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1ª parte Apostila DirConsumidor

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APOSTILA Nº	01
O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
4.1	Raízes do consumo
Em Marx,� a produção não só produz o consumo, mas também o modo de consumo, gerando no consumidor a necessidade de produtos e o impulso do consumo. Desta forma, se a produção cria o consumidor e o impulso do consumo, fica evidente a forte influência do capital na cultura do consumo. A propósito, a cultura do consumo compreende um conjunto de imagens, símbolos e sinais que são criados e recriados, vinculados aos bens de consumo, gerando novas formas de comportamento, modo de pensar e sentir da sociedade.�
Nesse processo criativo, uma análise dos tipos de bens de consumo, da periodicidade de consumo destes bens e do segmento social que consomem estes bens, desde o feudalismo, permitirá reconstituir a trajetória do consumidor contemporâneo, além de possibilitar uma visualização das raízes do consumo de maneira mais legível.
A cultura do consumo não só envolve os produtos essenciais para a subsistência física do ser humano, mas igualmente os produtos considerados supérfluos, também denominados consumo conspícuo.� O consumo conspícuo, segundo Veblen,� teve sua origem na sociedade feudal e estava relacionado ao estilo de vida de uma classe social ociosa, cujas diferenças eram visualizadas pelos trabalhos executados pelo integrante da classe social menos favorecida.
As classes sociais altas estavam isentas de trabalhos braçais e executavam trabalhos que lhe asseguravam um determinado grau de honra - atividades ligadas ao governo, guerra, práticas religiosas e esportes.� A classe mais privilegiada era a dos guerreiros,� pois era considerada a mais importante das tarefas, seguida pela classe dos sacerdotes, sendo que os guerreiros e sacerdotes não executavam trabalhos industriais,� em razão de sua superioridade hierárquica. 
No primeiro momento, a aquisição de bens era oriunda das façanhas e dos troféus adquiridos na guerra, cujo produto era destinado para o grupo e não para o indivíduo, ou seja, um grupo adquiria o troféu e o outro grupo perdia. No segundo momento, com a evolução social dos grupos, a propriedade é transferida para cada indivíduo do grupo. Ocorreu, então, uma mudança valorativa� entre os proprietários com os demais membros do grupo. Esta mudança valorativa torna a posse de bens e de riquezas "expressão de prepotência e êxito" do indivíduo em relação ao grupo, em especial para assegurar-lhe "reputação e estima".�
 Em suma, a acumulação de riquezas consiste na formulação inicial das teorias contemporâneas que buscam explicar o consumo supérfluo em nossa sociedade, com fundamento da emulação (competição, concorrência e rivalidade), cuja base está no prestígio e no poder que os indivíduos buscam no que são infinitamente insaciáveis.�
4.1.1	Consumo: Cortes Européias
As cortes européias começaram a se formar na Idade Média e têm o seu auge no Absolutismo, sendo consideradas como os primeiros grupos da sociedade moderna a consumir sem restrições.� As cortes sofreram um processo de mutação, em especial nas relações de poder entre os reis e os nobres, cujo poder foi centralizado nas mãos do rei – poder real.�
O conjunto de regras, etiquetas e boas maneiras, foi desenvolvido nas cortes européias, assim como a contenção de impulsos, de agressividade, de emoções, de funções, postura, ruídos e odores do corpo. A nova etiqueta ou o novo estilo de vida originado nas cortes propiciou uma alteração significativa nos hábitos de consumo. Nesse período, passou a se comer sentando à mesa, a se utilizar de talheres e louças individuais.� Os nobres necessitavam de uma gama enorme de itens de consumo para se manterem na corte, pois não era a riqueza que concedia prestígio, mas o fato de pertencer à corte. Assim, os nobres era obrigados a ter um padrão de consumo muito elevado (carruagens, valetes, empregados, casas, roupas, jóias etc.), o que exigia riqueza ou a dependência dos favores do rei.�
Assim, a teoria de que os nobres permaneciam em torno do rei com suas espadas e conselhos teve alguma validade no início da Idade Média, sendo que no final do século XVII o motivo pelo qual os nobres permaneciam em seu redor, era porque ao lado do rei poderiam conseguir os favores reais (pensões, benefícios e posições no exército, na Igreja e na burocracia etc.).� 
4.1.2	Consumo: Modismo
A nobreza diante da dura competição entre seus pares transformou o padrão de consumo; com isso, foi necessário providenciar as reformas das casas de campo em padrões altíssimos e a construção de novas residências próximas da corte, em Londres. Os nobres aperfeiçoaram o seu padrão de hospitalidade, passando a receber outros nobres e os próprios integrantes da monarquia, aumentando seus custos pessoais com decoração, banquetes e roupas. Assim, os bens eram adquiridos para suprir as necessidades imediatas da nobreza, valorizando-se a novidade. O culto à novidade, aos novos padrões de consumo, e o constante processo de variações dos bens e das coisas foram a chave e talvez o traço mais característico da origem e do desenvolvimento da moda.�
Para Lipovestsky,� a primeira manifestação do individualismo, na sociedade ocidental moderna, verificou-se por meio da moda. Mas, o processo de difusão da moda não se fez de forma mecânica: 
a imitação fez-se de modo seletivo, adaptando-se na burguesia tendências da moda da corte, rejeitando-se outras (vistas como exageradas), a ponto de se formar, no começo do século XVII, uma moda paralela à da corte, mais moderada, correspondendo ao 'homem correto', livre de excessos aristocráticos e conforme os valores burgueses de prudência, de medida, de utilidade, de limpeza, de conforto.
Esse modismo ponderado, que recusava as extravagâncias das cortes, desenvolveu a noção de conforto, fez evoluir os padrões de moradia, em busca da privacidade; tinha como referência os padrões da nobreza, mas não reduzidos ao modismo dos nobres, que se caracterizava pelos altos custos, extravagância e demonstração de luxúria. Foi esse novo padrão de modismo ponderado que se estendeu para as classes sociais menos favorecidas e mais populares e, mediante um processo de mimetismo, se consolidou na sociedade moderna, estabelecendo novos estilos de consumo que se transformaram, posteriormente, no consumo de massas. 
4.1.3	Proteção do Consumidor: Sentido Histórico
A Lei n.o 48, do Código de Hamurábi (2.300 A.C – Babilônia), como dito anteriormente, já previa a modificação do contrato por desequilíbrio das prestações, em decorrência de acontecimentos imprevisíveis oriundos das forças da natureza: "Se alguém tem um débito a juros, e uma tempestade devasta o campo ou destrói a colheita, ou por falta d'água não cresce o trigo no campo, ele não deverá nesse ano dar trigo ao credor, deverá modificar sua tábua de contrato e não pagar juros por esse ano." 
É antiga a preocupação com o enriquecimento sem justa causa; desde a antiguidade tem-se combatido a usura como forma de proteção dos interesses econômicos da sociedade.� As Ordenações Filipinas, em seu livro n.o V, censuravam a usura com a pena de exílio no continente africano.� 
Adam Smith, com a publicação de sua obra "A riqueza das Nações", revolucionou o pensamento econômico no início da Revolução Industrial, que clamava pela abertura de novos mercados e à livre iniciativa. Não obstante o livre mercado, Smith concluiu que os empresários não eram seres benevolentes: "Não é da benevolência do açougueiro, do fabricante de cerveja e do padeiro, que devemos esperar o nosso jantar, mas da atenção que eles dedicam aos seus próprios interesses". Desta forma, na visão de Adam Smith seria necessária a intervenção do Estado para preservar a concorrência, evitar a formação de cartéis e impedir a exploração do consumidor.� 
A propósito, na sociedade de livre mercado, defendida por Adam SMITH, em que se desenvolve uma economia sem a interferência estatal, que acredita no livre jogo de preços e na livre competição empresarial, esta mesma economia jamais poderá ter êxito se nãoproteger o consumidor (fim último da produção), garantindo-lhe pelo menos escassos direitos na esfera econômica e social.� Ademais, a liberdade de contratar nunca foi ilimitada, porque sempre sofreu vigília dos bons costumes e da ordem pública, devendo, pois, os princípios do liberalismo econômico se adequarem aos princípios da justiça social.� 
Na França, apesar do princípio da liberdade contratual, oriundo do modelo liberal clássico e sedimentado no Código Civil Francês, o consumidor encontrava proteção na proliferação de leis e regulamentos especiais, com fundamento na teoria dos vícios redibitórios – o vice caché dos franceses, que se estendeu por toda Europa. No direito norte-americano, os princípios do "Caveat emptor" (da formação e interpretação dos contratos) e o da necessidade de "privity" no terreno da responsabilidade civil contratual, durante muito tempo, foram barreiras para o desenvolvimento do direito do consumidor.�
De qualquer modo, seja no common law, seja no civil law, o desenvolvimento maciço do Direito do Consumidor como realização de política pública mundial pode-se dizer que teve sua origem na campanha presidencial do Presidente Kennedy, que enfatizava a necessidade de promover a defesa do consumidor. Assim, logo após a sua eleição e posse, em sua primeira mensagem ao Congresso norte-americano, definiu quatro direitos fundamentais dos consumidores: o direito à segurança, o direito à informação, o direito de escolha e o direito de ser ouvido.�
Segundo Eliana Cáceres,� a mensagem do Presidente Kennedy ao Congresso americano (1962) fez com que no ano de 1973 a Comissão de Direito Humanos das Nações Unidas, em sua 29.a sessão, realizada em Genebra, reconhecesse os princípios enunciados por Kennedy, como "direitos fundamentais e universais do consumidor". Em 1985, a Resolução da ONU, de n.o 39.248, recomendou aos Estados nacionais a adoção de direitos políticos de proteção ao consumidor.� 
Nesse aspecto, o Professor Fábio Konder Comparato� ensina que o "direito do consumidor, em seu conjunto, como realização de uma política pública, é novo na evolução do direito". E complementa a seguir: 
É obvio que o surgimento dessa nova política governamental, dando nascimento a um conjunto sistemático de normas jurídicas, nada mais é do que a manifestação do que as regiões industrializadas do planeta haviam atingido, desde o início dos anos sessenta, desse século, uma nova etapa na evolução econômica. Até então, a preocupação maior dos economistas – os sacerdotes dessa "triste ciência", como disse Ricardo foi, sem dúvida, a de resolver as carências, que afetavam, em maior grau, todas as regiões do mundo. A se ingressar, porém, pela primeira vez na história da humanidade, na era da opulência, foi possível mudar o objeto central das preocupações político-econômicas: não mais a falta de produção e, sim, a qualidade dos produtos ou mercadorias distribuídos no mercado. O consumidor, de elemento passivo e secundário na cena econômica, assumia um papel ativo e relevante, no campo político, ele deixava de ser tutelado, para se tornar uma força eleitoral com a qual era doravante preciso contar.
Não obstante a mitigação da autonomia privada seja uma tendência anterior ao movimento dos consumidores, não se pode negar as transformações sociais e econômicas que o Código do Consumidor trouxe à teoria dos contratos, i.e., um maior equilíbrio nas relações consumeristas, estabelecendo freios à concorrência desleal e publicidade enganosa, com o objetivo de garantir e manter o funcionamento do sistema capitalista. Em outras palavras, estas transformações, mesmo estando baseadas na proteção das relações de consumo, não visam tão- somente à defesa dos interesses dos consumidores, mas também asseguram a sobrevivência do sistema capitalista, com nova roupagem, ou seja: a mundialização da economia com fundamento nas políticas neoliberais.�
Com efeito, endossam-se as palavras de Andressa Caldas� quando enfatiza: 
não se pode negar que a necessidade de proteção do consumidor busca, fundamentalmente, fornecer maior equilíbrio nas relações de oferta e procura, no mercado de bens de consumo, respondendo, com isso, às exigência de constante elaboração do capitalismo. É preciso, portanto, desmistificar as medidas de proteção que têm em vista a simples defesa do sistema e não dos consumidores. Tal fato, todavia, não pode conduzir à mera e simples desconsideração de todos os avanços que o direito do consumidor trouxe e tem trazido para a teoria contratual. Não se pode olvidar, ainda, das conquistas obtidas em decorrência das lutas sociais por melhores condições de vida, fato que repercute necessariamente na ordem jurídica.
Finalizando, o desenvolvimento econômico pós-guerra ocasionou uma enorme concentração dos meios de produção e da circulação de riquezas, além da massificação das relações jurídicas e a grande rapidez com que se processam os negócios econômicos e jurídicos de aquisição de bens e serviços no meio social. Assim, a defesa do consumidor não busca a simples defesa dos interesses dos consumidores, mas também a proteção do sistema capitalista, ou seja, o jogo de poder e interesses socio-econômicos não termina aqui.
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4.1.4	Proteção do Consumidor: Evolução no Brasil
O consumidor no início do século XX adquiria seus produtos no pequeno empório e seus remédios em pequenas boticas. Os empórios e as boticas foram substituídos pelos hipermercados, shopping-centers, grandes lojas de departamentos e pelas redes de drogarias.� Em outras palavras, o crescimento constante do mercado fez com que as relações de consumo no trânsito jurídico se multiplicassem, a ponto de descaracterizar o caráter pessoal dessas relações, tornando-as massificadas e exigindo novas técnicas contratuais.�
A necessidade de o direito tutelar essa multiplicidade de relações de consumo construídas ao longos dos anos passou a exigir mecanismos de proteção ao consumidor, cuja normatização se iniciou há mais um de século, mediante regras esparsas que buscavam proteger o consumidor dos conflitos originados com os fornecedores, prestadores de serviço e produtores.�
No Brasil, as primeiras regras de proteção ao consumidor foram introduzidas pelas Ordenações Filipinas, que vigoraram até 1830, antes da edição do Código Penal do Império. Nelas estava estabelecido que, "se alguma pessoa falsificar alguma mercadoria, assim como cêra, ou outra qualquer, se a falsidade, que nela fizer, valer hum marco de prata, morra por isso". No título LVIII, do Código Filipino, constava ainda: "toda pessoa, que medir, ou pesar com medidas, ou peso falso, se a falsidade que nisso fizer, valer hum marco de prata, morra por isso. E se for de valia de menos do dito marco, seja degradado para sempre para o Brasil".
O Código Comercial (1850), Código Penal (1890� e 1940) e o Código Civil (1916) disciplinavam as relações de consumo, mas não coibiam os abusos e os danos à parte mais fraca das relações jurídicas, haja vista que no bojo desses códigos não havia previsão de reparação, danos ou indenização para a publicidade enganosa e o cumprimento da oferta, além da responsabilidade objetiva e a inversão do ônus da prova, entre outros institutos previstos no Código do Consumidor.
A primeira Constituição Brasileira a conceber espaço à ordem social e econômica foi a de 1934, com base nas demais constituições de pós-Primeira Guerra Mundial, reconhecendo os direitos econômicos e sociais do homem.� 
Na década de 1930, o Decreto n.o 22.626, de 07 de abril de 1933 (Lei da Usura) restringiu a cobrança de juros nas relações contratuais acima da taxa legal. A limitação dos juros, hodiernamente, não se aplica aos contratos realizados por instituições que integram o Sistema Financeiro Nacional, por força da interpretação do Supremo Tribunal Federal (Súmula n.o 596�). 
 O Decreto n.o 24.150, de 20 de abril de 1934, regulamentou o processo de revisão das locações comerciais e pôs fim ao abuso do locador, mediante a exigência do pagamento das "luvas".� O Decreto-lein.o 869, de 18 de novembro de 1938, pela primeira vez regulamentou os crimes contra a economia popular (usura e abuso do poder econômico). Em 11 de setembro de 1946, o Decreto-lei n.o 9.840 consolidou as infrações e os crimes contra a economia popular. A Lei de Economia Popular – Lei n.o 1.521, de 26 de fevereiro de 1951 – modificou a legislação vigente sobre crimes contra a economia popular. Pela Lei n.o 4.137, de 10 de setembro de 1962 (chamada de Lei de Repressão ao Abuso do Poder Econômico), foi criado o Conselho Administrativo de Defesa Econômico (CADE), estabelecendo normas à livre concorrência e a transparência do mercado, beneficiando de forma indireta o consumidor. Pela Lei Delegada n.o 4, de 26 de setembro de 1962, ficava assegurada a livre distribuição de produtos necessários ao consumo da população. Em 1969, a Lei n.o 4.717, de 29 de junho de 1965, regulou a Ação Popular, com objetivo de nulificar os atos lesivos ao patrimônio público. Dois anos depois, a Lei n.o 5.768, de 20 de dezembro de 1971, alterou a legislação sobre distribuição gratuita de prêmios, mediante sorteio, vale-brinde ou concurso, a título de propaganda, estabelecendo normas de proteção à poupança popular e criando o sistema de administração de grupos de consórcios. 
No ano seguinte, o Decreto n.o 70.951, de 09 de agosto de 1972, que regulamentou a Lei n.o 5.768/71, estabelecia normas para os sistema de consórcios e de proteção à poupança popular. A Lei n.o 6.024, de 13 de março de 1974, traçou normas de proteção à poupança popular na liquidação de instituições financeiras, sendo asseguradas a correção monetária para esses casos pelo Decreto-Lei n.o 1.477, de 26 de agosto de 1976. Posteriormente, a Lei n.o 6.463, de 09 de novembro de 1977, instituiu a obrigatoriedade da declaração do preço total nas vendas a prazo, além de constar no contrato e na publicidade escrita e falada o número e o valor das prestações mensais. 
A partir de 1980, inúmeros diplomas legais buscavam de forma direta ou indireta a proteção do consumidor, entre os principais, têm-se: Lei n.o 7.244, de 07 de novembro de 1984, que autorizou os estados a instituírem o Juizados de Pequenas Causas; Lei n.o 7.347, de 24 de julho de 1985, que regulou a ação civil pública que tem por objetivo proteger os interesses e direitos difusos, coletivos, individuais dos consumidores; Decreto n.o 91.469, de 27 de julho de 1985, que criou o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor; Decreto n.o 94.508, de 23 de junho de 1987, que extinguiu o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor substituindo-o pelo Departamento Nacional de Proteção e Defesa do Consumidor; Lei n.o 7.492, de 16 de junho de 1986, que pune os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional; Lei n.o 8.245, de 18 de outubro de 1991, que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos; Lei n.o 8.884, de 11 de junho de 1994, chamada de lei antitruste, transforma o CADE em autarquia e dispõe normas de prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; Lei n.o 9.099, de 26 de setembro de 1995, revoga a lei dos juizados de pequenas causa e cria os juizados especiais cíveis. 
Não obstante a diversidade das normas legais, o desequilíbrio nas relações de consumo permanecia, pois não existia previsão legal para a proteção dos consumidores nos contratos de adesão, que traziam em seu corpo cláusulas consideradas abusivas pela doutrina, tais como: cláusula mandato, cláusula de transferência de riscos, cláusula que permitia a alteração unilateral do contrato, cláusulas que permitiam a cobrança excessiva de juros, cláusulas que permitiam a cobrança de juros capitalizados, entre outras.�
Além disso, o consumidor na defesa de seus direitos era obrigado a provar o dano, tornando-se quase impossível a prova do nexo de causalidade entre o dano e o evento danoso, em razão da ausência de informações técnicas ou de recursos econômicos.�
A propósito, como a legislação esparsa não deu conta de solucionar as demandas dos consumidores, fez-se necessária uma reestruturação do trânsito jurídico nas relações de consumo, pois uma mera atualização da lei e/ou a proteção por dispositivos legais específicos não asseguraria a proteção dos consumidores. Assim, foi necessário um novo direito consubstanciado em princípios modernos e eficazes, garantindo uma autonomia da vontade protegida pela lei – Código de Defesa do Consumidor.
E foi assim que a Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, sensível às necessidades sociais e às tendências modernas do direito, estabeleceu normas de proteção ao consumidor.� Finalizando, este breve percurso histórico, a Carta Magna prescreveu, entre os direitos individuais e coletivos no inciso XXXII do artigo 5.o, que o "Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor". Em seu artigo 24, inciso XIV, que trata da competência concorrente da União, dos Estados e Distrito Federal, a possibilidade de legislar sobre responsabilidade por dano ao meio ambiente e ao consumidor. Na ordem tributária, o artigo 150, parágrafo 5.o, estabelece com função da lei "medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca de impostos que incidam sobre mercadorias e serviços", evitando que o consumidor seja iludido pelos fornecedores. O aspecto mais expressivo se observa quando o constituinte, ao definir os princípios gerais da atividade econômica, além de garantir a livre iniciativa, a liberdade da empresa, assegurou entre os princípios da atividade econômica a defesa do consumidor e a defesa do meio ambiente (art. 170, inciso V, CF/88). Por fim, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), em seu artigo 48, o constituinte determinou que "o Congresso Nacional, dentro de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, elaborará o Código de Defesa do Consumidor." 
Em 11 de setembro de 1990, apesar de vencido o prazo constitucional, o Presidente da República sancionava a Lei n.o 8.078, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor, com 119 artigos e tendo sofrido 36 vetos, dividido em 06 títulos que apresentam conceitos, definições e medidas que têm por escopo assegurar os direitos básicos do consumidor e a Política Nacional de Relações de Consumo.
�MARX, Karl. Para crítica da economia política. Do capital. O rendimento e suas fontes. Tradução de: Edgard Malagodi com colaboração de José Arthur Giannotti. São Paulo: Nova Cultural, 2000. (Os pensadores). p. 31-34: Marx afirma: "A fome é fome, mas a fome que satisfaz com carne cozida, que se come com garfo ou faca, é uma fonte muito distinta da que devora carne crua, com unhas e dentes. A produção não produz, pois, unicamente o objeto de consumo, mas também o modo de consumo, ou seja, não só objetiva, como também subjetivamente. Logo, a produção cria o consumidor." 
�TASCHNER, Gisela. Raízes da cultura do consumo. Revista da Universidade de São Paulo, São Paulo: USP, n.32, p. 28, dez./fev. 1996/1997. 
�Consumo conspícuo: consumo ostensivo; consumo notável.
�TASCHNER, op. cit., p. 29: A professora ensina que Veblen "foi um pioneiro no estudo do consumo conspícuo. Associou-o à emergência de uma classe ociosa - que teria chegado ao seu ponto máximo de desenvolvimento no feudalismo – e ao que hoje chamaríamos de estilo de vida dessa classe". (In: VEBLEN, Thomstein. Teoría de la classe ociosa. México: FCE, 1966.)"
�TASCHNER, op. cit., p. 29: Esclarece a autora que as atividades classificadas como proezas eram consideradas dignas e nobres e as atividades que não continham este elemento eram consideradas indignas. E complementa, citando Vedlen: "A instituição de uma classe ociosa é a excrescência de uma discriminação entre tarefas, com relação à qual algumas delas são dignas e outras indignas. (...) Sob essa antiga distinção são tarefas dignas aquelas que podem ser classificadas como façanhas; indignas, as ocupações de vida quotidiana em que não entra nenhum elemento apreciável de proeza." (In: VEBLEN, op. cit., p. 16-17.)
�TACHNER, op. cit., p. 30: A autora, citando Veblen, diz que o aparecimentoda propriedade coincide com o nascimento das classes ociosas, inicialmente pela propriedade das mulheres pelos homens, adquiridas como troféus nas guerras (capturadas), posteriormente estendendo a propriedade para os demais bens.
�TACHNER, op. cit., p. 29: As ocupações não-industriais eram aquelas que não implicavam tarefas manuais, rotineiras e cotidianas, associadas à subsistência do grupo social.
�TASCHNER, op. cit., p. 31: "Se o reconhecimento por parte dos outros membros de uma comunidade antes estava ligado à habilidade de realizar proezas, cujos resultados visíveis por vezes eram troféus, torna-se posteriormente associado à posse de bens. O indivíduo tem que atingir agora um 'certo nível convencional e pouco definido de riqueza' para se sentir reconhecido pelos outros e, em decorrência, por si mesmo.
�TASCHNER, op. cit., p. 30-31.
�TASCHNER, op. cit., p. 31-32: "O peso desse processo de competição entre os indivíduos, através da aquisição de bens, para a manutenção do status que eles possuem ou obtenção de um mais elevado, na conformação de uma cultura de consumo, não deve ser subsestimado. Veblen teve o grande mérito de ser um dos primeiros a formular essa relação – mérito esse maior ainda se levar em conta que o objetivo de seu livro era entender o consumo conspícuo de um ponto de vista estritamente econômico – e a abrir caminho para análises posteriores. Mas a compreensão dessa cultura exige que se vá além, não a reduzindo a um processo de competição social tout court.
�TASCHNER, op. cit., p. 29: Para a autora, as cortes européias desenvolveram esse padrão de consumo, que mais tarde é popularizado nas camadas sociais menos favorecidas, mediante de um processo de imitação – que está na base da cultura do consumidor.
�TASCHNER, op. cit., p. 33: "Os nobres passaram a depender mais do rei e o rei passou a ter mais poder. (...) O rei foi o único elemento da nobreza que, em virtude de sua função, não teve sua base econômica diminuída e cujo prestígio social e força, ao contrário aumentaram. Originalmente o rei tirava seus recursos do produto de suas terras, como todos os nobres. Mas com o tempo uma parte crescente de seus recursos passara a ser formada por impostos e rendas de todos os tipos que ele cobrava de seus súditos. Assim, de distribuidor de terras o rei se tornara cada vez mais um possuidor e distribuidor de dinheiro.
�TASCHNER, op. cit., p. 35: "... – o garfo de servir aparece em fins do século XVI, mas no século XVII, o garfo ainda é artigo de luxo –, a arquitetura e a forma de decoração dos interiores das residências se alteraram, dando lugar a uma série de novos itens de consumo, Rosalind Williams observa que: "uma vez admitido no círculo encantado da corte, um nobre teria de gastar ruinosamente para permanecer lá. Ele precisava de roupas bordadas com fios de ouro e prata e de jóias de brilhantes para usar nos bailes; um estábulo para cavalos e uma matilha de cães de caça; carruagens com interior de veludo e painéis pintados para que pudesse acompanhar o rei em migrações para outros palácios; casas e mobília adequadas para que ele pudesse oferecer jantares e festas dançantes para a corte; e dúzias de valetes e empregados para tornar todo o resto possível. Com raras exceções, os cortesões contraíam dívidas enormes... [e então] dirigiam-se ao monarca para obter ajuda financeira." 
�TASCHNER, op. cit., p. 35-36: "Tratava-se de um consumo de prestígio. Desde as características de suas casas, até as recepções, e o vestuário, o cortesão passara a ter gastos enormes. Faziam parte de sua posição social e do papel que lhe cabia nessa posição. (...) Não havia espaço para promover um equilíbrio entre receita e despesa, nem para poupar parte da renda, nem para economizar no consumo. Se os gastos fossem maiores do que a receita, fazia-se necessário achar novos recursos ou contrair dívidas, jamais diminuir os gastos. Trabalhar não era possível, o nobre não podia ganhar dinheiro através do trabalho. Isso seria profundamente desabonador, tanto como refrear os gastos de prestígio. Havia uma proibição legal tanto à nobreza de espada como à togada de se dedicar ao comércio, cuja transgressão implicaria a perda do título e de posição."
�TASCHNER, op. cit., p. 37: "O tesouro real bancou não apenas os gastos pródigos do rei mas, indiretamente, através de empréstimos e pensões, os de toda a corte. O gasto estatal aumentou astronomicamente. Em troca, a monarquia ganhava uma nobreza dependente que se reunia na corte porque o poder real estava concentrado ali, apenas para se descobrir constrangida a um nível de consumo que tornava maior aquele poder. Assim, fecha-se o círculo. No caso da França, que se tornou paradigmático do estilo de vida da corte européia, o processo de centralização do poder real articulado à perda de rendas (e terras) da nobreza tornou-se esse estatamento progressivamente dependente do rei. Acolhendo parte de seus membros na corte, e desenvolvendo ali um estilo de vida luxuoso e ritualizado, o rei tornava-os mais dependentes dele." 
�TASCHNER, op. cit., p. 39: "a alta sociedade foi tomada pela febre das novidades (...). Com a moda aparece uma primeira manifestação de uma relação social que encarna um novo tempo legítimo e uma nova paixão própria do Ocidente, a do moderno. A novidade tornou-se fonte do valor mundano, marca de excelência social; é preciso seguir o que se faz de novo e adotar as últimas mudanças do momento; o presente se impôs como eixo temporal que rege uma face superficial, mas prestigiosa da vida das elites." (In: LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 33.)
�LIPOVETSKY, op. cit., p. 42.
�"Aristóteles era severo: 'O objeto original do dinheiro foi facilitar a permuta, mas os juros aumentavam a quantidade do próprio dinheiro (esta é a verdadeira origem da palavra: a prole se assemelha aos progenitores, e os juros são dinheiro nascido do próprio dinheiro); logo, esta forma de ganhar dinheiro é de todas a mais contrária a natureza. Em Roma, de onde emanou a grande vertente de nosso sistema jurídico ocidental, os jurisconsultos já debatiam o problema da usura. Denominavam usurae, expressão derivada de usu, significa coisa que brota de outra, assimilada e, às vezes, mesmo contraposta a fructus. (...) A Lei das XII Tábuas já procurava limitar a usura, expedindo leis, e senatus consulta, que reduziam através de limites a respectiva taxa que era cobrada. (...) Com o advento do Cristianismo, a usura passou a ser combatida frontalmente, pois contrariava os ideais pregados por Jesus Cristo. (...) Na Idade Média, a Igreja continuou a repudiar a usura dentro de sua doutrina. (...) Aprofundada a análise elaborada por teológos, civilistas, canonistas, afirmou-se que todo contrato, todo negócio que visa a um lucro não justificado pelo trabalho é usurário, seja ou não mútuo. (...) No Brasil, desde o período colonial a usura foi condenada." (In: WEDY, Gabriel. O limite constitucional dos juros reais. Porto Alegre: Síntese, 1997, p. 21/23).
�O controle da usura sempre existiu. "É bastante significativo que Charles Dumoulin, advogado francês que escreveu no século XVI, tenha alegado a 'prática comercial diária' como justificativa para a legalização da 'usura moderada e aceitável'. Eis aqui a sua argumentação: "A prática comercial diária mostra que a utilidade do uso de uma soma considerável de dinheiro não é pequena... nem permite dizer que o dinheiro por si só não frutifica; pois sequer os campos frutificam sozinhos, sem gastos, trabalho e indústria dos homens; o dinheiro, da mesma forma, ainda que deva ser devolvida dentro de um prazo, proporciona nesse período um produto considerável, pela indústria do homem. E por vezes priva a quem empresta de tudo aquilo que traz a quem toma emprestado... Portanto, toda a condenação, todo ódio à usura, devem ser compreendidos como aplicáveis à usura excessiva e absurda, não a usura moderada e aceitável". (In: HUBERMAN,Leo. História da riqueza do homem. 21.ed. Rio de Janeiro: RTC, 1986. p. 41).
�ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à economia. 9.ed. São Paulo: Atlas, 1982. p. 370-371: "Tal reconhecimento levaria os clássicos à intransigente defesa da concorrência perfeita, cuja formação principal seria limitar os exageros do interesse individual e impedir que as unidades de produção conspirassem contra os consumidores. A concorrência, importante peça do modelo clássico, atuaria como a contrapartida do interesse próprio. Em certo sentido, seria uma instituição para a reconciliação dos interesses públicos e privados."
�ALMEIDA PRADO, Ana Emília de. Disposições gerais no CDC. Revista Direito do Consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 11, p. 26, jul./set. 1994.
�AMARAL, Luiz Otávio de Oliveira. História e fundamentos do direito do consumidor. Revista dos Tribunais, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 648, p. 34, out. 1989: "Os ditames do liberalismo econômico, não há fulgor, hão de se conciliar com os princípios da justiça social; os valores individuais abstratos hão de se mesclar com os valores sociais reais e o dever jurídico há de reduzir o ímpeto de vestusto Direito subjetivo. A vida dos contratos há de estar inspirada nos fins sociais deles mesmos. Com efeito, a liberdade de contratar jamais foi ilimitada, pois sempre a excepcionaram a ordem pública e os bons costumes, quiméricos princípios que precisavam ter mais objetividade, para não oscilarem segundo as convicções pessoais. Note-se, por outro lado, que o direito de propriedade sempre foi mais defendido que o direito de igualdade. Não se faz distinção entre a propriedade de bens de consumo e uso e a propriedade de bens de produção, simplesmente fala-se de propriedade privada; nada ou pouco se permitindo em termos de ingerência estatal em sua regulação. Mas a intervenção estatal se justifica plenamente quando seu desiderato comunga com o bem social, já que sem isto, não restará razão de ser para o Estado hodierno."
�BENJAMIM, Antonio Hermann V. O direito do consumidor. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 670, p. 54, ago. 1991: Para o autor, a evolução do direito do consumidor "na Europa parece que se fez com menos dificuldades, principalmente em face da existência de certas teorias tradicionais, como a dos vícios redibitórios, que já permitiam uma certa proteção para o consumidor. Enquanto nos Estados Unidos o aparecimento do Direito do Consumidor processou-se a partir de uma perspectiva individualista e reparatória (proteção do indivíduo-consumidor para se alcançar a do público-consumidor), na Europa a evolução ocorreu como um esforço muito mais de tutelar o público de uma maneira geral do que propriamente de reparar danos sofridos por consumidores individuais." 
�GARCIA, Mário Sérgio Duarte. Direito do consumidor. O Direito na década de 1990: Novos aspectos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992. Estudos em homenagem ao Prof. Arnoldo Wald. p. 22-23: "Na historiografia do direito do consumidor, lembra-se que foi o Presidente Kennedy quem sensibilizou o mundo com a necessidade de promover-se sua efetiva proteção. Em sua campanha presidencial já dera ênfase a essa preocupação, abordando o tema inúmeras vezes. Escolheu-o, logo após eleito e empossado, em sua primeira mensagem ao congresso norte-americano, quando apontou os princípios básicos da defesa do consumidor: os bens e serviços colocados no mercado, devem ser sadios e seguros para o seu uso; promovidos e apresentados de uma maneira que permita ao consumidor fazer uma escolha satisfatória; que a voz do consumidor seja ouvida no processo de retomada de decisão governamental que determina o tipo, a qualidade e o preço dos bens e serviços colocado no mercado; tenha o consumidor o direito de ser informado sobre as condições dos bens e serviços e ainda o direito de preços justos".
�CÁCERES, Eliana. Os direitos básicos do consumidor – uma contribuição. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 10, p. 64, abr./jun. 1994.
�CÁCERES, op. cit., p. 64: "Dez anos depois de intensas tratativas, o movimento de consumidores pode celebrar uma de suas vitórias mais significativas: a aprovação por unanimidade das Diretrizes para a Proteção do Consumidor por parte da Assembléia-Geral das Nações Unidas através da Res. 39.248 de 9.4.85. Esta Resolução recomenda aos países membros da ONU que desenvolvam, reforcem ou mantenham uma política firme de defesa do consumidor, sendo que cada governo deve determinar prioridades de acordo com as circunstâncias econômico/social do país e as necessidades de sua população, levando em conta os custos e benefícios das medidas propostas. Houve também a introdução de uma "Lei Base de Defesa do Consumidor".
�COMPARATO, Fábio Konder. A proteção ao consumidor na constituição brasileira de 1988. Revista de Direito Mercantil, São Paulo, n. 80, p. 66-67, out./dez. 1990.
�BENJAMIN, Antonio Hermann V., op. cit., p. 55: "Essa característica do Direito do Consumidor, hoje preponderante na nova disciplina, tem duas vertentes. Uma é a de impedir que a fragmentação da relação de consumo cause prejuízos ao consumidor. Outra é a de prevenir que o conflito de consumo venha enfraquecer o próprio mercado e, com ele, a ordem capitalista. Isso porque o Direito Econômico, é uma ação voltada à preservação do mercado – enquanto mecanismo de coordenação do processo econômico – tendo em vista o interesse social". 
�CALDAS, Andressa. Direito do consumidor: exigência do capitalismo ou transformação social? Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, Porto Alegre, v. 32, p. 113, 1999.
�SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 5.ed. São Paulo: Nobel, 2000. p. 34: "O poder do consumo é contagiante, e sua capacidade de alienação é tão forte que a sua exclusão atribui às pessoas a condição de alienados. Daí a sua força e o seu papel perversamente motor da sociedade atual." 
�MARQUES, Cláudia Lima, Contratos..., op. cit., p. 49-51: "Na sociedade de consumo, com seu sistema de produção e distribuição em grande quantidade, o comércio jurídico se despersonalizou e os métodos de contratação em massa, ou estandardizados, predominam em quase todas as relações contratuais entre empresas e consumidores. Dentre as técnicas de conclusão e disciplina dos chamados contratos de massa, destacaremos, neste estudo, os contratos de adesão e as condições gerais dos contratos ou cláusulas gerais contratuais. (...) Note-se que estas novas técnicas contratuais, de pré-elaboração unilateral do conteúdo do contrato, também são utilizadas por empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos (por exemplo, no fornecimento de água, luz, serviços de transportes, correios, telefonia). (...) Por fim cabe lembrar que nas relações de massa nem sempre os contratos serão feitos por escrito, pois ao lado dos contratos de adesão, expressos em formulários, existem os contratos orais, a aceitação através de condutas sociais típicas, os simples recibos, os tickets de caixas automáticas.
�SILVEIRA, Reynaldo Andrade da. Práticas mercantis no direito do consumidor. Curitiba: Juruá, 1999. p. 65: Para o autor "nenhuma dessas disposições legais estava a sistematizar a matéria. Nenhuma houvera instrumentalizado a Justiça. Nenhuma definia sequer o consumidor, ou ainda indicava com precisão o que seria relação de consumo. Noções básicas sobre responsabilidade civil, questões processuais importantes como a legitimidade para agir (ativa e passiva) e o desaparelhamento do Judiciário, principalmente, distanciavam o consumidor da justiça e tornavam impunes tanto o fabricante como o comerciante/empresário, o que, de fato, gerava a absoluta dispersão da massa consumidora, abrindo as portas para os abusos do poder econômico."
�O artigo 340 de nosso Código Penal de 1890, preocupava-se com os excessos do poder econômico, mas sem força para poder contê-lo.
�SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 11.ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 169-170: "Essa constituição durou poucomais de três anos, pelo que nem teve tempo de ter efetividade. A ela sucedeu a Carta de 1937, ditadorial na forma, no conteúdo e na aplicação, com integral desrespeito aos direitos do homem, especialmente os concernentes às relações políticas." Por outro lado, nas Constituições de 1946, 1967 e 1969, aparecem "os direitos econômicos e sociais, mais bem estruturados do que na de 1934, em dois títulos: um sobre a ordem econômica e outro sobre a família, a educação e a cultura. 
�Verbete n.o 596: "As disposições do Dec. 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional."
�Esse Decreto foi revogado pelo artigo 90 da Lei n.o 8.245, de 18 de outubro de 1991. 
�CAVALIERI FILHO, Sergio. O direito do consumidor no limiar do século XXI. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 35, p. 98, jul./set. 2000: O autor comentando as mudanças no processo de produção, distribuição e comercialização dos produtos assevera que "esse novo mecanismo de distribuição fez surgir novos instrumentos jurídicos - os contratos coletivos, contratos de massa, contratos de adesão, cujas cláusulas gerais, sabemos todos, são preestabelecidas unilateralmente pelo fornecedor sem qualquer participação do consumidor. Rapidamente, como dissemos, o direito material tradicional ficou ultrapassado; envelheceu aquele direito concebido à luz dos princípios romanistas, tais como a autonomia da vontade, a liberdade de contratar, o pacta sunt servanda e a própria responsabilidade fundada na culpa. Os remédios contratuais clássicos também se revelaram ineficazes para dar proteção efetiva ao consumidor em face das novas cláusulas engendradas para os contratos de massa. E essa disciplina jurídica deficiente, arcaica, ultrapassada, foi o clima propício para a proliferação de todas as práticas abusivas possíveis, aí incluídas as cláusulas de não indenizar ou limitativas de responsabilidade, o controle do mercado, a eliminação da concorrência e assim por diante, gerando insuportáveis desigualdades econômicas e jurídicas entre o fornecedor e o consumidor."
�NOGUEIRA, Tania Lis Tizzoni. A prova no direito do consumidor. Curitiba: Juruá, 1998. p. 24-25.
�BULGARELLI, Waldírio. Direito do consumidor. O direito na década de 1990: novos aspectos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, Estudos em Homenagem ao Prof. Arnold Wald. p. 35: "A promulgação do Código de Proteção ao Consumidor (Lei n.o 8.078/91) vem coroar uma aspiração de mais de uma década da sociedade brasileira. Dos inúmeros anteprojetos e projetos apresentados durante todo esse tempo, o que veio ser finalmente aprovado - e que foi discutido à exaustão pelas classes interessadas - certamente se apresenta como uma visão precisa dos grandes problemas decorrentes das relações de consumo, apresentado um laivo de modernidade significante para a confirmação do qual bastaria tão-só um exemplo: o da responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto. Sem dúvida que não se esgota o Código nessa colocação, trazendo toda uma série de inovações que foram conquistadas, por que não dizer, a duras penas em outros ornamentos jurídicos como os dos países anglo-saxões e da Europa continental. De um ponto de vista normativo, a bem dizer, formal, verifica-se que se trata de uma lei completa, quase autônoma, com incursões no Direito privado, no campo administrativo, no plano processual e na órbita penal, o que se verifica pelos seus 119 artigos, o que enquadra a naqueles diplomas legais caracterizados pela doutrina moderna, como um microssistema legal autônomo. A justificativa de uma lei deste tipo encontra-se em pelo menos dois aspectos: a) A primeira, de caráter geral, é a de que a sociedade civil brasileira, à medida que se consolida o capitalismo na sua projeção mais acentuada, que é a da produção e distribuição em massa, vai tomando consciência de que necessita de proteção mais efetiva em relação ao modelo jurídico criado anteriormente, e conseqüentemente que a política jurídico-legislativa deve deixar de lado a postura adotada até agora de privilegiar sempre a empresa, para levar em conta os interesses daqueles a quem a produção é destinada, e que se convencionou chamar de consumidor. b). A outra, mais específica, é de certa forma antecedente àquela, pois refere-se à constatação de que os mecanismos jurídicos existentes revelam-se a cada dia insuficientes e incapazes de tornar efetiva a proteção que deve ser dispensada àqueles que se encontram em situação de inferioridade perante as empresas, tanto no que toca à reparação dos danos causados, como no que se refere à prevenção. A constância e a intensidade dos abusos verificados na produção-venda dos produtos de uso e costumes de massa, com a incrível série de danos verificados que inclusive ultrapassam a esfera individual, em muitos casos, para tomar proporções catastróficas, como no caso do uso do MERCK-29, do Contergan-Thalidomida, do Stalidom, exemplos que se tornaram tristemente clássicos, fez surgir aos olhos de todos uma nova categoria de sujeito, identificado não mais pelo aspecto de sua nacionalidade, da profissão, da condição social, de pai de família ou chefe de empresa, de civil ou militar, assalariado ou investigador, mas como sendo aquele que consome, portanto, o consumidor. Razão pela qual já se chegou a ser comparado ao aparecimento do proletariado, como um desamparado no campo econômico do consumo.”

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