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RELATÓRIO DE ESTÁGIO EM TRABALHO DOCENTE 2 SEMESTRE

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RELATÓRIO PSICOLÓGICO
“O novo não está no que é dito, mas no acontecimento de sua volta”.
Michel Foucault
1. Identificação 
1.1 Autor (a): 
Josely da Silva Quaresma e Margareth Valdo Pansini – acadêmicos (a) do 10º período de curso de Psicologia sob o registro de matrícula número 205615 e 206830 respectivamente.
Gabriel Alvarenga – Psicólogo e professor do Colegiado do Curso de Psicologia do Centro Universitário São Camilo - ES, registrado no CRP/16 sob o número.
1.2 Interessado:
EMEB Luiz Marques Pinto, localizada à Rua Alfredo Secco, 36 no Bairro Boa Vista - Cachoeiro de Itapemirim – ES.
1.3 Assunto: 
Este relatório visa informar sobre a experiência vivenciada na Escola acima citada, onde se deu o estágio curricular de trabalho docente entre os dias 05/08/2016 ao dia 08/12/2016.
2. Descrição da demanda
Escola Municipal que atende crianças e adolescentes do pré ao nono ano, totalizando aproximadamente 790 alunos. Situada em uma região periférica da cidade. Conta com uma boa estrutura física e pedagógica, mas também enfrenta a complexa realidade comum à educação no país, sendo atravessada por questões socioeconômicas e políticas que interferem no processo ensino aprendizagem, potencializando os riscos de produção do fracasso escolar. 
A instituição apresenta um número significativo de alunos com laudos que se referem a transtornos neuropsiquiátricos, como também alguns professores com sinais de esgotamento psíquico emocional, o que representa um desafio para a gestão escolar e um convite a psicologia a adentrar nesse contexto com uma escuta atenta e um olhar abrangente as especificidades desse espaço de produção do saber e de múltiplas relações humanas. 
3. Procedimento
Estágio realizado semanalmente sendo às sextas feiras no horário de 08h às 12h. Neste período foram realizados observação nos vários ambientes do contexto escolar, na relação professor e aluno; palestras com a família e a escola e uma escuta e acolhimento com alunos, professores e família bem como participação e colaboração nos eventos da escola.
4. Análise
	O trabalho no segundo semestre ganhou contornos práticos com atuação mais reativa, saindo da observação primária para ações mais interventivas. Essas ações foram planejadas a partir dos resultados obtidos com a observação citada, buscando atingir as demandas mais relevantes no que tange a gravidade da urgência de cada fase do contexto escolar. Porem sem fragmenta-la, mas tendo sempre um olhar para sua totalidade na busca das possibilidades ainda lactentes, para trazê-las a luz da percepção coletiva e da análise interventa, produtora de movimentos e práticas transformadoras.
“É preciso cavar para mostrar como as coisas foram historicamente contingentes, por tal ou qual razão inteligiveis, mas não necessárias. É preciso fazer aparecer o inteligível e pensar o que existe está longe de preencher todos os espaços possíveis. Fazer um verdadeiro desafio inevitável da questão: o que se pode jogar e como inventar um jogo”. (FOUCAULT). 
Na busca por tais possibilidades foram desenvolvidas atividades com os professores buscando ampliar a discussão em torno da problemática escolar que inclui temas como:
O docente e seus desafios – “somos chamados a fazer o que não é o nosso fazer”. 
Essa fala de um dos professores em um dos encontros realizados com eles abriu a discussão sobre o papel do professor na atualidade e as múltiplas funções que ele precisa ocupar na sala de aula. Segundo eles, a criança chega à escola sem uma orientação básica sobre limites, respeito pelo outro e obediência às regras sociais. A família não fez a parte que lhe cabia. Assim o professor se vê obrigado a ocupar o lugar do pai e da mãe e fazer a tentativa de dar a esse aluno a educação sobre valores humanos e relações interpessoais, para tornar viável ministrar uma aula com conteúdo acadêmico, o que seria o objetivo especifico do seu trabalho. Porem, só esse “objetivo especifico” não satisfaz os sonhos da vocação docente. Isso o limita, impede sua atividade (Yves Clot), que deseja espaço ser grande e eficaz.
 “Por isso os sonhos para a escola devem ser reelaborados. É necessário que se trace um novo plano sobre a imanência, com novas curvaturas, que permitam atender e lidar com a realidade tal como ela se apresenta”. (Prof. Jefferson). 
Outro desafio são os recursos materiais de apoio pedagógico, que quase sempre não estão disponíveis deixando a sala de aula com aspecto medieval se comparado a outros espaços não educacionais, equipados com aparelhos de última geração. Falta vontade política para disponibilizar as escolas os equipamentos e o suporte técnico necessário. 
As salas superlotadas também representam uma dificuldade expressiva, pois contribui para a sobrecarga do professor que se vê sem esperança com a falta de perspectiva de soluções imediatas, ou em médio prazo, somada ao excesso de exigências institucionais e políticas que se juntam aos dramas socioeconômicos que atravessam a escola. 
“E assim, o professor, cada vez mais desmotivado, desvalorizado, calcula, recalcula e ainda se encontra no déficit, sem os recursos das pedaladas fiscais, pois não há quem lhes dê crédito”. (Prof. Dirceu Freire).
Todos esses fatores causam um grande desgaste no corpo docente gerando estresse continuado evidenciando a possibilidade de adoecimento. Vale explicitar que esses fatores atingem não só os professores, mas também a equipe pedagógica e gestores, tão implicados quanto os primeiros. 
 O aluno e suas questões – Ao inserir-se no contexto escolar, o aluno se vê diante de dilemas que fogem ao seu alcance. Sendo o método de ensino ainda enraizado na educação bancaria (FREIRE), que não considera as potencialidades do sujeito, mas tenta enquadra-lo em um padrão apriorístico e ultrapassado, que não atrai a atenção do aluno que se ocupa em conversar assuntos paralelos ao conteúdo apresentado pelo docente. Além disso, a criança que na maioria das vezes vem de um contexto familiar complexo e conturbado, onde não é assistido em suas necessidades básicas como afeto, proteção e cuidado, ou até chegando a sofrer agressões verbais e físicas de quem deveria dar apoio e acolhimento, vê na sala de aula um prolongamento desse ambiente de violência, demonstrada das mais variadas formas, onde tudo pode e ao mesmo tempo tudo falta. 
“Tem-se dificuldades em identificar um menino que passa por três escolas no ano, seja por mudanças de endereço, ou por falta de mudanças no comportamento, de modo que não se consegue auxilia-lo na criação de uma identidade, apesar de que, mesmo com lagrimas na alma, o cômico nos ressalta na frase do menino do pré que diz: “quando crescer eu vou ser bandido, igual o meu irmão”... cordãozão, boné maneiro”, cheio de gírias e expressões corporais que coreografam o ar”. (Prof. Dirceu Freire)
 	Desse modo a indisciplina e rebeldia do “aluno problema”, não se constituem apenas numa questão de comportamento inadequado, mas trata-se de uma questão estrutural que atravessa a realidade social das famílias na contemporaneidade liquida e repleta de valores de produção e consumo desmedido e desprovida de valores que consideram a ética como fundamental à dignidade humana. Esse aluno, centro da discussão educacional e familiar, se vê sem um projeto de vida que lhe faça sentido e entre duas forças que o oprimem, exigindo dele respostas e atitudes que não lhe foi dada condição de aprender, levando-o a escolher afastar-se da educação, trilhando outros caminhos que o conduzem a uma vida desistida, comprometendo um futuro que poderia ser possível. 
Família: adversária ou parceira – Sendo o seu bem maior, a família representa o esteio, a base para toda criança desde o seu nascimento. É nela que a criança começa a ter contato com o mundo e seus encantos e desafios. É nela que esse pequeno ser vai se espelhar para criar os parâmetros de seu desenvolvimento como um todo, tornando-se reflexo do seu meio e de seus integrantes, os quais devem ter o cuidado de acolher, orientar
e ajudar a criança a ter a percepção de seus limites e também deixar fluir suas potencialidades. Entretanto com a modernidade, a influência das mídias e a liberação sexual, a família sofreu mudanças profundas no seu modo de funcionamento e na sua configuração, tornando-se assim uma problemática para outras instituições, como a escola, que insiste em enxerga-la na sua organização tradicional dificultando o diálogo e a compreensão dessa nova realidade e suas características desconcertantes para um olhar radical. Faz-se necessário e urgente uma abertura para um novo modo de lidar com essa relação escola – família, potencializando a interação e consolidação de uma parceria entre as duas instituições, haja vista que o aluno é a interseção entre ambas, e depende que tanto uma como a outra invista na sua formação acadêmica e humana.
 “No contexto escolar, o desafio – e também o de toda a sociedade – é o lidar com a diversidade, respeitando-a, sem preposições que lhes podem a multiplicidade” (Prof. Jefferson). 
Nesse propósito é que foi implantado o projeto família e escola, buscando criar um espaço de diálogo, trazendo para a discussão as questões em comum, considerando a ótica de cada uma, sempre buscando encontrar soluções que atenda suas expectativas, mas que sobre tudo favoreça a evolução e o bem-estar da criança. Após os primeiros passos desse projeto, ficou mais claro o caminho a ser trilhado para que ele se firme como instrumento necessário ao processo educativo, ajudando este, a alcançar as metas desejadas. E como ferramenta inicial, foi usada a dinâmica da “roda de conversa”, que mostrou ser uma boa estratégia de mudança no caráter informativo e diretivo das reuniões escolares, abrindo a possibilidade a uma comunicação mais livre, participativa e democrática, onde família e escola falam e escutam e juntas busquem saídas viáveis para suas demandas.
“... embora a ventania tenha desfeito o que o sonho anterior (o) permitiu edificar, voltou-se a sonhar: Eu dou um passo, ela dá dois; eu dois, ela quatro; eu quatro, ela oito... para isso serve a utopia, para que eu me mantenha em movimento”, (Eduardo Galeano). Obs. (citado pelo Prof. Jefferson). 
 
 
As ações aconteceram como se segue:
Alunos:
- Atendimento individual; (acolhimento e escuta interventiva).
- Oficina: Vivências grupais e sexualidade na adolescência; (tema escolhido pelos alunos do 8º ano, depois da aplicação da dinâmica “tempestade de ideias”).
- Encaminhamentos para atendimento psicoterapêutico. (algum caso, devido sua complexidade, demandava um acompanhamento mais efetivo, sendo por isso encaminhado) 
Professores:
- Grupos de discussão: Mesmo com dificuldades de disponibilidade de tempo entre outras intercorrencias, foram realizados vários momento com pequenos grupos de professores. 
- Encontro com professores: Motivação e diálogo sobre trabalho e saúde, sendo aplicado um questionário sobre avaliação de nível de estresse e burnout. 
- Devolutiva individual do questionário de avaliação de nível de estresse e risco de Síndrome de Burnout: foi discutido de modo particular sobre o estado geral de cada um, oferecendo orientações e sugestões para uma melhor qualidade de vida. 
- Atendimento individual: o professor, como qualquer pessoa, traz questões pessoais para além do trabalho, mas sendo inerente ao sujeito, implicam e são implicadas pelo ambiente laboral. Fazendo-se necessário uma ajuda na elaboração de tais questões.
Família:
- Encontro: Família e Escola: Projeto que tem como objetivo ampliar o dialogo, fortalecendo a interação, facilitar a solução de questões, mas sobre tudo criar novas possibilidades de ação.
- Acolhimento (escuta e orientação): Assim como professores e alunos, familiares também foram acolhidos e quando necessários encaminhados para atendimento psicoterápico. 
- O planejamento contemplava um último encontro quando seria dada uma devolutiva aos participantes, faria a análise do que foi realizado e discutir-se-ia a continuidade do projeto. Entretanto, a data prevista para tal, coincidiu com o dia em que a escola fez uma celebração de agradecimento pelo ano letivo e suas realizações. Estava nesse evento apenas alguns familiares responsáveis que participaram dos demais encontros. Embora tendo sido mencionada a presença desses participantes no evento, não se fazia viável uma ação mais especifica do projeto naquele momento. Ficando a discussão para uma ocasião posterior mais propícia a ser agendada. Como observação final, ficou a percepção que, com a abertura dada pela escola e a resposta das famílias, o projeto está no caminho certo e é possível. 
5. Conclusão
O estágio na escola foi de fundamental importância para a compreensão do trabalho do psicólogo na escola e na educação. Possibilitou adentrar-se num contexto múltiplo, desafiador, mas profundamente instigante, que convida a todo instante, o profissional Psicólogo a desvendar mistérios instituídos e a desbravar caminhos ainda não transitados.
 
Construir outro paradigma para a educação, redimensionar nossas práticas implicam, necessariamente, recusar os lugares fixos e as verdades a serem descobertas, ocupando a posição de intelectual nômade, que desmonta verdades e faz toda afirmação ser provisória. BARROS (2000) 
Essa área de atuação da Psicologia ficou claro, que carece de uma discussão ampla que abarque a educação e suas especificidades, trazendo a luz da analise, os novos fenômenos que atravessam a escola, sem esquecer velhas questões ainda embargadas por um sistema político que quer manter o povo com uma consciência ingênua da realidade, sendo uma massa de fácil manipulação e domínio. 
Não tenho outra maneira de superar a quotidianeidade alienante senão através de minha práxis histórica em si mesma social e não individual. Somente na medida em que assumo totalmente minha responsabilidade no jogo desta tensão dramática é que me faço uma presença consciente no mundo. Como tal, não posso aceitar ser mero espectador, mas pelo
contrário, devo buscar o meu lugar, o mais humilde, o mais mínimo que seja, no processo de transformação do mundo [...]
 PAULO FREIRE
Assim, a psicologia é chamada a contribuir com a escola e o processo educativo, utilizando de suas ferramentas e dispositivos para desenvolver estratégias que possibilitem avanços significativos e eficazes ao processo de ensino-aprendizagem, mas não só. É também sua missão, problematizar os modelos e métodos instituídos e consolidar a ideia de que a escola, tendo como parceiras cotidianamente a família e a sociedade, não é apenas uma transmissora de informações frias, mas dotada de vida e movimento, com os pés na realidade e com os olhos focados na utopia dos sonhos, ela se firma como formadora de pessoas humanas, no sentido mais amplo da palavra, sujeitos autênticos, protagonistas de sua história e da construção de um futuro justo e democrático. 
 
6. Referência bibliográfica
Barros, Maria Elizabeth Barros de. Procurando outros paradigmas para a educação. 2000.
FOUCAULT, M. Vigiar e Punir. Trad. Raquel Ramalhete. 27. ed. Petrópolis: Vozes, 1987.
FOUCAULT, Michel. A governamentalidade. In: ______. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1982.
LUENGO, FC. A vigilância punitiva: a postura dos educadores no processo de patologização e medicalização da infância. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. 
Patto, M. H. S. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia (2a ed.). São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002.
_____. A família pobre e a escola pública: anotações sobre um desencontro. In: _____. (Org.). Introdução à Psicologia Escolar. 3. ed.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997. p.281‑96.
Cachoeiro de Itapemirim, 21 de Junho de 2016.
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Josely Da Silva Quaresma
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Margareth Valdo Pansini
Estagiários (a) do 9º período do curso de Psicologia
Mat. 205615 e 206830
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Profº Gabriel Alvarenga
Professor Supervisor do Estágio de Atendimento Clínico
CRP

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