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CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS* SILVIA HELENA PANISSET SÁ RÊoo** 1. Conceito 1. Conceito; 2. Função; J. Princípios fundamentais; 4. Elementos e requisitos do contrato; 5. Formação do contrato; 6. Classificação dos contratos Contrato é o acordo de vontades que faz nascer obrigações. f. a fonte por excelência das obrigações no direito brasileiro. 2. Função o contrato é o negócio jurídico que tem por objetivo criar, modificar, trans- ferir ou extinguir obrigações (art. 81 do Código Civil). A função do contrato é fazer circular riquezas através das obrigações que proporcionam a troca de bens e a prestação de serviços. Trata-se, portanto, de um instrumento básico da autonomia privada e o pressuposto de qualquer sistema econômico. Quanto à estrutura, isto é, quanto a sua constituição, o contrato apresenta basicamente duas partes: a) o chamado preâmbulo, onde se indicam as pessoas que estabelecem o con- trato; b) o contexto onde essas partes estabelecem as regras desse contrato em dis- posições que se chamam cláusulas. 3. Princípios fundamentais o direito contratual, isto é, o conjunto das regras jurídicas que disciplinam os contratos no direito brasileiro é formado basicamente por normas jurídicas de natureza supletiva ou dispositiva. Sua aplicação deve observar os seguintes princí pios: - autonomia da vontade; * Apresentado ao Curso de Direito Contratual, promovido pelo Centro de Atividades Didá- ticas do INDIPO. Mereceu nota máxima e está sendo publicado por decisão do Conselho Editorial da Revista de Ciência Política. ** Advogada. R: C. pol., Rio de Janeiro, 31(1):92-8, jan./mar. 1988 consensualismo; força obrigatória; boa-fé; relatividade nos efeitos. 3.1 Autonomia da vontade Significa que em matéria contratual predomina a vontade das partes que se manifesta no poder de contratar, na escolha do contrato, na escolha do con- teúdo do contrato e na escolha da pessoa com quem contratar. Dada autono- mia é, porém, limitada pela ordem pública e pelos costumes, bem como pela interrupção do Estado através do chamado dirigismo, que é o conjunto de meios de intervenção do Estado no campo da autonomia privada. Essa intervenção se faz, quer através da obrigação, quer através de possi- bilidade de revisão judicial dos contratos. 3.2 Consensualismo Significa que na maioria dos casos basta o acordo de vontades para fazer nascer o contrato. Somente nos contratos reais (comodato, mútuo e depósito) é necessária a entrega de uma coisa para que o contrato exista. 3.3 Força obrigatória Significa que, uma vez concluído, o contrato passa a ter força de lei entre as partes contratantes. 3.4 Boa-fé É o princípio segundo o qual as partes contratantes devem proceder se- gundo os ditames da lealdade. 3.5 Relatividade nos efeitos É o princípio segundo o qual o contrato só produz efeito entre as partes contratantes, não afetando terceiros. 4. Elementos e requisitos do contrato Como todo ato jurídico, o contrato exige, para sua formação, determinados elementos, e para sua validade, determinados requisitos. Tais elementos são: manifestação de vontade, objeto e forma. E os requisitos são: capacidade do agente, licitude do objeto e legalidade da forma. Classificação dos contratos 93 5. Formação do contrato o contrato se forma quando se verifica o acordo de vontades acerca dos seus elementos. Na formação de um contrato distinguem-se três fases distintas: as negociações preliminares, a proposta e a aceitação, sendo ainda imposto o lugar em que se dá essa formação. Negociações preliminares, também chamadas tratativas, compõem a fase em que as pessoas que desejam contratar discutem acerca das condições do con- trato. Não geram obrigações, a não ser na hipótese de comportamento do- loso ou culposo de um dos contratantes. Proposta é a declaração receptiva de vontades dirigida à pessoa com quem o declarante deseja contratar. Nos contratos em que a proposta e a resposta são por via epistolar, há que distinguir o momento em que um contrato se aperfeiçoa. A respeito da corres- pondência epistolar, em matéria de proposta e da aceitação dos contratos exis- tem quatro teorias: 1. Teoria da declaração, segundo a qual o contrato se aperfeiçoa no momento em que o oblato declara concordar com os respectivos termos. 2. Teoria da expedição, segundo a qual o contrato se aperfeiçoa no momento em que o oblato expede a resposta. 3. Teoria da recepção, segundo a qual é o momento em que a resposta é re- cebida que caracteriza os contratos. 4. Teoria da cognição, segundo a qual o contrato está fechado no momento em que o proponente recebe a resposta do oblato. 6. Classificação dos contratos A existência de aspectos comuns a diversas espeCles de contratos toma con- veniente a sua classificação. Podemos, assim, dividir os contratos em: 1. contratos unilaterais e contratos bilaterais; 2. contratos onerosos e contratos gratuitos; 3. contratos consensuais e contratos reais; 4. contratos comutativos e contratos aleatórios; 5. contratos de execução imediata, diferida e sucessiva; 6. contratos civis e contratos mercantis; 7. contratos preliminares e contratos definitivos. 6.1 Contratos unilaterais e contratos bilaterais Todos os contratos são bilaterais na sua formação, visto que exigem duas ou mais pessoas colocadas em posições antagônicas para que se estabeleça o acordo de vontades que caracteriza o contrato. No entanto, eles podem ser unilaterais e bilaterais, conforme produzam efeitos para uma ou ambas as partes. São 94 R.C.P. 1/88 contratos bilaterais: a compra e venda, a locação, a troca e a empreitada, o transporte, etc. São contratos unilaterais: a doação, o mútuo, o depósito. A importância desta distinção reside no fato de que determinados institutos só existem nos contratos bilaterais, tais como a cláusula resolutiva tácita, a execução do contrato não-cumprido: exceptio non adimpleto contractus, os vÍ- cios redibitórios, evicção, as arras ou sinal. 6.2 Contratos onerosos e contratos gratuitos Contratos onerosos são aqueles em que existem vantagens e ônus para am- bas as partes. Contratos gratuitos são aqueles em que existem vantagens apenas para uma das partes e ônus para outra. Exemplo: doação, mútuo. 6.3 Contratos consensuais e contratos reais Contratos consensuais são aqueles que se formam com um simples acordo de vontades. Exemplo: compra e venda, doação, locação. Contratos reais são aqueles que além do acordo exigem a entrega de uma coisa. Exemplo: como- dato, mútuo e depósito. 6.4 Contratos comutativos e contratos aleatórios Os comutativos são aqueles em que cada uma das partes conhece, no mo- mento da celebração, a extensão de suas vantagens e desvantagens. Contratos aleatórios são aqueles em que, na celebração, uma das partes não sabe a ex- tensão de suas obrigações. 6.5 Contratos de execução imediata, diferida e sucessiva Denomina-se de execução imediata aquele em que o cumprimento da obri- gação se faz no momento da celebração. O de execução diferida é aquele em que o cumprimento da obrigação é posterior à celebração do contrato. O de execução sucessiva ou continuada é aquele cujo cumprimento das obri- gações é protraído no tempo. 6.6 Contratos civis e contratos mercantis Contratos civis se caracterizam pela onerosidade, incidência sobre bens mó- veis, enquanto os mercantis são de provas mais fáceis. Contratos civis são o oposto dos mercantis. 6.7 Contratos preliminares e contratos definitivos Contratos preliminares são aqueles que têm por objeto a celebração de um contrato definitivo. Já os definitivos fazem nascer, para ambas as partes, obri- gações. São exemplos de contratos preliminares: promessa de venda unilateral, opção e a promessa de venda bilateral. Classificação dos contratos 95 A importância da classificação dos contratos reside no fato de que existem determinados institutos que só se aplicam a determinadas espécies contratuais. Assim, somente noscontratos bilaterais é que se aplicam: 1. Exceptio non adimpleti contractus (exceção do contrato não-cumprido) - significa a possibilidade que tem a parte de um contrato bilateral de recusar- se a cumprir a sua obrigação enquanto a outra parte não cumprir a sua (art. 1.092 do Código Civil). 2. Cláusula resolutiva tácita - é a que presume existir em um contrato obri- gação da outra parte. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a res- cisão do contrato (art. 1.092, parágrafo único, do Código Civil). 3. Vícios redibitórios - são os defeitos ocultos da coisa que a tornam im- prestável ou lhe diminuem o valor. Quanto à sua natureza, os vícios redibitórios consistem numa garantia legal aos contratos translativos de domínio ou de uso; baseia-se no princípio da boa-fé, que deve existir entre as partes contratantes. Os vícios redibitórios diferem do erro essencial porque este é de natureza subjetiva, enquanto aqueles são de natureza objetiva. Além disso, os prazos prescricionais respectivos são diferentes. Por outro lado, a existência de erro dá origem a uma ação de anulação do contrato, enquanto o vício redibitório dá origem à ação redibitória destinada a desfazer o contrato, ou a uma ação esti- matória destinada a pedir abatimento do preço do objeto (art. 1.101 do Có- digo Civil). Para que se configure o vÍCio redibitório é preciso que o defeito seja oculto e que exista no momento do contrato, além de ser desconhecido pelo com- prador (art. 1.106 do Código Civil). Evicção e arras - evicção é a perda do direito de propriedade ou de posse em virtude de uma sentença que atribui esse direito a outra pessoa. A pessoa que sofre os efeitos da evicção chama-se evicto, e a que indevidamente lhe cause prejuízo chama-se evictor. A evicção possibilita à pessoa prejudicada - isto é, o evicto - mover uma ação de perdas e danos contra o evictor. Todavia, para que isso seja pos- sível é necessário que na ação de reivindicação o réu peça ao juiz que o pro- cesso seja comunicado à pessoa que lhe vendeu o objeto (denunciação à lide). O evicto r é obrigado a indenizar o evicto pelos prejuízos a ele causados com a evicção, e que podem consistir na obrigação de devolver: 1. o preço; 2. o valor dos frutos que o evicto foi obrigado a indenizar e ainda eventuais honorários de advogados e custas judiciais em que o evicto possa ter sido con- denado na ação de evicção (arts. 1.107 e 1.109 do Código Civil). Arras ou sinal são quantias dadas como presunção da realização do con- trato. As arras ou sinal consistem normalmente em dinheiro, podendo serem abatidas do preço final ou devolvidas integralmente. 96 R.C.P. 1/88 As arras podem ser de duas espécies: 1. arras confirmatórias, quando se destinam apenas a confirmar a realização do contrato; 2. arras penitenciais, quando além de confirmarem o contrato permitem, toda- via, o arrependimento de ambas as partes (arts. 1.094 e 1.095 do Código Civil). Riscos significam o prejuízo decorrente da perda ou deterioração da coisa objeto do contrato. Em princípio aplica-se a regra res peri domino (a coisa pe- rece para o dono). Essa regra nos contratos bilaterais enuncia-se do seguinte modo: a coisa perece para o devedor (res peri delitoris). E, nos contratos uni- laterais, a coisa perece para o credor (res peri creditoris). Efeitos do contrato. O principal efeito do contrato é criar obrigações para uma ou para ambas as partes. Em relação ao modo como se manifestam, exis- tem efeitos fundamentais: 1. princípio da obrigatoriedade, segundo o qual, uma vez firmado o contrato, é de cumprimento a obrigação para ambas as partes sob pena de a parte ina- dimplente responder por perdas e danos; 2. princípio da intangibilidade, segundo o qual, uma vez firmado o contrato, suas disposições são insuscetíveis de mudança, a não ser mediante acordo de ambas as partes através de um instrumento chamado aditamento ou termo aditivo; 3. princípio da relatividade significa que, em princípio, o contrato produz obri- gações apenas entre as partes que nele intervêm. Existem, todavia, alguns con- tratos que são exceção a esse princípio, como, por exemplo, a enipenação a favor de terceiro, que é o contrato em que uma pessoa convenciona a outra de- terminadas vantagens a favor de um terceiro (arts. 1.090, 1.099 e 1.100 do Código Civil). Ocorre a extinção dos contratos de três formas: 1. resilição; 2. resolução; 3. rescisão. • Resilição significa voltar atrás e pode ser feita unilateral ou bilateral- mente. No segundo caso, faz-se através do distrato e, no primeiro, implica nor- malmente o pagamento de multa. • Resolução é a extinção de um contrato quando ocorre inadimplemento de uma ou de ambas as partes. Se existir cláusula resolutiva expressa, não é preciso prévia retificação judicial; todavia, no caso de uma cláusula tácita, é necessária a prévia notificação sob pena de impossibilidade da ação de resolução. • Rescisão é a extinção do contrato em que exista lesão, isto é, grande desequilíbrio entre os direitos de ambas as partes devido a incapacidade, ima- turidade ou até situação de perigo de uma das partes. Cláusula penal é a cláusula acessória aos contratos em que se estabelece uma sanção para a parte que descumprir suas obrigações. Quanto à sua natureza, Classificação dos contratos 97 é uma disposição acessória de modo que sua existência, qualidade e quantidade dependem do contrato principal. Sua finalidade é estabelecer previamente o valor das perdas e danos em que a parte inadimplente seria condenada pelo fato de descumprir o contrato e causar prejuízo (art. 915). A cláusula penal destina-se a fixar perdas e danos para o caso de total inadim- plemento ou para o de inadimplemento relativo, isto é, atraso no cumprimento da obrigação. No primeiro caso chama-se cláusula penal compensatória e des- tina-se a substituir a obrigação principal. Nesse caso, diz-se que a cláusula penal é alternativa, isto é, o devedor deve cumprir sua obrigação ou pagar a cláusula penal. Todavia, o direito de escolha cabe ao credor (art. 918 do Código Civil). Cláusula penal moratória é a que se destina ao pagamento de perdas e danos decorrentes do atraso do devedor no cumprimento de sua obrigação. Diferen- temente da cláusula penal compensatória, que é alternativa, a moratória é cumulativa, isto é, o código permite que o credor exija o pagamento da cláu- sula moratória mais o da cláusula compensatória (art. 919). O valor da cláusula penal pode igualar-se, mas não pode ser superior ao valor da obrigação principal, com exceção do mútuo. O Decreto n.<? 22.626/33 determina que o valor da cláusula penal não pode ser superior a 10% do valor da obrigação principal, sob pena de configurar crime de usura. Além disso, essa cláusula penal também se destina a cobrir os honorários de advogado e os custos devidos. Qualquer que seja o valor da cláusula penal, é permitido ao juiz reduzi-la no caso de o devedor já ter cumprido parcial- mente a obrigação principal (art. 1.024 do Código Civil). Compra e venda Contrato de compra e venda é aquele em que uma das partes se obriga a transferir a propriedade de um bem, e a outra a pagar o respectivo preço. A eficácia do contrato de compra e venda no direito brasileiro é apenas obriga- cional, no sentido de que crie apenas obrigações, sem transferir a propriedade; esta se transfere por tradição, que nos imóveis toma o nome de transcrição (art. 1.122 do Código Civil). Características do contrato de compra e venda: 1. bilateral; 2. consensual; 3. oneroso; 4. cumulativo ou aleatório; 5. de execução imediata, diferida e sucessiva. Como todo negócio jurídico, a compra e venda exige agente capaz, objeto lícito e forma legal. Exige _ ainda, como elementos típicos, o consentimento e o preço. Além da capacidade de fato, isto é, aptidão para a prática de atos da vida diária, a compra e venda exige também a legitimação, que é a posição jurídica da pessoa em face de determinada relaçãojurídica, ou de forma mais simples, a aptidão para a prática de determinado ato. 98 R.C.P. 1/88
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