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[FICHAMENTO HERMENÊUTICA] TÉRCIO - MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO

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TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR.
5.1.3. Voluntas legis ou voluntas legislatoris?
- O saber dogmático exige que sejam criadas condições de decidibilidade, uma vez que considera que não existem questões indecidíveis, ou seja, mesmo que não se saiba de pronto qual a decisão, sabe-se de antemão que uma decisão deverá ser tomada.
- Desafio kelsiano: é a tensão existente entre dogma e liberdade, que se expressa pela necessidade de determinar objetivamente os pontos de partida e a possibilidade subjetiva de, ao final, sempre se encontrarem diversos sentidos.
- Problema hermenêutico da decidibilidade: diz respeito à criação de condições para que seja selecionada [ao final] uma decisão que gere o mínimo de perturbação social possível. Para a tradição da ciência jurídica, essa tensão significa que não apenas estamos obrigados a interpretar, como também que deve haver uma interpretação (e, pois, um sentido) que prepondere e ponha um fim (prático) às múltiplas possibilidades interpretativas.
- Postulado universal da ciência jurídica: não há norma sem interpretação.
* Métodos interpretativos
A questão deixa de ser a mera enumeração de técnicas, para referir-se ao fundamento de uma teoria da interpretação. Surge o problema de explicar o critério (metódico) da interpretação verdadeira. A resposta envolvia a determinação do fator responsável pelo sentido de unidade último e determinante do sistema. A questão foi enfrentada primeiro pelo Jusnaturalismo.
- Jusnaturalismo: trouxe a ideia de unidade sistemática. O sistema era o conjunto de elementos estruturados pelas regras de dedução e a unidade das normas era dada com base em princípios dos quais tudo o mais era deduzido. Interpretar significava, então, inserir a norma em discussão na totalidade do sistema. Neste momento, se colocou a questão de qual seria o sentido da unidade do todo (da ordem normativa). No plano jurídico, foram elaboradas por Savigny (que se preocupava com o significado textual da lei) 4 técnicas interpretativas: i) a interpretação gramatical, que procurava o sentido vocabular da lei, ii) a interpretação lógica, que visava a seu sentido proposicional (o propósito da palavra), iii) a sistemática, que buscava o sentido global ou estrutural, e iv) a histórica, que tentava atingir o sentido genético (pelo que entendi, retrocedendo ao passado a fim de identificar o sentido pretendido pelo legislador).
Em princípio, a concepção de que o texto da lei era expressão de mens legislatoris leva Savigny a afirmar que interpretar é compreender o pensamento do legislador manifestado no texto da lei. De outro lado, porém, enfatizava ele a existência fundante dos "institutos
de direito" que expressavam "relações vitais" responsáveis pelo sistema jurídico como um todo orgânico, um conjunto vivo em constante movimento. Daí a ideia de que seria a convicção comum do povo o elemento primordial para a interpretação das normas. Essa oscilação entre um fator subjetivo o pensamento do legislador e outro objetivo o "espírito do povo" torna-se assim um ponto nuclear para entender o desenvolvimento da ciência jurídica como teoria da interpretação.
Para oferecer um esquema didático, podemos resumir aquelas tendências em dois grandes grupos. Método e objeto aparecem como questões correlatas. Do ângulo do objeto, o direito pode ser visto como a positivação de normas dotadas de sentido. Do ângulo do método, o problema é como e onde captar esse sentido. Em função disso, podemos cindir a doutrina em duas correntes que, embora não se distingam com essa nitidez, podem ser separadas didaticamente conforme o reconhecimento ou da vontade do legislador ou da vontade da lei como sede do sentido das normas. Chamamos a primeira de doutrina subjetivista, a segunda de objetivista.
- Doutrina subjetivista: sendo a ciência jurídica um saber dogmático (a noção de dogma enquanto um princípio arbitrário, derivado de vontade do emissor de norma lhe é fundamental), é, basicamente, uma compreensão do pensamento do legislador; portanto, interpretação ex tunc (desde então, isto é, desde o aparecimento da norma pela positivação da vontade legislativa), ressaltando-se, em consonância, o papel preponderante do aspecto genético e das técnicas que lhe são apropriadas (método histórico).
- Doutrina objetivista: a norma goza de um sentido próprio, determinado por fatores objetivos (o dogma é um arbítrio social), independente até certo ponto do sentido que lhe tenha querido dar o legislador, donde a concepção da interpretação como uma compreensão ex nunc (desde agora, isto é, tendo em vista a situação e o momento atual de sua vigência), ressaltando-se o papel preponderante dos aspectos estruturais em que a norma ocorre e as técnicas apropriadas a sua captação (método sociológico).
	- Críticas: levado a um extremo, podemos dizer que o subjetivismo favorece certo autoritarismo personalista, ao privilegiar a figura do legislador, pondo sua vontade em relevo.
O objetivismo, também levado ao extremo, favorece certo anarquismo, pois estabelece o predomínio de uma equidade duvidosa dos intérpretes sobre a própria norma ou, pelo menos, desloca a responsabilidade do legislador, na elaboração do direito, para os intérpretes ainda que legalmente constituídos, chegando-se a afirmar, como fazem alguns realistas norteamericanos, que direito é "o que decidem os tribunais".
- Conclusão do autor: Quando se diz que interpretar é compreender outra interpretação (a fixada na norma, seja pela vontade do legislador, seja pela vontade social), afirma-se a
existência de dois atos doadores de sentido: um que se positiva na norma e outro que procura identificá-lo. Ora, para que possa haver uma interpretação verdadeira, é preciso que ao menos um ato doador de sentido prevaleça (pressuposto dogmático). Como reconhece-lo e fundá-lo? Estamos, de novo, diante do desafio kelseniano.
5.1.4 Interpretação e tradução: uma analogia esclarecedora 
Para enfrenta-lo, faz-se mister investigar as razões pelas quais tanto a corrente objetivista quanto a subjetivista manifestam sua notória insuficiência. Para apontá-las, propomos que se proceda a uma analogia com semelhante problema que ocorre na teoria da tradução. Também aqui nos vemos às voltas com o critério da boa ou correta tradução. A analogia justifica-se: afinal, quem traduz interpreta.
Tanto a teoria realista quanto a teoria idealista da tradução são insuficientes, assim como as correntes subjetivista e objetivista da hermenêutica. 
- teoria realista: entende que primeiro deve ser identificado o objeto da tradução para depois traduzir seu significado. Mas como aponta Tércio, primeiro é necessário traduzir o que significa determinado objeto para depois saber seu significado (p. ex.: primeiro eu traduzo table como cadeira para depois eu entender o que é uma cadeira).
- teoria idealista: entende que a partir da sentença a ser traduzida (ex. “this is a table”) seria preciso recorrer ao que pensa um inglês quando a pronuncia, identificar o mesmo pensamento em um português e então realizar a tradução. Contudo, Tércio adverte que primeiro deve ser feita a tradução da sentença para depois se identificar o que teria pensado o inglês ao pronunciar a sentença. Para ele, a tradução é método de verificação do pensamento, uma vez que pensamento e língua são articulados em conjunto.
- Objeções semelhantes aos métodos de tradução e hermenêuticos: a) a teoria da voluntas legislatoris (subjetivista) se assemelha à teoria idealista. Assim, entende-se que primeiro de deve-se alcançar o sentido da norma por meio da interpretação para depois se descobrir a intenção do legislador, e não ao contrário como sugere tal teoria. Do mesmo modo, não pode-se conceber como possível acessar o pensamento normativo (intenção) do legislador por outro meio que não seja o meio de seu discurso normativo (lei). Pra que isso fosse possível, teríamos de buscar uma vontade capaz de comunicar-se de forma não linguística. Como isso é impossível, recorre-se aos debates preliminares, aos testemunhos pré-normativos, os quais, porém, tambémtêm de ser interpretados! Se as palavras do legislador, unidades em que se expressa a consciência, representassem ideias, elas se fundariam num vazio, refletindo certo arbítrio, o que torna o critério da interpretação verdadeira inexplicável. b) a teoria objetivista se assemelha à teoria realista. Pode-se dizer, então, que não se vai primeiro à própria realidade, aos fatores objetivos reais e atuais, para depois atingir o sentido prescritivo das palavras da norma, pois antes se alcança o sentido normativo desta (interpreta-se) e só depois se verificam os (normativamente) relevantes fatores reais. Em segundo lugar, existe nessa teoria o mesmo pressuposto indemonstrável que encontramos na teoria realista da tradução. Supõe-se, pois, que a realidade contém uma essência que tem um sentido normativo independente do próprio discurso normativo e isto não é verdadeiro.
5.2 MÉTODOS E TIPOS DOGMÁTICOS DE INTERPRETAÇÃO
Os chamados métodos de interpretação são, na verdade, regras técnicas que visam à obtenção de um resultado. Com elas procuram-se orientações para os problemas de decidibilidade dos conflitos. Esses problemas são de ordem sintática, semântica e pragmática. Embora não possamos circunscrevê-los rigorosamente no Direito, vamos tomá-los esquematicamente para a exposição.
5.2.1.1. Interpretação gramatical, lógica e sistemática 
- A orientação para enfrentar os problemas sintáticos constitui o objeto dos métodos sistemáticos. Quando se enfrenta uma questão léxica, a doutrina costuma falar em interpretação gramatical. Parte-se do pressuposto de que a ordem das palavras e o modo como elas estão conectadas são importantes para obter-se o correto significado da norma. Porém, uma interpretação dita gramatical, não se reduz a meras regras da concordância, mas exige regras de decidibilidade. No fundo, pois, a chamada interpretação gramatical tem na análise léxica apenas um instrumento para mostrar e demonstrar o problema, não para resolvê-lo. A letra da norma, assim, é apenas o ponto de partida da atividade hermenêutica.
- Quando enfrentamos problemas lógicos, a doutrina costuma falar em interpretação lógica. O que se disse para a interpretação gramatical pode ser repetido nesse caso. Trata-se de um instrumento técnico, inicialmente a serviço da identificação de inconsistências. Parte-se do pressuposto de que a conexão de uma expressão normativa com as demais do contexto é importante para a obtenção do significado correto. Não obstante as exigências de compatibilidade lógica, ocorrem, no entanto, inconsistências quando, às vezes, num mesmo diploma legal, usa-se o mesmo termo em normas distintas com consequências diferentes. Fere-se o princípio lógico da identidade
- Por fim, quando se enfrentam as questões de compatibilidade num todo estrutural, falemos em interpretação sistemática (stricto sensu). A pressuposição hermenêutica é a da unidade do sistema jurídico do ordenamento. Há aqui um paralelo entre a teoria das fontes e a teoria da interpretação. Correspondentemente à organização hierárquica das fontes, emergem recomendações sobre a subordinação e a conexão das normas do ordenamento num todo que culmina (e principia) pela primeira norma-origem do sistema, a Constituição.
A primeira e mais importante recomendação, nesse caso, é de que, em tese, qualquer preceito isolado deve ser interpretado em harmonia com os princípios gerais do sistema, para que se preserve a coerência do todo. Portanto, nunca devemos isolar o preceito nem em seu contexto (a lei em tela, o código: penal, civil etc.) e muito menos em sua concatenação imediata (nunca leia só um artigo, leia também os parágrafos e os demais artigos).
5.2.1.2. Interpretação histórica, sociológica e evolutiva 
Os problemas que tentamos didaticamente circunscrever como de ordem sintática mostram, aqui e ali, questões de ordem semântica. Num sentido restrito, os problemas semânticos referem-se ao significado das palavras individuais ou de sentenças prescritivas. Aqui aparecem as questões de ambiguidade e vagueza. A hermenêutica pressupõe que tais significados são função da conexão fática ou existencial em consideração ao conjunto vital cultural, político e econômico que condiciona o uso da expressão.
A teoria dogmática da interpretação costuma distinguir entre conceitos indeterminados, conceitos valorativos e conceitos discricionários.
Diz-se, assim, que o conceito indeterminado sempre admite uma determinação, isto é, conceitos indeterminados são, presumidamente, determináveis, o que acontece por um processo de refinamento progressivo de seu sentido. A indeterminação está na extensão imprecisa de seu campo de referência objetiva, ou seja, quais os objetos abarcados (denotados) pelo conceito. O conceito é indeterminado se não é possível, de antemão, precisar tais objetos.
Já os conceitos valorativos são os que manifestam uma imprecisão de sentido não quanto aos objetos abarcados (denotação), mas quanto à intenção (conotação), isto é, uma imprecisão quanto aos atributos que os definem. Conceitos valorativos admitem e exigem, no campo jurídico, a busca de certa objetividade dos valores neles presentes, o que ocorre pela referência ao contexto social em que são utilizados.
Por fim, conceitos discricionários são os que manifestam uma imprecisão que nunca se fecha genericamente, mas que se renova em cada uso concreto. Por isso não admitem estandardização nem conotação objetiva, mas deixam ao intérprete, de caso para caso, uma opção que renovadamente se coloca toda vez que confrontados com a realidade. No campo jurídico, o modo pelo qual se controla o conceito discricionário não é a relação gênero/espécie (utilizável para os conceitos indeterminados) mas a relação meio/fim: razoabilidade ou proporcionalidade da opção, em cada caso.
Para enfrentar problemas gerados por tais conceitos, a hermenêutica jurídica vale-se dos chamados métodos sociológicos e históricos, bem como dos métodos teleológicos e axiológicos, tratados no item 5.2.1.3.
Podemos distinguir entre a interpretação sociológica e a histórica conforme se leve em consideração a estrutura momentânea da situação ou sua gênese no tempo. Na prática, porém, ambos se interpenetram. Daí, às vezes, a ideia de uma interpretação histórico-evolutiva. É preciso ver as condições específicas do tempo em que a norma incide, mas não podemos desconhecer as condições em que ocorreu sua gênese. 
Para o levantamento das condições históricas, recomenda-se ao intérprete o recurso aos precedentes normativos, isto é, de normas que vigoraram no passado e que antecederam à nova disciplina para, por comparação, entender os motivos condicionantes de sua gênese.
Já o levantamento das condições atuais deve levar o intérprete a verificar as funções do comportamento e das instituições sociais no contexto existencial em que ocorrem.
5.2.1.3. Interpretação teleológica e axiológica
Temos, por fim, o que podemos didaticamente circunscrever como problemas pragmáticos stricto sensu. Todo ato interpretativo tem primariamente uma qualidade pragmática, isto é, deve ser entendido numa relação de comunicação entre emissores e receptores das mensagens normativas. Não obstante, as relações entre os comunicadores colocam, num sentido estrito, problemas peculiares que a hermenêutica enfrenta por meio dos métodos teleológico e axiológico.
As questões pragmáticas (stricto sensu) de interpretação reportam-se mormente à carga emocional (valorativa) dos símbolos. É preciso neutralizar os conteúdos, o que não quer dizer eliminar a carga valorativa, mas controlá-la. E preciso generalizar de tal modo esses valores que eles passem a expressar "universais do sistema". Esta neutralização da carga emocional pode ser obtida por meio da atribuição de propósito às normas. Postula-se que a ordem jurídica, em sua totalidade, seja sempre um conjunto de preceitos para a realização da sociabilidade humana.
A doutrina costuma distinguir, assim, os princípios como fins imanentes da ordem jurídica e social e reguladores teleológicos da atividade interpretativa, das chamadasregras gerais. Ambos se caracterizam por sua generalidade, mas a generalidade dos princípios é vista como de maior grau: os princípios valem para séries indefinidas de casos, enquanto as regras valem para séries definidas.
Em suma, a interpretação teleológica e axiológica ativa a participação do intérprete na configuração do sentido. Seu movimento interpretativo, inversamente ao da interpretação sistemática que também postula uma cabal e coerente unidade do sistema, parte das consequências avaliadas das normas e retoma para o interior do sistema. É como se o intérprete tentasse fazer com que o legislador fosse capaz de mover suas próprias previsões, pois as decisões dos conflitos parecem basear-se nas previsões de suas próprias consequências. Assim, entende-se que, não importa a norma, ela há de ter, para o hermeneuta, sempre um objetivo que serve para controlar até as consequências da previsão legal (a lei sempre visa aos fins sociais do direito e às exigências do bem comum, ainda que, de fato, possa parecer que eles não estejam sendo atendidos).

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