Buscar

Conceito de espécie e processos de especiação

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 4 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

2 (UnB) Conceito de espécie e processos de especiação
Identificar e reconhecer espécies, bem como desvendar os mecanismos pelas quais elas surgiram, sempre foram temas intrigantes e desafiadores para muitos biólogos. É bem provável que as respostas para as infinitas perguntas geradas a cerca deste tema estejam na multidisciplinaridade de conhecimentos sobre: morfologia, evolução, genética, biogeografia e muitas outras disciplinas. A fim de contextualizar dentro das propostas e limites desta dissertativa, será discutido os principais conceitos de espécie e os mecanismos pelos quais estas se originam (especiação) dentro de uma linguagem e didática adequada ao nível de graduação em ciências biológicas. Porém, quando necessário, serão utilizados conceitos em níveis acadêmicos mais elevados.
2.1 Conceito de espécie
Antes de discutirmos os processos de especiação, é necessário definir o que é uma espécie. Utilizamos este termo como se tivesse um significado simples e não ambíguo. Apesar de ampla discordância quanto à natureza das espécies, os biólogos utilizam certos critérios para identificar as espécies. 
Primeiramente, a descendência comum é um aspecto central para todos os conceitos modernos de espécie. Os membros de uma espécie devem ter sua ancestralidade em uma população ancestral em comum, porém não necessariamente no mesmo par de pais. As espécies são, portanto, entidades históricas. 
Um segundo critério é que as espécies precisam ser o menor agrupamento distinto de organismos que compartilham padrões de ancestralidade e descendência; de outra maneira ficaria muito difícil separar espécies de táxons mais altos cujos membros também compartilham descendência comum. 
Um terceiro critério importante é o de comunidade reprodutiva. Os membros de uma espécie devem formar uma comunidade reprodutiva que exclui membros de outras espécies. No caso de populações com reprodução sexuada, o cruzamento é crítico para manter uma comunidade reprodutiva. Em se tratando de organismos com reprodução estritamente assexuada, a comunidade reprodutiva perfaz a ocupação de um habitat ecológico em particular para que uma população reprodutiva responda como uma unidade às forças evolutivas como seleção natural e deriva genética.
Existem diferentes conceitos de espécie, os quais serão discutidos a seguir.
2.1.1 Conceito tipológico de espécie
Antes de Darwin, as espécies eram definidas a partir de características essenciais fixas (geralmente morfológicas) consideradas como padrões criados pela divina providência ou arquétipo. Essa prática constitui o conceito tipológico (ou morfológico) de espécie. Os cientistas reconheciam espécies formalmente pela designação de um espécime-tipo que era etiquetado e depositado em um museu para representar a forma ou morfologia ideal para a espécie. Dessa maneira, o mundo vivo era classificado em espécies. 
Os evolucionistas descartaram o conceito tipológico de espécie, mas algumas de suas tradições continuam. Os cientistas ainda descrevem espécies ao depositar espécimes-tipo em museus, e o espécime-tipo carrega formalmente o nome da espécie. Porém, um espécime-tipo serve apenas como um guia para as características morfológicas gerais que se espera encontrar em uma espécie particular observada atualmente.
2.1.2. Conceito biológico de espécies
O conceito de espécie mais influente, inspirado pela teoria evolutiva darwiniana, é o conceito biológico de espécie formulado por Theodosius Dobzhansky e Ernst Mayr. Este conceito foi definido da seguinte maneira: “Uma espécie é uma comunidade reprodutiva de populações (isoladas reprodutivamente de outras) que ocupa um nicho específico na natureza”. Uma espécie é uma população intercruzante que apresenta descendência comum e compartilha características variáveis. Os estudos de variação populacional com características de morfologia, estrutura cromossômica e genética molecular são bastante úteis para avaliar as fronteiras geográficas de populações intercruzantes na natureza. O critério do “nicho” reconhece que membros de uma comunidade reprodutiva devem também ter propriedades ecológicas semelhantes.
A crítica ao conceito biológico de espécie revelou, primeiramente, que este não tem uma dimensão temporal explícita. Ele fornece um método para avaliar o status de espécie para populações contemporâneas, porém ajuda muito pouco a traçar a duração temporal da linhagem de uma espécie ao longo de sua história passada. Os proponentes do conceito biológico de espécie discordam constantemente sobre o grau de isolamento reprodutivo necessário para considerarmos duas populações como espécies separadas, revelando um pouco de ambiguidade no conceito. Um outro problema é que, como o conceito biológico de espécie enfatiza o intercruzamento como o critério da comunidade reprodutiva, ele nega a existência de espécies que se reproduzem apenas de maneira assexuada.
2.1.3. Conceitos evolutivo e de coesão de espécies
Uma das maiores dificuldades encontradas ao aceitar o conceito biológico de espécie está na demarcação de um ponto ao longo de uma linhagem temporal em que uma espécie é definida. Para solucionar este problema o conceito de espécie evolutiva foi proposto por George Gaylord Simpson. Uma definição atual do conceito de espécie evolutiva é uma linhagem única de populações ancestrais e descendentes que mantém sua identidade separada de outras linhagens semelhantes e tem suas próprias tendências evolutivas e destino histórico. O critério de descendência comum é mantido na necessidade de a linhagem ter sua identidade histórica distinta. A coesão reprodutiva é o método pelo qual uma espécie mantém sua identidade separada de outras linhagens de maneira a manter seu destino evolutivo independente. Os mesmos tipos de características diagnósticas discutidas para o conceito biológico de espécie são relevantes para identificar espécies evolutivas. De maneira distinta do conceito biológico de espécie, o conceito evolutivo de espécie aplica-se tanto a formas com reprodução sexuada como com reprodução assexuada. Enquanto a continuidade de características diagnósticas é mantida pela linhagem em evolução, ela é reconhecida como a mesma espécie. Mudanças bruscas em características diagnósticas marcam as fronteiras de espécies distintas no tempo evolutivo.
O geneticista de populações Alan Templeton atualizou esse conceito em 1989 para tornar explícita a expectativa de que as populações de uma espécie evoluem como uma unidade geneticamente coesiva por meio da seleção natural e da deriva genética. Templeton definiu seu conceito de espécie coesa da seguinte maneira: a população mais inclusiva de indivíduos que apresenta o potencial para coesão fenotípica através de mecanismos intrínsecos de coesão. Os mecanismos de coesão incluem fluxo gênico através da distribuição geográfica da espécie, perda compartilhada de alelos através de deriva genética e modificações genéticas compartilhadas causadas pela seleção natural. Uma outra maneira de definir o critério de coesão é que qualquer indivíduo em uma espécie é um possível ancestral comum da espécie inteira em algum momento futuro.
2.1.4. Conceito filogenético de espécie
O ornitólogo Joel Cracraft definiu o conceito filogenético de espécie como um agrupamento irredutível (basal) de organismos diagnosticamente distintos de outros grupos semelhantes e no qual existe um padrão parental de ancestralidade e descendência. Esse conceito enfatiza mais fortemente o critério da descendência comum. Tanto grupos sexuados como assexuados estão incluídos. Uma espécie filogenética é uma única linhagem de população sem ramificação detectável. A diferença principal na prática entre o conceito evolutivo/de coesão e o conceito filogenético de espécies é que o último enfatiza reconhecer como espécies diferentes os menores agrupamentos de organismos que sofreram mudança evolutiva independente. Em geral, um número maior de espécies seria descrito utilizando-se o conceito filogenético de espécie do que com qualquer outro conceito e, por essa razão, muitos taxonomistasconsideram-no impraticável. Pela aderência estrita à sistemática cladística, o conceito filogenético de espécie é ideal, pois apenas esse conceito garante unidades monofiléticas no nível de espécie. Neste sentido, é importante que se conheça os mecanismos que levaram a especiação.
2.2. Processos de especiação
A multiplicação das espécies ao longo do tempo é um processo dedutivo lógico da teoria de descendência comum de Darwin. Um ponto de ramificação na árvore evolutiva significa que uma espécie ancestral se dividiu em duas espécies diferentes. A teoria de Darwin postula que a variação genética presente em uma espécie, é a matéria-prima da qual novas espécies se originam. Um grande desafio para os evolucionistas é descobrir o processo pelo qual uma espécie ancestral se ramifica, formando duas ou mais espécies descendentes. O processo de formação de novas espécies é denominado especiação. 
Para o entendimento dos processos de especiação é necessário um consenso do conceito de espécie (discutido nas sessões anteriores), como de fato este consenso ainda não existe, os pesquisadores dos fenômenos de especiação partem do princípio que: os membros de uma espécie são uma linhagem de uma população ancestral; possuem compatibilidade reprodutiva com membros da mesma espécie e incompatibilidade com membros de outra; e há manutenção da coesão fenotípica e genotípica. O critério de compatibilidade reprodutiva tem recebido grande atenção nos estudos de especiação e os atributos que impedem espécies de se intercruzarem são chamados de barreiras reprodutivas. Os biólogos frequentemente distinguem entre as barreiras reprodutivas que impedem a fertilização (barreiras pré acasalamento) e aquelas que impedem o crescimento e o desenvolvimento, sobrevivência ou reprodução de indivíduos híbridos (barreiras pós-acasalamento).
Basicamente, os processos de especiação podem ser classificados como alopátricos ou não-alopátrico (os quais incluem especiação simpátrica e parapátrica) e serão discutidos a seguir.
2.2.1. Especiação alopátrica
A especiação alopátrica (“em outra terra”) começa quando uma espécie se separa em duas ou mais populações geograficamente isoladas. As populações separadas evoluem independentemente e adaptam-se aos respectivos ambientes, gerando barreiras reprodutivas entre elas que são consequências das suas trajetórias evolutivas independentes. Já que sua variação genética origina-se e evolui independentemente, populações fisicamente separadas divergem geneticamente mesmo quando seus ambientes mantêm-se muito semelhantes. Uma mudança ambiental entre populações também pode promover diferenciação genética mediante favorecimento de fenótipos distintos em populações separadas. Esta divisão pode ocorrer por meio de especiação vicariante ou por um evento fundador.
Especiação vicariante inicia-se quando mudanças climáticas ou geológicas fragmentam o habitat de uma espécie, produzindo barreiras impenetráveis que isolam geograficamente as diferentes populações. Por exemplo, a população de uma espécie de mamífero que habita uma floresta de planície poderia ser dividida pela elevação de uma barreira montanhosa, por um afundamento ou inundação de uma falha geológica, ou mudanças que causem a fragmentação da floresta pela formação de pradarias ou desertos. A formação do istmo do Panamá separou as populações de ouriço-do-mar do gênero Eucidaris, resultando na formação do par de espécies E. tribuloides e E. thouarsi. 
Embora a população ancestral tenha sido fragmentada, os fragmentos individuais normalmente permanecem relativamente intactos. O processo vicariante em si não induz mudança genética pela redução de uma população a um tamanho pequeno ou por deslocá-la para novos ambientes. Uma outra consequência importante é que um mesmo evento vicariante pode, simultaneamente, fragmentar várias espécies. Por exemplo, a fragmentação de uma floresta de planície perturbaria espécies de uma variedade de grupos taxonômicos, incluindo salamandras, rãs, lesmas e muitos outros habitantes das florestas. Consequentemente, os mesmos padrões geográficos são observados em espécies proximamente aparentadas em diferentes grupos de organismos cujos habitats são similares. Tais padrões fornecem forte evidência de especiação vicariante.
Uma forma alternativa de iniciar especiação alopátrica é a dispersão de um pequeno número de indivíduos para um local distante em que nenhum membro da espécie ocorre. Os indivíduos que se dispersaram podem estabelecer uma nova população, o que é conhecido como evento fundador. Especiação alopátrica resultante de eventos fundadores foi observada, por exemplo, nas moscas-das-frutas nativas do Havaí. O Havaí contém muitas manchas de floresta separadas por fluxo de lava vulcânica. Em raras ocasiões, ventos fortes podem transportar umas poucas moscas de uma floresta para outra, geograficamente isolada, onde as moscas podem começar uma nova população. Diferente do que ocorre na especiação vicariante, a nova população tem um tamanho inicial muito pequeno, o que pode levar a uma mudança rápida e profunda de sua estrutura genética em relação à população ancestral. Quando tal evento acontece, as características fenotípicas que eram estáveis nas populações ancestrais frequentemente mostram variação inédita na nova população. À medida que a nova variação expressa é sujeita à seleção natural, ocorrem grandes mudanças nas propriedades reprodutivas e fenotípicas, acelerando a evolução de barreiras reprodutivas entre as populações ancestrais e as recentemente fundadas.
2.2.2. Especiação não alopátrica
Existem casos em que é difícil explicar situações em que muitas espécies proximamente aparentadas ocorrem juntas em uma área sem nenhum tipo de barreira à dispersão animal. Por exemplo, os grandes lagos da África contêm muitas espécies de peixes ciclídeos que são encontrados apenas neles e em nenhum outro lugar. É difícil concluir que essas espécies evoluíram em quaisquer outros lagos além daqueles que habitam, embora esses lagos sejam jovens na escala de tempo evolutivo e não apresentem nenhuma barreira ambiental que isolaria as populações desses peixes.
Para explicar a especiação dos peixes em lagos de água doce e outros exemplos semelhantes, postulou-se a existência de especiação simpátrica (“mesma terra”). De acordo com essa hipótese, diferentes indivíduos dentro de uma mesma espécie especializam-se na ocupação de diferentes componentes do ambiente. Ao procurar e utilizar habitats específicos em uma única área geográfica, populações diferentes atingem separação física e adaptativa suficiente para que as barreiras reprodutivas evoluam. Por exemplo, as espécies de ciclídeos dos lagos africanos são muito diferentes umas das outras em suas especializações alimentares. Estudos que advogam especiação simpátrica foram criticados porque a distinção reprodutiva entre populações diferentes muitas vezes não é bem demonstrada e, assim, não se pode garantir que registrem efetivamente a formação de linhagens evolutivas distintas que se tornarão espécies diferentes. Além disso, é provável que os ciclos climáticos produzam lagos geograficamente isolados em períodos de seca e, posteriormente, transformem-se em lagos maiores durante as estações úmidas, produzindo assim um modelo alopátrico para a evolução de cardumes de espécies de peixes.
Um outro modelo plausível de especiação, denominado especiação parapátrica, é um intermediário geográfico entre especiação simpátrica e alopátrica. Duas espécies são reciprocamente parapátricas se suas distribuições geográficas são primariamente alopátricas, mas mantêm contato ao longo da borda entre suas distribuições, que nenhuma espécie consegue cruzar. Na especiação parapátrica, a borda evolui dentro da distribuição geograficamente contínua da espécie ancestral e diferenças interespecíficas evoluem nas duas populações, embora estas continuem mantendo contato ao longo dessa fronteira. Diferentemente da especiação alopátrica vicariante, as populações nos dois habitats não são isoladas por uma barreirafísica, mas mantêm interações genéticas através da borda que as separa. A disparidade das condições ambientais através da borda, entretanto, leva as populações a evoluírem como linhagens separadas, adaptadas aos diferentes ambientes, apesar do intercâmbio gênico entre elas.
2.3 Concluindo
O conceito de espécie, apesar de ser um termo amplamente utilizado, ainda carece de uma definição exata, sendo assim, é um consenso adotado pela comunidade científica. Da mesma forma, os processos de especiação alopátrica são mais fáceis de serem explicados, tendo em vista a dificuldade de se estudar eventos pré históricos para muitas espécies. A imensa complexidade e abrangência deste tema é alvo de muitos estudos que vêm sendo publicados a todo momento, e devido a isto, uma abordagem detalhada deste assunto estaria fora do contexto e proposta desta dissertativa, cujo tema está ainda muito distante de seu encerramento.

Outros materiais