momentos as atividades realizadas em sala de aula limitavam-se às atividades que envolviam gramática e vocabulário. Existe uma tendência, na atualidade, fruto de discussões mais recentes, de os professores se sentirem um tanto perdidos quando precisam decidir se vão ou não ensinar gramática ou priorizar uma atividade de vocabulário. O que dizer, então, do ensino de pronúncia? Assim como as dúvidas sobre ensinar ou não gramática e vocabulário, isso também pode ser dito a respeito do ensino da pronúncia. Quando a pronúncia era ensinada aos moldes do MA, as práticas aproximavam-se de características muito mais behavioristas,e havia uma tentativa de aproximar a produção oral do aprendiz de língua estrangeira daquela do falante nativo da língua-alvo. Hoje, o ensino da pronúncia ganhou outros contornos, novos espaços e outras preocupações. Com tudo isso que foi apresentado até o momento, o que podemos então dizer sobre o ensino das habilidades linguísticas: devemos ensiná-las ou não? Devemos ter em mente que são muitas as possibilidades de atuação em sala de aula. Escolher estilo de trabalho e pressupostos teóricos depende de um certo número de variáveis. Pergunte-se, então: qual é a necessidade do aluno? A resposta a essa pergunta servirá de fio condutor para o trabalho em uma sala de aula de língua estrangeira. Voltando, então, à questão do ensino das quatro habilidades, ele continua sendo importante, mas o equilíbrio entre elas precisa ser levado em consideração. Reflita sobre o grupo de alunos com o qual você vai trabalhar. Pode ser que seu grupo, por exemplo, precise dar conta da leitura de 015 manuais em língua estrangeira, e, nesse caso, a habilidade de leitura deverá ser mais trabalhada; ou se o grupo é composto por secretárias, talvez o fato de este tipo de profissional atender ligações telefônicas e precisar redigir documentos mais formais seja indício de que a produção oral ou a escrita devam ter mais ênfase no curso. A decisão sobre o que ensinar e quais habilidades devem ser incluídas no currículo ou devem ter maior ênfase envolve não somente o professor em sala de aula, mas também a coordenação do curso e os demais professores. Saiba mais Leia o artigo Ensino de língua estrangeira vai além da gramática e a entrevista com o prof. Giuliano Cezar Polivellis sobre a sua experiência com o ensino de línguas estrangeiras. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/2459/ensino-de-lingua-estrangeira-vai- alem-da-gramatica>. Acesso em: 18 dez. 2017. TEMA 5 – QUESTÕES QUE INFLUENCIAM A APRENDIZAGEM / QUESTÕES QUE INFLUENCIAM O ENSINO Nós, como professores, temos algumas ideias sobre os elementos que acreditamos influenciar a aprendizagem de língua estrangeira. Esses fatores, por vezes, acabam interferindo em nosso trabalho em sala de aula. Talvez um dos pontos com quais temos que lidar em nossa prática seja a motivação e o interesse do aluno. Enquanto alguns mostram interesse e vontade de aprender, outros só estão no curso por mera formalidade. Também devemos levar em consideração a idade do grupo com o qual trabalhamos: adolescentes, crianças, adultos e idosos têm ritmos de aprendizagem diferentes. Há alunos que são mais sociáveis, ao passo que outros temem a exposição em sala de aula. Isso sem falar dos estilos de aprendizagem de cada aluno, que, conforme vimos com as inteligências múltiplas de Gardner, precisam ser levados em consideração. Outro aspecto relevante para a aprendizagem diz respeito ao tempo que o aluno dispõe para se dedicar ao curso – alunos com maior disponibilidade tendem a ter um melhor aproveitamento. Além desses fatores que induzem a aprendizagem, há outros que influenciam direta ou indiretamente o trabalho em sala de aula. Aí podemos incluir o planejamento, por exemplo, que direciona nosso estilo de trabalho, especialmente se estamos em um contexto que exige o cumprimento rigoroso do 016 que foi planejado. Também precisamos considerar o material didático selecionado para o curso, com seus pressupostos teóricos e concepção de língua, que também determinam o estilo do nosso trabalho. Devemos ainda levar em conta a própria estrutura do nosso contexto de inserção. Temos equipamentos à nossa disposição, como aparelhos de som ou computadores? Em caso negativo, a falta desses equipamentos pode prejudicar as atividades de compreensão auditiva, por exemplo. O nosso gerenciamento em sala e o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem também influenciam a forma como nossos alunos aprendem e como nós acreditamos que ensinamos língua estrangeira. Lembre-se que nossas crenças e nossos valores estão presentes em nossas aulas e interferem no processo de ensino e aprendizagem de língua estrangeira. Saiba mais Leia o artigo É possível aprender inglês na escola regular?, do site Planeta Educação. Qual é a sua opinião sobre a posição do autor do artigo? Você concorda ou não? Disponível em: <http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=2813>. Acesso em: 12 nov. 2017. FINALIZANDO Nesta aula, estudamos alguns dos movimentos pós-comunicativos utilizados no ensino de língua estrangeira: abordagem baseada em conteúdo e em tarefas; abordagem participativa; abordagem lexical; abordagem cooperativa; treinamento das estratégias de aprendizagem; inteligências múltiplas, de Gardner; pedagogia de projetos; abordagem intercultural; e os letramentos e multiletramentos. Tratamos também de algumas questões relacionadas ao ensino das quatro habilidades (escrita, leitura, compreensão auditiva e produção oral) e da pronúncia. Por fim, apresentamos uma reflexão sobre as questões que influenciam a aprendizagem e o ensino de uma língua estrangeira. Bons estudos e até a nossa próxima aula! 017 REFERÊNCIAS LARSEN-FREEMAN, D. Techniques and principles in language teaching. Oxford: [s.n.], 2000. MOROSOV, I.; MARTINEZ, J. R. A didática do ensino e a avaliação da aprendizagem em língua estrangeira. Curitiba: Ibpex, 2008. PAZELLO, E. Pedagogia de projetos e o ensino de inglês como língua estrangeira moderna em escola regular de 5ª a 8ª séries: convicção ou modismo? 2005, 196f. (Dissertação de Mestrado) – Universidade Federal do Paraná, 2005.
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