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Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 1 TROMBOSE É um distúrbio da coagulação do sangue, sendo um processo patológico de solidificação do sangue dentro dos vasos ou do coração no indivíduo vivo – ocorre como consequência da ativação imprópria da hemostasia. A hemostasia é um processo altamente regulado que mantem o sangue em um estado líquido (fluido) no interior de vasos íntegros, permitindo a formação de um tampão hemostático no local de uma lesão vascular. Na hemostasia funcional, há formação de coágulo através da agregação plaquetária e deposição de fibrina, que solidifica o sangue a fim de impedir o extravasamento de sangue em um vaso que houve ruptura de sua parede. Na trombose, ocorre formação de um coágulo em um território da circulação, do indivíduo vivo, que não está rompido, isto é, forma-se um coágulo patológico, pois ele não está ali para promover o estancamento do sangue. O coágulo patológico é chamado de trombo. Após a morte todo sangue coagula, independente da integridade do vaso, o que é chamado de coagulação pós mortem. Patogênese da trombose Tríade de Virchow – em cada ponta é colocada a patogênese da trombose: alterações no endotélio, alterações na coagulação e alteração no fluxo sanguíneo. A explicação pode ser dada por apenas uma ponta do triangulo ou pela associação de mais de uma. Esses fatores não são completamente independentes, isto é, estão ligados entre si. 1) Lesão/alteração endotelial O endotélio é formado por epitélio simples pavimentoso que forma uma barreira entre o sangue e a parede do vaso. Abaixo, tem-se a membrana basal. A lesão endotelial está associada a uma situação de perda do revestimento, no entanto, a parede do vaso mantem- se íntegra. A perda do revestimento provoca contato das plaquetas com o colágeno, levando a formação de um trombo. É melhor chamar de alteração endotelial ao passo que o endotélio pode estar íntegro, mas ainda assim ser pró-trombótico. O endotélio é extremamente dinâmico, que pode expor na sua membrana moléculas que são atrativas para diversos elementos figurados do sangue que atraem a agregação das plaquetas – superfície pró-trombótica. Só a lesão do endotélio não é suficiente para causar uma hemorragia, uma vez que existem mais camadas. No entanto, a lesão endotelial expõe a membrana basal a moléculas que são atrativas para diversos elementos figurados do sangue, como aquelas que atraem a agregação das plaquetas que ativa a cascata da coagulação que forma fibrina, e isso provoca a formação de um trombo. Fatores que podem provocar lesão endotelial HAS – problema mecânico em função do atrito, do cisalhamento e da força do sangue contra a parede do vaso. Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 2 Diabetes mellitus e tabagismo – agressão química, glicemia elevada e fatores inalados do cigarro. Toxinas bacterianas – processo infeccioso que provoca lesão endotelial. Inflamações agudas – atração de mediadores inflamatórios que alteram o endotélio Aterosclerose e aneurisma – turbilhonamento sanguíneo que lesa o endotélio. Infarto subendocárdico – região do coração que atinge o endotélio: terço inferior interno à metade da parede ventricular. Lesão funcional – não agride diretamente o endotélio, mas desequilibra as atividades pró e anticoagulantes do endotélio, com exposição de moléculas que fazem com que essa superfície se torne pró-trombótica. Vasculite Inflamação da parede do vaso que pode resultar de doença autoimune (inflamação do lado de fora do vaso quando há reação de anticorpos contra elementos da parede do vaso); agente etiológico instalado na parede do vaso; trauma (pancada que gera inflamação); pós-operatório de cirurgias muito extensas (estímulo da produção de mediadores inflamatórios – o aumento dos mediadores pode fazer o endotélio reagir a essa inflamação, se tornando pró-trombótico); paciente poli traumatizado; grande queimado. Endocardite infecciosa Associada a formação de trombos nas valvas cardíacas – caracterizada pela instalação de microorganismos, como bactérias e fungos, no coração, formando colônias bacterianas ou fungicas dentro do órgão, principalmente nas valvas cardíacas. A destruição do endotélio valvar pelos microorganismos pode provocar trombose. Drogas injetáveis Podem gerar trombose por vasculite, uma vez que o tipo de medicamento agride a parede do vaso e é tóxico a ela. Sendo assim, alguns medicamentos precisam ser diluídos, e às vezes necessita-se de um acesso mais calibroso. Procedimentos invasivos Fator iatrogênico – a necessidade de administração de medicamentos em acesso central faz com que seja necessário colocar um cateter dentro de um vaso mais calibroso, e pode ser que haja lesão endotelial durante a penetração do vaso. Há também o exemplo de cateterismo arterial para visualizar o fluxo sanguíneo nas coronárias, em que há inserção de cateter pela artéria femoral que sobe pela aorta e entra pelas coronárias – nesse percurso, a passagem do cateter por dentro dos vasos pode gerar lesão endotelial e causar trombose. 2) Hipercoagulabilidade A trombose pode aparecer em locais pouco frequentes, como no membro superior, por exemplo. Podem ser hereditárias (trombofilias) ou adquiridas, seja por medicamentos ou por câncer. Redução de concentração de anticoagulantes, como a antitrombina III ou proteína C. A diferenciação é feita por meio de fatores como idade do paciente (se jovem, é sugestivo da hereditária; se mais velho, é sugestivo da adquirida); medicamentos que esse toma e doenças que apresenta. Diátese trombótica: tendência a coagular o sangue. Quando o paciente sofre um estresse agudo, como um politraumatismo, cirurgias extensas ou uma queimadura, há aumento dos fatores de coagulação como uma forma de reação ao estresse, e isso pode estar associado à trombose. Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 3 Hereditária Processo genético; em que se suspeita principalmente em casos de pacientes jovens que não apresentam fatores de risco para trombose, e com trombose em repetição. Existem testes para detectar a hipercoagulabilidade genética, porém, nem todas as moléculas envolvidas no processo são conhecidas, e assim nem todos os testes estão disponíveis. O paciente possui tendência à formação de trombo quando possui déficit de moléculas anticoagulantes ou excesso de moléculas pró-coagulantes. Doenças autoimunes Podem ser responsáveis pela síndrome, uma vez que certas interações dos anticorpos com moléculas do sistema anti e pró-coagulante podem deslocar o sistema para a pró- coagulação. Um exemplo é a síndrome do anticorpo antifosfolipídico, em que há predisposição a formação de trombos. Essa síndrome está associada ao lúpus eritematoso sistêmico, doença em que a ocorrência de vasculite é comum. O paciente portador dessa doença possui um quadro que coincide com duas pontas da Tríade de Virchow: hipercoagulabilidade e lesão endotelial. Adquirida Pensa-se em medicamentos ou em doenças de base. Anticoncepcionais orais Medicamentos pró-coagulantes. Efeito associado ao estrógeno, não a progesterona, tendo em vista que os anticoncepcionais injetáveis (feitos apenas de progesterona) não aumentam risco de trombose na mesma proporção do que os anticoncepcionais orais. Tendo em vista tal efeito do medicamento, sua prescrição deve ser pensada pelo médico levando em consideração o quadro geral do paciente. Caso ele possua outros fatores de risco para trombose, deve-se reconsiderar o método uma vez que esses fatores podem atuar sinergicamente com o medicamento para a formação do trombo.Câncer As células tumorais podem atuar favorecendo a pró-trombose na interação de moléculas anti e pró-coagulantes. Além disso, pode ser que o organismo produza substancias pró- coagulantes contra o câncer que promovam o desequilíbrio da cascata de coagulação; ou até mesmo que impeçam a produção de substancias anticoagulantes. Tabagismo As substancias provocam desequilíbrio entre os pró e anticoagulantes. Síndrome paraneoplásica – efeito sistêmico a partir de substâncias produzidas no câncer que provocam alterações em outros sistemas, não é um efeito local do crescimento do câncer. 3) Fluxo sanguíneo anormal O fluxo normal possui padrão laminar, e os elementos figurados circulam dentro do vaso enquanto o plasma se encontra na periferia. Logo, os elementos estão distantes da parede do vaso e há menos contato entre eles e o endotélio. A alteração do fluxo ocorre nesse padrão, podendo ocorrer estase sanguínea ou turbilhonamento. Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 4 Estase Fluxo lento que favorece a decantação dos elementos figurados sob a ação da gravidade. Como nas veias o fluxo é naturalmente mais lento, ao se falar em estase, pensa-se em veias e em trombose venosa. Logo, ocorre decantação das plaquetas, que favorece sua interação e agregação plaquetária, e consequentemente, a coagulação sanguínea. Um fluxo lento significa hipóxia, oferecendo um sangue baixo em oxigênio e isso pode ser uma causa de lesão endotelial. Normalmente, as situações que costumam provocar estase venosa vêm na congestão. Tudo que provoca congestão provoca estase; e existe retroalimentação: trombose venosa gera congestão, e congestão gera trombose venosa. Logo, na trombose venosa ocorre propagação do trombo (aumento do tamanho e do volume), e no caso da congestão sistêmica poderá haver trombose na circulação sistêmica, principalmente nos membros inferiores e em território drenado pela VCI. Paciente desidratado, com perda de volume sanguíneo apresenta sangue mais viscoso (hematócrito aumentado), e isso pode causar estase também. Além disso, outros fatores como IAM, arritmias cardíacas, estenose ou insuficiência valvar também provocam trombose. Hematócrito: percentual do sangue composto pelas hemácias. O aumento do hematócrito ocorre ou quando você está produzindo mais hemácia (policitemia vera) ou porque houve redução do volume de líquido (policitemia falsa). Anemia falciforme As hemácias da anemia falciforme tem dificuldade de se deslocar pelos vasos, principalmente naquelas de menor calibre, provocando diminuição do fluxo sanguíneo, provocando estase e trombose no paciente. Insuficiência cardíaca Possível causa de trombose por duas razões: dilatação da câmara cardíaca (estase) e pela congestão retrógrada que provoca. Quando a câmara está dilatada, a sua força de contração está diminuída. Assim, resta sangue dentro da câmara durante o ciclo cardíaco, provocando estase. As aurículas são naturalmente bolsões de sangue em que não há incidência de trombose devido a recorrente substituição sanguínea, no entanto, quando estão dilatadas, ocorre estagnação sanguínea e a força de contração é menor. Insuficiência cardíaca direita – possui maior potencial de provocar trombose ao passo que possui efeitos diretos nos membros inferiores, uma vez que são territórios propensos a formação de trombo pelo fato de serem naturalmente congestos (sua drenagem ocorre contra ação da gravidade). Além disso, causa estase se há dilatação no átrio e ventrículo direito. Insuficiência cardíaca esquerda – pode haver trombose nas câmaras caso haja dilatação do átrio e do ventrículo esquerdo. No entanto, a congestão será pulmonar, a qual raramente causa trombose, logo, sugere-se que esse fato esteja associado ao tipo de revestimento endotelial da circulação pulmonar. Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 5 A bradicardia também pode gerar estase, uma vez que a lentificação do ritmo cardíaco provoca o aumento do tempo de permanência do sangue na câmara cardíaca. A aterosclerose também pode gerar estase, ao passo que a presença de uma placa ateromatosa no vaso pode diminuir o fluxo sanguíneo em decorrência da obstrução da luz. Turbilhonamento Fluxo desorganizado, com padrão “máquina de lavar” – chacoalha-se, de modo que os elementos figurados se choquem contra a parede do vaso. Ocorre em maior frequência nos vasos arteriais, uma vez que o fluxo é maior, mais rápido e mais forte. Essa alteração faz com que as plaquetas se choquem entre si, favorecendo sua agregação e, consequentemente, a coagulação sanguínea. Além disso, o contato das plaquetas com o endotélio favorece que agregação ocorra na superfície endotelial. Obs.: no coração, o sangue possui fluxo turbilhonado de uma maneira organizada, uma vez que a contração é coordenada e possui um sentido. No entanto, ainda assim pode haver alterações no turbilhonamento que ocorre no coração, e também pode haver estase. Fibrilação Um tipo de taquicardia que leva ao turbilhonamento. Ao invés da câmara se contrair de maneira coordenada, as fibras miocárdicas se contraem de maneira anárquica, aleatória. Logo, a câmara treme e o sangue em seu interior é chacoalhado, e não impulsionado para frente de maneira adequada. Ao mesmo tempo em que a fibrilação provoca sensação de palpitação, o paciente pode estar manifestando sinais de insuficiência cardíaca, já que o sangue não está sendo ejetado de maneira adequada – além de também favorecer a formação de trombose. A fibrilação pode ser atrial ou ventricular. No entanto, a fibrilação atrial possui menor potencial de provocar insuficiência cardíaca do que a ventricular, uma vez que os átrios são munidos de aurículas que provocam o movimento do sangue. Aterosclerose Placa de gordura na parede do vaso formada pela entrada de colesterol de baixo do endotélio, e se acumulando na camada íntima, promovendo seu estufamento. Assim, a placa funciona como um obstáculo para o sangue, que bate na placa e fica turbilhonando em seu entorno. Logo, pode haver formação de trombo. Além disso, há estenose arterial. Aneurisma Forma-se a partir do enfraquecimento da parede do vaso, ocorrendo uma dilatação em sua parede que forma uma bolsa. A camada média da artéria se encontra enfraquecida e, portanto, dilata. Logo, o fluxo muda de direção e pode acabar se chocando, portanto, dentro de um aneurisma pode haver formação de trombo. A parede fraca também pode se romper, provocando hemorragia por rexe. Se a partir de então houver coagulação do sangue irá haver formação de um coágulo, não de um trombo. A mesma situação se aplica para o rompimento de um aneurisma, uma vez que o coágulo se formou para estancar a hemorragia de uma parede que não está mais íntegra. Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 6 Aspectos morfológicos do trombo Macroscopia O trombo é uma massa disforme no interior de vasos. Diferencia-se do coágulo pelas linhas de Zahn – zonas pálidas intercaladas com zonas avermelhadas, com aspecto laminar. Parece que o trombo é penteado. Isso tem a ver com a deposição dos elementos do trombo: plaqueta, fibrina e elementos do sangue. Microscopia Linhas de Zahn As plaquetas e a fibrina serão um material mais eosinofílico, e as hemácias ficam vermelhas. O coágulo é formado sem nenhuma organização, as plaquetas, fibrinas e elementos estão todos juntos. Já no trombo, estão organizados nas linhas de Zahn. O paciente em necropsia estará cheio de coágulos, e é importante saber diferenciar do trombo para saber se ele foi uma causa demorte. Evolução do trombo À medida que o tempo passa, há organização do trombo com formação de colágeno, há fibrose do trombo e também há proliferação de vasos sanguíneos dentro do trombo para reduzir a obstrução causada pelo trombo, canalizando o fluxo. As linhas de Zahn são evidentes na trombose recente. Quando ocorre embolização do trombo, um pedaço dele se desprende e se desloca pelo sistema circulatório, e o pedaço que se desloca é chamado de tromboembolo. O trombo está sempre preso na parede do vaso, se ele se descola, é chamado de tromboembolo. A parte que se desloca é do trombo recente, pois o trombo antigo está fibrosado, as paredes estão presas. O trombo pode ser dissolvido pelo próprio sistema fibrinolítico (plasmina) a ponto de ele se dissolver completamente. No entanto, o trombo que consegue se dissolver é o recente, pois a plasmina não consegue dissolver o trombo antigo fibrosado. Trombo antigo e trombo recente Trombo com linhas de Zahn Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 7 Quatro evoluções possíveis para o trombo: 1. Dissolver espontaneamente. 2. Organização e recanalização – gerando fibrose e novos vasos. 3. Embolização – fragmentação e deslocamento: formação do tromboembolo. 4. Crescimento (propagação) do trombo – a partir da deposição de plaquetas, fibrina e hemácias. A parte que aumentou é recente. Não confundir, o trombo não está se locomovendo. Os canais vasculares que são abertos durante a recanalização são tortuosos, e muitas vezes pode haver turbilhonamento sanguíneo, formando um trombo recente dentro de um trombo antigo. Classificação da trombose 1. Quanto ao nível de obstrução a) Oclusiva. b) Semi-oclusiva. 2. Quanto ao tempo de evolução a) Recente b) Antiga (Em organização) 3. Quanto à presença de infecções a) Séptico – colonização de bactéria secundária ou processo infeccioso primário (como endocardite valvular). b) Asséptico Na endocardite infecciosa, uma bactéria que estava no sangue acomete a valva cardíaca esquerda e agride o seu endotélio, gerando um processo trombótico, formando uma vegetação. E misturado na trombose está o próprio agente etiológico. Logo, há trombose séptica e tromboembolismo séptico para a circulação sistêmica. Caso chegue ao SNC através das carótidas, há interrupção de fluxo sanguíneo naquele ponto, o que pode gerar isquemia, degeneração hidrópica e infarto, além de propagar o agente infeccioso para aquela região. A bactéria em uma área previamente necrótica gera gangrena úmida, que pode gerar um abcesso cerebral. Já uma bactéria que acomete a valva cardíaca direita pode gerar abcesso pulmonar pelo mesmo processo. 4. Quanto à localização a) Trombos murais – coração e grandes vasos (aorta, veia cava, átrios, ventrículos). b) Trombos arteriais – coronárias, cerebrais, femorais (coloração mais pálida). c) Trombos venosos – veias do membro inferior +/- 90% (coloração mais avermelhada devido à deposição das hemácias – fluxo mais lento). d) Vegetações – válvulas cardíacas (vegetação aórtica). e) Trombos hialinos (microtrombos) – microcirculação. (apenas plaquetas + fibrina, e não são visualizados a macroscopia). Tromboembolismo sistêmico: Um trombo mural no ventrículo esquerdo que se emboliza vai para a aorta, e depois para a circulação sistêmica. Tromboembolismo pulmonar: Um trombo mural no ventrículo direito que se emboliza vai para a circulação pulmonar. Para saber de onde vem o tromboembolo é só realizar o caminho contrário. Trombo mural no ventrículo esquerdo Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 8 Consequências e complicações da trombose A trombose venosa, quando leve ou superficial, possui como únicas consequências congestão e edema, podendo gerar úlceras varicosas ou úlceras de estase. Ex.: trombose de veia safena. Já as tromboses em veias profundas, como a femoral, poplítea e ilíaca, possuem maior chance de embolização. Se forem veias do membro inferior, o tromboembolo vai para a cava inferior, átrio direito, ventrículo direito, tronco pulmonar e circulação pulmonar. Qualquer trombose venosa é um obstáculo para drenagem do sangue, logo, é um processo que se retroalimenta, pois a trombose gera congestão, que gera estase, que gera trombose. Na parte arterial, o principal processo é a obstrução da passagem que está chegando no tecido, podendo levar a infarto, isquemias, etc. Se há trombos murais, o processo tende a ser semi-oclusivo. Eles são mais perigosos pela embolização do trombo do que pela própria trombose in locu com obstrução do vaso. No IAM, há trombose na artéria coronária, que obstrui a artéria. Caso haja trombose na aorta, que é muito grande, dificilmente há obstrução, mas pode haver embolização que obstrua vasos com diâmetro menor. A trombose em vasos arteriais é difícil acontecer de maneira espontânea, pois o fluxo sanguíneo é mais acelerado. É necessário que haja alguma lesão prévia no vaso, como aterosclerose e aneurisma. Sequencias etiopatológicas importantes 1) Placa aterosclerótica nas coronárias Aterosclerose nas coronárias – isquemia crônica – alteração do fluxo – turbilhonamento – trombose na placa – obstrução da luz do vaso – isquemia aguda – degeneração hidrópica – necrose coagulativa. A obstrução que estava acontecendo em função da placa aterosclerótica agora está somada pela formação do trombo. A isquemia que era crônica passa a ser aguda. Se o trombo se dissolve antes da degeneração hidrópica, o paciente sofre uma isquemia miocárdica sem infarto – angina instável. Isquemia por reperfusão – ocorre caso a obstrução já tiver acontecido há um tempo longo o suficiente para gerar muita necrose, logo a dissolução do trombo reperfunde uma área da necrose. Essa reperfusão distribui para os tecidos adjacentes radicais livres e enzimas lisossômicas, de modo que ao invés de restringir o infarto, sua área é aumentada. Tratamento: injeção de substancia trombolítica, para induzir a dissolução da trombose. Além disso, podemos fazer cateterismo na coronária, colocar um stent ou uma dilatação com balão a fim de desobstruir a passagem de sangue. 2) Tromboembolo na veia femoral Tromboembolo sobe para V. Ilíaca – VCI – átrio e ventrículo direito – tronco pulmonar – circulação pulmonar. Quando o tromboembolo encontra vasos de calibres cada vez menores, ele fica estacionado na circulação pulmonar. Assim, a trombose venosa profunda (TVP) causa tromboembolia pulmonar (TEP). Paciente dentro de um voo (estase) com dor no peito e dispneia – infarto (IC esquerda com edema pulmonar) ou TVP, levando a TEP, que provoca dispneia e dor no peito. Se o paciente é jovem, consideram-se fatores genéticos. No exame físico, deve-se palpar os Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 9 membros inferiores para ver se tem edema, que ne sempre está presente, mas pode ser causado por TVP e TEP. 3) Trombo mural na aorta e gangrena do pé direito Aterosclerose ou aneurisma na aorta – turbilhonamento – formação de trombo – embolização – tromboembolo que vai para a A. Ilíaca Direita – A. Femoral – estaciona em um vaso de circulação terminal com poucos vasos colaterais – isquemia aguda no pé – degeneração hidrópica – necrose coagulativa – desidratação da área de necrose pelo ar (gangrena seca) OU proliferação bacteriana da flora cutânea (gangrena úmida). Conduta: amputação do pé em função do risco de sepse. É importante observar que a formação do trombo na aorta não é espontânea, por isso vem de uma lesão prévia. EMBOLIA Obstrução vascular, parcial ou total, de um vaso por um corpoestranho que se desloca na circulação sanguínea. Esse corpo estranho é denominado êmbolo. Possui efeito de massa, uma vez que funciona como um fator obstrutivo mecânico. Caso o embolo cause obstrução na circulação sanguínea pode haver isquemia aguda. Caso o embolo cause obstrução na circulação linfática pode haver formação de linfedema. Importante observar que a trombose é um evento exclusivo da circulação sanguínea, enquanto a embolia também acomete o sistema linfático. Classificação de acordo com a natureza do embolo Êmbolos sólidos Mais frequentes. Podem ser formados por massas neoplásicas, bactérias, larvas, ovos parasitários. Tipos de embolo sólido Tromboêmbolo Mais entre o embolo sólido. Advindo de um trombo, logo, é formado por plaqueta, fibrina, hemácias, linhas de Zahn. Ateroêmbolo Advindo da placa aterosclerótica; Pedaço da placa, logo, é constituído pelos constituintes dela, como o colesterol. Embolo neoplásico Advindo de um neoplasma maligno, que é constituído por células malignas que invadem o sistema circulatório. Esse tipo de embolo é o originador da metástase – via metastática. Apesar de provocar isquemia aguda e linfedema, o seu objetivo é gerar metástase. Embolo neoplásico Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 10 Se a embolia neoplásica for sanguínea ocorre metástase nos órgãos que recebem sangue, ou seja, quase todos os órgãos do corpo. No entanto, como os pulmões recebem o sangue do corpo inteiro, essa embolia os atinge primordialmente. Já o fígado drena o sangue de várias veias, principalmente da via gastrointestinal, antes que elas sejam direcionadas a VCI, portanto, também é um órgão que ocorrem várias metástases. Se a embolia neoplásica for linfática, ocorre metástase nos linfonodos. Embolo infeccioso Formado por colônia de bactérias ou fungos, além de larvas e ovos de parasitas. Ex.: esquistossomose – deposição de ovos na circulação. Embolia gordurosa e de medula óssea Ocorre a partir da entrada de gotículas de gorduras, provenientes dos adipócitos, na corrente sanguínea. Pode ser provocada por fratura de ossos longos, uma vez que eles possuem gordura na medula óssea amarela e, com a fratura, essa gordura pode estar em forma de gotículas e ir para a corrente sanguínea. Pode ser proveniente também em pacientes politraumatizados e pacientes que passaram por lipoaspiração. Além disso, pode ocorrer por introdução de uma substancia gordurosa, oleosa ou viscosa no sangue – preenchimentos feitos por substancias viscosas causam embolia de padrão gorduroso. Paciente do Dr. Bumbum – insuficiência respiratória devido à quantidade de êmbolos gordurosos que chegaram aos pulmões, dificultando as trocas gasosas. Mais do que obstruir a passagem do sangue, esse fenômeno agride o endotélio dos vasos, podendo fazer que haja formação de trombos, de edema pulmonar por aumento de permeabilidade capilar (inflamatório), e o paciente evolui com insuficiência respiratória; sintomas neurológicos ocorrem por embolia do SNC; e a anemia e trombocitopenia vem por quebra dessas células ao passar pelas áreas semiobstruídas pelos êmbolos gordurosos. Portanto, além de causar obstrução dos vasos, isquemia e infarto, a embolia gordurosa também gera um fenômeno pro-inflamatório. Embolia gasosa É uma embolia descompressiva que ocorre quando há diminuição abrupta da pressão atmosférica, e isso provoca a formação de bolhas gasosas na corrente sanguínea. Existe ar diluído no sangue, logo, quando se vai a grandes profundidades ou grandes altitudes, provocando variação brusca de pressão, pode ocorrer essa formação de bolhas. Esse tipo de embolia não consegue obstruir tanto a passagem de sangue, no entanto, ele irrita o endotélio provocando lesão endotelial com formação de edema por aumento de permeabilidade capilar, principalmente nos pulmões, o que provoca falta de ar ao paciente, que fica ofegante. Outra forma de embolia gasosa é iatrogênica, por meio da injeção de ar na corrente sanguínea. Os mergulhadores possuem preparo para que o retorno à superfície seja de forma lenta e gradual, e não abrupta, para evitar esse tipo de embolia. Gotículas de gorduras dentro dos capilares pulmonares Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 11 Embolia de líquido amniótico Complicação grave do pós-parto imediato. Quando se rompem os vasos placentários durante o parto, há entrada acidental de parte do líquido amniótico para dentro da corrente sanguínea da mãe. O líquido amniótico possui restos de células do filho, que possui antigenicidade diferentes da mãe; o que pode desencadear em uma reação inflamatória, com lesão endotelial e formação de edema pulmonar, e até mesmo em um quadro de sepse. Não tem como prevê-la. Pode ocorrer com qualquer gestante. O tratamento é complicado, geralmente envolve intubação (maior oferta de O2) e tentar melhorar esse processo inflamatório no pulmão. No entanto, os trombolíticos nesse caso não possuem nenhum efeito, e essa situação pode evoluir de forma muito grave. Na imagem, observa-se lamelas de ceratina que estavam boiando no líquido amniótico, que vieram do bebe e agora estão dentro dos vasos da mãe. Isso gera inflamação dos vasos, que pode provocar um quadro de insuficiência respiratória aguda. Na embolia gasosa, gordurosa e de líquido amniótico, observa-se que os maiores problemas são para os pulmões (não é uma tromboembolia). Mais do que gerar obstrução do fluxo pulmonar, esse processo altera a permeabilidade capilar e gera edema de padrão exsudato (inflamatório), e isso altera a troca gasosa realizada pelos pulmões. Tromboembolia pulmonar (TEP) O tromboembolo movimenta-se até o território pulmonar, até que se estaciona nele. Principal causa: trombose venosa sistêmica. Trombose venosa profunda (TVP) – principal geradora de TEP. Êmbolos grandes – provocam oclusão do tronco da artéria pulmonar – obstrução do fluxo sanguíneo – sobrecarga cardíaca direita – cor pulmonale agudo e choque Êmbolos médios – alojam-se em ramos de médio calibre; podem ser assintomáticos em pacientes saudáveis ou causar infartos hemorrágicos em pacientes com ICC. Êmbolos pequenos – múltiplos e pequenos podem obstruir a circulação pulmonar – hipertensão pulmonar – cor pulmonale crônico. Tromboembolia sistêmica O tromboembolo estaciona na circulação sistêmica. Principal causa: trombose arterial sistêmica. Local de comum ocorrência de aterosclerose e aneurisma, devido a HAS, logo, é mais comum que ocorra trombose arterial sistêmica no território arterial esquerdo (aorta). Trombose mural na aorta – geradora de tromboembolia sistêmica. Consequências: isquemia e infarto de membros inferiores, encéfalo (AVC), artérias mesentéricas, baço ou rins Trombose no coração esquerdo (mais comuns) o Trombose mural esquerda, vegetações mitral e aórtica. o São influenciadas por HAS e insuficiência cardíaca esquerda. Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 12 Trombose no coração direito (menos comuns) o Trombose mural direita, vegetações tricúspide e pulmonar. o São influenciadas por insuficiência cardíaca direita e arritmias. o Geralmente, é mais difícil ocorrer trombose arterial pulmonar, uma vez que o principal fator de risco para aterosclerose e aneurisma (lesões prévias) é HAS, que não afeta essa parte da circulação. Trombose venosa sistêmica o Veias da circulação sistêmica: VCI, VCS e suas tributárias. o Extremamente comum devido à estase. Trombose venosa pulmonar o Veias dacirculação pulmonar. o Não é muito comum. Os trombos são mais facilmente formados na circulação sistêmica; se for na parte arterial, o tromboembolo para na própria circulação sistêmica; se for na parte venosa, o tromboembolo vai parar na circulação pulmonar. Além disso, o tromboembolo sempre para na artéria. Se a trombose venosa sistêmica ocorrer em vasos muito superficiais, como a veia safena, o tromboembolo não gera consequências importantes para a tromboembolia sistêmica, uma vez que o vaso possui um diâmetro muito pequeno. A TVP gera tromboembolos maiores, devido ao seu maior diâmetro. O pulmão é um órgão de circulação dupla, realizada pelas artérias brônquicas e pulmonares. Além disso, recebe oxigênio pelo ar. Dessa forma, a isquemia pulmonar provocada por TEP é algo extremamente raro, devido esses fatores “protetores”, para que isso ocorra, é necessário que esteja acontecendo mais alguma coisa no território pulmonar. Já os órgãos da circulação sistêmica possuem circulação terminal, logo, a partir da tromboembolia sistêmica é mais comum que haja infarto. Exceto no fígado, que também possui circulação dupla e é raro que ocorra infarto. Cor pulmonale (ICC direita aguda) Um tromboembolismo pulmonar maciço que obstrui grande parte da circulação pulmonar gera hipertensão pulmonar aguda, como se tivesse aumentando muito a resistência vascular, causando grande aumento na pressão. O ventrículo direito tenta vencer essa sobrecarga, e não consegue, logo, ele se dilata e gera uma insuficiência cardíaca aguda. O sangue volta para a circulação sistêmica venosa de maneira abrupta, gerando congestão hepática aguda, e o fígado pode sofrer hepatomegalia dolorosa. Esse quadro pode gerar choque cardiogênico, uma vez que há colapso circulatório agudo. (Cor pulmonale aguda) A circulação pulmonar também é chamada de pequena circulação uma vez que possui uma quantidade menor de vaso. Se ela é obstruída em vários pontos, há dificuldade na passagem do sangue, o que aumenta a pressão em determinados vasos. O TEP provoca hipertensão pulmonar no território anterior a ele. No entanto, se a obstrução ocorre de maneira crônica, a hipertensão pulmonar é crônica, que leva sobrecarga ao VD que faz hipertrofia na tentativa de compensar. Essa hipertrofia do VD pode chegar ao limite adaptativo, provocando uma insuficiência cardíaca crônica. O fígado pode sofrer hepatomegalia sem dor, e pode haver muita hemocaterese de hemácias, gerando depósito de hemossiderina em uma congestão hepática crônica – fígado em noz moscada. (Cor pulmonale crônica) Letícia Souza – 70A P2 PATOLOGIA GERAL – TROMBOSE E EMBOLIA 13 A TEP, mais do que um problema a jusante do tromboembolo (direção normal), provoca problemas a montante (direção contra) – congestão. Já na tromboembolia sistêmica, pensamos que o problema vai a jusante, uma vez que a consequência geralmente é a isquemia, que gera infarto. Tromboembolo em sela – tromboembolo muito grande que fica alojado na bifurcação pulmonar antes de decidir se iria entrar na artéria pulmonar direita ou esquerda; obstruindo as duas. O paciente geralmente morre instantaneamente. Embolia paradoxal – comunicação interatrial ou interventricular, com passagem do lado esquerdo-direito, entre circulação sistêmica e pulmonar, com deslocamento de embolos em ambos os territórios. O embolo que vem pelo lado direito gera embolia sistêmica, e o que vem pelo lado esquerdo gera embolia pulmonar. Muito raro.
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