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Quase 90 multas foram aplicadas nos últimos seis anos Maquiagem de produtos Editorial março e abril 2008 | Revista Procon-SP 1 D esde a estabilidade econômica, com a introdução do Plano Real, alguns fornecedores parecem ter encontrado a solução para seus problemas. Ao invés de aumentar os preços – um dos primeiros passos para afu- gentar o consumidor –, optaram em diminuir a quantidade do produto. Para a operação não gerar desgaste na ponta final, davam um verdadeiro banho de loja na nova embalagem. A prática, que prejudica a concorrência econômica e o consumidor, foi apelidada de “maquiagem de produtos”. A Fundação Procon-SP foi uma das instituições pioneiras neste trabalho. Mas engana-se, como se poderá ver na reportagem de capa, quem acredita que se trata de posturas do passado. O retoque atinge os mais diversos segmentos e aparece em itens de higiene, produtos alimentícios, de limpeza e até acessórios de informática. E o pior: uma pessoa desavisada pode até imaginar que está comprando mais pelo mesmo preço. Problemas com a “embalagem” também é o assunto da entrevista desta edição. A socióloga Gisela Taschner alerta para os perigos que a nova identidade do cidadão ganhou nas grandes cidades. “Símbolos de poder aquisitivo começam a se tornar muito importantes para a pessoa se sentir aceita”, diz. Para ela, o próprio conceito de cidadania está sofrendo mudanças dentro da nova etiqueta social. “A cidadania passa necessariamente pelo consumo.” E é neste contexto que surge um novo distúrbio de comportamento que atinge um número crescente de consumidores. Trata-se da oniomania, um descontrole de comprar com sintomas parecidos com transtornos como ansiedade ou dependência de substâncias psicoativas. A REVISTA DO PROCON-SP participou de uma reunião do grupo de auto-ajuda Devedores Anônimos (DA). Se não tomar o “primeiro gole” ou acender o “primeiro cigarro” são desafios para pessoas que procuram ajuda, como trabalhar com a questão em uma sociedade onde comprar é uma prática cada vez mais incentivada? Já o incentivo ao consumo consciente é abordado, nas próximas páginas, em duas frentes. Seja no ato de comprar, como no fim que será dado após o uso. Alguns artigos produzidos com madeira têm um selo que comprova que a matéria-prima foi retirada de forma não agressiva ao meio ambiente. E para aqueles que não sabem o que fazer com o óleo de cozinha após o uso, existe um procedimento para reprocessar o produto e transformá-lo em sabão. Francisco Itacarambi Editor-chefe Tamanho não é documento 16 Revista Procon-SP | março e abril 2008 Capa Por Felipe Neves e Francisco Itacarambi Presente de grego Q uando se fala em disfarce, logo se pensa em detetives, agentes secretos, espiões e, até, mafiosos. Óculos escuros, bigodes falsos, perucas – essas pessoas fazem qualquer coisa para não ser reconhe- cidas, para passar despercebidas. É justamente neste ponto que o termo pode ser emprestado a uma prática utilizada por alguns fornecedores pou- co preocupados com o consumidor. Não vale o quanto Por Felipe Neves e Francisco Itacarambi redução do valor final, e não avisar ade- quadamente o consumidor. “O que pode ocorrer numa mudan- ça repentina da quantidade do produ- to, com a manutenção do preço, é um aumento disfarçado”, define o pro- motor de Justiça do Consumidor João Lopes Guimarães Júnior. Em respeito à transparência e boa-fé, princípios que devem nortear as relações de consumo e estão expressamente previstos na Lei pesa Trata-se da chamada “maquiagem de produtos”. O termo não é uma refe- rência ao embelezamento das embala- gens. Muito pelo contrário – é, na ver- dade, uma alusão à tentativa, por parte de certos fornecedores, de disfarçar o aumento do preço de seus produtos. Note que aumentar preço de um pro- duto faz parte do jogo e é uma decisão empresarial. O problema está em dimi- nuir a quantidade, sem a proporcional março e abril 2008 | Revista Procon-SP 17 Capa Leonardo Tote/SJDC 8.078/90, cabe ao fornecedor, nessas hipóteses, deixar clara a situação para o consumidor. Por exemplo, um item, que costu- ma ter 100g, é vendido no mercado por R$ 10. Todo mundo que costuma comprá-lo sabe disso. De repente, o peso da unidade muda para 90g, sem que o consumidor seja alertado. O que deveria ocorrer? Diminuir o pre- ço, é claro. Mas o que ocorre de fato? Ele é mantido exatamente igual. Desse modo, o cidadão sequer se dá conta de que está pagando mais caro. E o pior, as novas embalagens podem até iludir o consumidor de que o produto se manteve igual ou, ainda, a quanti- dade foi aumentada. “Há casos de produtos que após a diminuição de sua quantidade aparen- tam ter ainda mais conteúdo do que sua versão anterior, resultado muitas vezes obtido com a ajuda de especia- listas em design, capazes de produzir uma verdadeira ilusão de ótica com as embalagens de determinados pro- dutos”, comenta Paulo Arthur Góes, diretor de Fiscalização do Procon-SP. Cronologia O termo “maquiagem de produ- tos” não tem sua paternidade conhe- cida. Foi a imprensa ao adotá-lo de forma ampla que conferiu o status que possui hoje. E não poderia ter sido mais acertada a escolha. Assim como uma pessoa que recorre ao uso de cremes e outros produtos cosméticos para es- conder rugas ou sinais indesejados em seu rosto, passando uma impressão de jovialidade, o fornecedor, usando de mecanismos extremamente sutis, pro- curava encobrir um aumento de preço. A estratégia até que ia bem, até que denúncias de consumidores che- garam à Diretoria de Fiscalização da Fundação Procon-SP. Foi constatado que empresas, as quais juntas deti- nham parcela significativa do mercado, haviam reduzido, ao mesmo tempo, a metragem dos rolos de papel higiênico em suas embalagens. O produto pas- sou de 40 metros para exatos 30 me- tros por rolo, ou seja, uma diminuição de 25% do produto final. Contudo, tal redução não havia sido acompanhada pela respectiva diminuição de preço. Existia um outro senão. Um con- sumidor desavisado não notaria a di- ferença entre as embalagens. “É inte- ressante destacar que, não obstante à diminuição de quantidade, as embala- gens desses produtos mantinham exa- tamente o mesmo tamanho, algo que, como se verificou mais tarde, era con- seguido por ajustes nas máquinas que realizavam a colocação do papel no tubo”, explica Góes. O Procon-SP apli- cou duas multas, que já foram pagas, de R$ 176 mil e R$ 226 mil, na época que identificou a estratégia. Após o caso, começaram a ser identificados problemas em produtos de diversos segmentos. A listagem inclui pacotes de bolacha, pacotes de fralda, latas de extrato de tomate,cal- do em cubo para tempero, frasco de adoçante, shampoo, palitos de fósfo- ro, iogurte, chocolate, medicamentos, achocolatados, leite em pó, suco em pó, sabonete, complemento alimentar, salgadinhos, doce de leite e, acredite, até cartuchos para impressora. Apesar de não compreender to- dos os produtos, a legislação brasileira determina uma padronização. A regu- lamentação praticada pelo Inmetro, desde o início da década de 90, está Ano Sanções administrativas Valor 2002 06 multas R$ 8, 5 milhões 2003 a 2005 71 multas R$ 25,5 milhões 2006 03 multas R$ 500 mil 2007 03 multas R$ 1,4 milhão 2008 06 multas R$ 1,8 milhão Total 89 multas R$ 37, 8 milhões Multas aplicadas por maquiagem de produtos O que pode ocorrer numa mudança repentina da quantidade do produto, com a manutenção do preço, é um aumento disfarçado João Lopes Guimarães Júnior 18 Revista Procon-SP | março e abril 2008 Capa alinhada com as recomendações pra- ticadas em outros países objetivando, de um lado, a proteção do consumidor e, de outro, a leal concorrência entre produtores. Desta forma, o produto fei- jão, por exemplo, não pode ser vendido em uma embalagem de 127 gramas – o chamado quebradinho. O produto deve ser comercializado em pacotes de 100g, 200g, 500g, 1 kg, 2 kg ou 5 kg. Tendências Especialistas apontam que foi a estabilidade econômica advinda do Plano Real que provocou alterações profundas no mercado. Antes habi- tuados a uma sistemática de elevação de preços – dia de pagamento era dia de supermercado –, fornecedores em geral tiveram que, da noite para o dia, adaptar-se à nova realidade econômi- ca. A inflação continuava a existir, mas com índices irrisórios se comparados ao período anterior. O controle de preços foi funda- mental para o amadurecimento do consumidor, agora mais preparado para efetuar comparações e pesquisas, e que não via com bons olhos empre- sas que tinham por hábito elevar seus preços acima dos índices inflacioná- Alimentos, cosméticos, produtos de higiene pessoal, entre outros, reque- rem muita atenção do consumidor. É importante observar se os produtos que costuma adquirir têm sofrido re- dução de quantidade. E, neste caso, se estão sendo prestadas informa- ções claras e ostensivas na respec- tiva embalagem sobre a quantidade anteriormente comercializada e a atual, na unidade de medida cor- respondente (massa, volume, etc), e o respectivo percentual de redu- ção. Faltando qualquer uma dessas informações a melhor coisa a fazer é denunciar ao órgão de defesa do consumidor municipal ou estadual, que adotará as providências admi- nistrativas cabíveis em caso de ser comprovada a denúncia. Fiscalize rios. Mas como toda ação causa uma reação, houve quem buscasse atalhos para, senão driblar, ao menos mitigar os efeitos trazidos por esse novo pa- radigma. É possível distinguir três fases da maquiagem de produtos. Em um pri- meiro momento, em meados dos anos 90, constata-se claramente a intenção de ludibriar o cidadão. Quando os órgãos de defesa do consumidor se atentaram à então nova prática abu- siva do mercado, houve um choque com a maneira ostensiva pela qual al- gumas empresas atuavam. Isto é, não apenas havia uma di- minuição na quantidade do produto como também, ao mesmo tempo, o fornecedor mudava a embalagem: a caixa de determinado sabão em pó, por exemplo, ficava maior enquanto o conteúdo havia sido reduzido. A inten- ção era clara: causar uma falsa sensa- ção ao consumidor. Na seqüência, aparece a chamada “maquiagem clássica” – fim dos anos 90 e início da década de 2000. Ocorre quando o fornecedor não usa mais os “truques de ilusionismo”, mas conti- nua sem informar o consumidor sobre mudanças na quantidade. Nesse caso, a apresentação do produto se man- tém idêntica. É como se nada tivesse acontecido e não se fala no assunto. Por fim, já a partir de 2002, apare- ce a terceira e última fase: a da “infor- mação miudinha”. Aqui, os fornece- dores já “se convenceram” (por meio de norma) de que precisam alertar o consumidor sobre a mudança. No en- tanto, fazem de forma bem discreta, para usar outro eufemismo. São aque- las famosas letras pequeninas nos ró- tulos das embalagens, em cores pou- co chamativas e que absolutamente ninguém percebe num primeiro olhar. Promotor defende que casos sejam analisados sob a ótica do direito coletivo Leonardo Tote/SJDC março e abril 2008 | Revista Procon-SP 19 Capa É o chamado “para inglês ver”. Para Guimarães Júnior, trata-se de “tática maliciosa” porque, a rigor, não é veiculada uma informação erra- da. “A nova quantidade está expressa ali, mas evidentemente a estratégia do fornecedor, nesses casos, é contar com a distração do consumidor, que não vai perceber que aquele produto tem 10% ou 20% menos”, diz. Apesar de ainda não ser o ideal, essa linha cronológica da maquiagem de produtos aparenta uma evolução em benefício do cidadão. Aquela pos- tura mais ostensiva da primeira fase não é mais possível nos dias de hoje. Na visão do diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), Ricardo Morishita, o trabalho do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) foi fundamental no combate desta prática abusiva e que prejudica todo o mercado. O diretor do DPDC cita, em espe- cial, o trabalho da Fundação Procon-SP, que foi o primeiro órgão a detectar o dispositivo da maquiagem e o quanto ele poderia ser danoso não apenas ao consumidor, mas para toda a socieda- de. “O Procon-SP foi quem levantou a bandeira de um mecanismo extrema- mente sofisticado que se incorpora no dia-a-dia do cidadão. A agenda eco- nômica também passa pela defesa do consumidor”, ressalta. A legislação brasileira define uma padronização para certos produtos. Veja alguns exemplos: PRODUTOS PADRONIZAÇÃO Açúcares 100g, 200g, 250g, 500g, 1kg, 2kg e 5kg. Livre abaixo de 100g e acima de 5kg Álcool 100ml, 200ml, 500ml, 1, 2, 5, 10, 20, 50, 100 e 200 litros Arroz 100g, 125g, 200g, 250g, 500g,1kg, 2kg e 5 kg. Livre acima de 5kg Azeite de oliva 100ml , 200ml, 250ml, 500ml, 750ml ou cm3 e 1 litro. Livre abaixo de 100ml ou cm3 e acima de 1 litro. Café em grão ou moído, tostado ou torrado 250g, 500g e 1kg. Livre: Abaixo de 200g e acima de 1kg. Cigarros Maço ou carteira de 20 cigarros Farinha de mandioca 250g, 500g, 1 kg e 2kg. Livre: abaixo de 250g e acima de 2 kg Farinha de trigo 500g, 1kg, 2kg e 5kg. Livre: acima de 5kg Feijão 100g, 200g, 500g, 1 kg, 2 kg e 5 kg. Livre: acima de 5kg Nada de “quebradinhos” Empresas utilizam magos do design para iludir o consumidor, critica Góes Divulgação 20 Revista Procon-SP | março e abril 2008 Capa Exemplos de alterações Nova regra Foi justamente esse trabalho de- senvolvido nos últimos anos que au- xiliou a formatação da Portaria nº 81, de janeiro de 2002, que, com base nos preceitos gerais do Código de Defesa do Consumidor, estabelece regulamen- tação específica para a informação aos consumidores sobre mudança de quan- tidade de produto. No mesmo ano, o Poder Legislativo paulista promulgou a Diminuição no extrato de tomate de 370 gramas para 350 gramas. Diminuição da metragem do rolo de papel higiênico de 40m para 30m. Diminuição da quantidade do biscoito wafer de 200g para 150g. Diminuição no pacote Extra Grande de 10 fraldas para 08 unidades. Diminuição do pote de sardinha de 135 gramas para 130 gramas. Diminuição do frasco de achocolatado de 500 gramas para 400 gramas. Lei Estadual n° 11.078, que trata da in- formação na embalagem de produtos com diminuição de quantidade. Com as novas normas em vigor, os fornecedores passaram a ser obrigados a informar que houve a alteração e qual era a quantidade anterior, por meio de “mensagem específica no painel princi- pal da respectiva embalagem, em letras de tamanhoe cor destacados”. A infor- mação deve permanecer no produto ao menos por três meses. Em outras palavras, a nova legisla- ção chegou para ser o terror dos de- partamentos de marketing das empre- sas que adotam a conduta. E a idéia foi justamente essa: pode até alterar, contanto que arque com a possibilida- de de o consumidor preferir comprar o item do concorrente, que eventual- mente traz um custo-benefício melhor. “A empresa não quer informar porque não quer que o consumidor compre de outro. Se ela é obrigada a informar, vai ter que pensar duas vezes se vai dimi- nuir ou não, sob pena de perder aquele consumidor”, explica Morishita. Desde 2002, o órgão federal já aplicou mais de R$ 37 milhões em multas contra fornecedores que des- respeitam a resolução. O pico ocorreu entre 2003 e 2005, quando 71 casos foram concluídos, totalizando mais de R$ 25 milhões. Só em 2008, já foram aplicadas seis sanções pecuniárias (to- tal de R$ 1.791.139,00). Os processos mais recentes foram contra as empresas Pepsico do Brasil Ltda. e Masterfoods Brasil Alimentos Ltda., ambos publicados no Diário Oficial da União em 22 de fevereiro. No primeiro, a conduta condenada pelo DPDC foi a redução de 250g para 200g do item Toddy Pronto – leite mis- turado com chocolate. O outro produto com problema foi a ração para cachorro Pedigree, que teve o peso diminuído de 1,5kg para 1,0kg, sem a adequada informação ao consumidor. Note que no caso da ração o preço foi reduzido. Mas no entender do DPDC o consumidor so- freu de vício de informação. Em uma analogia simples, seria algo como o consumidor achar que o preço redu- ziu e não reparar que a quantidade de produto também – uma vez que a informação não estava destacada de forma ostensiva, segundo o órgão. Divulgação/DPDC março e abril 2008 | Revista Procon-SP 21 Capa Portaria 81, de 2002 Art. 1º. Determinar aos fornece- dores, que realizarem alterações quantitativas em produtos embala- dos, que façam constar mensagem específica no painel principal da respectiva embalagem, em letras de tamanho e cor destacados, in- formando de forma clara, precisa e ostensiva: I - que houve alteração quantitativa do produto; II - a quantidade do produto na embalagem existente antes da alte- ração; III - a quantidade do produto na embalagem existente depois da al- teração; IV - a quantidade de produto au- mentada ou diminuída, em termos absolutos e percentuais. Parágrafo único. As informações de que trata este artigo deverão constar da embalagem modificada pelo prazo mínimo de 3 (três) meses, sem prejuízo de outras medidas que visem à integral informação do con- sumidor sobre a alteração empreen- dida, bem como do cumprimento das demais disposições legais acerca do direito à informação do consumidor. sanções aplicadas pelo DPDC foi efeti- vamente paga. O restante ainda está em trâmite judicial. Isto é, em vez de pagar e encerrar de uma vez por todas as demandas (comprovadas por pro- cessos administrativos que respeitam a lei e o direito de defesa), as empresas preferem entrar com recursos na Justi- ça, prolongando a decisão final. Para se ter idéia, dos 97 processos administrativos instaurados pelo órgão federal, apenas em cinco casos houve a celebração de um Termo de Ajustamento de Conduta. Quando a multa paga é des- tinada ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD) – que financia investimen- tos em projetos de interesses coletivos, de assuntos como consumo, meio-ambien- te, segurança, entre outros. Medicamento Uma outra frente de atuação é via ação civil pública. Em 2005, o Minis- tério Público de São Paulo conseguiu acordo com a DM Indústria Farmacêu- tica Ltda., para ressarcir os danos cau- sados à população por causa da prá- tica da maquiagem de produtos. No caso, em meados de 2001, a empresa mudou a quantidade do Atroveran Lí- quido, de 30ml para 20ml, sem infor- mar devidamente o consumidor. Além disso, elevou o preço (de R$ 0,56 para R$ 1,24) da cartela de quatro com- primidos do Atroveran, sem a devida autorização do órgão competente – a Câmara de Medicamentos, do Minis- tério da Saúde. Na ação movida em janeiro de 2004, encaminhada à Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo, Guimarães Júnior argumentava que “o lançamento de ‘nova embalagem’ em menor quantidade, sem proporcional redução do preço constitui a chamada ‘maquiagem de preço’, artifício usado para impedir o consumidor de perce- ber o aumento do produto”. O promotor ressaltava ainda a vul- nerabilidade do consumidor no caso, afinal precisa de remédio quem está doente. “Os aumentos de preços pra- ticados em desrespeito às regras em vi- gor – além de caracterizarem infrações administrativas –, provocam prejuízos aos consumidores que, necessitando dos medicamentos, ficam indefesos e à mercê dos abusos dos fornecedores.” Mais de um ano depois que a ação foi protocolada no Judiciário, a indús- tria acenou com a possibilidade de fa- zer um acordo, que só foi fechado em junho de 2005. A DM comprometeu- se a doar o equivalente a R$ 136 mil em medicamentos para hospitais que não possuíssem qualquer vínculo com ela. O valor foi calculado com base no lucro obtido a partir da mudança. Guimarães Júnior explica que essa é uma prática comum. Afinal, a doa- ção dos remédios para hospitais pode ser mais importante coletivamente do que o ressarcimento propriamente dito dos valores perdidos por cada cidadão que comprou aqueles medicamentos. “Em muitos casos, o Ministério Pú- blico faz um acordo que prevê algum tipo de compensação em benefício da sociedade”, explica o promotor. “Para cada indivíduo isoladamente conside- rado, às vezes o prejuízo é insignifi- cante. Mas se a gente multiplicar pelo número de pessoas lesadas, teremos milhões de reais”, conclui. Conduta de risco Infelizmente, apesar do esforço, a postura da maioria das empresas é de desrespeito a todas as instituições. Não apenas tentam ludibriar o consu- midor, demonstrando pouca responsa- bilidade cívica, como ainda procuram medidas protelatórias para não pagar a multa. Uma pequena parcela do total de A Fundação Procon-SP foi o primeiro órgão a detectar o dispositivo da maquiagem e o quanto ele poderia ser danoso não apenas ao consumidor, mas também para toda a sociedade