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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Escola de Engenharia – Departamento de Engenharia Civil ENG01201 – Mecânica Estrutural I Profa Vanessa Fátima Pasa Dutra Material de Apoio 5. Tensões no Entorno de um Ponto 5.1 Estados de Tensão Como vimos anteriormente (Capítulo 2, seção 2.3), o estado geral de tensão em um ponto de um dado material é caracterizado por seis componentes independentes dispostas sobre as faces de um cubo elementar localizado em seu entorno, sendo três componentes de tensão normal e três componentes de tensão de cisalhamento (Figura 1a). Entretanto, em muitos casos é possível obter-se uma abordagem simplificada em função das cargas atuantes sobre o corpo. Por exemplo, se não houver carga aplicada sobre a superfície lateral de um prisma de seção retangular, as componentes de tensão normal e de cisalhamento sobre a face de um cubo elementar situado nesta superfície serão nulas. O mesmo ocorre para as componentes localizadas na face oposta, de tal forma que o estado de tensões apresentado pelo material neste ponto pode ser caracterizado por um plano simples ao invés do cubo elementar. Nesse caso, diz-se que o material está sujeito a um estado plano de tensões (Figura 1b). O estado plano de tensões é geralmente representado através de um elemento bidimensional disposto sobre um plano cartesiano de eixos x-y, aos quais são associadas as componentes de tensão normal x e y e a componente de tensão de cisalhamento xy (Figura 1c). As tensões normais atuam em faces opostas do elemento de tensões segundo a direção dos eixos x-y, enquanto que a tensão tangencial atua sobre as suas quatro faces. A convenção de sinais aqui adotada indica que uma componente normal de tensão é positiva quando se caracteriza tração na direção da componente. Por outro lado, a tensão tangencial xy será positiva quando as tensões atuantes sobre as quatro faces convergirem para os vértices localizados nos cantos superiores direito e inferior esquerdo do elemento de tensões, como mostrado na Figura 1c. Observe que o estado de tensões representado sobre as faces do elemento deve estar sempre equilibrado. Estado geral de tensões Estado plano de tensões Estado plano de tensões (vista bidimensional) Figura 1. Estado geral e plano de tensões. )a )b )c 2 5.2 Transformação de Tensões em Estado Plano Supondo que um estado plano de tensões referente a um ponto de um dado material seja conhecido através de suas componentes x, y e xy, orientadas segundo o sistema de eixos x-y (Figura 2a), é possível obter as componentes de tensão x’, y’ e x’y’ para um sistema de eixos qualquer x’-y’ (Figura 2b) de modo que representem o mesmo estado de tensões neste ponto. Figura 2. Componentes das tensões em sistemas de referência distintos, x-y (a) e x’-y’ (b). 5.2.1 Equações de transformação Para obtermos componentes de tensão em um sistema de eixos x’-y’ (Figura 2b) com orientação qualquer a partir de um estado plano de tensões conhecido (Figura 2a), descrito pelas componentes x, y e xy dadas segundo as direções de um sistema de eixos x-y, emprega-se uma formulação baseada em equações de transformação que relacionam as componentes de tensão de dois sistemas de eixos defasados entre si por um ângulo . A obtenção das equações de transformação é feita considerando o elemento mostrado abaixo, onde encontra-se representado um estado plano de tensões (Figura 3a). Secionando o elemento ao longo do plano inclinado definido por e isolando o trecho à esquerda da seção (Figura 3b), podemos estabelecer a localização do sistema x’-y’ sobre o plano inclinado, onde identificamos a área secionada como sendo A. Figura 3. O diagrama de corpo livre para o trecho à esquerda da seção é mostrado na Figura 4, sobre o qual são aplicadas as equações de equilíbrio de força para a obtenção das componentes de tensão x’ e x’y’ da seguinte forma: = )a )b )a )b 3 Figura 4. Diagrama de corpo livre do trecho avaliado. ( ) ( ) ( ) ( ) 2 2 0 . A . A.sen .cos . A.sen .sen . A.cos .sen . A.cos .cos .cos .sen .sen .cos x x xy y xy x x x y xy F = − − − − = = + + ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )2 2 0 . A . A.sen .sen . A.sen .cos . A.cos .cos . A.cos .sen .sen .cos . cos sen y x y xy y xy x x y y x xy F = + − − + = = − + − Usando nas expressões acima as identidades trigonométricas sen2 2.sen cos = , 2sen (1 cos2 2 = − ) e 2cos (1 cos2 2 = + ) , obtém-se: .cos2 .sen2 2 2 x y x y x xy + − = + + .sen2 .cos2 2 x y x y xy − = − + Para a determinação da componente de tensão normal y’, substitui-se por = + 90º na equação de x’ acima, obtendo-se: .cos2 .sen2 2 2 x y x y y xy + − = − − Figura 5. Componentes de tensão x’, y’ e x’y’ para um sistema de eixos x’-y’ orientado de em relação ao sistema de eixos x-y. A cosA Asen 4 5.2.2 Tensões principais e cisalhamento máximo Nas aplicações em Engenharia é importante conhecermos qual a orientação de eixos x’-y’ que conduz a valores de máximo e mínimo para as componentes de tensão. Para a determinação da tensão normal máxima e da tensão normal mínima é preciso igualar a zero a primeira derivada de x’ ou y’ em relação a . Portanto: ( ) d .sen2 .cos2 d x x y xy = − − + = tg2 xy x y = − Devido às características da função tangente, a equação acima admite duas soluções, 21 e 22, defasadas em 180º. Assim, obtêm-se os ângulos 1 e 2, defasados em 90º. Figura 6. Tensões e direções principais. Substituindo os valores 1 e 2 na equação de transformação para x’ determinam-se a tensão normal máxima e a tensão normal mínima. Alternativamente, pode-se empregar a seguinte expressão: 2 1,2 x y x y xy + − = + Estas tensões são conhecidas como tensões principais e os planos sobre os quais elas atuam são denominados planos principais, dispostos segundo as direções principais. Sobre os planos principais constata-se que 0x y = , o que pode ser verificado ao substituir 1 e 2 na equação de transformação correspondente. Portanto, não há tensões de cisalhamento atuando sobre os planos principais. Por convenção a tensão máxima corresponde a 1 e a tensão mínima refere- se a 2, de maneira que temos sempre a condição 1 2 . Para determinarmos os planos de tensão de cisalhamento máximo, vamos igualar a zero a primeira derivada de x’y’ em relação a . Assim fazendo, obtém-se: ( ) tg2 x y xy − − = Observa-se que os ângulos e estão separados por 45º, de onde se conclui que os planos de cisalhamento máximo podem ser também obtidos por uma rotação de 45º a partir da orientação dos eixos principais. O valor da tensão de cisalhamento máximo é determinado pela expressão a seguir: 5 2 max x y xy − = + Substituindo os ângulos 1 e 2 na equação de transformação para x’, constata-se que nos planos de cisalhamento máximo atuam também tensões normais, denominadas tensões normais médias, sendo obtidas por: med x y + = 5.3 Transformação de Tensões em Estado Geral No caso de estado geralde tensões, as tensões e direções principais associadas a um ponto qualquer de um material podem ser obtidas a partir do chamado tensor de tensões. Este tensor é uma forma de representação das seis componentes atuantes nas faces de um cubo elementar no entorno do ponto. A disposição das componentes no tensor de tensões é feita como mostrado abaixo: x xy xz yx y yz zx zy z = Para a determinação dos sinais de cada uma das componentes do tensor, seguimos uma convenção onde se tomam como positivas aquelas componentes que atuam no sentido positivo dos eixos coordenados de referência, avaliadas sobre as faces do cubo elementar voltadas para os sentidos positivos dos eixos. Devemos também recordar a convenção utilizada para a identificação das componentes de tensão através de seus subíndices, apresentada na seção 2.3 do Capítulo 2. Na figura ao lado é mostrada uma configuração de tensões onde todas as componentes são positivas. A determinação das tensões e direções principais é feita através da solução de um problema de autovalores e autovetores, onde os autovalores correspondem às tensões principais e os autovetores descrevem as direções principais. A equação de autovalores e autovetores para este caso é dada por: 1 2 3 x x 0 x x xy xz yx y yz zx zy z − − = − x x = onde x1, x2 e x3 são as componentes do autovetor x , é a matriz identidade e um autovalor. Para que a equação não tenha solução trivial (x = (0,0,0)) é preciso que o determinante da matriz seja nulo. Desta operação obtêm-se três autovalores diferentes, a partir dos quais se determinam os respectivos três autovetores ao substituir cada um dos autovalores na seguinte equação: 2 2 2 1 2 3x x x 1+ + = ou seja, os autovetores são vetores unitários. Portanto, no caso geral temos três tensões principais que são representadas na seguinte ordem 1 2 3 . Para o caso particular de estado plano de tensões, a presente formulação também pode ser empregada, onde uma das tensões principais é necessariamente nula. Assim, temos uma das seguintes possibilidades: 6 1 2 3 1 2 3 1 2 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 = = = Um estado especial de tensões tridimensional é obtido quando as direções e tensões principais são conhecidas, de forma que tenhamos apenas tensões normais atuando nas faces do cubo elementar. Esta condição é conhecida como estado de tensão triaxial. 5.4 Exemplos Exemplo 1: Um estado plano de tensões é representado pelo elemento mostrado abaixo. Determine o estado de tensão referente a um sistema de eixos orientado a 30º no sentido horário em relação às direções de tensão indicadas. Pela convenção de sinais estabelecida para problemas de estado plano, conclui-se que: 80 MPa; 50 MPa; 25MPax y xy = − = = − Na figura ao lado é mostrada a configuração obtida para o elemento disposto segundo o sistema de eixos x’-y’, o qual é determinado pela rotação de 30º no sentido horário a partir do eixo horizontal x do sistema original x-y. Considerando as tensões acima definidas e que = -30º, temos: .cos2 .sen2 2 2 80 50 80 50 .cos( 25).sen( 2 2 2 25,8MPa x y x y x xy x x + − = + + − + − − = + − ) + (− − ) = − .cos2 .sen2 2 2 80 50 80 50 .cos( 2.30 ( 25).sen( 2.30 2 2 4,15MPa x y x y y xy y y + − = − − − + − − = − − )− − − ) = − .sen2 .cos2 2 80 50 .sen( 2.30 ( 25).cos( 2.30 2 68,8MPa x y x y xy x y x y − = − + − − = − − )+ − − ) = − Finalmente, com os valores calculados para x’, y’ e x’y’ e seus respectivos sinais, conforme a convenção adotada, obtém-se a configuração mostrada abaixo para o elemento de tensões segundo o sistema x’-y’. 7 Exemplo 2: O estado plano de tensões em um determinado ponto de um corpo é representado no elemento abaixo. Determine o estado de tensões em termos das tensões principais. Pela convenção de sinais estabelecida para problemas de estado plano, conclui-se que: 20 MPa; 90 MPa; 60 MPax y xy = − = = As tensões principais são obtidas por: 2 1,2 2 2 1 1 2 2 2 2 20 90 20 90 60 116MPa 20 90 20 90 60 46,4MPa x y x y xy + − = + − + − − = + + = − + − − = − + = − As direções dos planos principais são obtidas pela seguinte expressão: 60 tg2 20 90) 2 47,49 23,7 90 66,3 xy x y = = − − −(− = − = − = + = Para identificarmos sobre qual plano principal atua cada uma das tensões principais, calcula- se x’ para = 1, ou seja: .cos2 .sen2 2 2 20 90 20 0 .cos( 60.sen( 2 2 2 46,4MPa x y x y x xy x x + − = + + − + − − = + − ) + − ) = − Portanto, conclui-se que: p 1 p 2 66,3 116MPa 23,7 46,4MPa = = = − = − Os resultados acima obtidos são representados na figura ao lado, onde o elemento indica as tensões e direções principais de acordo com a convenção adotada. Observe que nenhuma tensão de cisalhamento atua sobre os planos principais. 8 Exemplo 3: Para o estado plano de tensões representado abaixo, determine esse estado de tensões em termos da tensão de cisalhamento máxima e da tensão normal média a ele associada. Pela convenção de sinais para problemas de estado plano, tem-se que: 20 MPa; 90 MPa; 60 MPax y xy = − = = As direções dos planos de tensão de cisalhamento máximo são obtidas pela expressão: ( )20 90 tg2 60 2 42,5 21,3 90 111,3 − − − = = = = + = A tensão de cisalhamento máximo é dada por: 2 max 2 2 max 20 90 60 81,4MPa x y xy − = + − − = + = Para identificarmos sobre qual plano atua a tensão tangencial máxima acima obtida, calcula-se x’y’ para = 1, ou seja: .sen2 .cos2 2 20 90 .sen(2.21,3 ) 60.cos(2.21,3 ) 2 81,4MPa x y x y xy x y x y − = − + − − = − + = Assim, máx atua no sentido positivo de y’ sobre a face do elemento determinada por = 21,3º e no sentido negativo de y’ sobre a face do elemento determinada por = 111,3º, como mostrado na figura o lado. Sobre as faces deste elemento devem ainda ser colocadas as tensões normais médias, obtidas por: med 20 35MPa x y + − + = = = A configuração final de tensões sobre o elemento é mostrada na figura a seguir. 9 Exemplo 4: Dado o estado de tensões representado pelo cubo elementar abaixo, determine as tensões e direções principais pela solução do problema de autovalores e autovetores a partir do tensor de tensões correspondente. O tensor de tensões correspondente ao prisma acima é dado por: 30 40 0 40 50 0 0 0 0 x xy xz yx y yz zx zy z − = = O problema de autovalores e autovetores fica definido como: 30 40 0 x 40 50 0 y 0 0 0 0 z − − − = − Calculando o determinante da matriz acima e igualando a zero, obtém-se: 0 − −(−+) + (−) − = Resolvendoa equação acima, obtém-se: ’ = 1 = 66,6 MPa ’’ = 3 = – 46,6 MPa ’’’ = 2 = 0 Para encontrarmos as direções principais, devemos substituir cada um dos autovalores na equação ( ) 0 x − = . Para = 66,6 MPa, tem-se que: 30 40 0 x 40 50 0 y 0 0 0 0 z − − − = − Resolvendo as duas últimas linhas do sistema, obtém-se que z = 0 e y = 2,41.x. Sabendo que x2 + y2 + z2 = 1, tem-se que: ( ) 22x 2,41.x 1 x 0,383 y 2,41.x y 0,924 + = = = = Para = – 46,6 MPa, tem-se que: 30 4 40 0 x 40 50 4 0 y 0 0 0 0 4 z − + + = + Resolvendo as duas últimas linhas do sistema, obtém-se que z = 0 e y = – 0,414.x. Sabendo que x2 + y2 + z2 = 1, tem-se que: ( ) 22x 0,414.x 1 x 0,924 y 0,414.x y 0,383 + = = = = − 10 Finalmente, para = 0, obtém-se: 30 40 0 x 40 50 0 y 0 0 0 0 z − = Resolvendo as duas primeiras linhas do sistema, obtém-se que x = 0 e y = 0. Sabendo que x2 + y2 + z2 = 1, tem-se que x = 0, y = 0 e z = 1. Exemplo 5: Encontrar as tensões e direções principais do prisma abaixo pela solução do problema de autovalores e autovetores a partir do tensor de tensões correspondente. O tensor de tensões para o prisma acima é dado por: 70 0 50 0 100 40 50 40 80 x xy xz yx y yz zx zy z − − = − − = O problema de autovalores e autovetores é definido por: 70 0 50 x 0 100 40 y 0 50 40 80 z − − − − = − − − Calculando o determinante da matriz acima e igualando a zero, obtém-se: 0 − − ++ = Resolvendo a equação acima, obtém-se: ’ = 1 = 109,13 MPa ’’ = 2 = – 29,93 MPa ’’’ = 3 = – 129,21 MPa Para encontrarmos as direções principais, devemos substituir cada um dos autovalores na equação ( ) 0 x − = . Para = 109,13 MPa, tem-se que: 11 179,13 0 50 x 0 9 40 y 0 50 40 189 z − − − = − − Resolvendo as primeiras duas linhas do sistema, obtém-se que x = – 0,279.z e y = 4,381.z. Sabendo que x2 + y2 + z2 = 1, tem-se que: ( ) 22 2( 0, 279.z) 4,381.z z 1 z 0, 222 y 4,381.z y 0,973 x 0,279.z x 0,062 − + + = = = = = − = − Para = – 29,93 MPa, tem-se que: 40 0 50 x 0 40 y 0 50 40 z − − = − − Resolvendo as primeiras duas linhas do sistema, obtém-se que x = – 1,248.z e y = – 0,308.z. Sabendo que x2 + y2 + z2 = 1, tem-se que: ( ) 22 2( 1,248.z) 0,308.z z 1 z 0,614 y 0,308.z y 0,189 x 1,248.z x 0,766 − + − + = = = − = − = − = − Finalmente, para = – 129,21 MPa, obtém-se: 0 50 x 0 40 y 0 50 40 z − = − Resolvendo as primeiras duas linhas do sistema, obtém-se que x = 0,844.z e y = – 0,175.z. Sabendo que x2 + y2 + z2 = 1, tem-se que: ( ) 22 2(0,844.z) 0,175.z z 1 z 0,757 y 0,175.z y 0,133 x 0,844.z x 0,639 + − + = = = − = − = = O prisma orientado segundo as direções principais assume a orientação mostrada ao lado. 12 Bibliografia Mecânica dos materiais. 5. ed. Beer, Ferdinand Pierre e Johnston, E. Russell, Jr. Porto Alegre: AMGH, 2011. Mecânica dos materiais. Gere, James M. São Paulo : Cengage Learning, 2010. Resistência dos materiais. 7. ed. Hibbeler, Russell Charles São Paulo: Pearson Education, 2010. Resistência dos materiais 4. ed. Beer, Ferdinand Pierre, Johnston, E. Russell, Jr. e DeWolf, John T. São Paulo : McGraw-Hill, 2006. Introdução à Mecânica Estrutural, Masuero, João Ricardo e Creus, Guillermo Juan, Ed. da Universidade.