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Filosofia do Direito
Prof. Luciana Barbosa Musse
Bibliografia
Básica:
· KYMLICKA, Will. Filosofia política contemporânea. São Paulo: Martins Fontes, 2006. (A biblioteca do UniCEUB dispõe de 25 exemplares).
· PALOMBELLA, Gianluigi. Filosofia do Direito. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2005. (A biblioteca do UniCEUB dispõe de 170 exemplares).
· POSNER, Richard A. Problemas de Filosofia do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007. (A biblioteca do UniCEUB dispõe de 171 exemplares).
Complementar:
· ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
· CASTANHEIRA NEVES, A. O Direito hoje e com que sentido? Lisboa-Portugal: Piaget, 2002.
· DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a prática da igualdade. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
· FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
· FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: Nau, 2005.
· NINO, Carlos Santiago. Introdução à análise do direito. São Paulo: wmf Martins Fontes, 2010.
Avaliação
· Há quatro avaliações, todas com mesmo peso e sem considerar progressões de menção. Duas destas avaliações são provas, compostas por questões objetivas e discursivas. Em geral, há duas questões discursivas significativamente abertas, para que se demonstre o que se sabe a respeito de determinado assunto. A AMC é a terceira avaliação e tem o mesmo peso das avaliações regulares e contará com 8 questões. Todas as questões objetivas, inclusive a AMC, terão questões elaboradas de forma contextualizada, envolvendo raciocínio lógico, capacidade crítico-reflexiva, com semelhança ao ENADE e questões de concursos, e que não cobrem somente memorização. O material da disciplina é constituído de 11 a 12 textos teóricos, sobre os quais serão feitos trabalhos individuais ou em grupo. A quarta avaliação é composta por um conjunto de atividades (provavelmente em total de 4 ou 5) acerca dos textos, entregues pelo Google Classroom. Cada atividade reunirá, possivelmente, mais de um dos textos, considerados em grupo. Pode haver atividades interdisciplinares extraclasse não previstas no Plano de Ensino, como relatórios de palestras, que também poderão ser utilizadas para composição da menção final.
· Primeira Prova: 17/09/2019
· AMC: 29/10/2019
	
· Segunda Prova: 21/11/2019
· Há somente uma chamada, em geral feita mais próximo do final da aula. A chegada no horário, no entanto, será considerada como um componente formativo da avaliação. A assiduidade tem peso na nota final.
Sumário
1. Visão geral da disciplina	6
2. Introdução à Filosofia do Direito	8
2.1. A Filosofia do Direito é parte da Filosofia Geral ou parte do Direito?	8
2.1.1. Defesa da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral	8
2.1.2. Defesa da Filosofia do Direito como parte do Direito	9
2.1.3. Defesa da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral e do Direito	9
2.1.4. Rejeição da Filosofia do Direito pela Filosofia Geral e pelo Direito	10
2.2. O jurista	10
2.3. A Filosofia do Direito é realizada por filósofos ou por juristas?	11
2.3.1. Filosofia do Direito dos filósofos	11
2.3.2. Filosofia do Direito dos juristas	12
2.3.3. Filosofia do Direito dos filósofos e dos juristas	13
2.3.4. Conquista da autonomia da Filosofia do Direito	13
2.4. Diferenciação entre Filosofia do Direito e Teoria Geral do Direito	14
2.5. Momento atual da Filosofia do Direito	15
3. Formas de apresentação do conhecimento jurídico e a ascensão e queda do Positivismo jurídico	17
3.1. Conhecimento jurídico e a diferença entre zetética e dogmática	17
3.2. Função social da dogmática jurídica como ferramenta de decidibilidade	20
3.3. Experiências históricas que originaram a Dogmática jurídica	21
3.4. A Dogmática jurídica e a ascensão e queda do Positivismo jurídico	22
4. Introdução à Filosofia do Direito contemporânea	25
4.1. Construção histórica da Filosofia contemporânea e o Pós-positivismo	25
4.2. Regras e princípios sob a ótica do pós-positivismo	26
4.3. Teses que o Pós-positivismo intenta superar	29
4.3.1. Jusnaturalismo (ou jusracionalismo)	29
4.3.2. Realismo jurídico	30
4.3.3. Positivismo jurídico	30
4.4. A expressão filosófica do Direito na contemporaneidade: principais temas e novas correntes	33
4.4.1. A abertura da Filosofia do Direito aos valores ético-políticos	33
4.4.2. A abertura da Filosofia do Direito aos fatos	34
4.4.3. Estudos sobre o raciocínio jurídico	36
4.4.4. Estudos de lógica jurídica	36
4.4.5. Novas fronteiras para a Filosofia do Direito	37
4.5. Subgrupos de teorias pós-positivistas de Filosofia do Direito contemporânea que serão abordados na disciplina	37
5. Funcionalismo jurídico – Discussões introdutórias	39
5.1. Racionalidade do Funcionalismo jurídico	40
5.2. Pressupostos do Funcionalismo jurídico	40
5.3. Conceito de “função” e a diferenciação entre “Funções do Direito” e “Função (tarefa) do Direito”	41
5.4. Funcionalismo jurídico versus Normativismo jurídico	41
5.5. Reflexões acerca da crise do Direito sob a ótica do Funcionalismo jurídico	44
5.5.1. Fator ontológico da crise do direito	44
5.5.2. Fator sociológico da crise do direito	45
5.5.3. Fator axiológico da crise do direito	45
5.5.4. Fator crítico-cultural da crise do direito	45
5.5.5. Fator funcional da crise do direito	45
5.6. António Castanheira Neves e o papel do homem no Funcionalismo jurídico	46
5.7. Convivência entre Funcionalismo jurídico e Positivismo em Norberto Bobbio	46
6. Funcionalismo jurídico – Correntes de pensamento	48
6.1. Funcionalismo político (ou “Funcionalismo jurídico de vertente política”)	49
6.1.1. Direito Achado na Rua	51
6.1.2. Critical Legal Studies (CLS)	54
6.1.3. Direito Alternativo	60
6.1.4. Juridicização, judicialização e ativismo judicial	64
6.2. Funcionalismo tecnológico-social (ou “Funcionalismo jurídico de vertente tecnológica-social”)	80
6.2.1. Análise Econômica do Direito	80
6.3. Funcionalismo sistêmico (ou “Funcionalismo jurídico de vertente sistêmica”)	92
6.3.1. Teoria dos sistemas de Niklas Luhmann	93
6.3.2. O pensamento de Gunther Teubner	104
6.3.3. Abertura do Direito aos valores	106
7. Teorias de Direito e Justiça (Deontologia jurídica)	107
7.1. A Teoria de Justiça como Equidade de John Rawls	107
7.1.1. O neocontratualismo de John Rawls e o “véu da ignorância”	109
7.1.2. Tipos de bens na teoria de Rawls e estrutura básica da sociedade justa	111
7.1.3. Os princípios necessários para promoção de liberdade e justiça social	111
7.1.4. Sequência de etapas para instalar a sociedade justa	113
7.1.5. Objeções à teoria de Rawls	113
7.2. A Teoria Intitular de Justiça de Robert Nozick	115
7.2.1. Aspectos gerais da Teoria intitular de Nozick	117
7.2.2. Diferenciação entre as teorias de Rawls e Nozick	118
7.2.3. Outros aspectos relevantes da Teoria intitular de Nozick	118
7.3. O Igualitarismo liberal de Ronald Dworkin	123
Aula 1 – 31/07/2019
Programa – Aula 1
1. Visão geral da disciplina
Visão geral da disciplina
· Entendimento: o campo de estudo da Filosofia do Direito é significativamente vasto e vem se desenvolvendo há centenas de anos, de modo que é impossível apresentá-lo em apenas um semestre. Assim, o grupo de professores da disciplina escolheu trabalhar apenas um momento específico do desenvolvimento da Filosofia do Direito, que, em verdade, é seu momento atual, chamado de Filosofia do Direito contemporânea. Dentro do momento histórico da Filosofia do Direito contemporânea, surge o conceito de Pós-positivismo. Este Pós-positivismo é, em verdade, um grupo de teorias, elaboradas a partir da segunda metade do século XX (mais precisamente a partir da década de 60), cujo objetivo é tentar superar os modelos, entendimentos e paradigmas do Positivismo jurídico, do Jusnaturalismo e do Realismo jurídico estadunidense. Chama-se “Pós-positivismo”, então, justamente porque intenta superar o Positivismo jurídico. Na disciplina, após a apresentação de alguns conceitos introdutórios relevantes, serão estudados três subgrupos de teorias, todas inseridas no “grande guarda-chuva” do Pós-positivismo, bem como algumasde suas ramificações internas. Essencialmente, serão estudados:
· (i) Funcionalismo jurídico:
· (a) Funcionalismo jurídico político;
· (b) Funcionalismo jurídico tecnológico-social:
· (I) Funcionalismo jurídico tecnológico-social em sentido estrito (com centralidade na obra de Hans Albert)
· (II) Funcionalismo jurídico tecnológico-social de vertente econômica (em especial na abordagem da Análise Econômica do Direito – AED, com centralidade na obra de Richard Posner).
· (c) Funcionalismo jurídico sistêmico.
· (ii) Teorias de Direito e Justiça (Deontologia jurídica):
· (a) Teoria da Justiça como Equidade (com centralidade na obra de John Rawls);
· (b) Teoria “intitular” e o “Estado Mínimo” (com centralidade na obra de Robert Nozick);
· (c) O igualitarismo liberal (com centralidade na obra de Ronald Dworkin);
· (d) Teorias de Justiça como eficiência (com centralidade na obra de Richard Posner).
· (iii) Teorias de Direito, Política e Poder: é necessário ressaltar, quanto a este subgrupo de teorias, que ele não se enquadra, propriamente, dentro do “grande guarda-chuva” do Pós-positivismo. Isso porque os autores mais relevantes deste subgrupo evitam rótulos (como é o caso de Foucault, que apesar de rejeitar quaisquer rótulos é frequentemente referido como um estruturalista) ou produziram seus estudos em momento anterior ou durante as primeiras décadas da segunda metade do século XX (como é o caso de Hannah Arendt, que foi judia e apátrida durante o regime nazista). Para efeitos didáticos, no entanto, as Teorias de Direito, Política e Poder serão estudadas como Pós-positivistas, apenas na medida em que trazem reflexões válidas para a construção da Filosofia do Direito contemporânea. Serão estudados:
· (a) O direito que justifica o poder político (com centralidade na obra de Michel Foucault);
· (b) Direitos Humanos e o princípio da Tolerância (com centralidade na obra de Hannah Arendt).
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
-------------------------------------- UNIDADE INTRODUTÓRIA --------------------------------------
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Aula 2 – 13/08/2019
Programa – Aula 2
2. Introdução à Filosofia do Direito
2.1. A Filosofia do Direito é parte da Filosofia Geral ou parte do Direito?
2.1.1. Defesa da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral
2.1.2. Defesa da Filosofia do Direito como parte do Direito
2.1.3. Defesa da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral e do Direito
2.1.4. Rejeição da Filosofia do Direito pela Filosofia Geral e pelo Direito
2.2. O jurista
2.3. A Filosofia do Direito é realizada por filósofos ou por juristas?
2.3.1. Filosofia do Direito dos filósofos
2.3.2. Filosofia do Direito dos juristas
2.3.3. Filosofia do Direito dos filósofos e dos juristas
2.3.4. Conquista da autonomia da Filosofia do Direito
2.4. Diferenciação entre Filosofia do Direito e Teoria Geral do Direito
2.5. Momento atual da Filosofia do Direito
Introdução à Filosofia do Direito
· Entendimento: esta introdução à Filosofia do Direito será apresentada por meio de discussões a respeito do eventual enquadramento da Filosofia do Direito, no campo da Filosofia Geral e/ou do Direito, e da discussão a respeito de quem a realiza – se filósofos, juristas ou ambos. A Filosofia do Direito também será diferenciada da Teoria Geral do Direito e, por último, serão apresentados os objetivos gerais da Filosofia do Direito.
A Filosofia do Direito é parte da Filosofia Geral ou parte do Direito?
· Entendimento: há questionamentos relevantes acerca de qual seria o enquadramento correto da Filosofia do Direito – se como parte da Filosofia Geral, como parte do Direito, como parte de ambos ou rejeitada por todos eles. Nesta subseção, são apresentados argumentos pela defesa de cada uma destas posições.
Defesa da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral
· Entendimento: para os defensores da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral, a Filosofia do Direito não é uma disciplina jurídica ao lado de outras. Para Cabral de Moncada (1995, v. 1, p. 1), a Filosofia do Direito não é sequer, rigorosamente, uma disciplina jurídica. É uma atividade mental ou um ramo da Filosofia que se ocupa do direito, ou seja, é uma parte (ou um capítulo particular) da Filosofia Geral. Para Friedrich (1993, p. 13). toda Filosofia do Direito é parte de uma determinada Filosofia Geral, pois oferece reflexões filosóficas sobre os fundamentos gerais do direito. No mesmo sentido, Posner (2007, p. XI) também aponta que “Filosofia” é o nome dado à análise de questões fundamentais, de modo que a definição tradicional de Filosofia do Direito como uma aplicação da Filosofia Geral ao Direito parece, à primeira vista, apropriada.
A filosofia do direito é um saber que brota das práticas gerais da filosofia, ao modo da espécie que se revela a partir do gênero, em meio a um buliçoso movimento de aprofundamento do conhecimento e de especialização dos saberes no bojo da modernidade (século XVII). Alguns registros indicam mesmo sua identidade promanando das obras de certos autores (Pufendorf, Grócio, Vittoria e Suárez). Isto está a indicar que a história anterior do conhecimento filosófico sobre o direito decorre da reflexão generalizada da própria filosofia, que, dentre outras questões, se ocupa também do problema da justiça, numa história que remonta aos primórdios da própria filosofia grega. Isto significa que não somente o conhecimento sobre o Direito não é uma exclusividade dos juristas, mas que, sobretudo, se trata de um conhecimento do qual a filosofia se apropria livremente ao seu modo, ou seja, sem os cacoetes ou exigências técnicas do saber jurídico. (BITTAR, 1995, v. 1, p. 13).
Defesa da Filosofia do Direito como parte do Direito
· Entendimento: para Lafer (2004, p. 54), a Filosofia do Direito é o campo de estudo dos juristas com interesses filosóficos, instigados, na sua reflexão, pelos problemas para os quais não encontram solução no âmbito do Direito Positivo. Por isso a Filosofia do Direito é, como diz Norberto Bobbio, obra de juristas e não de filósofos stricto sensu. Para o Lafer, uma comprovação desta afirmação seria de que os grandes nomes da Filosofia do Direito do século XX, como Hans Kelsen, são juristas e não filósofos.
A Filosofia do Direito […] a partir do seu próprio nome, coloca um problema delicado de equilíbrio na definição do seu alcance e dos seus campos de investigação. Com efeito, enquanto Filosofia ela tende a ser uma investigação teórica. Entretanto, enquanto Direito ela é uma atividade preponderantemente prática. (LAFER, 1988, p. 49).
Defesa da Filosofia do Direito como parte da Filosofia Geral e do Direito
· Entendimento: para Cunha (2013, p. 132), a Filosofia do Direito é parte tanto da Filosofia Geral, quanto do Direito. Isso porque, sendo uma “Filosofia” do Direito, e a disciplina seria, naturalmente, ramos da Filosofia Geral, de modo que corresponderia ao “cerne e sumo do Direito”, porque seria um “direito pensado”. Para o autor, a forma, o método e o estilo da Filosofia do Direito advêm da Filosofia Geral (embora com alguma natural “contaminação” por parte do “objeto” de estudo, o Direito), mas os temas, os problemas e o conteúdo sobre os quais se exerce a discussão, a reflexão e a meditação, pertenceriam ao Direito.
Rejeição da Filosofia do Direito pela Filosofia Geral e pelo Direito
· Entendimento: para Mascaro (2010), a Filosofia do Direito é ramo da Filosofia Geral, contudo, o autor chama atenção para o fato de que tal ramo é, frequentemente, rejeitado tantos pelos filósofos, quanto pelos juristas. Diz ele:
Um dos ramos mais importantes da filosofia é também um dos menos conhecidos do público em geral. A filosofia do direito quase sempre é ignorada pelo filósofo, que desconhece ou tem pouco interesse nos assuntos jurídicos. Mas, ao mesmo tempo, a filosofia do direito é ignorada pelo própriojurista, que não a considera uma disciplina prática, porque imagina que talvez não lhe seja útil para a vida forense. Trata-se, portanto, de uma duplamente enjeitada. (MASCARO, 2010)
O jurista
· Evolução histórica do conceito de jurista: historicamente, o conceito de “jurista” era associado ao “homem prático”. Isso porque a formação jurídica sempre fora constituída, em sua base, por uma multiplicidade de práticas manifestadas pelos juristas (rituais, técnicas, comportamentos, dentre outros). Na modernidade, no entanto, este conceito se modificou em face (i) da transformação da organização institucional do Estado em uma ordem burocrática; (ii) da transformação do modo de exercício do Direito em uma profissão (profissionalização do Direito) e (iii) da transformação da perspectiva do estudo do Direito em uma ciência.
· (*) Conceito atual de “jurista”: atualmente, levando-se em conta as transformações sociais verificadas ao longo do tempo, entende-se que o jurista é aquele que conhece, para além da norma, também seu sentido, sua gênese e sua razão mais profunda. O jurista conhece os textos e sabe interpretá-los para que tenham aplicação real, no mundo dos fatos, tendo como inspiração uma realidade de valores. Veja-se:
E dizemos um jurista completo porque o filósofo do Direito, na nossa perspectiva, não deve ser um sujeito abstruso, excêntrico, que não conheça o direito real, e que efabule teorias incompreensíveis; antes pelo contrário, o filósofo do Direito deve ser o jurista integral, completo, que conhece, além da norma, o seu sentido, a sua gênese, a sua razão mais profunda, etc., etc. E que sabe os textos, e os sabe interpretar para agir no real, no mundo dos factos, tendo como inspiração e Norte essa outra realidade dos valores, que infelizmente só a alguns é dado atingir plenamente [...] (CUNHA, 2013, p. 143).
· Diferenciação entre juristas práticos e juristas teóricos: a transformação das práticas de Direito levou ao surgimento das teorias jurídicas, ou seja, levou a uma organização racional dos principais conceitos, classificações e argumentos especificamente jurídicos. Assim, passou a ser possível classificar os juristas em práticos ou teóricos, contudo, é necessário ressaltar que não há antagonismo entre estes dois tipos. De maneira mais detalhada, tem-se:
· (i) Juristas práticos: os juristas práticos são aqueles que realizam o trabalho praticante do Direito, ou seja, que usam o argumento para defender o interesse de alguém para decidir. A centralidade está, pois, na persuasão e na decisão. Os juristas práticos são os advogados, os promotores, os juízes e os todos os operadores do cotidiano do Direito. 
· (ii) Juristas teóricos: os juristas teóricos são aqueles que têm compromisso com a verdade e/ou a consistência. A centralidade, pois, está na demonstração, na comprovação e na definição. Os juristas teóricos são os professores, doutrinadores (vale ressaltar que, quem desenvolve doutrina, o faz sob a ideia de dogmática jurídica) e pesquisadores.
· (a) Afirmação verdadeira: para os juristas teóricos, uma afirmação verdadeira é aquela que pode ser testada em face de algum fato.
· (b) Afirmação consistente: para os juristas teóricos, uma afirmação consistente é aquela que, embora não derive seu valor de uma correspondência fática empiricamente comprovável. Estas afirmações são construídas com rigor lógico interno e suficientemente escoradas em normas aceitas por uma comunidade, visando obter adesão à posição que sustentam, por meio de persuasão argumentativa racional.
A Filosofia do Direito é realizada por filósofos ou por juristas?
· Entendimento: para Sgarby (2007, p. 7), a Filosofia do Direito é um ramo da Filosofia Geral. Todavia, para o autor, isso não significa que tão-somente haja filósofos desenvolvendo-a. De fato, há tanto Filosofia do Direito de “puros filósofos” como de “puros juristas”. De maneira mais detalhada, tem-se:
Filosofia do Direito dos filósofos
· Entendimento: para os filósofos, a Filosofia do Direito seria um campo de interesse da Filosofia Geral, com um tema específico – o Direito – ou seja, seria uma Filosofia aplicada, que consistiria na transposição das grandes doutrinas filosóficas aos problemas do direito e da justiça.
· (*) Para os adeptos da Filosofia do Direito dos filósofos, as soluções para os problemas jurídicos deveriam ser pesquisadas nas obras dos filósofos, não na experiência jurídica.
· A Filosofia do Direito dos filósofos é reivindicada por aqueles que creem que a Filosofia do Direito não pode dispensar o direito natural e tem como tarefa, em razão da crise do humanismo e do universalismo, encontrar análogo ou correspondente para a velha natureza humana, em que possa enraizar a universalidade exigida pela noção de direitos humanos.
· Objetivo: a Filosofia do Direito dos filósofos busca determinar a essência do Direito. De fato, para Norberto Bobbio a Filosofia do Direito dos filósofos busca construir uma ciência jurídica sobre o modelo de outras ciências e fazer a transposição dos modelos da matemática ou da física para o Direito.
· Ideal de justiça: no tocante à justiça, os adeptos da Filosofia do Direito dos filósofos partem da concepção da natureza do homem, da qual tentam deduzir regras justas.
Filosofia do Direito dos juristas
· Entendimento: para os juristas, a Filosofia do Direito seria um campo de interesse do Direito por possibilitar reflexões filosóficas instigadas pelos problemas para os quais não se encontram soluções no âmbito do Direito Positivo. 
· (*) A Filosofia do Direito dos juristas inicia suas análises com uma descrição das práticas jurídicas (as quais se caracterizam por seu nível elevado de abstração), mas se apresenta como uma reação à esquematização e à generalização. Assim, as soluções dos problemas percebidos são alcançadas com base na experiência jurídica.
· Como se apresentará mais adiante, vale ressaltar que, pelo menos nas faculdades de Direito, triunfou a visão da Filosofia do Direito dos juristas.
	
· Para os adeptos da Filosofia do Direito dos juristas, quando as soluções para os problemas jurídicos são pesquisadas com base nas obras dos filósofos e não na experiência jurídica, os juristas não encontram na Filosofia do Direito nenhum reflexo de suas práticas e raciocínios, e, por isso, se afastam da reflexão filosófica. Nesse sentido, diz Lopes:
Como a filosofia procede de reflexão crítica ou refutação das opiniões normalmente aceitas, logo as perguntas da filosofia do direito procedem, no fundo, de perguntas de juristas feitas em chave filosófica. (LOPES, 2010)
· Objetivo: a Filosofia do Direito dos juristas busca elaborar um conceito de Direito, permitindo a compreensão e a interpretação do fenômeno jurídico como um complexo de normas, cujas propriedades fará esforço para definir. Para Norberto Bobbio, a Filosofia do Direito dos juristas tem por objeto o conceito de direito, a teoria da justiça e a teoria da ciência jurídica, mas em vez de especular sobre essências se esforça para ter como ponto de partida os fenômenos jurídicos. O autor também aponta que, conforme a Filosofia do Direito dos juristas, para tenta construir uma ciência jurídica seria necessário tão somente analisar os processos de raciocínio realmente empregados pelos juristas.
· Ideal de justiça: no tocante à justiça, os adeptos da Filosofia do Direito dos juristas pesquisam os valores efetivamente protegidos pelo direito nos diferentes sistemas jurídicos.
Filosofia do Direito dos filósofos e dos juristas
· Entendimento: como se apresentou anteriormente, há tanto Filosofia do Direito de “puros filósofos” como de “puros juristas”. Para Sgarby (2007, p. 7), no entanto, ambas são igualmente criticáveis, pois o conhecimento “filosófico do direito” cobra conhecimento recíproco de ambos os campos, ou seja, exige tanto a presença de “filósofos-juristas” quanto de “juristas-filósofos”. Qualquer parcialidade peca pela insuficiência especulativa, embora evidentemente existam os pontos de partida (alguns seguem da filosofia para uma formaçãojurídica; outros de uma formação jurídica para a filosófica).
	
Há é uma filosofia do Direito dos juristas e outra dos filósofos. O ideal é que quem filosofa sobre o Direito aproveitasse de ambas as experiências. Porque uma filosofia só filosofante, sem noção vivencial da experiência jurídica, é abstrata, e normalmente uma aplicação lógica ou uma extensão particular de um Sistema filosófico geral (disso foram acusados mesmo Kant e Hegel). Em contrapartida, uma filosofia excessivamente presa ao mundo jurídico, feita por quem não tenha um arcabouço político e filosófico puro suficiente, capaz de lhe permitir levantar voo e ter uma visão mais panorâmica e depurada, corre o risco de ser pouco crítica, pouco burilada, e afinal uma forma de reflexão teórica dos próprios institutos e instituições, ou uma visão cultural(ista) sobre o Direito – que tem seu lugar, mas se não pode, em rigor, chamar filosofia jurídica. (CUNHA, 2013, p. 133).
Conquista da autonomia da Filosofia do Direito
· (*) Entendimento: o uso da expressão “Filosofia do Direito” se disseminou a partir do século XIX, com a obra “Princípios da Filosofia do Direito”, de Hegel, publicada em 1821. Esta reflexão, contudo, é tão antiga quanto o próprio Direito. Diz-se que uma autonomia da Filosofia do Direito só é possível na medida em que, ao longo do tempo, ocorre o próprio amadurecimento do pensamento jusfilosófico, o qual se dá com o surgimento da identidade autônoma e fundamentada do Direito moderno. Nesse sentido, a obra de Hegel é considerada, justamente, o marco da autonomia da Filosofia do Direito, posto que também denota a passagem entre o período do jusnaturalismo para o jupositivismo.
A partir de fins do século XVIII, começaram a aparecer, ao lado da expressão ‘Direito Natural’ ou em seu lugar, outras denominações, como a de Fries (1803), Doutrina Jurídica Filosófica e Crítica de toda a Legislação Positiva’, ou a de Gustavo Hugo (1798), Filosofia do Direito Positivo. [...] Mas foi principalmente a partir de Hegel (1770-1831), com sua obra Fundamentos da Filosofia do Direito, que a nova designação passou a ser generalizada. A obra de Hegel, na realidade, denominava-se Direito Natural ou Ciência do Estado, mas tinha, também, outro título: Fundamentos de Filosofia do Direito. Este passou a ser usado preferencialmente. E, hoje, prevalece, em todos os centros de cultura, a denominação “Filosofia do Direito” ou “Filosofia Jurídica”.
A autonomia da Filosofia do Direito “[...] só é possível na medida em que o próprio amadurecimento do pensamento jusfilosófico se dá no tempo, ao longo do processo de surgimento da identidade autônoma e fundamentada do próprio direito moderno. [...] O marco desta autonomia, neste processo, será, propriamente, a obra de Hegel, nesta passagem entre o período do jusnaturalismo e do juspositivismo, especialmente a partir do espectral título Fundamentos de Filosofia do Direito (Grundlinien der Philosophie des Recht). [...] Se esta obra cria a possibilitação da Filosofia do Direito propriamente dita — Miguel Reale afirma que antes desta obra a Filosofia do Direito é arte dos filósofos e não dos juristas —, especialmente porque, inclusive, a partir dela a homogeneização do título da disciplina se difunde em toda a Europa, isto não quer dizer que desde a obra de Hegel a história da existência da disciplina tenha sido pacífica. Esta história é vivida de idas e vindas, passando por todo tipo de oscilação, inclusive, neste próprio século que entrou para a história reconhecido como o século do positivismo nas ciências, inclusive no conhecimento jurídico. (BITTAR, 2011, p. 15)
Diferenciação entre Filosofia do Direito e Teoria Geral do Direito
· Entendimento: como se apresentou anteriormente, a partir da obra “Princípios da Filosofia do Direito”, de Hegel, publicada em 1821, o termo “Filosofia do Direito” se popularizou. No entanto, de acordo com Bittar (2011, p. 15-16), no decorrer do próprio século XIX, a recém-nascida expressão “Filosofia do Direito” passou a encontrar resistência. Passou-se, então, a sugerir sua substituição pela expressão “Teoria Geral do Direito”, criada para denominar a dimensão dos estudos gerais sobre os institutos de Direito Positivo. Trata-se, então, de uma expressão cunhada pela cultura positivista que se consagrou nas obras de Merkel, Bergbohn e Bierling.
· Resultado da discussão: como se apresentou anteriormente, a expressão “Teoria Geral do Direito” foi usada em substituição à “Filosofia do Direito”, no século XIX, por alguns autores de orientação positivista, como Merkel, Bergbohm, Bierling e outros, para designar uma teoria geral da Ciência do Direito, como síntese e generalização dos institutos jurídicos positivos. Essa tendência não prevaleceu porque, na realidade, a Filosofia não é uma síntese ou Teoria Geral da Ciência, mas uma reflexão em profundidade sobre os fundamentos ou pressupostos de cada ciência. Assim, a expressão “Teoria Geral do Direito”, apesar de não ter desaparecido, se ressignificou. Ela é, atualmente, utilizada, não para substituir “Filosofia do Direito”, mas para designar os estudos gerais da Ciência do Direito.
· (*) Conceito atual de “Teoria Geral do Direito”: modernamente, a “Teoria Geral do Direito” é entendida como a disciplina que tem como interesse exclusivo descrever e analisar o Direito em si, graças ao emprego de um método científico, tentando ser isenta de qualquer julgamento de valor. A Teoria Geral do Direito não substitui a Filosofia do Direito, dado que esta Filosofia do Direito perdura em um nível de maior abstração.
Momento atual da Filosofia do Direito
· Contexto: para Norberto Bobbio (2011), no século XX, após o esgotamento da chama do positivismo (que se deu, em especial, a partir da segunda metade do século XX), a “Filosofia do Direito” reapareceu e foi considerada como matéria autônoma, distinta da Ciência Jurídica (Teoria Geral do Direito), individual e superior a esta. Naturalmente, com o ressurgimento da Filosofia do Direito, reapareceu o direito natural. A Filosofia do Direito, então, se consolidou e se colocou à frente da Teoria Geral do Direito e da Sociologia Jurídica, com as quais tinha sido confundida pelos positivistas (estes positivistas, muitas vezes, consideravam a Filosofia do Direito como uma “Teoria de valor do justo”, ou seja, meramente como uma Teoria da justiça).
· (*) Conceito atual de Filosofia do Direito: atualmente, a Filosofia do Direito corresponde a uma atitude (ou “atividade”) dos juristas perante o Direito, que pode ser caracterizada como uma tentativa de construir um sentido para a experiência humana do Direito. Esse sentido é construído por meio de debates, que aperfeiçoam a visualização dos problemas jurídicos. Com seus debates, a Filosofia do Direito – também chamada de “Filosofia Jurídica” – corresponde à busca dos juristas por um ponto de vista crítico sobre o Direito. Pode-se dizer, portanto, que triunfou a visão da Filosofia do Direito dos juristas.
· Convivência entre Teoria Geral do Direito e Filosofia do Direito: atualmente, Teoria Geral do Direito e Filosofia do Direito convivem. Nesse sentido, para Lopes (2010), algumas questões de Filosofia do Direito dizem respeito à condição de existência das regras e sua aplicabilidade, de modo que são questões de Teoria Geral do Direito. Outra série de questões, no entanto, pode surgir do desconforto que certas soluções previstas trazem para casos concretos que estão em julgamento: dizem respeito ao sentido geral de um sistema jurídico, de modo que se trata de questões de justiça e equidade, pertinentes ao campo da Filosofia do Direito propriamente dita. Nos últimos anos os campos que, em geral, ocupam os filósofos do Direito, são as questões da natureza, as questões de interpretação e as questões de justiça dos sistemas normativos.
· (*) Abordagem atual da Filosofia do Direito nas faculdades de Direito: atualmente, pelo menos nas faculdades de Direito, a Filosofia do Direito não é abordada como uma continuação da Filosofia Geral, ou seja, não é conceituadacomo um ramo da Filosofia Geral, aplicado ao Direito. Atualmente, a Filosofia do Direito é entendida como disciplina autônoma, com conhecimento desenvolvido, predominantemente, por juristas. Observa-se, então, que, pelo menos nas faculdades de Direito, triunfou a visão da Filosofia do Direito dos juristas.
· A Filosofia do Direito, atualmente, é ensinada nas faculdades de Direito como uma disciplina jurídica. Apesar de ter sido inserida nos cursos jurídicos a partir do século XIX, atualmente se entende que é diferente das demais disciplinas jurídicas do curso, posto que é voltada para a compreensão da legislação, da jurisprudência e dos comentários feitos pela doutrina.
E dizemos um jurista completo porque o filósofo do Direito, na nossa perspectiva, não deve ser um sujeito abstruso, excêntrico, que não conheça o direito real, e que efabule teorias incompreensíveis; antes pelo contrário, o filósofo do Direito deve ser o jurista integral, completo, que conhece, além da norma, o seu sentido, a sua gênese, a sua razão mais profunda, etc., etc. E que sabe os textos, e os sabe interpretar para agir no real, no mundo dos factos, tendo como inspiração e Norte essa outra realidade dos valores, que infelizmente só a alguns é dado atingir plenamente [...] (CUNHA, 2013, p. 143).
· Objetivo da Filosofia do Direito: partindo-se da verificação de que a Filosofia do Direito é um “modo de olhar” que permite identificar e discutir os problemas do fenômeno jurídico, entende-se que o enfoque filosófico-jurídico não visa instaurar a dúvida ou criar polêmicas, mas sim considerar e esclarecer os problemas presentes na própria prática jurídica.
· Entre esses problemas, o enfoque filosófico-jurídico destaca a questão da fundamentação racional do discurso jurídico, em face da distinção entre Ética e Direito elaborada no contexto das sociedades modernas.
Aula 3 – 15/08/2019
Programa – Aula 3
3. Formas de apresentação do conhecimento jurídico e a ascensão e queda do Positivismo jurídico
3.1. Conhecimento jurídico e a diferença entre zetética e dogmática
3.2. Função social da dogmática jurídica como ferramenta de decidibilidade
3.3. Experiências históricas que originaram a Dogmática jurídica
3.4. Dogmática jurídica e a ascensão e queda do Positivismo jurídico
Formas de apresentação do conhecimento jurídico e a ascensão e queda do Positivismo jurídico
· Entendimento: esta seção buscará apresentar as duas formas de entender e construir o conhecimento jurídico (a zetética e a dogmática), de acordo com Theodor Viehweg. Em seguida, se demonstrará de que maneira o “dogma jurídico” se diferencia do conceito de “dogma” da Sociologia e da Teologia. Depois, passa-se à apresentação das experiências históricas que originaram a Dogmática jurídica, bem como à demonstração de como o desenvolvimento desta Dogmática jurídica contribuiu para a ascensão e queda do Positivismo jurídico como modelo que tentava explicar o Direito na era da Modernidade (ou seja, anteriormente à era contemporânea, na qual se vive atualmente).
Conhecimento jurídico e a diferença entre zetética e dogmática
· Entendimento: o conhecimento jurídico pode se apresentar de duas formas, de acordo com o jurista alemão Theodor Viehweg (1907-1988). Ela são (i) a zetética e (ii) a dogmática. Vale ressaltar que estas duas formas de conhecimento jurídico não são antagônicas, mas complementares. Tem-se:
· (i) Zetética: a zetética é o conhecimento jurídico obtido por meio de especulação sem base em qualquer normatização pré-definida. Ela investiga o “ser” de algo. O papel principal da zetética, então, é produzir novos conhecimentos, avançando nos saberes, assim, diz-se que tem uma função cognoscitiva. A zetética se concentra no aspecto “pergunta” ou “problema”. Trata-se de uma atitude de investigação de problemas buscando corrigir premissas questionáveis para desenvolver saberes e conhecimentos. Tem-se, pois, reflexão.
· Exemplos: disciplinas jurídicas eminentemente zetéticas são a Filosofia do Direito, a Criminologia, a Sociologia e a Ciência Política.
· (ii) Dogmática: a dogmática, por sua vez, parte de um pressuposto arbitrário e preocupado com seu curso de ação, de modo a chegar em uma decisão acerca do conhecimento. Ela investiga o “dever-ser” de algo. O papel principal da dogmática, então, é pôr fim ao conflito jurídico. A dogmática se concentra no aspecto “resposta”. Trata-se de uma atitude de investigação de problemas buscando estabelecer premissas vinculantes para orientar ações e decisões. Tem-se, pois, tomada de decisão. Trata-se de uma função de decidibilidade.
· Exemplos: disciplinas jurídicas eminentemente dogmáticas são o Direito Processual, o Direito Penal, o Direito Civil e o Direito Tributário.
	
	Enfoque zetético
	Enfoque dogmático
	Comportamento geral
	Discutir um problema a partir de premissas
	Discutir um problema a partir de premissas
	Função específica
	Desenvolver saberes e conhecimentos
	Criar condições para a ação (tomada de decisão)
	Ênfase argumentativa
	As perguntas
	As respostas
	Modo de argumentar
	Abertura para a crítica (é possível realizar um questionamento global e infinito das premissas)
	Fechamento para a crítica (as premissas, ou seja, os pontos de partida, são colocados fora de questão)
	Uso da linguagem
	Predominantemente informativo
	Predominantemente diretivo
	Premissas
	São tratadas como evidências sujeitas à comprovação
	São tratadas como dogmas vinculantes
	Compromisso
	As premissas devem se adaptar ao problema. Assim, se a realidade fática contraria a premissa, o erro está na definição da premissa
	O problema deve se adaptar às premissas
	Resultados
	Supera opiniões e possibilita pesquisas (em especial, as ciências)
	Busca conservar opiniões e possibilitar o agir (possibilita, em especial, as decisões)
	Exemplos de enfoque
	Teorias de criminologia
Teorias de psicologia forense
Teorias de medicina legal
Teorias de política legislativa
Teorias de análise econômica do direito
Teorias de história do direito
Teorias de sociologia jurídica
Teorias de antropologia jurídica
Teorias de filosofia do direito
Teoria Geral do Direito
	Teorias de Direito Civil
Teorias de Direito Penal
Teorias de Direito Constitucional
Teorias de Direito Processual Civil
Teorias de Direito Processual Penal
Teorias de Direito Trabalhista
Teorias de Direito Empresarial
Teorias de Direito Tributário
Teorias de Administrativo
Teorias de Direito Concorrencial
Teorias de Direito Econômico
Teorias de Direito Internacional
· Exemplo concreto: a análise de um determinado tema pode priorizar um enfoque zetético ou enfoque dogmático. A respeito do direito de greve como exemplo concreto de aplicação dos diferentes enfoques para analisar o problema específico do direito de greve, tem-se:
· (i) Enfoque zetético: estudo “Experiências de greve no Estado Novo”, de Gustavo Silveira Siqueira. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/download/16527/12458>. Acesso em: 15.08.2019.
Resumo
O presente artigo tentar discutir a existência de experiências de greve no Estado Novo. Utilizando fontes primárias e inéditas no mundo acadêmico, problematiza-se a assertiva de alguns autores que afirmam a inexistência de movimentos grevistas no período. Desta forma procura-se demonstrar como o conceito e as experiências de greve podem ter se alterado e não desaparecido nos violentos anos da ditadura Vargas.
Palavras-chave
Greve no Estado Novo – Experiências jurídicas –Ditadura Vargas – História do Direito.
· (ii) Enfoque dogmático: inicialmente, cumpre ressaltar que os militares não têm direito de greve, nem de sindicalização, por expressa vedação constitucional (art. 142, §3º, IV, CF). Por sua vez, quando se trata de servidor público em sentido estrito, sim, há o direito de greve. Com efeito, nos moldes do art. 37, VII, CF, o servidor público civil tem direito de greve, que será exercido nos termos da lei específica.
EMENTA: CONSTITUCIONAL. GARANTIA DA SEGURANÇA INTERNA, ORDEM PÚBLICA E PAZ SOCIAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICADOS ART. 9º, § 1º, ART. 37, VII, E ART. 144, DA CF. VEDAÇÃO ABSOLUTA AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE AOS SERVIDORES PÚBLICOS INTEGRANTES DAS CARREIRAS DE SEGURANÇA PÚBLICA.
1. A atividade policial é carreira de Estado imprescindível a manutenção da normalidade democrática, sendo impossível sua complementação ou substituição pela atividade privada. A carreira policial é o braço armado do Estado, responsável pela garantia da segurança interna, ordem pública e paz social. E o Estado não faz greve. O Estado em greve é anárquico. A Constituição Federal não permite.
2. Aparente colisão de direitos. Prevalência do interesse público e social na manutenção da segurança interna, da ordem pública e da paz social sobre o interesse individual de determinada categoria de servidores públicos. Impossibilidade absoluta do exercício do direito de greve às carreiras policiais. Interpretação teleológica do texto constitucional, em especial dos artigos 9º, § 1º, 37, VII e 144.
3. Recurso provido, com afirmação de tese de repercussão geral: “1 - O exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou modalidade, é vedado aos policiais civis e a todos os servidores públicos que atuem diretamente na área de segurança pública. 2 - É obrigatória a participação do Poder Público em mediação instaurada pelos órgãos classistas das carreiras de segurança pública, nos termos do art. 165 do Código de Processo Civil, para vocalização dos interesses da categoria. (ARE nº 654.432/GO, rel. Min. EDSON FACHIN, rel. p/ Acórdão ALEXANDRE DE MORAES. Plenário do STF, j. 05/04/2017, publicado em 11/06/2018)
Função social da dogmática jurídica como ferramenta de decidibilidade
· Entendimento: na Ciência do Direito, o dogma é a própria norma jurídica, que serve de ponto de partida para as discussões jurídicas. Assim sendo, nas palavras de Tércio Sampaio Ferraz Junior, a função social da dogmática jurídica é de servir como um “controle de consistência da decidibilidade, sendo, então, a partir dela que se torna viável definir as condições do juridicamente possível”. A dogmática jurídica, então, facilita a decidibilidade, para colocar fim ao conflito. A Ciência do Direito, então, sob a ótica da dogmática jurídica, em seu aspecto prático, tem como objetivo chegar a uma decisão a respeito do caso concreto. A dogmática, no entanto, muitas vezes necessita da zetética para ser capaz de evoluir ou se modificar, de acordo com os avanços sociais (é o caso, por exemplo, da concepção, anteriormente dogmática, de ausência de culpabilidade em homicídio da esposa por legítima defesa da honra, que foi alterada em razão das sucessivas reflexões da zetética).
· Definição de dogmática jurídica: a dogmática jurídica é uma atitude de investigação que se vale de três elementos básicos, para criar condições de decidibilidade para os conflitos sociais. Esses elementos são (i) a lei em sentido amplo (legislação), (ii) as decisões dos tribunais (a jurisprudência), e (iii) os comentários dos especialistas em Direito (a hermenêutica jurídica).
· Características básicas da Dogmática Jurídica: a dogmática jurídica tem algumas características básicas. Elas são:
· (i) Trata-se de um modo de argumentar que toma por base premissas postas por decisão (“premissas arbitrárias”);
· (ii) Considera as premissas postas por decisão como vinculantes para a investigação de um problema;
· (iii) Renuncia ao postulado da pesquisa independente;
· (iv) Trata o problema como uma questão finita, que exige uma resposta, de modo que há uma proibição do non liquet (proibição da incerteza, ou proibição da não-resposta), ou seja, é vedado ao juiz não se pronunciar acerca de uma lide levada ao Poder Judiciário;
· (v) É regida, portanto, por um pressuposto geral, o postulado da inegabilidade dos pontos de partida, que significa que as premissas, ou seja, os pontos de partida, são colocados fora de questão, não podendo ser questionados. Assim sendo, nega-se o postulado da pesquisa independente (no qual se enquadra o enfoque zetético), de acordo com o qual se entende que todos os aspectos de um problema podem ser questionados.
· (vi) Definindo-se “tecnologia” como “ciência aplicada”, Tércio Sampaio Ferraz Jr entende que a dogmática jurídica tem uma característica de tecnologia. Isso significa que todo conhecimento produzido no campo da dogmática objetiva ser aplicado, ou seja, objetiva resolver problemas (não se busca produzir novos saberes, nem melhorar as respostas que já existem, os quais são funções da zetética).
· Relação entre dogmática e incerteza: o enfoque dogmático, ao estudar o Direito Positivo, não trabalha com certezas. Pelo contrário, as doutrinas jurídicas retomam e ampliam as incertezas originais de cada caso. Apesar disso, devido a seu compromisso com a decisão dos conflitos, os estudos dogmáticos não simplesmente “retomam dúvidas”, mas as retomam de um modo controlado, seguindo certos padrões de argumentação jurídica.
Experiências históricas que originaram a Dogmática jurídica
Tópico construído com base em: TOZO, Lucas Suárez de Oliveira; SOLON, Ari Marcelo. Dogmática jurídica: caracterização de um conhecimento jurídico historicamente construído. Disponível em: https://ojs.franca.unesp.br/index.php/estudosjuridicosunesp/article/view/234.
· Entendimento: a dogmática jurídica é uma forma específica de conhecimento jurídico fruto da consolidação de três heranças da tradição jurídica europeia sob condições epistemológicas e político-jurídicas determinadas. Estas três correntes são (i) a herança jurisprudencial dos romanos; (ii) a exegética dos medievais e (iii) a sistemática dos modernos.
· (i) Herança jurisprudencial dos romanos: parte-se da observação de que o Direito Romano era um direito casuístico, de modo que os técnicos jurídicos romanos buscavam soluções para cada caso concreto por meio do confronto de opiniões, ideias e proposições. A este confronto, Aristóteles denominou dialética. A partir desta ideia de direito aplicado na prática, entende-se que a contribuição romana está justamente no fato de que, a partir dela, o saber jurídico passa a agir e prescrever, ao invés de simplesmente contemplar.
· (ii) Exegética dos medievais: a principal contribuição dos medievais é o desenvolvimento de uma nova técnica interpretativa, apoiada em textos codificados. Para Norberto Bobbio, estes texto codificados representavam uma ratio scripta, definida como um “conjunto de regras racionalmente fundadas, exprimindo a própria essência da razão jurídica (Juristenrecht), e como tais capazes de serem usadas para resolver todas as possíveis controvérsias”. Os aplicadores da lei do período medieval, então, buscavam harmonizar o conteúdo dos diversos textos, buscando “paralelos, concordâncias e distinções entre as peculiaridades textuais, ou seja, a organização e a coerência entre os mesmos”. Assim, observa-se que, no período medieval, a aplicação da lei era dada conforme a compreensão que a autoridade tinha a partir dos textos da ratio scripta.
· (iii) Sistemática dos modernos: surgiu a partir do Humanismo Renascentista, quando se passou a considerar que à exegese dos medievais faltava sistematicidade. Essencialmente, o conceito de sistema ficou conhecido como um meio de ordem e classificação, que não mais tinha fundamento de validade apenas na autoridade do aplicador da lei, mas sim em uma “generalidade racional”. Nesse sentido, os autores apontam que a teoria jurídica europeia passa a ser vista como um sistema fechado “no qual se busca a legitimação perante a razão pela exatidão lógica da concatenação de suas proposições”. Assim, a contribuição desta herança para o desenvolvimento da dogmática jurídica está, justamente, nesta compreensão da aplicação da lei a partir de um método sistemático, também conhecido como método lógico-dedutivo. Elementos importantes da sistemática dos modernos são:
· (a) Estado moderno;
· (b) Renascimento;
· (c) Capitalismo;
· (d) Soberania;
· (e) Separação de poderes.
A Dogmática jurídica e a ascensão e queda do Positivismo jurídico
Tópico construídocom base em: TOZO, Lucas Suárez de Oliveira; SOLON, Ari Marcelo. Dogmática jurídica: caracterização de um conhecimento jurídico historicamente construído. Disponível em: https://ojs.franca.unesp.br/index.php/estudosjuridicosunesp/article/view/234.
· Entendimento: a dogmática jurídica passou por diversas formulações, ao longo do tempo, com início (i) na Escola Histórica, passando (ii) pelo formalismo da Jurisprudência dos conceitos, até chegar em sua forma definitiva dada (iii) pelo Positivismo Jurídico.
· (i) Escola Histórica: a Escola Histórica tem origem no historicismo, um movimento filosófico-cultural contemporâneo ao Romantismo, que valorizava o homem em sua individualidade, em oposição ao racionalismo dos modernos, associado ao método sistemático lógico-dedutivo. Trata-se, pois, de uma corrente antirracionalista. Esta corrente entende a história como um processo feito pelo homem e, o Direito, sendo também feito pelo homem, passa a ser entendido como fenômeno histórico. A Escola Histórica, então, faz uma primeira tentativa de enquadramento do conhecimento jurídico como científico, por um método próprio de natureza histórica, entendendo-se o Direito como a objetivação do espírito do povo, em uma aproximação dos métodos do Direito com os da ciência. Com o tempo, no entanto, o componente histórico do Direito se viu relegado a um segundo plano, enquanto o sistema dogmático-jurídico assumia papel principal.
· (ii) Formalismo da Jurisprudência dos conceitos: a Jurisprudência dos conceitos vem, justamente, como uma fase tardia da Escola Histórica, na qual se dava ênfase à construção do sistema de conceitos jurídicos. No que tange esta corrente, ressalta-se que também é denominada Jurisprudência pandectística, em razão de sua retomada do Direito Romano (pandectas). A partir da ideia da Escola Histórica de Direito como objetivação do espírito do povo, entendia-se que “as instituições jurídicas teriam princípios orientadores que garantiam sua unidade”. Assim, estes princípios gerais abstratos permitiriam a dedução de princípios inferiores, bem como a solução dos casos concretos. O tratamento dos conceitos jurídicos como “genéricos, abstratos e rigorosamente concatenados” fortaleceu a ideia de verdade científica, fugindo da arbitrariedade e ganhando universalidade. Os resultados mais importantes da Jurisprudência dos conceitos, para a dogmática, são (i) a teoria da subsunção; (b) o dogma da plenitude lógica do ordenamento jurídico e (c) a interpretação objetivista.
· (iii) Positivismo Jurídico: o Positivismo jurídico trouxe a formulação final do conceito de dogmática jurídica. Para esta corrente, dominante no século XIX, a ciência era a única forma válida de conhecimento e as leis científicas devem ser leis gerais. O que unia as diferentes percepções acerca do Positivismo, nessa época, era a crença comum de que se deveria recusar quaisquer formas de subjetivismo ou moralismo, priorizando-se métodos objetivos e verificáveis, sem juízos de valor. O Positivismo, pois, consiste no conjunto de reflexões e teorias filosóficas que busca sintetizar os métodos que permitem a interpretação do Direito como uma ciência. Enquanto isso, o direito positivo é entendido como o método de estudo do Positivismo jurídico. Sob esta concepção, o jurista deveria abordar o Direito também abstendo-se de concepções valorativas. A partir deste entendimento, a Lei escrita detinha supremacia sobre outras fontes e o ordenamento jurídico passou a considerar a estrutura não da norma isolada, mas do conjunto de normas vigentes numa sociedade.
· Este Positivismo jurídico remete à ideia de que “a missão da Ciência jurídica é investigar e elaborar, por procedimentos lógicos, todo material jurídico (normas) em unidade sistemática”. A Dogmática jurídica clássica, então, concebe a Ciência do Direito como se iniciando nas disposições particulares, buscando, entre estas, eventuais similaridades e homogeneidades, com objetivo de obter princípios unificadores. Em seguida, a partir do método sistemático lógico-dedutivo, tenta extrair, dos enunciados gerais, as soluções dos conflitos particulares, conforme um silogismo clássico.
· A Teoria Geral do Direito é um efeito desta sistematização, tratando-se de estrutura lógica das normas jurídicas, dos conceitos fundamentais (formais) encontrados em todos os ordenamentos (por exemplo: sujeito de direito, faculdade, lícito e ilícito) e a relação lógica destes conceitos entre si. O objetivo da Teoria Geral do Direito, então, era de emancipar a Ciência do Direito da Filosofia Geral, criando uma Filosofia do Direito, em um distanciamento da ciência em relação à filosofia. A Dogmática Jurídica como disciplina específica, por sua vez, não se confunde com a Filosofia do Direito e a Teoria Geral do Direito. A Dogmática jurídica, então, é, essencialmente, uma forma de apresentação da Ciência do Direito, quando esta se destina ao estudo sistemático das normas, ordenando-as segundo princípios, e tendo em vista a sua aplicação.
· No entanto, o Positivismo jurídico também pode levar ao excessivo formalismo, de modo que o conteúdo do Direito passa a não importar, não cabendo discussão quanto às origens destas normas. Assim sendo, a Dogmática jurídica clássica, analisada criticamente, padece do fato de que seus conceitos obtidos pela abstração e generalização da experiência jurídica são conceitos puramente lógicos, independentes das valorações ou da realidade social. Este excessivo formalismo foi utilizado como base de apoio para sistemas políticos como o Nazismo e o Fascismo. Assim, após o fim da 2ª Guerra Mundial (segunda metade do século XX), o Positivismo – à época fortemente calcado nas teorias de Hart – passou a receber duras críticas, passando-se a ressurgir o Direito e a Filosofia do Direito sob os ideais de busca de Justiça.
· Ocorre, pois, uma reaproximação entre moral e direito, na fase do pós-positivismo, que se desenvolve dentro do momento histórico conhecido como “Filosofia do Direito contemporânea”, cujo principal autor é Ronald Dworkin. O pós-positivismo é o grupo de teorias, elaboradas a partir da primeira metade do século XX, cujo objetivo era superar os modelos, entendimentos e paradigmas do positivismo jurídico e do realismo jurídico estadunidense.
Aula 4 – 20/08/2019
Programa – Aula 4
4. Introdução à Filosofia do Direito contemporânea
4.1. Construção histórica da Filosofia do Direito contemporânea e o Pós-positivismo
4.2. Regras e princípios sob a ótica do pós-positivismo
Introdução à Filosofia do Direito contemporânea
· Entendimento: para se começar a compreender a Filosofia do Direito contemporânea, deve-se avaliar uma questão de base, que , em verdade, é uma das circunstâncias formadoras do Direito. Partindo-se do fato de que as pessoas constituem uma diversidade de vidas vividas em um único mundo, e que tais pessoas vivem de modo inter-relacionado, há necessidade de uma ordem social apta e legítima a permear esse conjunto de relações recíprocas. A partir desta questão de base, o Direito nasce na realidade experienciada pelo homem, como uma obra de realização humana, historicamente condicionado. O Direito, portanto, advém da cultura humana e tem seu “porquê” (sua razão de ser) e seu “para que” (sua finalidade). É necessário, então, estabelecer uma certa ordenação a potencializar e permitir a comum presença de todos, com seus diversos objetivos, mesmo quando estes objetivos são contraditórios (ou, por vezes, radicalmente, opostos). Nesse sentido, o Direito emerge como uma alternativa à viabilização da existência humana no planeta.
Construção histórica da Filosofia contemporânea e o Pós-positivismo
· Entendimento: como já abordado, o Positivismo jurídico, apesar de seus pontos positivos, também pode levar ao excessivo formalismo, de modo que o conteúdo do Direito passa a não importar, não cabendo discussão quanto às origens destas normas. Este excessivo formalismo foi utilizado como base de apoio para sistemas políticos como o Nazismo e o Fascismo. Assim, após o fim da 2ª GuerraMundial (segunda metade do século XX), o Positivismo – à época fortemente calcado nas teorias de Hart – passou a receber duras críticas, passando-se a ressurgir o Direito e a Filosofia do Direito sob os ideais de busca de Justiça. Ocorre, pois, uma reaproximação entre moral e direito, na fase do pós-positivismo, que se desenvolve dentro do momento histórico conhecido como “Filosofia do Direito contemporânea”.
· Conceito de “pós-positivismo” e a ascensão da Filosofia do Direito contemporânea: o pós-positivismo é um grupo de teorias, elaboradas a partir da segunda metade do século XX (mais precisamente a partir da década de 60). O momento histórico no qual este pós-positivismo se desenvolve é chamado de “Filosofia do Direito contemporânea”. O pós-positivismo tem como objetivo superar os modelos, entendimentos e paradigmas do positivismo jurídico, do jusnaturalismo e do realismo jurídico estadunidense.
· De acordo com Lenio Streck, para os pós-positivistas, o fenômeno jurídico já não mais poderia ser pensado como “mera racionalidade instrumental” ou como “um instrumento destinado à proteção dos interesses das classes dominantes”, resultado das duas fases do legalismo, do nascedouro da modernidade ao Direito contemporâneo. As questões morais, políticas e econômicas – rejeitadas, em sentido amplo (lato sensu), pelo positivismo jurídico – passam a fazer parte da preocupação da comunidade jurídica.
Regras e princípios sob a ótica do pós-positivismo
· Entendimento: para Robert Alexy, autor pós-positivista, “regra” e “princípio” são normas jurídicas (e, portanto, atinentes ao mundo do “dever-ser”), mas se diferenciam a partir de dois fatores, a generalidade e a resolução de conflitos. Essencialmente, tem-se:
· (i) Conceito de “regra”: as regras são normas que (a) contêm determinações fáticas e jurídicas e que (b) devem ser cumpridas ou não. Assim, se uma regra é válida, deve-se fazer exatamente o que ela exige, sem mais nem menos.
· (ii) Evolução do conceito de “princípio”: o conceito de princípio sofreu significativa evolução ao longo do tempo. O conceito moderno de “princípio” já é bastante diferente do conceito que o termo tinha durante o predomínio do positivismo. Essencialmente, tem-se:
· Visão positivista de “princípio”: a posição positivista a respeito do princípio era de que se tratava de mero programa, um fim a ser atendido, um guia para a interpretação da lei. Na perspectiva positivista tradicional, o princípio é uma fonte subsidiária do Direito, que só seria utilizado na ausência da lei, ou para guiar a sua intepretação. O positivismo, portanto, atrela o Direito à lei escrita
· Crítica à visão positivista: a regra escrita (lei) não é suficiente para regular todas as situações fáticas que precisam de regulação, ou seja, a lei não é suficiente para regular a vida em sociedade.
Observação: Crítica à crítica acerca da visão positivista. Para Lenio Streck, o desprezo à lei escrita pode implicar o abuso na utilização dos princípios (panprincipiologismo), que pode significar insegurança decorrente do subjetivismo.
· Superação da visão positivista: após a 2ª Guerra Mundial, novas necessidade sociais surgiram. Nesse sentido, o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha precisava de uma lei diferente da lei nazista, por isso condensou todas essas leis em forma de princípios e direitos fundamentais. Atualmente, entende-se que o princípio é dotado de força normativa, ou seja, de obrigatoriedade.
· Conceito moderno de “princípio”: sob a ótica pós-positivista, os princípios são normas abertas, com alto grau de abstração, que estabelecem fins a serem atingidos e são dotadas de força normativa. Suas principais características são:
· (a) Têm alto grau de indeterminação;
· (b) Conferem fundamento para outras normas;
· (c) Estabelecem o dever de adotar comportamentos necessários à concretização de um fim (por exemplo, proteger a pessoa humana);
· (d) Podem ser utilizados como instrumentos de preenchimento de lacunas normativas.
· Quadro-resumo a respeito das diferenças entre “regra” e “princípio”:
	Relação entre norma e princípio
	Regras
	Princípios
	Generalidade
	É menor (baixa generalidade, pois a regra já é uma densificação)
	Alta generalidade
	Resolução de Conflitos
	Entre duas regras conflitantes: Sempre prevalecerá a regra válida
	Entre dois princípios conflitantes: ponderação (confere-se pesos aos princípios e prevalecerá o princípio mais pesado, em relação ao caso concreto)
	Conflito entre regra e princípio
	A “regra” tem determinação fática jurídica, ou seja, é melhor determinada, portanto, em conflitos entre “regra” e “princípio”, a regra prevalece, já que descreveu aquele fato de forma mais plena
· Papel da regra e do princípio na aplicação do Direito: essencialmente, o papel da regra e do princípio, na aplicação do Direito, é diverso. Tem-se:
· (i) Aplicação da regra: a regra será aplicada por intermédio da subsunção, ou seja, pela mera adequação do fato à lei.
· (ii) Aplicação do princípio: o papel do princípio é de conceder abertura para o juiz decidir. Os princípios, como normas abertas, são aplicados por intermédio de outras técnicas, a exemplo da “ponderação principiológica”, que é a técnica em que o aplicador (juiz ou doutrinador) confere peso aos princípios de modo a prevalecer o mais forte, no caso concreto, sem que o outro saia do ordenamento jurídico (este outro princípio, em outro caso concreto, poderá prevalecer). Entretanto, o juiz encontra alguns limites na aplicação dos princípios, sendo que o principal deles é a própria Constituição (o autor Lenio Streck, no entanto, questiona a possibilidade de variação desses limites conforme a subjetividade de cada juiz, o que pode, segundo ele, ser problemático).
Aula 5 – 22/08/2019
Programa – Aula 5
4.3. Teses que o Pós-positivismo intenta superar
4.3.1. Jusnaturalismo (ou jusracionalismo)
4.3.2. Realismo jurídico
4.3.3. Positivismo jurídico
Teses que o Pós-positivismo intenta superar
· Entendimento: o Pós-positivismo tem como objetivo superar os modelos modernos que intentavam explicar o Direito. Essencialmente, intentou-se superar os seguintes conceitos de Direito:
· (i) Jusnaturalismo (ou jusracionalismo);
· (ii) Realismo jurídico;
· (iii) Positivismo.
· Aspectos metodológicos: a ideia de superação de uma ou mais correntes de pensamento segue três passos metodológicos sequenciais básicos. Eles são:
· (i) Dissolução: consiste na ideia de “quebrar” os conceitos de determinada escola ou corrente de pensamento.
· (ii) Ampliação: consiste na definição do Âmbito temático de determinada escola ou corrente de pensamento.
· (iii) Inovação: consiste na introdução de novos pensamentos por meio de novas pesquisa, especialização, fragmentação, diversificação e fluidez.
Jusnaturalismo (ou jusracionalismo)
· Entendimento: na concepção jusnatural ou jusracional, entende-se o Direito como uma “correção material” (com o termo “correção” entendido como “agir de maneira correta, justa”). A concepção jusnaturalista pode ser caracterizada pela defesa conjunta de duas teses. Elas são:
· (i) Uma tese de Filosofia Ética, que afirma a existência de princípios morais e de justiça universalmente válidos e acessíveis à razão humana;
· (ii) Uma tese relativa à definição do conceito de Direito, segundo o qual um sistema normativo ou uma norma não podem ser classificados como “jurídicos” se estão em desacordo com aqueles princípios morais ou de justiça. Não são jurídicas, portanto, as normas que não tenham a justiça como finalidade.
Realismo jurídico
· Entendimento: na concepção realista, o Direito é aquilo que dizem os tribunais. Há duas correntes mais conhecidas de realismo, a estadunidense e a escandinava. A mais aceita no Brasil é a corrente estadunidense, que tem como pressuposto a defesa jurídica das seguintes proposições:
· (i) Foco nas mudanças e não no caráter estático da realidade jurídica;
· (ii) Afirmação de que os juízes exercem uma atividade criativa sobre o Direito;
· (iii) Concepção do Direito como meio (e nãocomo fim) para alcançar objetivos sociais. Esta última proposição se relaciona com o Funcionalismo (especialmente na vertente econômica, denominada Análise Econômica do Direito), bem como com a Critical Legal Studies (CLS);
· (iv) Assumir uma atitude científica direcionada à observação dos fatos sociais;
· (v) O conjunto de regras jurídicas não se coloca como o principal objeto de análise pela Ciência do Direito;
· (vi) Criticar os conceitos jurídicos tradicionais e as normas entendidas em sentido tradicional e advogar que essas normas tradicionais nada mais seriam que “profecias” a indicar o que os tribunais provavelmente farão.
Positivismo jurídico
· Entendimento: o conceito de Direito puramente positivista entende o Direito como a aplicação da legalidade conforme o ordenamento e/ou a eficácia social (resolução de problemas). Este positivismo pode ser entendido como o conjunto de teorias que rejeita o jusnaturalismo, negando que o fundamento do Direito positivo estaria na natureza racional do universo ou do homem. De maneira simplificada, tem-se:
· (i) Juspositivismo clássico (século XIX): movimento em que o material jurídico é estabelecido por alguma autoridade humana legitimada. O juspositivismo clássico tem diversas correntes, que predominaram em diferentes países. Na França foi mais forte a corrente do “Positivismo exegético”, para a qual a lei era produzida pelo legislador racional, com inspiração iluminista. A corrente da “Jurisprudência dos conceitos”, para a qual conceitos gerais e abstratos podem ser deduzidos pelos juristas-professores, a partir de um sistema hierarquizado de conceitos, predominou na Alemanha. Na Inglaterra, foi mais forte a corrente da “Jurisprudência analítica”, para a qual o Direito deve ser orientado a partir dos precedentes proferidos pela autoridade política competente.
· (ii) Positivismo normativista: o jurista austríaco Hans Kelsen foi o primeiro positivista pós-exegético, adepto do chamado “Positivismo normativista”, para o qual se parte de uma separação entre fato e valor. Para Kelsen, a validade da norma advém de uma norma superior, chegando, em seu limite, à norma hipotética fundamental, um elemento lógico-transcendental, definido pela doutrina, que dá fundamento de validade às Constituições. Para a Teoria Pura do Direito, de Kelsen, o fundamento do Direito positivo é uma norma jurídica hipotética (norma fundamental).
· (iii) Positivismo inclusivo: o jurista inglês Herbert Hart, por sua vez, é considerado adepto do “Positivismo inclusivo” (também chamado de “positivismo moderado”, “positivismo brando” ou “soft positivism"). Para Hart, a validade do Direito advém do mundo concreto e social. O Direito, então, pode se relacionar com a moral, mas esta relação não é obrigatória (relação contingencial). Se a comunidade entende a regra como obrigatória, correta e justa, esta regra será norma jurídica. Assim, o Direito tem validade porque a comunidade política na qual ele governa o reconhece como tal (regra de reconhecimento), logo, um conteúdo só pode ser reconhecido como Direito se possuir respaldo social daquela sociedade no espaço e na temporalidade localizada (elemento convencional). Conclusivamente, para a “Teoria das regras sociais” de Hart, o fundamento é uma regra jurídica não hipotética, a regra de reconhecimento. É possível que argumentos morais venham a integrar o Direito de forma contingencial, pois ele – Direito – enquanto linguagem, contém vaguezas e ambiguidades nas quais, não havendo definição de sua significação, entra em uma “textura aberta”, na qual os juízes podem criar Direito segundo padrões externos ao próprio Direito, como argumentos políticos, morais, dentre outros. Os juízes têm legitimidade para tanto porque a regra de reconhecimento assim estabelece.
· (iv) Positivismo contemporâneo: o positivismo contemporâneo pode ser entendido sob dois aspectos. Eles são:
· (a) Positivismo jurídico exclusivo ou radical: sustenta que a moral nunca é condição necessária para a definição do Direito. O único elemento relevante para identificação do Direito é que sua fonte seja uma autoridade social. Os expoentes desta corrente são Joseph Raz (que, curiosamente, era discípulo de Hart) e Andrei Marmor.
· (b) Positivismo jurídico inclusivo ou moderado: entende que a moral pode determinar o conceito de Direito em certas situações. Os expoentes desta corrente são Wilfrid Waluchow e Jules Coleman.
Observação: Pontos comuns entre as teorias positivistas de Direito. As teorias positivistas, apesar de distintas entre si, tem alguns pontos em comum. O primeiro deles é de que o Direito não é dado pela natureza (opõem-se, portanto, ao jusnaturalismo), mas sim construído pela sociedade (seguindo, então, a “Tese das fontes sociais e históricas do Direito”), de modo que o Direito sempre seria um fenômeno social. O segundo ponto em comum é de que não existe uma conexão obrigatória entre o conceito de Direito e o conceito de Moral (adotando-se, então, a “Tese da separação conceitual do Direito”). Assim, os vínculos entre o Direito e a Moral são contingentes, de modo que não integram o conceito de Direito.
· Quadro-resumo da diferenciação entre as perspectivas positivista e pós-positivista:
	Paradigma positivista / legalista
	Paradigma pós-positivista / constitucional
	1ª Tese – Modelo de regras.
	1ª Tese – Modelo de regras e princípios.
	2ª Tese – As únicas relações admitidas entre as normas são de natureza lógica.
	2ª Tese – As relações admitidas entre as normas são de natureza lógica e de justificação (as normas também requerem uma coerência valorativa).
	3ª Tese – Correlação entre direitos e deveres.
	3ª Tese – O reconhecimento de direitos impõe deveres, contudo, os deveres não justificam a titularidade dos direitos.
	4ª Tese – Modelo decisório no qual o raciocínio subsuntivo é suficiente para a justificação judicial.
	4ª Tese – Modelo decisório no qual o raciocínio subsuntivo é insuficiente para a justificação judicial, sendo, portanto, necessário a ponderação e o balanceamento.
	5ª Tese – Nítida distinção entre criar e aplicar a norma.
	5ª Tese – A distinção entre criar e aplicar a norma fica fragilizada.
	6ª Tese – Há apenas um juízo formal de validez.
	6ª Tese – Há distinção entre a validez formal e material das normas.
	7ª Tese – A maneira de compreender os casos é de se realizar uma distinção entre casos regulados e não regulados.
	7ª Tese – A maneira de compreender os casos é de se realizar uma distinção entre casos fáceis e casos difíceis (hard cases).
	8ª Tese – A linguagem do Direito é prescritiva e sem valor de verdade, enquanto a linguagem sobre o Direito é composta por enunciados descritivos que podem ser verdadeiros ou falsos.
	8ª Tese – Prioriza-se um discurso reconstrutivo do fenômeno. A pretensão de uma descrição não-valorativa é minorada, abrindo-se espaço para uma análise compreensiva e justificatória do Direito, enquanto racionalidade prática.
	9ª Tese – Há evidente separação entre a Estática e Dinâmica jurídicas. O Positivismo objetifica o Direito em normas e procedimentos, que formam um conjunto normativo (Estática jurídica), mas que pode alterar-se (Dinâmica jurídica). O Direito, portanto, é algo externo.
	9ª Tese – Considera o Direito como uma prática. O Direito não é algo externo, mas um fenômeno no qual os observadores são, também, participantes.
	10ª Tese – O ensino jurídico é limitado a uma transmissão de normas e conteúdo.
	10ª Tese – O ensino jurídico busca desenvolver certas habilidades ao estudante, diante de uma realidade em que as regras não estão mais no centro. Sendo o Direito uma prática, aqueles que o utilizam devem ter as capacidades e virtudes necessárias para que tal prática seja realizada adequadamente.
Aula 6 – 27/08/2019
Programa – Aula 6
3.4. A expressão filosófica do Direito na contemporaneidade: principais temas e novas correntes
3.4.1. A abertura da Filosofia do Direito aos valores ético-políticos
3.4.2. A abertura da Filosofia do Direito aos fatos
3.4.3. Estudos sobre o raciocínio jurídico3.4.4. Estudos de lógica jurídica
3.4.5. Novas fronteiras para a Filosofia do Direito
3.5. Subgrupos de teorias pós-positivistas de Filosofia do Direito contemporânea que serão abordados na disciplina
A expressão filosófica do Direito na contemporaneidade: principais temas e novas correntes
· Entendimento: na contemporaneidade, a expressão filosófica do Direito pode ser entendida como uma construção, realizada ao longo de anos de pesquisas e contribuições de diversos autores. Na disciplina, se escolheu compreender tal evolução por meio da obra de Carla Faralli (Livro “A filosofia contemporânea do direito”, 2006), que divide a expressão filosófica do Direito na contemporaneidade em cinco linhas de pesquisa, desenvolvidas ao redor do mundo, todas sob o “grande guarda-chuva” do Pós-positivismo. Nem todas estas expressões filosóficas do Direito contemporâneo serão estudadas a fundo na disciplina, de modo que a apresentação de cada uma delas, neste tópico, se dá apenas para efeito de conhecimento. As linhas de pesquisa de Carla Faralli são:
· (i) A abertura da Filosofia do Direito aos valores ético-políticos;
· (ii) A abertura da Filosofia do Direito aos fatos;
· (iii) Estudos sobre o raciocínio jurídico;
· (iv) Estudos de lógica jurídica;
· (v) Novas fronteiras para a Filosofia do Direito.
A abertura da Filosofia do Direito aos valores ético-políticos
· Contexto: a discussão dos valores ético-políticos, dada com o início do pós-positivismo, se aperfeiçoou com as discussões teóricas entre Ronald Dworkin (pós-positivista) e Herbert Hart (positivista). Como visto anteriormente, para Hart, o Direito tinha relação contingente com a Moral. Enquanto isso, para Dworkin, não se poderia reduzir os ordenamentos jurídicos a meras estruturas normativas. Assim, havia diferença entre regras (rules) e princípios (principles). Os princípios, para Dworkin, referiam-se a fins ou valores. Tratava-se de um padrão que deveria ser observado não por provocar ou manter uma situação desejada, mas porque seria uma exigência de justiça, ou de retidão, ou de qualquer outra dimensão moral.
· Entendimento: a abertura da Filosofia do Direito aos valores ético-políticos se deu, de forma geral, a partir de duas teorias. Elas são:
· (i) Teorias constitucionalistas (ou “neoconstitucionalismo”): a principal característica das teorias constitucionalistas consiste no reconhecimento do aumento da complexidade da estrutura normativa dos sistemas constitucionais contemporâneos, que está ligado à introdução dos princípio e à diferença entre princípios e regras. Seus principais expoentes são Robert Alexy, Ralf Dreier e Ronald Dworkin.
· (ii) Nova teoria do Direito natural: trata-se de corrente que retoma a “Teoria neoclássica de Direito natural, de Aristóteles e São Tomás de Aquino. Seus principais expoentes são John Finnis, Lon Fuller e Germain Grisez.
A abertura da Filosofia do Direito aos fatos
· Entendimento: a abertura da Filosofia do Direito aos fatos se deu, de forma geral, a partir de duas teorias. Elas são:
· (i) Teorias neo-institucionalistas: para esta corrente, o Direito é uma ordem normativa institucional. Seus principais expoentes são Neil MacCormick e Ota Weinberger. De acordo com as teorias neo-institucionalistas, o Direito é um fato institucional, ou seja, é uma entidade que depende, ao menos em parte, da vontade, das convenções ou do desígnio do homem e, portanto, são distintas dos fatos empíricos, dos simples acontecimentos naturais, de realidades independentes da atividade de atribuição de significado por parte dos homens. A “instituição”, portanto, é uma realidade tipicamente humana, cultural, que é normativamente fundada e possibilitada pela formulação de normas ou regras e adquire significado em relação a estas. Algumas das premissas básicas das teorias neo-institucionalistas são:
· (a) Primeira premissa: para as teorias neo-institucionalistas, os conceitos jurídicos são instituições, pois supõem uma interpretação sobre seu sentido para além do fato físico (ou bruto) em si. Exemplos são o casamento, a propriedade, os contratos, o homicídio e o furto. Todos esses fatos são interpretados, à luz do Direito, como algo distinto do que meramente a ocorrência da união entre duas pessoas, alguém deter algo em seu poder, alguém trocar alguma coisa por dinheiro, alguém tirar a vida de outrem ou alguém pegar algo de outrem,
· (b) Segunda premissa: os conceitos jurídicos, componentes das normas, são aplicados por meio de instituições como a Advocacia, o Judiciário, o Legislativo, o Executivo, a Polícia, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Advocacia da União, dentre outras.
· (ii) “Desdobramentos” do Realismo jurídico estadunidense: trata-se do conjunto de correntes de pensamento que derivam os Realismo jurídico estadunidense. Algumas das principais teorias que se encaixam nesta classificação são a Critical Legal Studies (CLS), a Análise Econômica do Direito (AED), a Teoria do direito feminista e as teorias da diferença racial. De maneira geral, tem-se:
· (a) Critical Legal Studies (CLS): o ponto de partida do CLS é a premissa de que “Direito é política”. Trata-se, então, de pensamento ligado à corrente do funcionalismo político. Para esta abordagem, quem explica a vida em sociedade da melhor forma é a Política. De maneira geral, a CLS defende que, quando se estuda a Política, verifica-se que o objetivo do direito seria o status quo.
· (b) Análise Econômica do Direito (AED): para a AED, uma ação eticamente boa é aquela que busca o maior ganho possível, para a maior quantidade possível de pessoas. O utilitarismo, portanto, é o ponto de partida da AED. Trata-se, então, de pensamento ligado à corrente do funcionalismo tecnológico-social.
· (c) Teoria do direito feminista: em seu primeiro momento, as teorias do direito feminista buscavam a igualdade de gênero. Em seu segundo momento, que se iniciou a partir do final dos anos 70, passou-se a tratar da diferença entre gêneros.
· Para Carol Smart, haveria três fases das posições feministas em relação ao Direito: (a) crítica ao direito vigente (o direito é sexista); (b) denúncia do direito como intrinsecamente masculino (direito é masculino) e (c) reivindicação de um direito das mulheres (o direito é sexuado).
· Gary Minda fala de três tipos de feminismo: (a) o feminismo liberal (problema de igualdade/diferença); (b) o feminismo cultural (Carol Gilligan), com ênfase na diversidade e (c) o feminismo radical (Catharine MacKinon), relacionado à teoria jurídica crítica e aos direitos das mulheres.
· (d) Teorias da diferença racial: estas teorias denunciam que a doutrina e a prática dos direitos civis, baseadas em uma visão meritocrática e “cega à cor”, refletem, em verdade, uma perspectiva que examina os problemas raciais do ponto de vista da cultura branca, perpetuando-se, assim, as injustiças sociais devidas às diferenças raciais. Expoentes desta teoria são Derrick Bell, Richard Delgado e Patricia Williams.
Estudos sobre o raciocínio jurídico
· Entendimento: desde os anos 50 do século XX, críticas ao modelo lógico do raciocínio jurídico próprio do antigo positivismo ressaltaram a inadequação e a insuficiência da metodologia lógico-formalista e sublinharam a necessidade de elaborar novos instrumentos de pesquisa da argumentação prática em geral e da argumentação jurídica em particular. Essencialmente, tem-se:
· (i) Lógica informal: um de seus expoentes é Stephen E. Toulmin.
· (ii) Tópica jurídica: um de seus expoentes é Theodor Vishweg.
· (iii) Nova retórica: um de seus expoentes é Chaïm Perelman.
· Estudos contemporâneos sobre raciocínio jurídico: a partir da década de 60 e início dos anos 70 do século XX, alguns autores que deram seguimento aos estudos sobre raciocínio jurídico são Robert Alexy, Ronald Dworkin, Aulis Aarnio e Neil McCormick.
· Direito e literatura: nos EUA, a partir de 1980, ganhou força uma abordagem particular dos temas da interpretação sobre o raciocínio jurídico. Acerca desta abordagem, tem-se três abordagens principais:
· (i)

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