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Universidade Federal do Rio de Janeiro Antiga I - Antiguidade Grega Fábio de Souza Lessa Milena Guerrão Lourenço - DRE 119029525 Resenha: Logos Gunaikós - Marta Mega de Andrade Marta Mega de Andrade, formada em História pela Universidade Federal Fluminense e pós-doutorada em Arqueologia pela Universidade de São Paulo, possui vasta produção intelectual em História Social, sobretudo acerca da História da Mulher e, principalmente, sobre a colocação da figura feminina e a construção de gênero na Grécia Clássica. Em seu artigo, Logos Gunaikós, publicado no livro intitulado Dialogando com Clio, a autora empreende mais uma contribuição na área em questão, levantando uma reflexão sobre a palavra (logos) feminina (gunaikós) na Pólis. Admitindo-se logos como a palavra política, o discurso argumentativo, como a posição de propor um debate, procura-se refletir sobre a possibilidade dessa palavra ser emitida por uma mulher. Marta Mega inicia sua colocação exemplificando referências à fala feminina na Grécia Clássica, como a de Clitemnestra na tragédia de Ésquilo, Agamemnon, onde, no episódio final, o autor aponta a palavra da personagem em relação à situação de instabilidade, onde ela procura apaziguar o conflito, como algo a não ser considerado. Pouco após a intervenção de Clitemnestra a peça se encerra, tal fala, então, não chega a possuir teor político, de deliberação. Sendo assim, a mensagem proposta por Ésquilo, em seu apontamento, é de que a voz feminina não deve ser levada em conta, uma mulher não é fonte de conselhos. Portanto, a autora propõe a reflexão: por que existe a insistência em afirmar tal coisa? Tem-se o cerceamento da palavra feminina no aspecto público, a repressão do Logos Gunaikós, mas qual seria a real preocupação com esta fala? No contexto da Lisístrata, de Aristófanes, Diceópolis evoca a autoridade de seu discurso elencando seus feitos e participações nos ritos da pólis durante toda sua vida, por suas atividades enquanto cidadã, ela tem o direito de ser ouvida, de levantar uma questão aos cidadãos. O que a autora quer discutir, isto posto, não é a simples fala da mulher, como a encontrada no âmbito doméstico e privado, mas a palavra no contexto social, político, com caráter propositivo, esta que é, como já citado, claramente negativada por Ésquilo em relação à Clitemnestra. No contexto funerário, entretanto, encontra-se a palavra da mulher, levando em consideração que este espaço não se enquadra na política pública, mas está próximo á vida doméstica. No período arcaico as epígrafes dedicadas às mulheres eram curtas e informativas, dando relevância à escultura e à quem a fez, assim, a obra parece ter precedência sobre a escrita. No fim do período clássico escrita e símbolo (monumento) se distanciam e o discurso toma a forma de epigrama. Marta Mega utiliza como exemplo um epigrama misto, onde se encontra a fala em terceira e em primeira pessoa. A dedicação, então, feita à Mélita, datada de 360 a.C., apresenta a fala imperativa por parte da mulher, que diz ao seu marido "ama os meus", se referindo aos filhos do casal. Ao reivindicar, portanto, o amor aos filhos, Mélita ocupa certo lugar de poder, sua fala póstuma, diante de um público, no caso o de seu enterro, exerce certa autoridade. Dessarte, a autora explicita, diante de suas análises e exemplos, a presença do logos gunaikós e a forma como este aparece e é administrado, e encerra levantando outra reflexão: não seria possível demarcar as distinções de gênero na pólis clássica através das relações verbais, da palavra política? Tal colocação, portanto, é de extrema importância, tendo em vista que na realidade atual esta discussão está constantemente em pauta. Na sociedade brasileira, por exemplo, as distinções de gênero vão além das atividades sociais e alcançam a liberdade de fala, colocando em questão quem pode falar, o que se pode falar, onde se pode falar, etc, concluindo-se que a mulher continua tendo sua fala, principalmente política, propositiva, argumentativa, cerceada. Visto isso, a contribuição reflexiva de Marta Mega de Andrade tem grande peso para as discussões da atualidade e deve fomentar novas análises. Bibliografia ANDRADE, M. M.. Logos Gunaikós. In: BUSTAMANTE, M. C.; LESSA, F.S (org.). Dialogando com Clio. Rio de Janeiro: Mauad X, 2009.
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