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OAT DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO (EXTRADIÇÃO) PROF: JOÃO ALBERTO CAPILUPE ACADÊMICOS ANDRÉ LUIZ LOUREIRO LANES E CHARLES JOSÉ REIS DA COSTA EXTRADIÇÃO A extradição é a entrega de um Estado para outro Estado, a pedido deste, de indivíduo que em seu território deva responder a processo penal ou cumprir pena por prática de crime de certa gravidade. Uma condicionante dessa entrega é a confirmação de que os direitos humanos do extraditando serão respeitados (chamada limitação humanística). A grande finalidade da extradição é garantir, por meio de cooperação internacional, que a prática de crime não ficará sem punição. E o fundamento jurídico do pedido de extradição pode ser existência de um tratado que preveja tal hipótese ou, na falta deste, a declaração de reciprocidade, que funciona como suporte jurídico para o procedimento. A aceitação da promessa de reciprocidade é, no entanto, ato discricionário do Estado que recebe. Deve-se ponderar que a extradição não é permitida quando relacionada à prática de crimes políticos, de imprensa, religiosos e militares. E se o indivíduo for condenado à morte, a extradição só deve tomar curso se ficar assegurada a conversão da pena de morte em pena de prisão. Ademais, a maioria dos países não permite a extradição de nacional seu - nesse sentido o Art. 5º, inciso LI da CRFB/88 determina: ''nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de intorpecentes e drogas afins, na forma da Lei.'' E quando mais de um Estado requerer a extradição da mesma pessoa pelo mesmo fato, terá preferência o pedido daquele cujo território a infração foi cometida (Art. 79 do Estatuto do Estrangeiro). O artigo segue definindo outras situações, assim quando se tratar de crimes diversos, terão preferência, sucessivamente I - o Estado requerente em cujo território haja sido cometido o crime mais grave, segundo a Lei brasileira; II - o que em primeiro lugar houver pedido a entrega do extraditando, se a gravidade dos crimes for idêntica; III - O Estado de origem, ou, na sua falta, o domiciliar do extraditando, se os pedidos forem simultâneos (§1° do art. 79). E nos casos não previstos decidirá sobre a preferência o governo brasileiro (§2°), ou havendo tratado ou conversão com alguns dos Estados requerentes, prevalecerão suas normas no que disseram respeito à preferência (§3º). Por fim, é possível a figura da reextradição conforme a leitura do Art. 91, inciso IV, do Estatuto do Estrangeiro nos permite interpretar. Porém para isso acontecer é necessá o consentimento do Estado brasileiro. Essa é a posição do STF (Ext, 1267/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.03.2014 - Inform.. STF 740, 2ª Turma). PROCEDIMENTO NO BRASIL O procedimento extraditório no Brasil foi alterado pela Lei 12.878, de 04.11.2013, que deu nova redação aos Arts. 80, 81 e 82 da Lei 6.815/1980. Em linhas gerais e num primeiro momento, o país interessado formula pedido de extradição que é transmitido por via diplomática para o Ministério da Relações Exteriores ou, na falta, de agente diplomático do Estado que a requerer ou mediante previsão em tratado , diretamente de governo a governo, devendo sempre o pedido ser instruído com a cópia autêntica da sentença condenatória, da sentença de pronúncia ou da que decretar a prisão preventiva, proferida por juiz ou autoridade competente. Importante destacar a exigência de o pedido de extradição com indicações precisas sobre o local, a data, a natureza e as circunstâncias do fato criminoso, a identidade do extraditando e, ainda, cópia dos textos legais sobre o crime, a competência, a pena e a sua prescrição (§1° do art. 80 do Estatuto do Estrangeiro). Feito isso, cabe ao Ministério da Justiça fazer uma análise identificadora da presença ou não dos pressupostos formais de admissibilidade exigidos no Estatuto do Estrangeiro ou em tratado. Caso o resultado seja positivo, o pedido de extradição será encaminhado ao Supremo Tribunal Federal, que é o juízo da extradição (Art. 102, inciso I, alínea ''g'' da CRFB/88). Percebe-se aqui uma grande modificação, pois antes o Ministério da Justiça ordenava a prisão do extraditando e somente depois de efetivada o pedido era encaminhado ao STF, para esse tomar as providências de julgamento. Agora, como visto, a regra geral é a análise dos requisitos do Ministério da Justiça e o encaminhamento ao STF quando esses estiverem presentes, sem necessidade de se impor a prisão cautelar. A prisão preventiva para fins de extradição passou de requisito e presente em todos os procedimentos de extradição para elemento excepcional e carente de pedido específico por parte do Estado requerente (Art. 82. do Estatuto do Estrangeiro). Essa prisão fazia parte do próprio procedimento de extradição, mas agora só ocorrerá se tiver pedido expresso do Estado requerente e correlata justificação (§1° do art. 82 do Estatuto do Estrangeiro). Ou seja, com a nova redação legal dada ao art. 82 do Estatuto do Estrangeiro, a prisão cautelar em análise ganhou roupagem de medida excepcional, como toda prisão preventiva deve ter no seio de um Estado Democrático de Direito. De agora em diante, o Estado interessado na extradição poderá, em caso de urgência e antes da formalização do pedido de extradição, ou conjuntamente com este, requerer a prisão cautelar do extraditando por via diplomática ou, quando previsto em tratado, ao Ministério da Justiça, que, após exame da presença dos pressupostos formais de admissibilidade exigidos no Estatuto do Estrangeiro ou em tratado, representará ao Supremo Tribunal Federal. Caso seja concedida a prisão preventiva para fins de extradição, é importante asseverar que o Estado estrangeiro deverá, no prazo de 90 dias contado da data em que tiver sido cientificado da prisão do extraditando, formalizar o pedido de extradição (§3° do art. 82 do Estatuto do Estrangeiro). E se o pedido não for formalizado dentro do prazo especificado acima, o extraditando deverá ser posto em liberdade, não se admitindo um novo pedido de prisão cautelar pelo mesmo fato sem que extradição haja sido devidamente requerida (§4º do art. 82 do Estatuto do Estrangeiro). Com relação ao prazo dessa prisão cautelar, o instituto sofreu uma mitigação pela jurisprudência, sendo atribuído limite temporal a ela, compátivel com o princípio da proporcionalidade em sentido estrito. Tal consideração sobre a prisão preventiva para fins de extradição foi fruto de uma modificação de entendimento pelo STF, que antes, com base no art. 84, parágrafo único, do Estatuto do Estrangeiro, defendiaque a prisão iria perdurar até o julgamento final da extradição. Cabe destacar que o fundamento para concessão de toda extradição pode ser tanto o fato de o governo requerente se fundamentar em tratado, como quando prometer ao Brasil a reciprocidade. E o art. 77 da Lei 6.815/1980 cuida das situações em que a extradição não será concedida, a saber: a) se tratar de brasileiro, salvo se a aquisição dessa nacionalidade verificar-se após o fato que motivar o pedido (ler o art.5º, inciso LI da CRFB/88); b) o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente (necessidade da presença de requisitos da dupla tipicidade e da dupla punibilidade); c) o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando; d) a lei brasileira impuser ao crime a pena de prisão igual ou inferior a 1 (um) ano; e) o extraditando estiver respondendo a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido; f) estiver extinta a punibilidade pela prescrição segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente; g) o fato constituir crime político (más ocorrerá a extradição quando o fato constituir, principalmente, infração da lei penal comum ou quando o crime comum, conexo ao delito político, constituir o fato principal e, h) o extraditando houver de responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção. Por outro lado, a Súmula 421 do STF assim dispõe: ''Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro.'' Antes de analisarmos as características do processo de extradição, cabe transcrever as condições para a concessão de extradição insculpidas no art. 78 da Lei 6.815/1980: a) ter sido o crime cometido no território do Estado requerente ou serem aplicáveis ao extraditando as leis penais desse Estado e b) existir sentença final de privação de liberdade ou estar a prisão do extraditando autorizada por juiz, tribunal ou autoridade competente do Estado requerente, salvo em caso de urgência, quando poderá requerer a prisão cautelar do extraditando (art.82 da Lei 6.815/80). O processo de extradição possui peculiaridades, pois o Estado requerente não é parte e o Ministério Público atua como fiscal da lei, isto é, seu caráter contencioso é mitigado. Mas, apesar disso, o STF admite que o Estado requerente seja representado por advogado. Contudo, a defesa do extraditando não pode explorar o mérito da acusação. Isso porque o exame do STF recairá somente sobre a existência ou não dos pressupostos autorizadores da extradição. Tanto é assim que o STF tem jurisprudência no seguinte sentido: ''Entendeu que o Supremo não é o foro adequado para análise da imputabilidade do extraditando e eventual imposição de medida de segurança. Asseverou que, de acordo com precedentes da Corte (Ext.367/Estados Unidos da América, DJU de 31.10 1979; Ext. 553/ República Federal da Alemanha, DJU de 18.08.1995), o estado de saúde do extraditando apenas pode influir por ocasião do momento de entrega deste as autoridades estrangeiras e que a questão acerca da inimputabilidade deve ser suscitada na ação penal originária.'' Por fim, caso o STF decida pela extradição o governo, pelo Itamaraty, colocará o indivíduo à disposição do Estado requerente, que dispõe de um prazo improrrogável de 60 dias (art.86 do Estatuto do Estrangeiro), salvo disposição diversa em tratado bilateral, para retirá-lo do território nacional. Se o prazo não for respeitado, o indivíduo será solto e o pedido extraditório não poderá ser renovado. De outro modo, negada a extradição, não se admitirá novo pedido baseado no mesmo fato (art. 88 da Lei do Estatuto do Estrangeiro). Mas, no julgamento da Extradição 1.085 (caso Cesare Battisti), o STF decidiu que é possível declarar a ilegalidade do ato, do Executivo, de concessão de refúgio e que o acatamento da extradição pela Corte tem o condão de autorizar o presidente da República a efetivar a tal medida, isto é, cabe ao chefe do Executivo decidir sobre a convivência de tal medida. Configura-se uma mudança de posicionamento, pois ao STF sempre coube determinar a extradição quando entendesse presentes seus pressupostos, e agora o acolhimento da demanda de extradição pela Corte gera apenas uma autorização. A partir dessa decisão, pode-se defender que, no Brasil, quem decide, em última instância, sobre a extradição ou não, é o presidente da República (sistema ''belga'' ou da contenciosidade limitada), com a ressalva de este deva acatar decisão do STF que reconheça alguma irregularidade no processo de extradição, ou seja, ''indeferido o pedido, deixa-se de constituir o título jurídico sem o qual o Presidente da República não pode efetivar a extradição; se deferida, a entrega do súdito ao Estado requerente fica a critério discricionário do Presidente da República. Posteriormente o tal julgamento, foi impetrada pela República Italiana a Reclamação 11.243, ocasião em que o STF decidiu ser procedente a preliminar de não cabimento da reclamação em função de ser irrecorrível o ato do presidente da República, pois se trata de ato de soberania nacional que está ancorado nos Arts. 1º, 4º, inciso I e 84 da CRFB/88. Portanto, cabe ao STF analisar a ilegalidade e a procedência do pedido de extradição, e inscreve-se na competência do presidente da República a decisão sobre a sorte do extraditando. A Corte entendeu nesse julgamento que a soberania nacional, no plano transnacional, funda-se no princípio da independência nacional, efetivada pelo presidente da República, consoante suas atribuições previstas no art. 84, incisos VII e VIII da Constituição brasileira. E o governo italiano vislumbra em tal situação um descumprimento do tratado firmado entre o Brasil e a Itália para regular a extradição, portanto, tem-se uma lide entre Estados soberanos, que provavelmente será resolvida pela Corte Internacional de Justiça. Por fim, é importante dizer que o reconhecimento da situação de refugiado pelo Poder Executivo não impede a extradição se o estrangeiro estiver sendo acusado de crime comum que não tenha qualquer pertinência com os fatos considerados para a concessão do refúgio. Todavia, mesmo se os fatos forem os mesmos, não impedirá eventual pedido de extradição se esses fatos estiverem em desacordo com os requisitos em lei (como pontuado acima quando da análise da Extradição 1.085). Essa última colocação aclara o âmbito de aplicação do art. 33 da Lei 9.474/1997, que assim dispõe: ''O reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.'' E o art. 34 da mesma Lei prossegue: ''A solicitação de refúgio suspenderá, até a decisão definitiva,qualquer processo de extradição pendente, em fase administrativa ou judicial baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.''
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