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Universidade Federal de Sergipe Centro de Ciências Biológicas e da Saúde Departamento de Fisiologia Apostila A Química dos Carboidratos ou Glicanos Prof. Paulo de Tarso Gonçalves Leopoldo São Cristóvão, 2019 - Instituição: Universidade Federal de Sergipe - Centro de Ciências Biológicas e da Saúde - Departamento de Fisiologia - Matéria de Ensino: Bioquímica II - Tema Central: A química dos Carboidratos ou glicanos. III - Duração: 4 horas/aula. IV - Estratégia: Aula Expositiva V - Meta Compreender as estruturas químicas dos carboidratos ou glicanos, relacionando-as com as diversas funções biológicas que eles desempenham na natureza. VI. Objetivos Ao final desta aula você será capaz de: 6.2.1 Conceituar carboidratos ou glicanos 6.2.2 Classificar carboidratos 6.2.3 Citar as funções dos carboidratos 6.2.4 Agrupar os monossacarídeos em famílias 6.2.5 Descrever a estereoquímica de carboidratos 6.2.6 Descrever as estruturas cíclicas dos monossacarídeos 6.2.7 Descrever a formação da ligação glicosídica 6.2.8 Descrever a formação de oligossacarídeos, exemplificando-os 6.2.9 Conceituar, classificar, exemplificar e citar as funções biológicas de polissacarídeos. 6.2.10 Descrever a estrutura e a função do amido e do glicogênio 6.2.11 Descrever a estrutura e a função da celulose 6.2.12 Diferenciar em termos de estrutura e função biológica os polímeros: amido, glicogênio e celulose. 6.2.13 Descrever a estrutura da parede celular das bactérias 6.2.13 Descrever a estrutura e função dos glicosaminoglicanos VII - Conteúdo Programático: 7.1 Introdução e conceito dos carboidratos 7.2 Classificação dos carboidratos 7.3 Funções dos carboidratos 7.4 Estudo dos monossacarídeos 7.4.1 Estereoquímica dos monossacarídeos 7.4.2 As estruturas cíclicas dos monossacarídeos 7.4.3 Derivados de monossacarídeos 7.4.4 Propriedades dos monossacarídeos 7.5 A formação da ligação glicosídica 7.6 Oligossacarídeos, dissacarídeo e nomenclatura dos dissacarídeos 7.7 Polissacarídeos ou glicanos. 7.7 Conclusão Capítulo 7 Carboidratos ou glicanos 1. Introdução e conceito dos carboidratos Em plena efervescência científica com os avanços da Biologia Molecular nos anos 50, a química dos carboidratos estava bem atrasada, comparada com o progresso das pesquisas nas áreas de proteínas e ácidos nucléicos. Isso é explicado em grande parte pela complexidade estrutural dos carboidratos, cujas estruturas não podem ser determinadas facilmente a partir de suas sequências, nem ser prevista a partir de um molde de DNA, como são os RNAs e as proteínas. A grande maioria dos carboidratos apresenta fórmulas empíricas, cuja proporção entre os átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio é 1:2:1 respectivamente, sugerindo ser um composto de carbono hidratado, daí a explicação pela qual foram denominados carboidratos ou hidratos de carbono. São exemplos dessas moléculas: D-manose, D-glicose, D-galactose, etc., que apresentam a mesma fórmula molecular C6H12O6. No entanto, alguns carboidratos não apresentam essa proporção entre os átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio, e ainda, há os que apresentam em sua composição átomos outros, como nitrogênio, enxofre e fósforo. Dessa forma, os carboidratos são definidos como poliidroxialdeidos, ou poliidroxiacetais, ou poliidroxicetonas, ou poliidroxicetais, (Figura 1) e seus derivados, ou ainda compostos maiores que por hidrólise produzam uma dessas unidades. FIGURA 1. A glicose, tem um grupo carbonila (C=O) no carbono 1 (C-1) e cinco hidroxilas (OH) ligadas aos carbonos C-2, C-3, C-4, C-5 e C-6, daí ser um polidroxialdeído. A frutose, por sua vez, tem a carbonila ligada ao C-2 e cinco OH ligadas aos C-1, C-3, C-4, C-5 e C-6, sendo assim uma poliidroxicetona. 2. Classificação dos carboidratos Os carboidratos classificam-se em três classes, de acordo com o número de unidades de poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas: monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos: 2.1 Monossacarídeos. São os carboidratos formados por uma única unidade de poliidroxialdeído ou poliidroxicetona. Os monossacarídeos mais simples contêm três átomos de carbono, as trioses: D-gliceraldeído e a diidroxicetona. Os monossacarídeos mais abundantes na natureza são os que contêm seis átomos de carbono, as hexoses, como D-glicose e D-frutose. 2.2 Oligossacarídeos. São os carboidratos formados por pequenas cadeias de monossacarídeos ligados entre si por ligações covalentes. Os dissacarídeos são os oligossacarídeos mais abundantes. São formados por duas unidades de monossacarídeos. A sacarose, o açúcar da cana é um exemplo típico desta classe, sendo formada por duas unidades de hexoses: D-glicose e D-frutose unidas covalentemente. Os trissacarídeos como a maltotriose, obtida da hidrólise do amido. É formada por três unidades de glicose uididas por ligação glicosídica. A rafinose, encontrada na cana de açúcar, é um trissacarídeo derivado da sacarose, sendo formado pelos monossacarídeos glicose, frutose e galactose. Oligossacarídeos com mais de cinco unidades de monossacarídeos não são encontrados na forma livre na natureza, mas ligados a proteínas (formando as glicoproteínas) ou a lipídios (formando os glicolipídios). 2.3 Polissacarídeos são carboidratos formados por longas cadeias, contendo centenas ou milhares de unidades de monossacarídeos, tais como: celulose (encontrada na parede celular de plantas), glicogênio (reserva energética das células animais), quitina (parede celular de fungos, exoesqueleto de artrópodes e alguns insetos), peptidoglicano (parede celular de bactérias Gram. positiva e Gram. negativa), etc. 3. Funções dos Carboidratos 3.1 Reservas energéticas de plantas e animais. Os carboidratos atuam como fontes de energia, liberando unidades de glicose que nos metabolismos aeróbico e anaeróbico celular produzem energia na forma de ATP. Exemplos desses são: o amido, reserva energética das plantas, e o glicogênio, reserva energética dos animais. 3.2 Função estrutural. Os carboidratos com esta função dão forma e sustentação aos tecidos dos organismos nos quais são encontrados, como celulose, peptidoglicano e quitina. A celulose forma a parede celular de plantas; a peptidoglicano compõe a parede celular de bactérias, e a quitina compõe o exoesqueleto de artrópodes, crustáceos, insetos etc. 3.3 Participação na adesão e no reconhecimento celular. Os carboidratos na forma de oligossacarídeos (de glicoproteínas ou glicolipídios) participam de eventos moleculares de reconhecimento celular como na interação célula a célula, na adesão de uma bactéria a superfícies de membranas celulares. Essa adesão ocorre com a interação de um receptor protéico localizado na superfície das bactérias com a porção glicídica das glicoproteínas ou dos glicolipídios das membranas celulares (Figura 2). Os glicanos da monocamada externa (voltado para a matriz extracelular) de membranas plasmáticas interagem com as glicoproteínas e com os glicolipídios, formando uma estrutura denominada glicocálix. O glicocálix é uma camada de glicoproteínas e glicolipídios, encontrada na superfície externa da membrana citoplasmática das células eucarióticas. O glicocálix desempenha inúmeras funções, como inibição do crescimento celular por contato, promove a adesão e reconhecimento celular, além de conter os antígenos envolvidos na determinação de grupos sanguíneos, entre outras funções. FIGURA 2 Funções de carboidratos no reconhecimento e na adesão celular. (a) Os carboidratos da classe dos oligossacarídeos (representadas por esferas coloridas) são componentes de uma variedade de glicoproteínas ou glicolipídios na superfície externa das membranas plasmáticas. Eles interagem com altas especificidade e afinidade com as lectinas, proteínas que se ligam a carboidratos na forma de mono e oligossacarídeos, no meio extracelular. (B) Os vírus que infectam as células animais, como o vírus da gripe, se ligam às glicoproteínasda superfície celular como o primeiro passo na infecção. (C) As toxinas bacterianas, como as toxinas da cólera e pertussis, se ligam a um glicolipídio do folheto externo da membrana para que possam ser internalizadas numa célula. (D) Algumas bactérias, como Helictobacter pylori, aderem a glicoproteínas do glicocálix para que possam infectar as células animais. (E) As selectinas (lectinas) são proteínas da membrana plasmática de certas células, que medeiam as interações célula-célula, como por exemplo, a ligação de neutrófilos com células endoteliais da parede capilar, em um local de infecção. 4. Química dos monossacarídeos 4.1 Propriedades e classificação dos monossacarídeos em aldose e Cetose. Propriedades dos monossacarídeos. Os monossacarídeos tem a propriedade de formar sólidos cristalinos, incolores, solúveis em água e muitos deles têm sabor doce. Família de aldoses e cetoses. Os monossacarídeos são agrupados em duas famílias: aldoses e cetoses. Esta classificação baseia-se na posição da carbonila (C=O) na cadeia do monossacarídeo. Assim, se a carbonila estiver na extremidade da cadeia, ligada a um carbono primário, conferindo-lhe função orgânica de aldeído, é classificado como aldose. Exemplos desse tipo são: D-gliceraldeído (Figura 3), D-glicose (Figura 1), D-manose, D-Frutose (Figura 1), D-galactose, entre outros. Por outro lado, se a carbonila estiver ligado a um carbono secundário, conferindo-lhe função de cetona, é do tipo cetose, como diidroxicetona (Figura 3) e D-frutose. O monossacarídeo mais simples da série das aldoses é o D-gliceraldeído e o da série das cetoses é a diidroxiacetona, ambos com três carbonos (Figura 3). FIGURA 3. Nas aldoses, como o gliceraldeído, o grupo carbonila localiza-se na extremidade da cadeia (carbono 1). Este monossacarídeo tem função orgânica do tipo aldeído. Quando o grupo carbonila estiver em qualquer posição, que não a extremidade da cadeia, conferindo uma função orgânica do tipo cetona, o monossacarídeo é denominado cetose, como a diidroxiacetona. 4.2 Classificação dos monossacarídeos quanto ao tamanho da cadeia carbônica. Quanto ao número de carbono, os monossacarídeos são classificados em: trioses, tetroses, pentoses, hexoses e heptoses por apresentar três, quatro, cinco, seis e sete átomos de carbono, respectivamente (Tabela 1). Uma aldose contendo três carbonos é denominada aldotriose; quatro carbonos, aldotetrose; cinco carbonos, aldopentose e seis carbonos, aldoexose. Para cada uma dessas aldoses existe uma cetose correspondente, por exemplo: cetotriose (3C), cetotretose (4C), cetopentose (5C), cetoexose (6C), e cetoeptose (7C). Os maiores monossacarídeos tem 9 átomos de carbono. Exemplo destes são os ácidos siálicos, derivados oxidados de monossacarídeos (assunto a ser estudado no item 7). TABELA 1: Alguns monossacarídeos da série das aldoses e cetoses Número de carbonos Aldoses Cetoses 3 Carbonos (trioses) D-gliceraldeído Diidroxicetona 4 Carbonos (tetroses) D-eritrose D-treose D-eritrulose 5 Carbonos (pentoses) D-ribose D-xilose D-ribulose D-xilulose 6 Carbonos (hexoses) 7 carbonos (heptoses) D-glicose D-galactose D-manose D-frutose D-psicose D-sorbose D-sedoheptulose 4.3 Nomenclatura dos monossacarídeos. A maioria dos monossacarídeos tem nomes terminados com o sufixo ose. Algumas cetoses, como as tetroses e pentoses, são denominadas pela inserção do sufixo ul ao nome de suas aldoses correspondentes, por exemplo, a D-Eritrulose é a cetotetrose correspondente a aldotetrose D-eritrose. As cetoexoses não seguem essa regra, apresentando nomes comuns, como por exemplo, D-frutose, D-psicose e D-sorbose (tabela 1). A frutose, por ser cetose e um monossacarídeo levorrotatório, era conhecida anteriormente por levulose (lev de levorrotatório e o termo ul de cetose). 5. Estereoquímica dos monossacarídeos 5.1. Estereoisômeros. São moléculas que tem a mesma fórmula molecular, mas que diferem no arranjo espacial de seus átomos, como também em algumas de suas propriedades químicas e físicas. Os estereoisômeros dos monossacarídeos podem ser tanto de cadeia aberta, quanto de cadeia fechada (ou estruturas cíclicas). Neste tópico abordaremos os estereoisômeros dos monossacarídeos de cadeia aberta, que são de dois tipos: enantiômeros (ou isômeros ópticos) e diasteroisômeros ( como os epímeros). No item 6 trataremos dos estereoisômeros das formas cíclicas dos monossacarídeos, os anômeros, que são diasteroisômeros cíclicos. 5.2. Enantiômeros. Os monossacarídeos que tem um ou mais carbonos assimétricos em suas estruturas podem apresentar enantiômeros ou isômeros ópticos. Os enantiômeros são imagens especulares não superponíveis. A diidroxiacetona é o único monossacarídeo que não tem isômeros ópticos, uma vez que não tem nenhum carbono assimétrico (Figura 4a). Já o D-gliceraldeído (Figura 4b), triose com o carbono 2 (C-2) ligado a quatro diferentes constituintes químicos (carbono assimétrico), tem isômeros ópticos (figura 4). Os enantiômeros ou isômeros ópticos são de dois tipos: D ou L, letras essas que representam a configuração absoluta desses isômeros (explicada no tópico 5.4). FIGURA 4: a) Estrutura da diidroxicetona, monossacarídeo que só tem carbono simétrico e, portanto, não tem enantiômeros ou isômeros ópticos. b) Estrutura química do gliceraldeído, com um carbono assimétrico, o C-2. 5.3 Determinação do número de estereoisômeros e enantiômeros. 5.3.1 Fórmula para determinar o número de estereoisômeros. A fórmula para determinar o número de estereoisômeros de uma molécula assimétrica é a expressão 2n, em que o n é igual ao número de carbonos assimétricos do monossacarídeo. 5.3.2 Para determinar o número de enantiômeros: utiliza-se a expressão: 2n-1. Importante: quando a molécula apresenta um único carbono assimétrico, todos os estereoisômeros encontrados com a expressão 2n são do tipo enantiômeros. As aldoexoses, como a D-glicose, com quatro carbonos assimétricos, apresentam dezesseis estereoisômeros diferentes (figura 5), pois aplicando a fórmula 2n, teremos: 24 = 16 estereoisômeros. Desses 16 estereoisômeros, 8 são enantiômeros e os outros 8 diasteroisômeros, como estudaremos no tópico 5.4. Aplicando a regra para determinar o número desses enantiômeros da glicose teremos: 24-1 = 23 = 8 (enantiômeros ou isômeros ópticos). 5.4 Configuração absoluta dos monossacarídeos. A configuração absoluta de uma molécula orgânica é a sua forma comparada com as estruturas do D- e L-Gliceraldeído. Assim, as letras maiúsculas D e L antes dos nomes dos monossacarídeos representam sua configuração absoluta. Para ter configuração absoluta, um monossacarídeo deve ter em suas estruturas um ou mais carbonos quirais (Figura 5). Como a maioria dos monossacarídeos tem mais de um carbono assimétrico, convencionou-se que o carbono usado para determinar sua configuração absoluta é o último carbono assimétrico em relação à carbonila (C=O). Portanto, quando a hidroxila (OH) desse último carbono assimétrico (nas tetroses é o C-3, nas pentoses é o C-4 e nas hexoses é o C-5 tanto de cetoses quanto aldoses) estiver do lado direito, sua configuração absoluta é D. De outro modo, se a OH estiver do lado esquerdo, sua configuração absoluta é L. Figura 5. Determinação da configuração absoluta dos monossacarídeos. A configuração absoluta do Gliceraldeído, uma aldotriose, é determinada pela posição da OH do seu carbonono assimétrico (C-2). Na determinação dessa configuração a molécula deve ser representada na projeção em perspectiva e o seu carbono mais oxidado (CHO) deve localizar-se na parte superior da molécula. Assim, quando a OH no C-2 está para o lado direito da molécula, ela terá a configuração absoluta D, como no D-|Gliceraldeído. Por outro lado, quando a OH está do lado esquerdo, sua configuração é L, como no L-Gliceraldeído. Determinação da configuração absoluta das aldoses e cetoses com mais de um cabono assimétrico. Como as aldotetroses, aldopentoses e aldoexoses(figura 6) e as cetopentoses e cetoexoses (figura 7) tem mais de um carbono assimétrico, convencionou-se que o carbono usado para determinar sua configuração absoluta é o último carbono assimétrico em relação à carbonila (C=O). Portanto, quando a hidroxila (OH) desse último carbono assimétrico (nas tetroses é o C-3, nas pentoses é o C-4 e nas hexoses é o C-5 tanto de cetoses quanto aldoses) estiver do lado direito, sua configuração absoluta é D. De outro modo, se a OH estiver do lado esquerdo, sua configuração absoluta é L. FIGURA 6. Família das Aldoses e suas configurações absolutas. As aldoses são agrupadas quanto ao número de carbonos em trioses (contendo 3 carbonos), tetroses (4C), pentoses (5C) e as hexoses (6C). O único monossacarídeo com 3 átomos de carbonos é o D-gliceraldeído, entre as tetroses temos a D-Eritrose e D-Treose. As pentoses são D-Ribose, D-Arabinose, D-xilose. A pentose D-Ribose é encontrada na estrutura do ácido nucléico RNA. As hexoses (6C) são as aldoses mais abundantes na natureza, sendo a D-Glicose a mais a comumente encontrada em biomoléculas. A letra D antes dos nomes das aldoses refere-se à sua configuração absoluta. A configuração absoluta dos monossacarídeos com mais de um carbono assimétrico, como nas tetroses, pentoses e hexoses é determinada pela posição da OH desse último carbono assimétrico (nas tetroses é o C-3, nas pentoses, o C-4 e nas hexoses, o C-5). Como a OH está do lado direito em todos esses monossacarídeos, a configuração absoluta é D. O D-gliceraldeído tem apenas um carbono assimétrico, o C-2. A maioria dos carboidratos encontrados na natureza apresenta configuração absoluta D (figuras 6 e 7). Os monossacarídeos com configuração L são encontrados também na natureza, mas são raros. As aldoses e cetoses da série L são imagens especulares de suas formas correspondentes da série D. FIGURA 7. Família das cetosese suas configurações absolutas. As cetoses são agrupadas quanto ao número de carbonos em trioses (cetotrioses), tetroses (cetotretoses), pentoses (cetopentoses) e as hexoses (cetoexoses). O único monossacarídeo com 3 átomos de carbonos é Diidroxiacetona. Entre as tetroses tem-se apenas D-Eritrulose. As cetopentoses são D-Ribulose, D-xilulose. As cetoexoses são as cetoses mais abundantes na natureza, quais sejam: D-Psicose, D-Frutose, D-Sorbose e D-Tagatose. A letra D antes dos nomes das cetoses refere-se a sua configuração absoluta. A configuração absoluta dos monossacarídeos com mais de um carbono assimétrico, como nas pentoses e hexoses, é determinada pela posição da OH do último carbono assimétrico (nas pentoses é o C-4 e nas hexoses, o C-5). Como a OH está do lado direito em todos esses monossacarídeos, a configuração absoluta é D. A diidroxiacetona não apresenta configuração absoluta, por ter apenas carbono simétrico. D-Eritrulose tem apenas um carbono assimétrico, o C-3, também com configuração absoluta D. Desvio da luz planopolarizada por monossacarídeos. A propriedade óptica dos monossacarídeos de desviar a luz planopolarizada num polarímetro não tem relação com as letras D e L, que representam a configuaração absoluta dessas moléculas. Essa propriedade de desviar a luz planoplarizada é representada pelos sinais (+) ou (-). Para indicar que uma molécula é dextrorrotatória, ou seja, que desvia a luz planopolarizada para a direita, usa-se o símbolo (+). Por outro lado, quando ela desvia a luz para a esquerda, a molécula é levorrotatória, sendo representada pelo simbolo (-). 5.4 Diastereoisômeros. São pares de estereoisômeros que diferem na configuração de um ou mais carbonos assimétricos, mas que não são imagens especulares superponíveis um do outro, ou seja, não tem relação entre si de enantiômeros (Figura 8). Assim, uma aldoexose com 4C quirais não pode ter formas relacionadas diferindo na configuração de todos os seus 4 centros assimétricos, pois elas serão enantiômeros e não diasteroisômeros. Os pares de monossacarídeos D-manose e D-galactose são diasteroisômeros que diferem nas configurações dos seus carbono 2 e 4. (Figura 8). Outro tipo de diasteroisômeros são os epímeros, estudados no tópico abaixo. Figura 8. Os pares de monossacarídeos D-manose e D-galactose são diasteroisômeros que diferem nas configurações dos seus carbono 2 e 4. 5.4.1 Epímeros. Os diastereoisômeros que diferem na configuração de um único carbono assimétrico são denominados epímeros. A estrutura da D-manose difere da estrutura da D-glicose apenas na configuração do carbono 2 (C-2), enquanto a D-galactose difere da D-Glicose na configuração do C-4. Dessa forma, a D-manose é epímero da D-glicose no C 2 e a D-galactose é epímero da D-glicose no C 4 (Figura 9). FIGURA 9. Epímeros da D-glicose. Os epímeros são pares de estereoisômeros da classe dos diastereoisômeros, que se caracterizam pela diferença na configuração de um único carbono quiral. Assim, a estrutura da D-Glicose difere da D-manose na posição da OH do C-2. A D-Galactose difere da D-glicose apenas na configuração do C-4. D-manose e D-galactose são diasteroisômeros que diferem nas configurações dos seus carbono 2 e 4. 6. A estrutura cíclica dos monossacarídeos. Em soluções aquosas, os monossacarídeos com cinco ou mais átomos de carbono ocorrem, predominantemente, como estruturas cíclicas (em anel). A formação dessas estruturas cíclicas resulta da reação da carbonila das aldoses e cetoses com qualquer uma de suas hidroxilas, formando derivados hemiacetais ou hemicetais, respectivamente (Figuras 10). FIGURA 10. Reações químicas de produção de hemiacetal e hemicetal. Quando a OH de um monossacarídeo da família das aldoses reage com o seu grupo aldeído (topo da figura), tem-se a formação de um hemiacetal. Por outro lado, quando a OH reage com o grupo ceto (R-C=O), tem-se como produto um hemicetal (parte inferior). 6.1 Formação das piranoses e furanoses dos monossacarídeos. A estrutura cíclica ou em anel dos monossacarídeos com cinco ou mais átomos de carbono, em soluções aquosas, assemelham-se as do pirano e furano, daí serem denominadas piranoses e furanoses, respectivamente (Figura 11). FIGURA 11. Estrutura das moléculas orgânica pirano e furano. Os carboidratos que formam aneis hexagonais têm suas estruturas semelhantes a do pirano, com a diferença de não ter anel com dupla ligação. Já os carboidratos que formam anéis pentagonais, assemelham-se ao furano, sem as duplas ligações. 6.2. Estruturas cíclicas da D-glicose. A estrutura da D-glicose em solução aquosa é um hemiacetal intramolecular, formado em decorrência da reação de sua carbonila (C=O ligada ao C-1) com a OH do carbono 5. Nesta reação de ciclização da estrutura aberta da glicose, forma-se um novo centro assimétrico no C-1 da estrutura cíclica. Esse centro assimétrico a mais gerado na estrutura cíclica é denominado carbono hemiacetal ou carbono anomérico. Essas estruturas cíclicas são denominadas piranose (anel hexagonal), ou furanose (anel pentagonal), por se assemelhar ao pirano ou ao furano, respectivamente (Figura 12). As piranoses se formam quando a C=O reage com a OH do C-5 e as furanoses quando a C=O reage com a OH do C-4. As piranoses são formas mais estáveis do que as furanoses. A nomenclatura sistemática para as duas estruturas cíclicas formadas pela D-glicose em forma de piranose são α-D-glicopiranose e β-D-glicopiranose (Figura 12). As aldoexoses também existem em formas cíclicas com anéis de 5 átomos denominadas furanoses (figura não mostrada). A estrutura aldopiranosídica das hexoses é mais estável que a aldofuranosídica. Em meio aquoso predominam as formas piranosídicas das aldoexoses. Apenas aldoses contendo cinco ou mais átomos de carbono podem formar anéis furanosídicos e piranosídicos. Os isômeros dos monossacarídeos, que diferem apenas na configuração do átomo de carbono hemiacetal ou hemicetal, são denominadas anômeros. FIGURA 12: Formação das estruturas cíclicas da D-glicose. As estruturas cíclicas da D-glicose em solução aquosa devem-se à reação do seu grupoaldeído (ligado ao C-1, carbono primário) com a OH do C-5, formando um novo centro assimétrico no C-1 da estrutura cíclica, denominado carbono hemiacetal ou carbono anomérico. Este anel hexagonal è denominado piranose, por se assemelhar ao anel do pirano. A nomenclatura sistemática para essas duas estruturas cíclicas da D-glicose são α-D-glicopiranose e β-D-glicopiranose, que são formas isoméricas denominadas anômeros. 6.3. Estruturas cíclicas da D-Frutose As cetoexoses também ocorrem nas formas anoméricas α e β. Nestes compostos a OH do C-5 (ou C-6) reage com a C=O (grupo ceto) do C-2, formando um anel furanosídico (ou piranosídico), contendo uma ligação hemicetal (Figura 13). A forma livre da D-frutose produz predominantemente piranoses em soluções. Na figura 13 observamos a formação dos anômeros em furanoses da D-Frutose: D-frutofuranose e β-D-frutofuranose. FIGURA 13: Formação das estruturas cíclicas da D-Frutose. As estruturas cíclicas da D-Frutose em solução aquosa resultam da reação do seu grupo carbonila (ligado ao C-2,carbono secundário) com a hidroxila livre do carbono 5, formando um novo centro assimétrico no C-2 da estrutura cíclica, denominado carbono hemicetal ou carbono anomérico . Este estrutura cíclica é denominada furanose, por se assemelhar ao anel do furano. A nomenclatura sistemática para essas duas estruturas cíclicas da D-Frutose são α-D-frutofuranose e β-D-frutofuranose. Essas formas isoméricas são denominadas anômeros, pois diferenciam apenas na configuração do carbono anomérico, o C-2 do anel furanosídico. 7. Derivados dos monossacarídeos. Os monossacarídeos podem produzir formas derivadas devido a reações de seus grupos OH e C=O, que podem ser oxidados, reduzidos ou ter adição de grupos químicos como amino e fosfatos a suas OH (figura 14). FIGURA 14. Derivados dos monossacarídeos. Os ácidos D-glicônico, D-glicurônico e o N-Acetil-neuramínico (um ácido siálico) são derivados ácidos (oxidados) dos monossacarídeos. O ácido glicônico, um ácido aldônico, é produzido a partir da oxidação do carbono 1 da glicose. O ácido glicurônico, por sua vez, é produzido a partir da oxidação do C-6 da glicose. 7.1 Os derivados oxidados dos monossacarídeos são produzidos pela oxidação de seus grupos carbonila ou de suas hidroxilas, ou de ambos os grupos. Esses derivados são de quatro tipos: os ácidos aldônicos, urônicos, aldáricos e siálicos. 7.1.1 Os ácidos aldônicos são produzidos por oxidação do aldeído do C-1 das aldoses. Esse grupo aldeído é oxidado, sendo convertido a um ácido carboxílico. Os ácidos aldônicos são nomeados por adição do sufixo ônico à raiz do nome da aldose parental. Por exemplo, a D-glicose oxidada no C-1 produz ácido D-glicônico, D-galactose produz D-galactônico (Figura 15). 7.1.2 Ácidos urônicos, obtidos por oxidação da OH do carbono primário (última OH do monossacarídeo, nas hexoses é o C-6) Os ácidos urônicos são nomeados por adição do sufixo urônico à raiz do nome da aldose parental, por exemplo: a D-glicose oxidada no C-6 produz o ácido D-glicurônico, D-galactose produz D-galacturônico, etc. Esses monossacarídeos são importantes na formação dos polissacarídeos glicosaminoglicanos (Figura 15). FIGURA 15. Os derivados ácidos da glicose: aldônico e urônico. Os derivados aldônico são produzidos por oxidação do grupo aldeído da aldose (CHO) a ácido carboxílico (COOH). Assim, a oxidação do grupo aldeído da glicose produz um ácido aldônico denominado D-glicônico. Os derivados urônicos são formados pela oxidação da OH do carbono primário, o C-6 da glicose, que oxidado a COOH produz o ácido D-glicurônico. 7.1.3 Ácidos aldáricos. Quando expostos a soluções de ácido nítrico diluído, as aldoses sofrem oxidação dupla do seu grupo aldeído do C1 e de sua última OH do C-6. Assim, a D-glicose é oxidada nos C-1 e C-6, produzindo o ácido D-glicárico (Figura 16). A D-galactose produz o ácido D-galactárico. FIGURA 16. Os ácidos aldáricos são derivados ácidos de monossacarídeos. Os derivados aldáricos são produzidos por oxidação tanto do grupo aldeído da aldose (CHO) quanto da OH de um carbono primário, o carbono 6 de uma hexose. Nesta figura tem-se a oxidação dupla da glicose nos C-1 e C-6, formando o ácido D-glicárico. 7.1.4. Os ácidos siálicos. Os ácidos siálicos constituem uma família dos derivados N- ou O-substituídos do ácido neuramínico, encontrados como componentes de carboidratos complexos. Esses derivados ácidos caracterizam-se por conter nove carbonos. O ácido N-acetilneuramínico (abreviatura: Neu5Ac ou NeuNAc), frequentemente denominado apenas “ácido siálico”, é um derivado da N-acetilmanosamina, encontrado em muitas glicoproteínas e glicolipídios animais (Figura 17). Os grupos ácidos carboxílicos dos derivados de açúcar ácidos estão ionizados em pH 7,0, sendo, portanto, nomeados como carboxilatos, glicuronato, galacturonato, e assim por diante. Figura 17. Estrutura do ácido N-Acetilneuramínico, da família dos ácidos siálicos, derivados oxidados de monossacarídeos com 9 carbonos. O ácido N-acetilneuramínico é derivado da N-acetilmanosamina. Os grupos ácidos carboxílicos são ionizados em pH 7. 7.2 Derivados reduzidos dos monossacarídeos. Os derivados reduzidos dos monossacarídeos são produzidos pela redução de seu grupo carbonila (alditóis ou polialcoóis) ou pela substituição de suas hidroxilas por um átomo de hidrogênio (desoxiaçúcares). Os derivados desta classe são os alditóis ou polialcóois e os desoxiaçúcares. 7.2.1. Os alditois ou açúcares alcoóis (polialcoóis) são derivados reduzidos de monossacarídeos produzidos pela reação com boroidreto de sódio. A glicose reduzida produz glicitol ou sorbitol, xilose produz xilitol, gliceraldeído produz glicerol e manose produz manitol (Figura 18). FIGURA 18. Alditóis ou poliálcóois. O ribitol é produzido a partir da redução da D-Ribose, assim como xilitol é derivado de D-xilose, glicerol do D-gliceraldeído e mio-inositol da D-glicose. 7.2.2 Desoxiaçúcares. São derivados reduzidos em que algumas OH dos monossacarídeos podem ser substituídas por átomos de hidrogênio, produzindo derivados denominados desoxiaçúcares. Na célula esta reação é catalisada por enzimas da classe das redutases. O desoxiaçúcar de maior importância biológica é a β-D-2'-desoxirribose, componente dos nucleotídeos do DNA (Figura 19). A desoxigenação da pentose ribose produz a β-D-2’-desoxirribose. O monossacarídeo fucose (Figura 19) é obtido a partir da desoxigenação do C-6 da manose e a β-L-Ramnose, pela desoxigenação do C-6 da galactose (Figura 19). FIGURA 19. Desoxiaçúcares são formados pela substituição de uma OH por um H. O derivado β-D-2-desoxirribose é a pentose componente dos nucleotídeos do DNA. O derivado α-L-Fucose éproduzida pela desoxigenação do C-6 da manose e a β-L-Ramnose pela desoxigenação do C-6 da galactose. 7.3 Derivados aminados ou Aminoaçúcares. São os derivados obtidos pela substituição de um ou mais grupo de OH do monossacarídeo por um grupo amino (NH2). Esse grupo amino é freqüentemente acetilado (CH3CO), como ocorre nos glicosaminoglicanos. Os monossacarídeos α-D-glicosamina e α-D-galactosamina são os mais comuns (figura 20). Por acetilação, formam respectivamente N-Acetil-D-glicosamina e N-Acetil-D-galactosamina. FIGURA 20. Os monossacarídeos α-D-glicosamina e α-D-galactosamina são derivados aminados, produzidos pela substituição da OH dos C-2 da D-glicose e D-galactose, respectivamente. 7.4 Ésteres fosfóricos. Os ésteres fosfóricos são formados pela adição de um grupo fosfato (PO-4) a qualquer uma das hidroxilas do monossacarídeo. A glicose pode ser fosforilada na OH do C-6, produzindo glicose 6 fosfato (éster de Robinson). A frutose fosforilada no C-6 poduz frutose-6-fosfato (Figura 21). A frutose pode ser fosforilada duplamente tanto no C-1 quanto no C-6, produzindo ésteres de Harden e Young, como frutose 1,6-bisfosfato. Esses derivados fosforilados são importantes intermediários metabólicos, atuando nas reações de quebra da glicose (via glicolítica) atépiruvato, para produção de energia na forma de ATP. FIGURA 21. Ésteres de fosfatos de monossacarídeos. A glicose é fosforilada no C-6 produzindo glicose-6-fosfato, primeiro intermediário glicolítico produzido na glicólise. A frutose pode ser fosforilada tanto no C-1 quanto no C-6, produzindo ésteres de Harden e Young, como frutose 1,6-bifosfato (não mostrado) e frutose 6-fosfato. As trioses diidoxiacetona e D-gliceraldeído produzem também ésteres de fosfato: Diidroxiacetonafosforilada no C-1 e D-gliceraldeído no C-3. 8. Propriedades dos monossacarídeos 8.1 Propriedade de açúcar Redutor Os monossacarídeos e alguns oligossacarídeos em solução apresentam propriedades de agentes redutores. Os açúcares redutores tem a capacidade de reduzir agentes oxidantes por causa de seus grupos aldeído (da aldoses) ou cetona (das cetoses) livres ou potencialmente livres. Nas estruturas em piranose e furanose a OH do carbono anomérico é a que participa das reações de óxido-redução, portanto, para um açúcar ser considerado redutor, essa OH deve estar livre, não participando de ligação covalente. Os açúcares formam enedióis em meio alcalino. A forma enediólica é fortemente reativa e facilmente reduz algumas substâncias oxidantes tais como: Ag+, Hg2+, Bi3+, Cu2+. Nestas reações os açúcares são oxidados a uma mistura de ácidos orgânicos e derivados. Essa propriedade redutora dos açúcares em meio alcalino tem sido explorada em ensaios laboratoriais tanto para identificação de monossacarídeos, quanto de sua quantificação. A mais importante destas reações é a que envolve a reação do Cu2+ em meio alcalino e em presença de ácido tartárico (reação de Fehling ou Benedict). O regente de Benedict é uma solução contendo um complexo alcalino de citrato. Quando o Cu2+, que é solúvel e apresenta cor azul, é reduzido a Cu1+, precipita da solução, reagindo com oxigênio, formando óxidos insolúveis e alaranjados (Figura 22). FIGURA 22. Redução do cobre por açúcares redutores. Os açúcares em meio alcalino formam enedióis (enol), que podem ceder elétrons, reduzindo os sais de cobre do reativo de Benedict, dessa forma o cobre passa do estado de oxidação Cu2+ para Cu1+. A glicose ao se oxidar no C-1 forma um derivado aldônico, o ácido D-glicônico. Essa reação baseia-se na propriedade de açúcar-redutor de monossacarídeos, foi usada por muito tempo em clínica médica para dosar açúcar em líquidos biológicos como urina e sangue. Atualmente o método de dosagem de glicose é enzimático, utilizando a enzima glicose oxidase. 8.2. Propriedade da mutarrotação. A mutarrotação é a mudança gradativa da rotação óptica da solução contendo piranoses ou furanoses, até que o ângulo do poder rotatório específico atinja um valor de equilíbrio. Isso se deve ao fato dos dois anômeros e dos monossacarídeos se interconverterem, quando de sua dissolução em água. Assim, uma solução recentemente preparada de α-D-glicose, com um poder rotatório especifico inicial de +112°, diminui gradativamente esse número até atingir o ângulo de +52,5°. Por outro lado, uma solução recentemente preparada de β-D-glicose tem um poder rotatório especifico inicial de +18,7°. Depois de algum tempo em repouso, a sua rotação específica também muda gradativamente até atingir o ângulo de +52,5° (Figura 23). Essa mudança de rotação observada em ambas as soluções de glicose ( e ) deve-se a uma mistura formada por 2/3 de β-D-glicose, 1/3 de -D-glicose e quantidades mínimas da forma aberta. A forma β-D-glicose predomina em soluções aquosaas por ser a mais estável. FIGURA- 23. A mutarrotação é a interconversão entre a formas dos anômeros α e β da glicose. Uma solução recentemente preparada de α-D-glicose tem um poder rotatório especifico inicial de +112°, que após certo tempo em repouso, muda gradativamente até atingir o valor de + 52,5°. Outra solução recente de β-D-glicose apresenta um poder rotatório especifico inicial de + 18,7°; depois de algum tempo em repouso, a sua rotação específica também muda gradativamente para + 52,5°. 9. A formação da ligação glicosídica A ligação glicosídica, que une os monossacarídeos para formar oligo e polissacarídeos, é uma ligação covalente, resultante da reação de condensação de uma OH do carbono hemiacetal (das aldoses cíclicas) ou hemicetal (das cetoses cíclicas) de um monossacarídeo com qualquer OH do segundo monossacarídeo (Figura 24). Nessa reação, a OH de um carbono anomérico de um monossacarídeo reage com qualquer OH do segundo monossacarídeo, ocorrendo eliminação de água e a formação de uma ponte de oxigênio entre eles, que é a ligação glicosídica (Figura 24). A configuração do carbono anomérico do monossacarídeo que participa dessa reação é que determina a configuração da ligação glicosídica. Assim, se o carbono anomérico reagente apresenta configuração α, a ligação glicosídica será igualmente α. Por outro lado, se o carbono anomérico for , essa ligação terá configuração β. Figura 24: Formação da ligação glicosídica entre duas unidades de glicose, formando o dissacarídeo maltose. Nesta reação, o grupo OH do C-1 da glicose (carbono anomérico), cuja configuração é , reage com a OH do C-4 da segunda unidade de glicose, formando uma ligação glicosídica do tipo α1→4. 10. Oligossacarídeos. Os oligossacarídeos são pequenas cadeias de glicanos, contendo até dez unidades de monossacarídeos ligados entre si por ligação glicosídica. Os oligossacarídeos mais comuns são os dissacarídeos, sendo a sacarose, a maltose e a lactose os mais abundantes na natureza. Os oligossacarídeos com mais de dez unidades de monossacarídeos são encontrados apenas ligados a proteínas e lipídios formando as glicoproteínas e os glicolipídios, respectivamente. 10.1 Dissacarídeos 10.1.1 Maltose. O dissacarídeo maltose é obtido na hidrólise do amido, pela ação da enzima α-amilase, que promove a liberação de duas unidades de D-glicose. Essas duas unidades de glicose estão unidas por ligação (α1→4). O segundo resíduo de D-glicose da maltose possui uma hidroxila do carbono anomérico livre, capaz de existir nas formas α e β, das quais a forma β predomina na natureza (figura 24). O nome sistemático da maltose é O-–D-Glicopiranosil(14)-D-Glicopiranose. Os resíduos de D-glicose na maltose são hidrolisados pela enzima maltase. Propriedades do dissacarídeo maltose: É um açúcar hidrossolúvel, redutor e com propriedade de mutarrotação. É hidrolisado pela enzima intestinal maltase em duas unidades de glicose. 10.1.2 Lactose. O dissacarídeo lactose é o açúcar do leite, composto por D-glicose e D-galactose, ligadas por ligação glicosídica (β1→4). O resíduo de D-glicose desse dissacarídeo possui uma OH do carbono anomérico com configuração β (figura 25). A ligação glicosídica que une os resíduos de D-glicose e D-galactose na lactose é hidrolisada pela enzima lactase. Seu nome sistemático é O-β–D-Galactopiranosil (14) -D-Glicopiranose. Propriedades da lactose: é açúcar redutor, hidrolisado pela enzima intestinal lactase em glicose e galactose e é solúvel em água. 10.1.3 Sacarose. A sacarose é o açúcar da beterraba e da cana-de-açúcar e é formada por D-frutose e D-glicose unidas por ligação glicosídica (β2→1). Como as hidroxilas do carbono anomérico da D-frutose e D-glicose estão envolvidas na formação da ligação glicosídica, a sacarose não apresenta a propriedade de açúcar redutor (figura 25). A ligação glicosídica que une os resíduos de D-frutose e D-glicose na sacarose é hidrolisada pela sacarase ou invertase. Seu nome sistemático é O-α-D-Glicopiranosil (12) –D-Frutofuranosídeo ou O-β–D-Frutofuranosil (21) α-D-Glicopiranosídeo. A inversão da sacarose. Uma solução de sacarose tem uma rotação específica +66,5°. Se a essa solução for adicionada a sacarase (ou invertase), enzima que hidrolisa a sacarose, seu poder rotatório vai mudar de dextrorrotatório para levorrotatório devido a mistura equimolar de D-glicose (Rotação específica +52,5°) e D-frutose (rotação específica –92°). 10.1.3.1 Propriedades da sacarose: Não é açúcar redutor,é hidrolisado pela enzima intestinal sacarase em glicose e frutose e, portanto, açúcar invertido e é solúvel em água. A sacarose não tem grupo reativo livre porque os carbonos anoméricos de ambas as unidades monossacarídicas estão envolvidos na ligação glicosídica. Portanto, a sacarose não apresenta caracteres de açúcar redutor nem de mutarotação. A sacarose é chamada açúcar invertido porque a atividade ótica da sacarose (dextrorrotatória) é invertida após a hidrólise (por um ácido ou uma enzima (invertase ou sacarase) em uma mistura equimolar de seus dois componentes glicose (+52,5) e frutose (-92,5) e a atividade ótica da mistura torna-se levorrotatória. 10.1.4 Trealose. A trealose é um dissacarídeo não redutor formado por dois resíduos de glicose unidos por ligação glicosídica (α1→1), como demonstrada na figura 25. O nome sistemático é O-α-D-Glicopiranosil (11) α–D-Glicopiranosídeo. A trealose ou açúcar do cogumelo está presente não só em fungos, como também em muitos outros organismos. Em alguns insetos a trealose atua como uma fonte de reserva energética da hemolinfa e ainda age como um anticongelante em muitas espécies. É responsável por até 20% do peso seco de organismos anidrobióticos (que podem sobreviver em completa desidratação), como esporos de alguns fungos e bactérias, células de levedura e alguns nematóides. Esses organismos podem permanecer por muitos anos em estado de desidratação. Embora possam ser dessecados, os esporos de fungos permanecem dormentes mesmo quando a quantidade de água disponível seja considerável. Uma das primeiras alterações detectáveis quando os esporos germinam é um rápido aumento na atividade da enzima trealase, que hidrolisa a trealose em dois resíduos de glicose. 10.1.4.1 Propriedades da trealose: Não é açúcar redutor, é hidrolisado pela enzima intestinal trealase em duas unidades de glicose e é hidrossolúvel. Não apresenta a propriedade da mutarrotação. FIGURA 25: A estrutura dos dissacarídeos lactose, sacarose e trealose. (a) O dissacarídeo lactose é o açúcar do leite, redutor, composto por D-glicose e D-galactose unidos por ligação glicosídica (β1→4). (b) A sacarose é o açúcar da beterraba e da cana-de-açúcar e é formada por D-frutose e D-glicose unidas por ligação glicosídica (β2→1). (c) A trealose é um dissacarídeo não redutor formado por dois resíduos de glicose unidos por ligação glicosídica (α1→1). Como as hidroxilas do carbono anomérico dos monossacarídeos da sacarose e trealose estão envolvidas na formação da ligação glicosídica, não tem a propriedade de açúcar redutor 10.1.5 Isomaltose: A isomaltose é um dissacarídeo de glicose, diferenciando-se da maltose apenas na forma de ligação das duas unidades de glicose (Figura 26). Enquanto na maltose as unidades de glicose são unidas por ligação (α1→4), na isomaltose esses resíduos são unidos por ligação glicosídica do tipo (α1→6). Nome sistemático da isomaltose é O--D-Glicopiranosil (16) -D-Glicopiranose. 10.1.5.1 Propriedades da isomaltose: É formada por duas unidades de glicose unidas por ligação (α1→6).. É produzida a partir da hidrólise do amido (amilopectina) ou glicogênio (amilopectina), apresenta propriedade de açúcar redutor, é hidrolisada pela enzima intestinal isomaltase em duas unidades de glicose e é hidrossolúvel. Apresenta a propriedade da mutarrotação. Figura 26 Estrutura do dissacarídeo isomaltose. A isomaltose é um dissacarídeo de glicose, diferenciando-se da maltose apenas na forma de ligação das duas unidades de glicose. O seu nome sistemático é O--D-Glicopiranosil (16) -D-Glicopiranose. 10.1.6 Celobiose: É um dissacarídeo formado por duas unidades de glicose unidas por ligação glicosídica (β1→4). É obtido a partir da hidrólise da celulose (Figura 27). A celobiose é solúvel em água, apresenta propriedade de açúcar redutor e também é hidrolisado pela enzima celulase em duas unidades de glicose. O nome sistemático é O-α–D-Glicopiranosil (11) α-D-Glicopiranosídeo. FIGURA 27 A estrutura do dissacarídeo Celobiose. É obtida a partir da hidrólise da celulose. Tem propriedade de açúcar redutor e também é hidrolisado pela enzima celulase em duas unidades de glicose. Seu nome sistemático é O-α–D-Glicopiranosil (11) α-D-Glicopiranose 10.2 Trissacarídeos e tetrassacarídeos. Muitos trissacarídeos como a rafinose e a melezitose são da família da sacarose (derivados de sacarose). Geralmente esses derivados tem um resíduo de -galactose ligado à sacarose. O tetrassacarídeo estaquiose é também um derivado de sacarose, cuja sacarose está ligada a duas moléculas de galactose. 10.2.1 Rafinose. Trissacarídeo que tem um resíduo de -D-galactose ligado a sua unidade de sacarose. Seu nome sistemático é O-α-D-galactopiranosil-(1→6)-O-α-D-glicopiranosil-(1→2)-β-D-fructofuranosídeo. Ocorre em plantas, estando presente, por exemplo, em grãos de cereais, sementes de algodão e muitas leguminosas. Não apresenta propriedade de açúcar redutor. Sua hidrólise libera glicose, frutose e galactose (Figura 28). 10.2.2 Melezitose. Trisacarídeo derivado da sacarose, sendo formado por duas unidades de glicose e uma frutose. Tem como nome sistemático O-α-D-glicopiranosil-(1→3)-O-β-Dfructofuranosil-(2→1)-α-D-glicopiranosideo. É Componente dos exsudatos doces de muitas plantas e das folhas de algumas árvores após o ataque de insetos (Figura 28). Não apresenta propriedade de açúcar redutor. 10.2.3 Estaquiose ou lupeose. Tetrasacarídeo formado por duas unidades de galactose ligadas à sacarose. Seu nome sistemático é O-α-D-galactopiranosil-(1→6)-O-α-D-galactopiranosil-(1→6)-O-α-D-glicopiranosil-β-Dfructofuranosideo. É isolado de rizomas de Stachystuberifera. Está presente ainda nas sementes de leguminosas. A hidrólise da estaquiose produz duas moléculas de galactose, uma de glicose e uma de frutose. Não apresenta propriedade de açúcar redutor (Figura 28). Figura 28. Estruturas da rafinose, melezitose e estaquiose. A rafinose. Trissacarídeo que tem um resíduo de -D-galactose ligado a sua unidade de sacarose. Seu nome sistemático é O-α-D-galactopiranosil-(1→6)-O-α-D-glicopiranosil-(1→2)-β-D-fructofuranosídeo. Melezitose. Trisacarídeo derivado da sacarose, sendo formado por duas unidades de glicose e uma frutose. Tem como nome sistemático O-α-D-glicopiranosil-(1→3)-O-β-Dfructofuranosil-(2→1)-α-D-glicopiranosideo. Estaquiose ou lupeose. Tetrasacarídeo formado por duas unidades de galactose ligadas à sacarose. Seu nome sistemático é O-α-D-galactopiranosil-(1→6)-O-α-D-galactopiranosil-(1→6)-O-α-D-glicopiranosil-β-Dfructofuranosideo. 11. Polissacarídeos ou glicanos. Os polissacarídeos são formados por longas cadeias com centenas ou milhares de unidades de monossacarídeos. A maioria dos carboidratos é encontrada na natureza na forma de polissacarídeos, que diferem entre si pela natureza das suas unidades monossacarídicas recorrentes, pelo comprimento das suas cadeias e pelo grau de ramificação. Alguns polissacarídeos, como a celulose, têm cadeias lineares; outros, como o glicogênio, são ramificados. Esses dois glicanos são formados por unidades repetidas de D-glicose, mas diferem no tipo de ligação glicosídica e, em consequência, têm propriedades e funções biológicas notavelmente diferentes. Os polissacarídeos tem diversas funções biológicas como estrutural e reserva energética. São classificados de acordo com as unidades de monossacarídeos em homopolissacarídeos ou heteropolissacarídeos (Figura 29). Os homopolissacarídeos são formados por um único tipo de unidade de monossacarídeo. Exemplos: amido, glicogênio e celulose, são polissacarídeos formados apenas pelo monossacarídeo D-glicose. Os heteroploissacarídeos são polissacarídeos formados por duas ou mais unidades monoméricas diferentes. Exemplos: o ácido hialurônico, que é formado por resíduos alternados de ácido D-glicurônico e N-acetil-D-glicosamina. FIGURA 29. Homo e heteropolissacarídeos. Os polissacarídeos podem ser compostos por um, dois ou alguns monossacarídeos diferentes, em cadeias lineares ou ramificadas de várioscomprimentos. 11.1 Polissacarídeos de reserva energética 11.1.1 Amido. O Amido é a reserva energética das plantas. É formado por duas unidades poliméricas de resíduos de glicose: amilose e amilopectina (Figura 30a). A amilose é o polímero não ramificado do amido e hidrossolúvel, sendo formada por resíduos de α-D-glicose interligadas por ligação α1→4. A amilopectina (Figura 30b) é o polímero ramificado e insolúvel em água. Tem resíduos de D-glicose interligados por ligação α1→4 e nos pontos de sua cadeia onde ocorrem ramificações, são unidos por ligação α1→6. As ligações α1→4 que unem os resíduos de D-glicose no amido estão perfeitamente adaptadas à função de reserva energética das plantas por duas razões principais, quais sejam: 1. São flexíveis e, portanto, dobráveis, o que permite que a molécula do amido se dobre sobre si mesma, facilitando o enovelamento desse polímero na célula, formando grânulos densos. 2. São hidrolisadas pela enzima α-amilase, liberando como produto D-glicose, que será metabolizada na célula para produzir energia (figura 30c). Dessa forma o amido atua como uma reserva celular de D-glicose FIGURA 30. A estrutura dos polímeros amilose e amilopectina do amido. a) Estrutura da amilose e b) Estrutura da amilopectina. C. estrutura dobrável das ligações (α1→4) dos polímeros da amilopectina e do glicogênio, o que facilita o armazenamento desses polímeros na forma de grânulos densos. 11.1.2 Glicogênio. As células dos animais armazenam D-glicose na forma de glicogênio. A estrutura do glicogênio é como a amilopectina do amido, dela diferindo apenas no fato de apresentar uma maior compactação e também um maior número de ramificações (Figura 31). Na cadeia não ramificada, os resíduos de D-glicose unem-se por ligações glicosídicas α1→4. Já nas ramificações dessa cadeia, os resíduos de D-glicose são unidos por ligação α1→6. FIGURA 31: A. Amilopectina, polímero ramificado do amido. B. Estrutura do glicogênio, que se assemelha a da amilopectina, apenas mais ramificado. C. Ligações glicosídicas (α1→4) e (α1→6). 11.2 Polissacarídeos estruturais. Muitos polissacarídeos atuam como elementos estruturais, como a peptidoglicano, que compõe as paredes celulares de bactérias; a celulose, a parede celular de vegetais superiores, o glicocálix, que forma a superfície externa de células animais. Outros ainda podem ser componentes estruturais do tecido conjuntivo de vertebrados (glicosaminoglicanos) e do exoesqueleto dos artrópodes (quitina). Os polissacarídeos estruturais conferem forma e dão proteção e suporte às células e aos tecidos onde são encontrados. 11.2.1 Celulose. A celulose é um homopolissacarídeo linear não ramificado, formado por dez mil ou mais unidades de D-glicose interligadas por ligação glicosídica β1→4. Essa ligação permite à celulose formar polímeros de D-glicose lineares, resistentes e insolúveis, adaptando-a perfeitamente a sua função estrutural (Figura 32). Os polímeros de D-glicose que formam as fibras de celulose são interligadas por pontes de hidrogênio intra e intercadeia, que estabilizam essas fibras, de modo a formar estruturas resistentes e insolúveis em água. Essa insolubilidade em água da celulose, deve-se a que as OH das glicose não interagem com a água do meio, mas entre as unidades de glicose, formando as pontes de hidrogênio. FIGURA 32: A estrutura dos polímeros de D-glicose unidos por ligação glicosídica (β1→4) para formar fibras de celulose. Como o sistema digestivo dos vertebrados não produz qualquer enzima capaz de hidrolisar as ligações β1→4 da celulose, esse polímero não pode ser hidrolisado em suas unidades de D-glicose, portanto, completamente inaproveitável como alimento para a maioria desses animais. Os cupins digerem a celulose porque o seu sistema digestivo abriga um microrganismo Triconympha, que secreta a celulase, enzima que hidrolisa a celulose e capacita os cupins a se alimentarem de madeira. Os fungos e bactérias que se alimentam de madeira também produzem a celulase. Os mamíferos não possuem celulase e, portanto, não podem digerir madeira e fibras vegetais. Contudo, alguns ruminantes como as ovelhas, boi, girafa, camelo, etc, abrigam em seus intestinos bactérias produtora de celulase, razão pela qual podem digerir a celulose. 11.2.2. Quitina. Outro polissacarídeo estrutural é a quitina, material insolúvel e resistente da carapaça ou do exoesqueleto de lagostas, caranguejos e de muitos insetos. A quitina é um homopolissacarídeo formado por resíduos de N-acetil-glicosamina (Figura 33) unidos por ligações β1→4. A única diferença química em comparação com a celulose é a substituição de uma OH no C-2 por um grupo amina acetilado. A quitina forma longas fibras similares às da celulose e, como tais, não são digeridas por vertebrados. FIGURA 33: A estrutura química do monossacarídeo N-acetil-D-glicosamina, um derivado da glicosamina por acetilação do grupo amino no carbono 2 do anel piranosídico. Os resíduos de N-acetil-D-glicosamina são unidos por ligação glicosídica (β1→4), formando polímeros que dão estrutura a quitina. 11.2.3. Peptidoglicano, a parede celular das bactérias. As bactérias são envolvidas por uma parede celular rígida que lhes permite viver em ambientes hipotônicos (concentrações de sais mais baixa do que o meio intracelular), sem que ocorra lise de suas membranas plasmática, em decorrência do fluxo de água do meio externo para o intracelular. A parede celular bacteriana denominada peptidoglicano consiste de cadeias polissacarídicas e polipeptídicas ligadas covalentemente, formando uma estrutura resistente, assemelhando-se a um muro, daí anteriormente ser denominada mureína (Figura 34). Essa estrutura resistente que envolve completamente a bactéria foi elucidada por Jack Strominger. Suas fibras de polissacarídeos são formadas por duas unidades recorrentes de N-acetilmurâmico e N-Acetil-D-glicosamina unidas por ligação β1→4, dispostas lado a lado. A OH do C-3 do N-acetilmurâmico tem seu hidrogênio substituído por ácido láctico, ao qual se liga um tetrapeptídeo composto por alanina, isoglutamato, lisina e alanina (Figura 34). As fibras de polissacarídeos são interligadas por um pentapeptídeo de glicina, que se liga a um resíduo de alanina de uma cadeia com outro resíduo de alanina ligado ao N-acetilmurâmico da cadeia ao lado (Figura 34). FIGURA 34. Estrutura do polímero de peptidoglicano, formado por N-acetilglicosamina e ácido N-acetilmurâmico ligado por ligação (β1→4). Representação esquemática desse polímero destacando a importância do peptídeos na formação da peptidoglicano. Os D-aminoácidos do peptidoglicano tornam essa estrutura resistente a proteases, que apresentam em sua maior parte, especificidade para L-aminoácidos. Entretanto, a lisozima, uma enzima presente nas lágrimas, no muco e em outras secreções do corpo, como também na clara do ovo, catalisa a hidrólise da ligação glicosídica β1→4 entre o ácido N-acetilmurâmico e N-Acetil-D-glicosamina. As paredes celulares das bactéria são tipicamente compostas por peptidoglicanos (polímeros de polissacarideoss ligados a proteínas). Quando a parede exterior tem esta composição, a célula tinge de cor púrpura quando fixada com violeta-cristal, uma preparação conhecida como técnica de Gram - bactérias "Gram-positivas". Outras bactérias possuem uma parede celular dupla, em que a interna é uma fina camada de peptidoglicanos, enquanto que a exterior á formada por carboidratos, lípidos e proteínas. Estas bactérias não tingem de púrpura com o corante de Gram - "Gram-negativas". Muitos antibióticos, incluindo a penicilina e seus derivados, atacam especificamente a parede celular das bactérias. 11.2.4. Glicosaminoglicanos. A matriz extracelular de tecidos conjuntivos como cartilagem, tendões, pele e parede dos vasos sanguíneos contém uma matriz gelatinosa composta por glicosaminoglicanos. Os glicosaminoglicanos são cadeias de polissacarídeos sem ramificações (carga negativa pelos radicais sulfato e carboxila), compostas de unidades repetitivasde dissacarídeos, sendo um deles uma hexose-aminada N-acetilada (N-acetilglicosamina ou N-acetilgalactosamina) e a outra unidade é um ácido urônico (açúcar derivado de ácido Glicurônico ou idurônico). Alguns glicosaminoglicanos contêm ainda sulfato, como também o monossacarídeo pode aparecer na forma de aldose como a D-galactose no queratana sulfato (Figura 30). São exemplos de glicosaminoglicanos: ácido hialurônico, condroitina-4-sulfato, condroitina-6-sulfato, dermatan-sulfato, queratan-sulfato, heparina (Figura 35). O ácido hialurônico é formado por unidades repetitivas de D-glicuronato e N-Acetil-D-glicosamina unidas por ligação (β1→3), é um componente do líquido sinovial (fluido lubrificante de juntas) e do humor vítreo dos olhos. A vida dos olhos depende muito dos seus dois humores: o humor vítreo, substância gelatinosa que enche quase todo o globo ocular, e o humor aquoso, uma solução salina que enche a região da íris. Apresenta cargas negativas o que proporciona a hidratação desse polímero, uma vez que as cargas negativas do ácido hialurônico ligam muitas moléculas de água e cálcio. A ligação (β1→3) do ácido hialurônico favorece a formação de fibras distendidas rígidas, resistentes à tensão. Os glicosaminoglicanos são encontrados normalmente ligados a proteínas, formando proteoglicanos. Os glicosaminoglicanos e proteoglicanos formam uma substância altamente hidratada do tipo gel, onde as proteínas estão inseridas. Este gel é altamente resistente a forças de compressão, enquanto que as proteínas fibrosas (colágeno) dão ao tecido uma resistência à tensão. FIGURA 35. Os glicosaminoglicanos são cadeias de polissacarídeos sem ramificações (carga negativa pelos radicais sulfato e carboxila), compostas de unidades repetitivas de dissacarídeos, sendo um deles uma hexose-aminada N-acetilada (N-acetilglicosamina ou N-acetilgalactosamina) e a outra unidade é um ácido urônico (açúcar derivado de ácido glicurônico ou idurônico). Alguns glicosaminoglicanos contêm ainda sulfato, como também o monossacarídeo pode aparecer na forma de aldose como a D-galactose no queratana sulfato. São exemplos de glicosaminoglicanos: ácido hialurônico, condroitina-4-sulfato, condroitina-6-sulfato, dermatan-sulfato, queratan-sulfato, heparina. 12. Conclusão Os carboidratos ou glicanos são poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas, ou substâncias que por hidrólise liberam um desses dois compostos. Classificam-se em monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos. Desempenham diversas funções na natureza como reserva energética de plantas e animais, função estrutural e participam no reconhecimento e adesão celular. Os monossacarídeos assimétricos apresentam isômeros ópticos , tendo configuração absoluta D. Os monossacarídeos com 5 mais átomos de carbonos podem formar estruturas cíclicas denominadas piranoses e furanoses. Os monossacarídeos reagem em uma reação de eliminação de H2O produzindo uma ligação covalente denominada ligação glicosídica. A ligação glicosídica une monossacarídeos formando oligossacarídeos e polissacarídeos. Os oligossacarídeos são pequenas cadeias de monossacarídeos, sendo os dissacarídeos os mais abundantes. Os polissacarídeos são cadeias enorme, contendo centenas oumilhares de unidades de monossacarídeos. Podem ser homo ou heteropolissacarídeo e desempenham funções estrutural, de reserva energética, entre outras. Celulose e quitina são homopolissacarídeos com função estrutural. Amido e glicogênio são homopolissacarídeos com função de reserva energética. 13. Resumo Os carboidratos são poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas, ou substâncias que por hidrólise liberam um desses dois compostos. Atuam como reserva energética de plantas e animais, desempenham função estrutural e participam, ainda, na adesão e reconhecimento celular. De acordo com o número de unidades de poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas, classificam-se em: monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos. Os monossacarídeos são sólidos cristalinos, incolores, solúveis em água e são agrupados em duas famílias: aldoses e cetoses. Os monossacarídeos com 3 átomos de carbono são denominados trioses, com 4 tetroses, com 5 pentoses, com 6 hexoses e com 7 heptoses. A maioria dos monossacarídeos apresentam configuração absoluta D, com exceção da diidroxicetona (que não tem carbono assimétrico). Os monossacarídeos que apresentam imagem especular não superponívelsãoenantiômeros ou isômeros ópticos e aqueles que diferem apenas na configuração de um único centro assimétrico são denominadas epímeros. Em soluções aquosas, os monossacarídeos com cinco ou mais átomos de carbono ocorrem, predominantemente, como estruturas cíclicas (em anel) que resultam da reação geral entre aldeídos ou cetonas e alcoóis formando derivados hemiacetais ou hemicetais, respectivamente. A formação de oligossacarídeos e polissacarídeos ocorre com a reação de unidades de monossacarídeos, em que se produz uma ligação covalente denominada ligação glicosídica. Nessa reação a hidroxila de um carbono anomérico de um monossacarídeo reagem com qualquer outra hidroxila de outro monossacarídeo. Os oligossacarídeos são pequenas cadeias de carboidratos contendo até dez unidades de monossacarídeos. Os mais comuns são os dissacarídeos, dos quais a sacarose, a maltose e a lactose são os mais abundantes na natureza. Os polissacarídeos são formados por cadeias contendo centenas ou milhares de unidades de monossacarídeos e diferem entre si pelo tipo de monossacarídeo que entra em sua composição, comprimento das suas cadeias e grau de ramificação da cadeia. Assumem importante função estrutural e de reserva energética e são classificados em homopolissacarídeos e heteropolissacarídeos, de acordo com as unidades de monossacarídeos que entram em sua composição. Os polissacarídeos amido (reserva energética das plantas), glicogênio (reserva energética dos animais) e celulose são homopolissacarídeos de glicose que estão perfeitamente adaptados às funções biológicas que desempenham na natureza. 14. Exercícios 1. O que são aldoses e cetoses? 2. Como são nomeadas os monossacarídeos das famílias das aldoses e cetoses? 3. Como é determinada a configuração absoluta dos monossacarídeos com apenas um centro assimétrico e a dos que tem dois ou mais carbonos quirais? 4. Por que a diidroxicetona não apresenta isômeros ópticos nem configuração absoluta? 5. Quais são as aldoses e cetoses mais abundantes na natureza? 6. Explique o porquê das pentoaldoses terem 8esteroisômeros e as pentocetoses terem só 4. 7. O que são diasteroisômeros e epímeros? Quais são os epímeros da D-glicose? 8. Qual a relação isomérica existe entre D-glicose e D-manose? 9.O que são anômeros? Exemplifique-os. 10. O que são ácidos aldônicos, urônicos, desoxiaçúcares e aminoaçúcares? 11. O que é a ligação glicosídica e como ela é formada? 12. O que são oligossacarídeos? Exemplifique-os. 13. O que é a intolerância à lactose? Como ela pode ser tratada? 14. Maltose, trealose e celobiose são dissacarídeos formados por dois resíduos de D-glicose, em que aspectos eles se diferenciam? 15. Descreva a nomenclatura dos monossacarídeos envolvidos na formação dos oligossacarídeos maltose, trealose, rafinose e celobiose. 16. Por que a sacarose não é um açúcar redutor? 17. Explique por que a sacarose é denominada de açúcar invertido. 18. O que são polissacarídeos e como eles são classificados quanto ao tipo de suas unidades formadoras? 19. Quais as funções biológicas dos polissacarídeos? 20. Apresente exemplos de homopolissacarídeos e heteropolissacarídeos 21. Descreva a estrutura do amido e explique como ela adapta-se bem ao seu papel biológico 22. Descreva a estrutura do glicogênio e explique como ela adapta-se bem ao seu papel biológico 23. Descreva a estrutura da celulose e fale sobre o seu papel biológico 24. Por que a celulose não é fonte de D-glicose para o homem, mas o é para os ruminantes e os cupins? 25. O que são glicosaminoglicanos e como eles são formados 26. Descreva a estrutura da paredecelular das bactérias. 27.Diferencie os glicoconjugados glicoproteínas, proteoglicanos e glicolipídios. 22