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AV2 - Resumão NEOCONSTITUCIONALISMO (Aula 1) Marcos Fundamentais: ATENÇÃO Luís Roberto barroso aponta três marcos determinantes para isso: a) Marco Histórico: formação do ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, ESTADO CONSTITUCIONAL DE DIREITO OU ESTADO CONSTITUCIONAL DEMOCRÁTICO, cuja consolidação se deu ao longo das décadas finais do século XX. O constitucionalismo do pós-guerra, que "redefiniu o lugar da Constituição e a influência do direito constitucional nas instituições contemporâneas". As principais referências são: a Lei Fundamental de Bonn, de 1949 (Alemanha), e a Constituição da Itália, de 1947. No Brasil, cita-se a Constituição de 1988. b) Marco Filosófico: o PÓS-POSITIVISMO. Com a centralização dos direitos fundamentais e a reaproximação entre direito e ética. Explicando melhor o que se entende por pós-positivismo, podemos dizer que é a junção das ideias no jusnaturalismo do século XVIII com as do positivismo do século XIX, criando uma nova forma de entender o direito. A corrente jusnaturalista fundou-se na crença de que existem princípios de justiça universalmente válidos para todos os seres humanos. Ela impulsionou as revoluções liberais do século XVIII, mas, por ter sido considerada "abstrata" ou metafísica, foi substituída pelas ideias do positivismo. Este igualou o Direito à lei, retirando toda carga valorativa e filosófica da norma. Era a Ciência pura do Direito. Com a crise desse sistema em meados do século XX, era preciso repensar a filosofia jurídica. Como esclarece Barroso: "o pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas." c) Marco Teórico: processo de constitucionalização do direito, que inclui a ideia de FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO (Konrad Hesse), a EXPANSÃO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL e o desenvolvimento de uma NOVA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. Em primeiro lugar, a constituição passou a ser dotada de força normativa. Isso quer dizer que o texto constitucional deixa de ser um convite à atuação do governante, uma mera carta política, e reconhece o papel do Judiciário na concretização de direitos. Em segundo lugar, consequentemente, há uma expansão da jurisdição constitucional, criando-se Tribunais Constitucionais com o objetivo de efetivar o texto constitucional, na perspectiva da Supremacia 2 da Constituição. Por fim, em terceiro lugar, houve uma mudança em relação à forma de se interpretar a norma constitucional. A nova interpretação constitucional passou a ter que lidar com a existência de princípios e conceitos abertos, a serem concretizados pelo intérprete, a exemplo do princípio da dignidade da pessoa humana. Além disso, a técnica da ponderação de interesses e a argumentação jurídica se tornam fundamentais para a solução de colisões entre direitos. Transconstitucionalismo (conceitual) • Entrelaçamento de ordens jurídicas diversas em torno dos mesmos problemas de natureza constitucional. • Não há hierarquia entre as ordens jurídicas, logo não há que se falar em imposição de uma ordem sobre outra. • Nega a máxima do constitucionalismo de que as Cortes Constitucionais são detentoras da prerrogativa da última palavra sobre a Constituição. • Diálogos institucionais. Os problemas centrais do constitucionalismo moderno sempre foram o reconhecimento e a proteção dos direitos humanos, de um lado; e o controle e a limitação do poder, de outro. Sucede, porém, que na contemporaneidade, em razão da maior integração da sociedade mundial, estes problemas deixam de ser tratados apenas no âmbito dos respectivos Estados e passam a ser discutidos entre diversas ordens jurídicas, inclusive não estatais, que muitas vezes são chamadas a oferecer respostas para a sua solução. Isso implica, como propõe, com muita propriedade, Marcelo Neves, uma “relação transversal permanente” entre as distintas ordens jurídicas em torno de problemas constitucionais comuns. O Direito Constitucional, portanto, afasta-se de sua base originária, que sempre foi o Estado, para se dedicar às questões transconstitucionais, que são aquelas, segundo Neves, que perpassam os diversos tipos de ordens jurídicas e que podem envolver tribunais estatais e internacionais na busca de sua solução. Neves explica que o conceito de transconstitucionalismo não tem nada a ver com o conceito de constitucionalismo internacional ou transnacional. O conceito está relacionado à existência de problemas jurídico-constitucionais que perpassam às distintas ordens jurídicas, sendo comuns a todas elas, como, por exemplo, os problemas associados aos direitos humanos. 3 Neste caso, impõe-se um diálogo entre estas distintas ordens jurídicas a fim de que os problemas que lhes são comuns tenham um tratamento harmonioso e reciprocamente adequado. Essa interlocução pode ocorrer das mais variadas formas. É possível que ela decorra da vinculação das ordens jurídicas estatais às decisões das ordens jurídicas internacionais, como, por exemplo, a sujeição do Brasil às decisões emanadas da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em razão da adesão do Estado brasileiro às disposições da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH); é possível, outrossim, que essa conversação se desenvolva a partir do respeito e consideração espontânea e mútua entre as diversas ordens jurídicas (estatais e internacionais), como pode se verificar, por exemplo, quando um Tribunal estatal considera, sem estar obrigado a tanto, a decisão de outro Tribunal estatal ou internacional, e vice versa. https://dirleydacunhajunior.jusbrasil.com.br/artigos/199235257/transconstitucion alismo-e-as-questoes-constitucionais-transnacionais CONCEPÇÕES SOBRE O SENTIDO DA CONSTITUIÇÃO (Aula 2) • Qual a natureza, significação e papel da Constituição? → Sentido sociológico – Ferdinand Lassale (1863): a Constituição é o SOMATÓRIO DOS FATORES REAIS do poder dentro de uma sociedade, sob pena de se tornar mera folha de papel escrita, que não corresponde à Constituição real. - CONSTITUIÇÃO COMO FATO SOCIAL; - Evento determinado pelas forças dominantes da sociedade; - Constituição escrita apenas formaliza a Constituição real e será mera folha de papel se não reproduzir a SOMA DOS FATORES REAIS DE PODER. → Sentido político – Carl Schmitt (1932): A Constituição decorre de uma DECISÃO POLÍTICA FUNDAMENTAL, e se traduz na estrutura do Estado e dos Poderes e na presença de um rol de direitos fundamentais. - CONSTITUIÇÃO COMO DECISÃO POLÍTICA FUNDAMENTAL. - É constitucional aquilo que organiza o Estado e limita o poder. - O restante das normas seriam apenas “Leis Constitucionais”, fruto da decisão política fundamental, ou seja, da Constituição. (Norma que não traduz decisão política fundamental = mera Lei Constitucional). CONSTITUIÇÃO ≠ LEI CONSTITUCIONAL 4 CONSTITUIÇÃO LEI CONSTITUCIONAL Constituição é apenas a decisão política fundamental do titular do poder constituinte (estrutura e órgãos do estado, direitos individuais, vida democrática, etc.). Demais dispositivos inseridos no texto do documento constitucional, mas que não contêm matéria de decisão política fundamental. • Sentido jurídico – Hans Kelsen (1933): Adotado pelo Brasil. A Constituição é estrutura formal, de caráter normativo, a prescrição de um dever-ser, independentemente de sua legitimidade ou da justiça de seu conteúdo, ou ainda da realidade política em que ela está inserida. Está no topo da ordem jurídica. - CONSTITUIÇÃO COMO NORMA FUNDAMENTAL DE UM ESTADO, conferindo validade a todo o seu ordenamento jurídico; - Pressuposto e parâmetro de validadede toda a legislação infraconstitucional. - NORMA PURA. - Estritamente formal. - A Constituição não depende de aceitação, valores ou normas. - A Constituição é considerada norma do mais alto grau. → Sentido lógico-jurídico: é a norma fundamental hipotética pura, cuja função é servir de fundamento lógico transcendental da validade da Constituição jurídico-positiva (plano lógico), que é a norma suprema do Estado. → Sentido jurídico-positiva: é norma posta, norma positiva suprema, conjunto de normas que regula a criação de outras normas, leis nacionais do seu mais alto grau (plano positivo). HISTÓRIA DAS COSNTITUIÇÕES BRASILEIRAS (Aula 3) CONSTITUIÇÃO DE 1824 • Fase Colonial – Capitanias hereditárias e Governos Gerais. • Fase Monárquica – Chegada da Família Real (1808); – Reino Unido Portugal, Brasil e Algarves (1815); – Processo de Independência / Império do Brasil (1822); – Convocação da Assembleia Constituinte em 1923 e Conselho de Estado. – Constituição de 1824 • Império do Brasil / Monarquia; • Estado unitário; • Legislativo, Executivo, Judiciário, Moderador; • Voto censitário; • União Igreja-Estado; • Regime escravocrata; • Constituição semirrígida; • Inspiração Liberal. 5 CONSTITUIÇÃO DE 1891 – Renúncia de Dom Pedro I e Período Regencial; – Maioridade de Dom Pedro II (1840); – Afirmação do Exército; – Partido Republicano (República e Federalismo); – Fim da escravidão (Lei Áurea – 1888); – Crise entre Estado e Igreja; – Proclamação da República (1889); – Decreto nº 1 / Projeto da Constituição. – Constituição de 1891 • República dos Estados Unidos do Brazil; • Estado laico; • Extinção Poder Moderador; • Fortalecimento Judiciário (STF); • Presidencialismo exacerbado; • Constituição Rígida / Reforma 1926; • Direito ao voto / homens maiores de 21 anos. CONSTITUIÇÃO DE 1934 – República Velha / Pacto Café com Leite; – Coronelismo; – Agitação social e reivindicação de direitos; – Fundação do Partido Comunista (1922); – Revolução de 1930; – Governo Provisório (Getúlio Vargas) / Decreto 19.398 /1930; – Revolução Constitucionalista 1932; – Assembleia Nacional Constituinte 1933/1934. – Constituição de 1934 • República dos Estados Unidos do Brasil; • Anteprojeto elaborado pelo Governo Provisório; • Federalismo e Tripartição de Poderes; • Eleições diretas para Presidente; • Sufrágio Universal (voto direto, secreto, igual, 18 anos); • Direitos Sociais; Direitos trabalhistas e Justiça do Trabalho. CONSTITUIÇÃO DE 1937 – Crise do café (crise na economia mundial); – Movimentos sociais; – Nazifascismo na Europa; – Ação Integralista Brasileira e reorganização do Partido Comunista; – Golpe de Estado (1938). – Constituição de 1937 • República dos Estados Unidos do Brasil; • Redigida pelo Governo; • 3 Poderes. Concentração de Poderes no Executivo. Extinção da figura do Vice-presidente; • Forma Federal, mas Estado Unitário; • Controle setores estratégicos da economia; • Restrição de direitos. Censura (imprensa e cultura). Pena de morte. 6 CONSTITUIÇÃO DE 1946 – Fim da Segunda-Guerra Mundial; – Pressão contra o Governo; – Sucessivas Reformas Constitucionais; – CLT (1943); – Getúlio Vargas deixa o poder; – Assembleia Constituinte de 1945/1946. – Constituição de 1946 • República dos Estados Unidos do Brasil; • Retorno ao Federalismo; • Reestabeleceu equilíbrio entre 3 Poderes e a figura do Vice-presidente; • Proibiu pena de morte; • Estabeleceu igualdade perante a lei e outros direitos. CONSTITUIÇÃO DE 1967 E EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1 DE 1969 – Retorno de Getúlio Vargas ao poder em 1950 e suicídio em 1954. – Instabilidade política. – Governos JK, JQ, JG. – Golpe de 1964. – Atos Institucionais 1, 2, 3 e 4 durante os primeiros anos de ditadura. – Constituição de 1967. “Farsa Constituinte” = homologação do Congresso convocado para votar projeto do Governo militar. – Constituição de 1967. “Farsa Constituinte” = homologação do Congresso convocado para votar projeto do Governo militar. • Eleições indiretas para Presidente. • Centralização na União. • Restrições de direitos. • AI5 (1968) = suspensão direitos políticos e cassação de mandatos, instituição da perseguição política e da censura. • Emenda Constitucional nº 1 de 1969. CONSTITUIÇÃO DE 1988 – Oposição violenta à Ditadura; – Crise internacional do petróleo; – Manifestações por todo o Brasil; – Reforma partidária; – Lei da Anistia; – “Diretas Já”; – Eleições indiretas em 1985; – Assembleia Nacional Constituinte de 1987/1988; – Ampla participação popular; – Constituição Cidadã; – República Federativa do Brasil; – Forma de Estado Federal; – Forma de Governo República e sistema Presidencialista; – Caráter dirigente; – Estado democrático de direito - dignidade da pessoa humana; – Direitos e garantias fundamentais; – Legislativo, Executivo e Judiciário; – Valorização do Judiciário e das funções essenciais à Justiça. 7 PODER CONSTITUINTE (Aula 4) A teoria do poder constituinte foi originalmente concebida pelo abade francês Emmanuel Sieyès, no século XVIII, em sua obra “O que é o Terceiro Estado?”. Nesse trabalho, concluído às vésperas da Revolução Francesa, Sieyès trouxe tese inovadora, que rompia com a legitimação dinástica do poder. Ao mesmo tempo, colocava por terra as teorias anteriores ao Iluminismo, que determinavam que a origem do poder era divina. Quanta coragem para um clérigo, não é mesmo? A teoria do poder constituinte, que se aplica somente aos Estados com Constituição escrita e rígida, distingue poder constituinte de poderes constituídos. Poder Constituinte é aquele que cria a Constituição, enquanto os poderes constituídos são aqueles estabelecidos por ela, ou seja, são aqueles que resultam de sua criação. Pergunta importante que se deve fazer é a seguinte: quem é o titular do Poder Constituinte? Para Emmanuel Sieyès, a titularidade do Poder Constituinte é da nação. Todavia, numa leitura moderna dessa teoria, há que se concluir que a titularidade do Poder Constituinte é do povo, pois só este pode determinar a criação ou modificação de uma Constituição. Segundo Canotilho, o “problema do titular do poder constituinte só pode ter hoje uma resposta democrática. Só o povo entendido como um sujeito constituído por pessoas - mulheres e homens - pode ‘decidir’ ou deliberar sobre a conformação da sua ordem político-social. Poder constituinte significa, assim, poder constituinte do povo.” Embora o povo seja o titular do poder constituinte, seu exercício nem sempre é democrático. Muitas vezes, a Constituição é criada por ditadores ou grupos que conquistam o poder autocraticamente. Assim, diz‐se que a forma do exercício do poder constituinte pode ser democrática ou por convenção (quando se dá pelo povo) ou autocrática ou por outorga (quando se dá pela ação de usurpadores do poder). Note que em ambas as formas a titularidade do poder constituinte é do povo. O que muda é unicamente a forma de exercício deste poder. A forma democrática de exercício pode se dar tanto diretamente quanto indiretamente. Na primeira, o povo participa diretamente do processo de elaboração da Constituição, por meio de plebiscito, referendo ou proposta de criação de determinados dispositivos constitucionais. Na segunda, mais frequente, a participação popular se dá indiretamente, por meio de assembleia constituinte, composta por representantes eleitos pelo povo. A Assembleia Constituinte, quando tem o poder de elaborar e promulgar uma constituição, sem consultaou ratificação popular, é considerada soberana. Isso 8 se dá por ela representar a vontade do povo. Por isso mesmo, seu poder independe de consulta ou ratificação popular. Diz‐se que a Assembleia Constituinte é exclusiva quando é composta por pessoas que não pertençam a qualquer partido político. Seus representantes seriam professores, cientistas políticos e estudiosos do Direito, que representariam a nação. A Assembleia Constituinte de 1988 era soberana, mas não exclusiva. O poder constituinte pode ser de dois tipos: originário ou derivado. Poder constituinte originário (poder constituinte de primeiro grau ou genuíno) é o poder de criar uma nova Constituição. Apresenta 6 (seis) características que o distinguem do derivado: é político, inicial, incondicionado, permanente, ilimitado juridicamente e autônomo. a) Político: O Poder Constituinte Originário é um poder de fato (e não um poder de direito). Ele é extrajurídico, anterior ao direito. É ele que cria o ordenamento jurídico de um Estado. (*) Cabe destacar que os jusnaturalistas defendem que o Poder Constituinte seria, na verdade, um poder de direito. A visão de que ele seria um poder de fato é a forma como os positivistas enxergam o Poder Constituinte Originário. Cabe destacar que a doutrina dominante segue a corrente positivista. b) Inicial: O Poder Constituinte Originário dá início a uma nova ordem jurídica, rompendo com a anterior. A manifestação do Poder Constituinte tem o efeito de criar um novo Estado. c) Incondicionado: O Poder Constituinte Originário não se sujeita a qualquer forma ou procedimento predeterminado em sua manifestação. d) Permanente: O Poder Constituinte Originário pode se manifestar a qualquer tempo. Ele não se esgota com a elaboração de uma nova Constituição, mas permanece em “estado de latência”, aguardando um novo chamado para manifestar‐se, aguardando um novo “momento constituinte”. e) Ilimitado juridicamente: O Poder Constituinte Originário não se submete a limites determinados pelo direito anterior. Pode mudar completamente a estrutura do Estado ou os direitos dos cidadãos, por exemplo, sem ter sua validade contestada com base no ordenamento jurídico anterior. Por esse motivo, o STF entende que não há possibilidade de se invocar direito adquirido contra normas constitucionais originárias. A doutrina se divide quanto a essa característica do Poder Constituinte. Os positivistas entendem que, de fato, o Poder Constituinte Originário é ilimitado juridicamente; já os jusnaturalistas entendem que ele encontra limites no direito natural, ou seja, em valores suprapositivos. No Brasil, a 9 doutrina majoritária adota a corrente positivista, reconhecendo que o Poder Constituinte Originário é ilimitado juridicamente. Embora os positivistas defendam que o Poder Constituinte Originário é ilimitado, é importante que todos reconheçamos, como o Prof. Canotilho, que ele deverá obedecer a “padrões e modelos de conduta espirituais, culturais, éticos e sociais radicados na consciência jurídica geral da comunidade”. f) Autônomo: tem liberdade para definir o conteúdo da nova Constituição. Destaque‐se que muitos autores tratam essa característica como sinônimo de ilimitado. O Poder Constituinte Originário pode ser classificado, quanto ao momento de sua manifestação, em histórico (fundacional) ou pós‐fundacional (revolucionário). O Poder Constituinte Originário histórico é o responsável pela criação da primeira Constituição de um Estado. Por sua vez, o poder pós‐ fundacional é aquele que cria uma nova Constituição para o Estado, em substituição à anterior. Ressalte‐se que essa nova Constituição poderá ser fruto de uma revolução ou de uma transição constitucional. O Poder Constituinte Originário é, ainda, classificado, quanto às dimensões, em material e formal. Na verdade, esses podem ser considerados dois momentos distintos na manifestação do Poder Constituinte Originário. Primeiro, há o momento material, que antecede o momento formal; é o poder material que determina quais serão os valores a serem protegidos pela Constituição. É nesse momento que toma‐se a decisão de constituir um novo Estado. O poder formal, por sua vez, sucede o poder material e fica caracterizado no momento em que se atribui juridicidade àquele que será o texto da Constituição. Trataremos, agora, da segunda forma de Poder Constituinte: o Derivado. O Poder Constituinte Derivado (poder constituinte de segundo grau) é o poder de modificar a Constituição Federal bem como de elaborar as Constituições Estaduais. É fruto do poder constituinte originário, estando previsto na própria Constituição. Tem como características ser jurídico, derivado, limitado (ou subordinado) e condicionado. a) Jurídico: é regulado pela Constituição, estando, portanto, previsto no ordenamento jurídico vigente. b) Derivado: é fruto do poder constituinte originário c) Limitado ou subordinado: é limitado pela Constituição, não podendo desrespeita‐la, sob pena de inconstitucionalidade. d) Condicionado: a forma de seu exercício é determinada pela Constituição. Assim, a aprovação de emendas constitucionais, por 10 exemplo, deve obedecer ao procedimento estabelecido no artigo 60 da Constituição Federal (CF/88). O Poder Constituinte Derivado subdivide‐se em dois: i) Poder Constituinte Reformador: consiste no poder de modificar a Constituição; e ii) Poder Constituinte Decorrente: é aquele que a CF/88 confere aos Estados de se auto organizarem, por meio da elaboração de suas próprias Constituições. Ambos devem respeitar as limitações e condições impostas pela Constituição Federal. Em nosso mundo globalizado, fala‐se hoje em um poder constituinte supranacional. Atualmente, tal modalidade de poder constituinte existe na União Europeia, onde vários Estados abriram mão de parte de sua soberania em prol de um poder central. É a manifestação máxima daquilo que se chama direito comunitário, reconhecido como hierarquicamente superior aos direitos internos de cada Estado. NORMAS CONSTITUCIONAIS (Aula 5) • Características das normas constitucionais: – Posição de superioridade no ordenamento jurídico – Natureza aberta da linguagem constitucional – Dimensão política da Constituição – Conteúdo constitucional • Organiza exercício do poder político; • Define os direitos fundamentais dos indivíduos; • Estabelece princípios e traça fins públicos do Estado. >> Classificação proposta por Luís Roberto Barroso • Normas constitucionais de organização: – Veiculam decisões políticas fundamentais do Estado. – Definem as competências das entidades estatais e órgãos de poder. – Criam ou autorizam criação de órgãos públicos e definem sua composição e funcionamento. – Estabelecem normas processuais e procedimentais relativas à própria Constituição, à legislação e à fiscalização. • Normas constitucionais definidoras de direitos: – Direitos individuais, políticos, sociais, difusos. 11 • Normas constitucionais programáticas: – Instituem princípios e traçam fins públicos a serem alcançados pelo Estado. Classificação das normas constitucionais quanto à eficácia e à aplicabilidade • Doutrina estrangeira: – Thomas Cooley: Self-executing e not self-executing norms. – Vezio Crisafulli: Normas autoaplicáveis (natureza plena) e normas dependentes de complementação (natureza limitada). – Gustavo Zagrebelsky: Normas de eficácia direta e de eficácia indireta. • Doutrina nacional: – Pontes de Miranda: Normas bastantes em si e não bastantes em si. – José Afonso da Silva: Eficácia plena, contida e limitada. Constituição Federal de 1988 • Preâmbulo “Nós, representantesdo povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem- estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.” – Tem força vinculante (obrigatória)? Força normativa O preâmbulo é a parte inicial de uma constituição, é a carta de apresentação, onde de forma sucinta e objetiva traceja os caminhos e ideais da lei fundamental, sendo responsável por explicitar os ideais do novo Estado, bem como a impressão filosófica e política da nação para qual foi constituído. O preâmbulo passou a ser parte integrante da nossa lei maior, simbolizando uma relação integrativo programática em relação ao texto constitucional, no sentido de que através de suas expressões e diretrizes seriam assentadas as bases constitucionais. Manoel Gonçalves Ferreira Filho entende que: 12 “o preâmbulo da Constituição não tem força obrigatória, destina-se simplesmente a indicar a intenção do constituinte...”. O preâmbulo define-se como a intenção do constituinte, e não como um imperativo à sociedade, sobressai-se como um informe do que pretende o Estado social democrático de direito. https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/6294/A-forca-normativa-do- Preambulo-constitucional • Estrutura do texto constitucional: – Título I - Dos Princípios Fundamentais. – Título II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais. – Título III - Da Organização do Estado. – Título IV - Da Organização dos Poderes. – Título V - Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas. – Título VI - Da Tributação e do Orçamento. – Título VII - Da Ordem Econômica e Financeira. – Título VIII - Da Ordem Social. – Título IX - Das Disposições Constitucionais Gerais. • Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT – Normas de eficácia exaurida. INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL (Aula 6) Interpretar a Constituição significa compreender, investigar o significado do texto constitucional. A Hermenêutica (Interpretação) Constitucional serve para solucionar, no caso concreto, conflitos entre bens jurídicos protegidos pela Carta Magna, bem como para dar eficácia e aplicabilidade às normas constitucionais. A quem cabe a tarefa de interpretar a Constituição? Só ao Judiciário? Não caia nessa pegadinha, comum nas provas de concursos! Tanto o Judiciário quanto o Executivo e o Legislativo interpretam a Constituição. A interpretação constitucional foi vista, durante um bom tempo, como algo restrito aos juízes; tratava‐se, portanto, de atividade exclusiva de um pequeno grupo, uma verdadeira “sociedade fechada”. Peter Häberle, jurista alemão, quebrou completamente esse paradigma após a crise do processo democrático dos anos 70 na Alemanha, ao propor um novo modelo para a interpretação constitucional. Segundo ele, são intérpretes da Constituição todos aqueles que a vivenciam: os cidadãos, os órgãos públicos, a opinião pública e demais grupos sociais. A teoria desenvolvida por Häberle é conhecida como a “sociedade aberta dos interpretes”, que nos mostra que a interpretação constitucional é tarefa de todos (e não apenas dos juízes). 13 Métodos de Interpretação Constitucional À Hermenêutica Constitucional são aplicáveis todas as técnicas de interpretação das demais normas jurídicas (gramatical, histórica, teleológica, dentre outras). Entretanto, ela apresenta também métodos próprios, devido à supremacia da Constituição. A interpretação da Constituição envolve um conjunto de métodos desenvolvidos pela doutrina e pela jurisprudência. São eles: - Métodos sugeridos pela teoria constitucional alemã Método jurídico (hermenêutico clássico - Savigny)): Este método considera que a Constituição é uma lei como qualquer outra, devendo ser interpretada usando as regras da Hermenêutica tradicional, ou seja, os elementos: literal (textual), lógico (sistemático), histórico, teleológico e genético. O elemento literal, como o nome diz, busca analisar o texto da norma em sua literalidade. O lógico, por sua vez, busca avaliar a relação de cada norma com o restante da Constituição. O histórico avalia o momento de elaboração da norma (ideologia então vigente), enquanto o teleológico busca a sua finalidade. Por fim, o genético investiga a origem dos conceitos empregados na Constituição. O método jurídico valoriza o texto constitucional. Cabe ao intérprete descobrir o sentido deste texto, sem extrapolar a literalidade da lei. Método tópico‐problemático: Criado por Theodor Viehweg, neste método, há prevalência do problema sobre a norma, ou seja, busca‐se solucionar determinado problema por meio da interpretação de norma constitucional. Este método parte das premissas seguintes: a interpretação constitucional tem caráter prático, pois busca resolver problemas concretos e a norma constitucional é aberta, de significado indeterminado (por isso, deve‐se dar preferência à discussão do problema). Método hermenêutico‐concretizador: Este método foi criado por Konrad Hesse, segundo o qual a leitura da Constituição inicia‐se pela pré-compreensão do seu sentido pelo intérprete, a quem cabe aplicar a norma para a resolução de uma situação concreta. Valoriza a atividade interpretativa e as circunstâncias nas quais esta se desenvolve, promovendo uma relação entre texto e contexto, transformando a interpretação em “movimento de ir e vir” (círculo hermenêutico). 14 OBS.: O método hermenêutico‐concretizador diferencia‐se do método tópico‐ problemático, porque enquanto este pressupõe a primazia do problema sobre a norma, aquele se baseia na prevalência do texto constitucional sobre o problema. - A interpretação na teoria constitucional americana Há duas correntes doutrinárias que se posicionam de maneira diversa com relação à atuação do juiz na interpretação constitucional. De um lado, estão os interpretativistas; do outro, os não-interpretativistas. É bastante comum a confusão quanto ao que pensam cada uma dessas correntes. Interpretativismo: • Textualismo e Originalismo. Os interpretativistas consideram que o juiz não pode, em sua atividade hermenêutica, transcender o que diz a Constituição. Nesse sentido, o juiz deverá limitar‐se a analisar os preceitos expressos e os preceitos claramente implícitos no texto constitucional. 15 Não interpretativismo (Construtivismo): • Interpretação evolutiva; leitura moral da Constituição; pragmatismo jurídico. Os não-interpretativistas, por sua vez, defendem que o juiz deve pautar sua atuação em valores substantivos, tais como justiça, liberdade e igualdade. O nome dessa corrente doutrinária advém do fato de que os resultados da atuação judicial não decorrem de uma interpretação direta do texto constitucional, mas sim da aplicação de valores substantivos à apreciação de um caso concreto. Na ótica não-interpretativista, o juiz goza de um nível bem superior de autonomia, podendo transcender a literalidade da Constituição. A corrente não‐interpretativista defende uma “abertura” do sistema constitucional, daí surgindo o conceito de “Constituição aberta”. A Constituição não pode ser um sistema fechado; ela deve captar a evolução dos valores da sociedade, sob pena de perder sua força normativa, tornando‐se desconectada da realidade. Segundo Canotilho, a existência da Constituição enquanto um sistema aberto de regras eprincípios é a melhor maneira de se concretizar o Estado democrático de direito. Princípios de Interpretação Constitucional Para auxiliar a entender o significado das normas constitucionais, a doutrina criou vários enunciados, os chamados princípios de interpretação constitucional. Esses princípios são aplicados facultativamente pelo intérprete, não tendo qualquer valor normativo. São eles: • Princípio da Supremacia da Constituição Profundamente ligado à chamada teoria da construção escalonada das normas jurídicas, segundo a qual “a estrutura da ordem jurídica é uma construção escalonada de normas supra e infra ordenadas umas às outras, em que uma norma do escalão superior determina a criação da norma do escalão inferior” (KELSEN, 1998, p. 144), em que a Constituição estaria no vértice da pirâmide normativa, o princípio da supremacia da Constituição é base para diversos outros pressupostos da interpretação constitucional, senão todos os outros. Por força do pós-positivismo, a Constituição foi translocada para o centro do ordenamento jurídico, passando a orientar a conformação de todas as demais normas infraconstitucionais (BARROSO, 2006). Emerge daí a noção de controle de constitucionalidade, vez que a norma suprema não pode ser ferida por outra de hierarquia inferior, caso de uma lei ordinária ou complementar, decretos ou outras espécies normativas infraconstitucionais. O Poder Judiciário, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da República. O regular exercício da função jurisdicional, por isso mesmo, desde que pautado pelo respeito à Constituição, não transgride o princípio da 16 separação de poderes. (MS 23.452, Rel. Min. Celso de Mello, j. 16.9.1999, Plenário, DJ 12.5.2000.) Partindo do ponto que as normas constitucionais se sobrepõem às infraconstitucionais, o Supremo já decidiu, em vários momentos, em favor dessa posição, ao declarar incompatíveis ou não recepcionadas diversas leis. Exemplificando, cite-se que a Constituição da República apenas autoriza a prisão em caso de flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, ressalvados os casos de transgressão militar ou de crime propriamente militar, assim definidos em lei (art. 5°, LXI). Portanto, se uma lei viesse a destoar dessa disposição constitucional, seria prontamente afastada, em decorrência do princípio da supremacia da Constituição. Assim se deu no caso do art. 319 do Código de Processo Penal (antes da redação pela Lei 12.403, de 2011), que definia os casos de prisão administrativa, a qual se dava sem ordem judicial. O art. 319 foi alterado, após a Lei 12.403/2011, passando a prever “medidas cautelares diversas da prisão”, o que encontra-se mais afinado com o dispositivo constitucional que resguarda a cláusula de reserva de jurisdição. Do mesmo modo, compreendia-se que, sob a égide da Constituição de 1988, não poderia mais o Ministro da Justiça (que não é autoridade judiciária) deter da legitimidade para determinar prisão, no caso do art. 69 do Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/1980, revogada pela Lei de Migração – Lei 13.445/2017). Interessante citar, também, que o princípio da supremacia da Constituição vem sendo invocado no sentido de conferir máxima efetividade a direitos sociais, resguardados pelo artigo 6° da Carta Magna de 1988., Em decorrência do princípio da supremacia, surge outro cânone: o da interpretação conforme a Constituição. Ora, uma norma apenas tem capacidade de interferir na esfera de outra se a primeira estiver em hierarquia superior à segunda. A interpretação de acordo com a Carta Magna ganha relevância quando uma norma infraconstitucional se identifica “com mais de um sentido ou significado” (CUNHA JÚNIOR, 2012, p. 236), devendo-se conceder preferência àquele que esteja em conformidade com a Constituição, ou esteja mais próximo da orientação constitucional, em caso de interpretações diversas e todas conforme o texto magno (CUNHA JÚNIOR, 2012). Esse processo revela-se “de fundamental importância para a constitucionalização dos textos normativos infraconstitucionais” (STRECK, 2002, p. 443), ao mesmo tempo que impede que uma lei seja declarada nula, quando passível de ser interpretada conforme o texto magno. https://www.conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/52610/os-principios-da- interpretacao-constitucional-na-jurisprudencia-brasileira 17 • Princípio da Presunção de Constitucionalidade das leis e Atos Normativos Consoante assevera esse princípio, as leis e os atos normativos em geral existentes no ordenamento jurídico devem ser presumidos constitucionais, salvo se houver declaração judicial de inconstitucionalidade, a qual importará, conforme entendimento da doutrina majoritária e do próprio STF, em nulidade da norma, a qual não terá aptidão para produzir efeitos jurídicos, já que possui nulidade congênita. Assim, como regra, a declaração de nulidade, se não houver modulação de efeitos, importará em efeito ex tunc (retroativo), com eficácia retroativa, sendo a norma desprovida de qualquer eficácia. https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-constitucional/principios-da- interpretacao-constitucional/ • Princípio da Unidade da Constituição (Interpretação Sistêmica) Esse princípio determina que o texto da Constituição deve ser interpretado de forma a evitar contradições entre suas normas ou entre os princípios constitucionais. Assim, não há contradição verdadeira entre as normas constitucionais: o conflito entre estas é apenas aparente. Ou, em outras palavras, não há antinomias reais no texto da Constituição; as antinomias são apenas aparentes. Segundo esse princípio, na interpretação deve‐se considerar a Constituição como um todo, e não se interpretarem as normas de maneira isolada. Um exemplo de sua aplicação é a interpretação do aparente conflito entre o art. 61, §1º, II, “d” e o art. 128, §5º, da Constituição. Utilizando‐se o princípio da unidade da Constituição, percebe‐se que não se trata de um conflito real (antinomia) entre as normas, mas de uma iniciativa legislativa concorrente do Procurador Geral da República e do Presidente da República para dispor sobre a organização do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios. O STF aplica, em vários de seus julgados, o princípio da unidade da Constituição. Segundo a Corte, “os postulados que informam a teoria do ordenamento jurídico e lhe dão o substrato doutrinário assentam‐se na premissa fundamental de que o sistema de direito positivo, além de caracterizar uma unidade institucional, constitui um complexo de normas que devem manter entre si um vínculo de essencial coerência” (STF, RE 159.103‐0/SP, DJU de 4.8.1995). Do princípio da unidade da Constituição, deriva um entendimento doutrinário importante: o de que não existem normas constitucionais originárias inconstitucionais. • Princípio da Máxima Efetividade das Normas Constitucionais Esse princípio estabelece que o intérprete deve atribuir à norma constitucional o sentido que lhe dê maior efetividade social. Visa, portanto, a maximizar a norma, a fim de extrair dela todas as suas potencialidades. Sua utilização se dá 18 principalmente na aplicação dos direitos fundamentais, embora possa ser usado na interpretação de todas as normas constitucionais. • Princípio da Força Normativa da Constituição Esse princípio determina que toda norma jurídica precisa de um mínimo de eficácia, sob pena de não ser aplicada. Estabelece, portanto, que, na interpretação constitucional, deve‐se dar preferência àssoluções que possibilitem a atualização de suas normas, garantindo‐lhes eficácia e permanência. Para Konrad Hesse, seu idealizador, as normas jurídicas e a realidade devem ser consideradas em seu condicionamento recíproco. A norma constitucional não tem existência autônoma em face da realidade. Desse modo, a Constituição, para ser aplicável, deve ser conexa à realidade jurídica, social e política. Aprofundando ainda mais no estudo do tema, trazemos a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a manutenção de decisões divergentes da interpretação constitucional revela‐se afrontosa à força normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional. Isso porque a postura atual do Supremo é a de valorizar cada vez mais suas decisões, com vistas a criar um ambiente de maior segurança jurídica. Visa‐se, enfim, conferir maior uniformidade as decisões do Judiciário brasileiro. • Princípio da Interpretação conforme a Constituição Esse princípio, criado pela jurisprudência alemã, se aplica à interpretação das normas infraconstitucionais (e não da Constituição propriamente dita!). Trata‐ se de técnica interpretativa cujo objetivo é preservar a validade das normas, evitando que sejam declaradas inconstitucionais. Ao invés de se declarar a norma inconstitucional, o Tribunal busca dar‐lhe uma interpretação que a conduza à constitucionalidade. É relevante destacar que a interpretação conforme a Constituição não é aplicável às normas que tenham sentido unívoco (apenas um significado possível). Essa técnica somente deverá ser usada diante de normas polissêmicas, plurissignificativas (normas com várias interpretações possíveis). Assim, no caso de normas com várias interpretações possíveis, deve‐ se priorizar aquela que lhes compatibilize o sentido com o conteúdo constitucional. A partir deste princípio, tem‐se que a regra é a manutenção da validade da lei, e não a declaração de sua inconstitucionalidade. Isso, desde que, obviamente, a interpretação dada à norma não contrarie sua literalidade ou sentido, a fim de harmoniza‐la com a Constituição. Por seu caráter extremamente didático, reproduzimos julgado do STF em que se discorre sobre a técnica de interpretação conforme a Constituição: 19 “A interpretação conforme é uma técnica de eliminação de uma interpretação desconforme. O saque desse modo especial da interpretação não é feito para conformar um dispositivo subconstitucional aos termos da Constituição Positiva. Absolutamente! Ele é feito para descartar aquela particularizada interpretação que, incidindo sobre um dado texto normativo de menor hierarquia impositiva, torna esse texto desconforme à Constituição. Logo, trata‐se de uma técnica de controle de constitucionalidade que só pode começar ali onde a interpretação do texto normativo inferior termina.” (STF, ADPF 54‐QO, 27.04.2005). Destaque‐se, mais uma vez, que quando a norma só tem um sentido possível (sentido unívoco), não é possível a aplicação da interpretação conforme. Nesse caso, ou a norma será declarada totalmente constitucional ou totalmente inconstitucional (STF, ADI 1.344‐1/ES, DJ de 19.04.1996). Outro ponto importante é que a interpretação conforme não pode deturpar o sentido originário das leis ou atos normativos. Não é possível ao intérprete “salvar” uma lei inconstitucional, dando-lhe uma significação “contra legem” (contra lei). A interpretação conforme a Constituição tem como limite a razoabilidade, não podendo ser usada como ferramenta para tornar o juiz um legislador, ferindo o princípio da separação dos Poderes. Veja o que o Supremo decidiu a respeito: “Por isso, se a única interpretação possível contrariar o sentido inequívoco que o Poder Legislativo lhe pretendeu dar, não se pode aplicar o princípio da interpretação conforme a Constituição, que implicaria, em verdade, criação de norma jurídica, o que é privativo do legislador positivo” (STF, Repr. 1.417‐7, em 09.12.1987). A interpretação conforme pode ser de dois tipos: com ou sem redução do texto. a) Interpretação conforme com redução do texto: Nesse caso, a parte viciada é considerada inconstitucional, tendo sua eficácia suspensa. Como exemplo, tem‐se que na ADI 1.127‐8, o STF suspendeu liminarmente a expressão “ou desacato”, presente no art. 7º, § 2º, do Estatuto da OAB. b) Interpretação conforme sem redução do texto: Nesse caso, exclui‐se ou se atribui à norma um sentido, de modo a torna‐la compatível com a Constituição. Pode ser concessiva (quando se concede à norma uma interpretação que lhe preserve a constitucionalidade) ou excludente (quando se exclua uma interpretação que poderia torna‐la inconstitucional). 20 Interpretação Tradicional e a Nova Hermenêutica • Interpretação tradicional da Constituição: – Método clássico: subsunção1. – Ênfase na norma. – Normas constitucionais >> regras. – Papel do intérprete >> Atuação técnica: Identificar norma aplicável, declarar seu sentido e fazê-la incidir sobre o caso concreto. • Nova hermenêutica constitucional: – Neoconstitucionalismo. – Normatividade de princípios (ao lado das regras). – Norma impregnada de conceitos jurídicos indeterminados. – Papel do intérprete >> coparticipante no processo de significação da norma. Mutação Constitucional A Constituição Federal é o Principal Diploma Legal (Normativo), que estrutura e organiza a sociedade. Por isso ela tem que ser dotada de certa estabilidade para garantir a segurança jurídica das pessoas. A Constituição pode ser alterada para acompanhar a evolução e as mudanças da sociedade. A Emenda Constitucional (EC) é o processo formal de modificação da Constituição, que se utiliza de critérios e procedimentos preestabelecidos para alterar o texto constitucional, contando com a participação tanto da Câmara dos Deputados quanto do Senado Federal. No caso da Emenda o texto da Constituição Federal é alterado; é o que aconteceu, por exemplo, com a Emenda Constitucional 45: a famosa reforma do poder judiciário. Mutação Constitucional é a forma pela qual o poder constituinte difuso se manifesta. Ocorre que além do procedimento formal de alteração da Constituição, ela também pode ser alterada de modo informal, sem a necessidade de um processo legislativo. A constante evolução da sociedade, alteração de valores religiosos e morais, fatores econômicos, tudo isso faz com que a Constituição precise se adequar à realidade em que ela se insere. É nesse ponto que entra a Mutação Constitucional. 1 Como definição jurídica, configura-se a subsunção quando o caso concreto se enquadra à norma legal em abstrato. É a adequação de uma conduta ou fato concreto (norma-fato) à norma jurídica (norma-tipo). 21 Na Mutação Constitucional não há alteração no texto da Constituição, altera-se apenas o sentido que se dá à Norma Constitucional. No Brasil cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF) dar a última palavra em Temas Constitucionais. O Supremo tem sido o grande responsável por aplicar a Mutação Constitucional. – Fatores que influenciam: • Caráter mais ou menos principiológico da Constituição; • Existência de normas que admitam/careçam de regulamentação futura; • Existência de lacunas constitucionais; • Rigidez constitucional; • Dimensão do texto. REFORMA CONSTITUCIONAL MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL Processo FORMAL Processo INFORMAL Alteração do TEXTO constitucional, através de emendas. Alterações no SIGNIFICADO e SENTIDO interpretativo do texto (permanece inalterado). Esse novo sentido pode decorrer de uma mudança na realidade fática ou de uma nova percepção do direito. https://www.youtube.com/watch?v=9snPH7QU62o https://duraorodrigo.jusbrasil.com.br/artigos/154636521/mutacao-constitucional-conceito-historico-e-evolucao JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL (Aula 7) Controle de Constitucionalidade • Matriz Americana: Marbury X Madison (1803). Supremacia da Constituição. Supremacia Judicial. Judicial review. Suprema Corte. Common Law. Sistema de precedentes. Controle de constitucionalidade difuso. Controle de Constitucionalidade Difuso, também é chamado de controle concreto ou incidental. 1º) Onde esse Controle de Constitucionalidade foi desenvolvido? Foi desenvolvido nos Estados Unidos, primeiro como uma teoria pelos federalistas James Madison e Alexander Hamilton e depois ele foi acolhido pela 22 Suprema Corte num célebre caso, num precedente muito famoso chamado Marbury vs. Madison de 1803 e lá nos Estados Unidos o Controle de Constitucionalidade Difuso se chama Judicial review, que quer dizer revisão judicial das leis aprovadas pelo poder legislativo. 2º) Qual é a premissa básica por trás dessa forma de controle de constitucionalidade? A premissa básica é a Supremacia da Constituição. “Qualquer lei que contrariar a Constituição é nula e sem efeito” - foi o que disse o Chefe de Justiça John Marshall, presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos no caso Marbury vs. Madison. E aqui vem uma grande diferença em relação ao Controle de Constituição Concentrado. Nos Estados Unidos, eles entenderam que a atividade de interpretar e aplicar a Constituição é uma atividade que cabe ao Poder Judiciário; assim como o Poder Judiciário tem também que aplicar e interpretar todas as leis do país. Então quando o juiz está considerando o ordenamento jurídico, ele tem uma Lei e tem a Constituição e pode ser que aquela Lei contrarie a Constituição. Nesse caso, quando o juiz deixa de aplicar a Lei, ele está aplicando então a Constituição e aquela Lei que contraria a Constituição é Inconstitucional e é por isso que o juiz não a aplica. ↓ Antinomia - Critério Hierárquico - "lex superior derogat legi inferiori" (lei superior derroga leis inferiores). 3º) O que significa Controle de Constitucionalidade Difuso? Difuso significa espalhado, por isso ele é exercido por todos os juízes e por todos os tribunais, o que quer dizer, por todo o Poder Judiciário. Mas esse controle difuso seja quando é feito por um juiz, seja quando é feito por um tribunal, ele é sempre feito diante de um caso “Concreto” e também de forma “incidental” ("incidenter tantum"), porque a constitucionalidade da lei é uma questão que o juiz aprecia preliminarmente (antes de apreciar o pedido). 4º) Quais os Efeitos da Decisão no caso Concreto? Por dizer respeito ao caso concreto, os efeitos da decisão são entre as partes ("inter partes"). Mas não devemos confundir isso com o respeito aos precedentes da Corte Suprema, já que não é possível que um modelo de controle difuso funcione sem respeito aos precedentes. Nos Estados Unidos a obediência aos precedentes da Suprema Corte integra a tradição de Common Law2. 2 A Common Law é uma estrutura jurídica onde a aplicação do direito se dá precipuamente através da adoção de costumes e precedentes. Caso em que os costumes sociais ou jurisprudências serão usados como referência para justificar a decisão judicial do caso concreto. 23 • Matriz Austríaca-Kelseniana: Debate Kelsen X Schmitt sobre quem deve ser o guardião da Constituição. Tribunal Constitucional. Constituição da Áustria de 1920. Civil law. Controle de constitucionalidade concentrado. Controle de Constitucionalidade Concentrado, também chamado de controle abstrato de constitucionalidade ou de fiscalização abstrata de constitucionalidade. 1º) Onde surgiu o Controle de Constitucionalidade Concentrado? O idealizador do controle concentrado foi Hans Kelsen. O primeiro país a ter um Tribunal Constitucional foi a Áustria em 1920, depois o modelo se difundiu, para a Alemanha, para a Itália e para a Europa Continental, de maneira geral. 2º) Qual é a premissa por trás do Controle de Constitucionalidade Concentrado? Embora o Controle Concentrado leve em conta a "pirâmide normativa" de Kelsen, ele parte de uma premissa de "Supremacia da Lei", mas isso não significa a Supremacia da Lei em relação à Constituição, mas sim a supremacia do Poder Legislativo sobre o Poder Judiciário e consequentemente então a Supremacia da Lei sobre o Juiz. O juiz foi concebido para aplicar a lei na tradição de "civil law"3, que quer dizer, que o magistrado apenas busca a solução na lei e nas fontes do direito; por isso o juiz não pode deixar de aplicar a lei mesmo que ela contrarie a Constituição. 3º) Quem realiza o Controle de Constitucionalidade e como esse controle é realizado? O responsável pelo controle concentrado na Europa é o Tribunal Constitucional. Apesar do nome, ele não integra a estrutura do Poder Judiciário. Como regra geral, ele realiza o controle de forma concentrada, mediante ação direta, proposta pelos legitimados específicos e em abstrato, quer dizer, no plano das ideias, não diante de um caso concreto. Mas essa forma de acesso ao Tribunal Constitucional apenas por ação direta com legitimados específicos acabou trancando demais o sistema. O nosso STF integra a estrutura do Poder Judiciário. Agora o que acontece é que ao longo dos anos, ele passou a receber a configuração de um tribunal constitucional europeu. Aqui no Brasil os legitimados para o controle concentrado de constitucionalidade estão no artigo 103 da Constituição 3 A Civil Law é uma estrutura jurídica onde a aplicação do direito se dá a partir da interpretação da lei. Caso em que a própria lei será usada para justificar a decisão judicial do caso concreto. 24 4º) Quais os efeitos da decisão do controle concentrado? A decisão do Tribunal Constitucional que reconhece a inconstitucionalidade de uma lei a retira do ordenamento jurídico. Na Europa, isso se chama de "força de lei". Aqui no Brasil, essa ideia de “força de lei” equivale ao que nós chamamos de eficácia contra todos ("erga omnes"). • Controle de Constitucionalidade Misto (Brasil): O modelo misto é aquele que congrega os sistemas difuso e concentrado. Geralmente, nos países de sistema misto, como é o caso do Brasil, os órgãos do Poder Judiciário possuem competência de afastar a aplicação das leis em casos concretos e, ao mesmo tempo, é reconhecida a competência da Corte Constitucional em proferir decisões de controle de constitucionalidade abstrato. No Brasil o controle difuso faz-se presente desde a primeira Constituição Republicana, assim, qualquer juiz pode declarar inconstitucionalidade de um ato normativo nos casos concretos. Caberá ao Supremo Tribunal Federal julgar recurso extraordinário contra decisão inferior que “julgue válida lei local contestada em face da lei federal”. Gradualmente, o modelo de controle concentrado foi sendo incorporado pelo Brasil, que já tinha o sistema de controle difuso. Em 1988 a Representação de Inconstitucionalidade virou Ação Direta de Inconstitucionalidade e a legitimação para propor essa ação foi ampliada. Não é mais só o Procurador-geral da República que pode propor. A CF/88 através da Emenda Constitucional 3/93 ampliou significativamente o nosso modelo de Controle Concentrado. No Brasil, existem cinco espécies de controle concentrado de constitucionalidade: - A Ação declaratória de constitucionalidade (ADC); - A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI); - A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADI por omissão); - A Ação Direta Interventiva (ou Representação Interventiva); e - A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Judicialização x Ativismo Judicial • Judicialização Não é difícil de perceber que não só atualmente, mas ao longoda história, o Poder Judiciário tem sido muito aplaudido e também bastante criticado por suas tomadas de decisões, especialmente quando estas envolvem questões de cunho 25 político, de implementação de políticas públicas ou escolhas morais em temas controversos na sociedade. A judicialização, portanto, significa que algumas questões de grande repercussão política ou social estão sendo resolvidas pelo Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais, como Congresso Nacional e Poder Executivo. Assim, a judicialização, no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política. Importante destacar que na judicialização, o Poder Judiciário é devidamente provocado a se manifestar e o faz nos limites dos pedidos formulados. O tribunal não tem a alternativa de conhecer ou não das ações, de se pronunciar ou não sobre o seu mérito, uma vez preenchidos os requisitos de cabimento. A judicialização não decorreu de uma opção ideológica ou filosófica do Judiciário, pois esse decide em cumprimento, de modo estrito, ao ordenamento jurídico vigente. • Ativismo Judicial O ativismo judicial é uma atitude, ou melhor, uma escolha de um modo específico e proativo que o Poder Judiciário possui de interpretar a Constituição, muitas vezes, expandindo seu sentido e seu alcance. Assim, podemos observar o ativismo judicial, por exemplo, nas situações que envolvem o Poder Legislativo (classe política) e a sociedade civil, principalmente quando nessa relação as demandas sociais não venham ser atendidas efetivamente. Fica claro que o ativismo judicial é uma tentativa do Poder Judiciário de ter uma participação mais ampla e intensa na concretização de fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros poderes. Sob uma ótica mais garantista, podemos dizer que o ativismo judicial é um importante elemento no desenvolvimento dos direitos fundamentais no Brasil. Contudo, tal atividade deve estar balizada em critérios compatíveis com o princípio da divisão dos poderes, com as normas constitucionais e com o princípio democrático. https://www.politize.com.br/judicializacao-e-ativismo-judicial/
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