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QUER SABER O QUE QUEREMOS? Por Marli Gonçalves Respeito. Em primeiro lugar, respeito. Antes de tudo o mais que se possa estar pen- sando para comemorar o Dia da Mulher, nos presenteiem com respeito, que é isso que mais está faltando para en- tender a dimensão e a reali- dade da condição feminina. A lista do que nós, mulhe- res, queremos e precisamos é longa, não está em nenhuma loja, e começa por entender que não estamos brincan- do quando falamos em bus- ca de, no mínimo, igualda- de, que já não é sem tempo. Desarme-se. Pronto? Posso falar? Me deem um pouco de sua atenção, todos aí do outro lado desse texto? Senhores e senhoras, meninos e meni- nas. As mulheres já fizeram grandes avanços, e a luta por igualdade e conquistas hoje alcança outro patamar, mais complexo, muito mais ligado ao comportamento e cultura. Os espaços cada vez mais ocupados. Isso, sem dúvida, certamente acarretou e traz confusão entre valores, en- volvendo sexo e a questão de gênero. Mas é hora de se- guir adiante, por todos nós. Têm acompanhado o noti- ciário que todo dia fala so- bre a morte violenta de uma ou mais mulheres por seus companheiros ou ex-compa- nheiros? Pois esse número é muito maior do que as que viram “notícia”. Têm sabi- do das que ficarão aleijadas para sempre por conta de ataques? Aleijadas, inclusive moralmente, porque a vio- lência deixa sequelas e não só na pessoa atingida, mas em todos à sua volta. Em todos nós, envergonhados. Ah! Não gosta da palavra feminicídio? Acha que é in- venção da imprensa? Não é: trata exclusivamente da violência, o ódio, que atinge mortalmente a mulher, e ape- nas pela sua condição de ser uma mulher. Definição im- portante, porque foi só a par- tir de muita luta que se con- seguiu chamar a atenção para esse problema tão grave. Pelo menos agora estão medindo, pesquisando, dando atenção, inclusive, ano após ano, re- velando que os índices estão, na verdade, piorando. É pre- ciso fazer alguma coisa para mudar. Já somos o quinto país do mundo mais violen- to contra a mulher, e isso não é para se orgulhar, mas para corar. Não gosta da palavra feminicídio? Tá bom, use ou- tra: assassinato de mulheres. “Têm acompanhado o notici- ário que todo dia fala sobre a morte violenta de uma ou mais mulheres por seus companhei- ros ou ex-companheiros?” Outra: mulheres agredidas e que não prestaram quei- xa não é porque gostam de apanhar. Mas porque têm “ O feminismo é sério, amplo; não é coisa só de mulher. É movimento de toda a sociedade...” medo, muito medo. Por não confiar – e com certa razão – nas autoridades que deveriam protegê-las. Várias, desse rio de sangue e horror, estavam sob medidas protetivas, mas quem as cumpre? Essa polícia que muitas vezes não aceita nem que se registre um bole- tim de ocorrência, esses juízes que liberam os agressores em poucas horas, porque eles vão lá e se dizem arrependidos? A realidade é que ainda se tei- ma em não admitir que a mu- lher ainda é tratada de forma di- ferente, como se menor fosse, e não só dentro de sua própria casa, mas na rua, no trabalho, na política, na lei, na sociedade. Chega a ser vergonhosa a mí- nima participação na política nacional, só com algumas elei- tas, muitas delas apenas desa- justadas, justamente por nega- rem sua condição para chegar até ali. Vemos ainda a crimi- nosa utilização das cotas parti- dárias em candidaturas fantas- mas de mulheres apenas para a obtenção de recursos, apenas mais um dos assuntos atuais e cavernosos do país que trata tão mal a parcela que é mais da metade de sua população. Por que ainda tantos e tantas de vocês não admitem, parecem não ter noção do desgaste que é todo dia ter de se reafirmar, sé- culo após século, ano após ano, dia após dia, suportando retro- cessos ideológicos, a ignorân- cia e as pedras no caminho? “A realidade é que ainda se tei- ma em não admitir que a mu- lher ainda é tratada de forma di- ferente, como se menor fosse.” É preciso garantir a liber- dade de denunciar, de exi- gir respeito e chamar a aten- ção para o que é tão urgente. Respeito. Respeite. É essa a noção básica do feminismo. Precisamos todos também fa- lar sobre isso: o feminismo é sério, amplo; não é coisa só de mulher. É movimento de toda a sociedade que não se desenvolverá sem que se te- nha noção da importância da igualdade de condições, e que se manifeste e esteja presente em todos os grandes temas. Percebo, sim, aqui do meu posto de observação, que a coisa está tão confusa que até uma luta política tão impor- tante como essa esteja infe- lizmente virando clichê. Virando qualquer coisa, sendo ridiculariza- da. Tudo baseado apenas em pa- lavras vazias, grosseiras e men- tirosas que só parecem pretender manter as mulheres acuadas e ca- ladas. Repito, desistam. Não adian- ta. Precisamos todos nos acertar. Chamo a sua atenção. Respeito. Nos dê – a todos – esse presente, bem simples, aproveitando o Dia da Mulher, que foi para isso que foi criado, para que se pense mais seria- mente. É só o que queremos: respei- to. A partir daí virá a consideração. Marli Gonçalves é Jornalista formada pela FAAP, em 1979. Diretora da Brickman- n&Associados Comunicação, B&A. Tem 40 anos de atuação na profissão, com pas- sagens por vários veículos, entre eles Jornal da Tarde, Rádio Eldorado e revista Veja.
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