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INTRODUÇÃO “Na evolução das formas literárias, durante os últimos três séculos, avulta como fenómeno de capital magnitude o desenvolvimento e a crescente importância do romance. Alargando continuamente o domínio da sua temática, interessando-se pela psicologia, pelos conflitos sociais e políticos, ensaiando constantemente novas técnicas narrativas e estilísticas, o romance transformou-se, no decorrer dos últimos séculos, mas sobretudo a partir do século XIX, na mais importante e mais complexa forma de expressão literária dos tempos modernos” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 671) INTRODUÇÃO “O romance é uma forma literária relativamente moderna. Embora na literatura helenística e na literatura latina apareçam narrativas de interesse literário - algumas delas de particular valor, como o Satiricon de Petrónio, precioso documento de sátira social - o romance não tem verdadeiras raízes greco-latinas, diferentemente da tragédia, da epopeia, etc., e pode considerar-se como uma das mais ricas criações artísticas das modernas literaturas europeias” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 672) A palavra Romance “Para grande parte dos historiadores literários, o romance consolidou- se, como um gênero praticado e bastante lido, somente a partir do século XVIII. Ian Watt (2007) afirma que o termo “romance” só se consagrou no final dos Setecentos”. (CASTILHO, 2014, p. 5) A palavra Romance “Na Idade Média, o vocábulo romance (espanhol romance, francês romanz, italiano romanzo) designou primeiramente a língua vulgar, a língua românica [...]. Depois, a palavra romance ganhou um significado literário, designando determinadas composições redigidas em língua vulgar e não na língua latina, própria dos clérigos. Apesar das suas flutuações semânticas, o vocábulo romance passou a denominar sobretudo composições literárias de cunho narrativo. Tais composições eram primitivamente em verso – o romance em prosa é um pouco mais tardio – próprias para serem recitadas e lidas, e apresentavam muitas vezes um enredo fabuloso e complicado” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 672). Condições históricas Ascensão da burguesia “[...] no final do século XVIII, período em que o romance já começava a ser visto como um gênero valorizado, o poderio burguês estava em franca expansão. A classe econômica que, naquele momento, era a protagonista da Europa, queria ser refletida nas manifestações literárias, e assim foi feito. Desse modo, os ideais da burguesia, bem como sua visão de mundo, seus defeitos, seus valores, etc., foram trazidos à tona pela pena dos romancistas. A literatura, nesse contexto em que a burguesia passou a dominar e a ditar as regras sociais, tornou-se um produto a serviço dessa classe emergente” (CASTILHO, 2014, p. 10). Surgimento de um mercado consumidor: atrela o surgimento do romance a mudanças na natureza e organização do público leitor. Lukács e o romance A visão de Lukács sobre o tema compreende um vasto trabalho sobre a natureza desse gênero, envolvendo os estudos A teoria do romance (1914/1915), O romance como epopeia burguesa (1934) e Romance histórico (1935). No primeiro, o autor aceita plenamente “a concepção de Hegel segundo a qual o romance é um produto literário típico da sociedade burguesa” (ANTUNES, 1998, p. 181), ou seja, ele vê essa forma literária como expressão da divisão entre o indivíduo e o mundo, dando origem à chamada condição do herói problemático. Lukács e o romance Em O romance como epopeia burguesa, apoiado na ciência da história de Karl Marx, Lukács vê o romance como “gênero artístico dominante da sociedade burguesa” (ANTUNES, 1998, p. 185). O romance, ao contrário, é fruto dessa dualidade entre Eu e mundo externo; ele nasceu em uma sociedade sem comunidade, “puramente social”, e busca representá-la: é a epopeia burguesa. Nesse gênero, as objetivações do herói não são diretamente utilizáveis pelo indivíduo, pois este não mais se identifica com as ações do herói, que constrói um universo para o seu uso individual, não coletivo. A ação na epopeia visava cumprir o designado, o herói tinha um destino; no romance, em sentido oposto, o herói luta por si, não segundo instâncias superiores. Por causa disso, o herói do romance, sem Deus, com liberdade, emancipado, quer construir um mundo integral, que é a filosofia burguesa. Bakhtin e o romance Para Bakhtin (1988, p. 397-428), em “Epos e romance”, o gênero se constitui em forma de expressão inacabada, apresentando um ciclo contínuo do homem: assim como o ser humano, o romance também está em constante evolução, daí a dificuldade em estabelecer uma teoria do gênero. Em seus estudos, o estudioso russo aborda o romance como “gênero que está por se constituir, levando-se em conta o processo de evolução de toda a literatura nos tempos modernos [...]”. Bakhtin desenvolve uma análise comparativa entre o romance e a epopeia, observando que esta possui alguns traços distintivos, como o passado absoluto, o herói coletivo e o isolamento do mundo épico em relação ao momento presente do escritor, revelando-se como um gênero já acabado. Bakhtin e o romance Podemos dizer que para Bakhtin o romance é a forma de expressão de um mundo inacabado, que tem uma problemática nova e específica, apresentando, portanto, traços distintivos que são a reinterpretação e a reavaliação permanente do tempo presente, representando a realidade como material de criação artística. Ian Watt e o romance A questão da realidade também é tratada nos estudos de Ian Watt, explorando o chamado realismo filosófico e o formal, e para ele, é o realismo formal – um conjunto de procedimentos narrativos típicos do romance – que possibilita a definição de que o romance “é um relato autêntico e completo sobre a experiência humana” (WATT, 1990, p. 27), pois é o realismo formal que permite uma “imitação mais imediata da experiência individual, situada num contexto temporal e espacial, do que outras formas literárias” (WATT, 1990, p. 32). Ian Watt e o romance Nesse estudo sobre o realismo e a forma romance, Watt elege categorias narrativas definidas como individualidade, originalidade, identidade, tempo, espaço e linguagem referencial, os quais são apontados por ele como elementos configuradores dessa narrativa. Ou seja, a personagem representa um indivíduo que faz parte de uma sociedade, cuja ação, situada num contexto temporal e espacial, revela a experiência humana por meio de uma linguagem o mais transparente possível, propiciando ao leitor a possibilidade de ler o texto, muitas vezes identificando-se nele, estabelecendo, assim, uma “correspondência entre a vida e a arte” (WATT, 1990, p. 32). Estrutura de composição do romance A mudança de valores que se dá na sociedade burguesa, em relação à sociedade antiga, pode ser apreciada em função das transformações, em relação à epopeia, verificadas na estrutura do romance. Como consequência do desagregamento do caráter público do romance, o estatuto de valor da família se altera; o centro do enredo, a tensão dos conflitos passa a ser a família (e não a grande comunidade), pois o indivíduo, inserido em um mundo estranho, tem que se proteger da sociedade em sua esfera íntima. Estrutura de composição do romance O homem representado na epopeia tinha uma genealogia, sua origem era significante; no romance, por sua vez, configura-se o anonimato do herói: não importa saber quem é ele, sua procedência, pois ele só quer representar seus valores individuais; ele está liberto dos laços de sangue, da tradição, da herança. Representação formal do romance A partir das transformações estruturais ocorridas no romance, é possível apontar as suas principais características formais, começando pela categoria do herói. A tese de Fehér é de que se pode conceber o indivíduo no romance a partir de Marx, no que concerne ao seu caráter fortuito: a genealogia, até mesmo o nome, não acrescenta para a identificação desse heróianônimo; a evidência direta do caráter dada pela situação se perde; o indivíduo realiza-se na concorrência (sua inserção se dá numa classe, e ele então é caracterizado não mais como pessoa, herdeiro de valores humanos). Segundo Fehér, esse caráter fortuito do indivíduo leva ao impasse na resolução da dicotomia entre Eu e mundo externo; o caráter do indivíduo é reduzido a fatores sociológicos. Além disso, há uma rejeição do herói por parte do leitor, devido à acidentalidade daquele, que não representa valores éticos. Representação formal do romance Outra categoria fundamental para a compreensão do gênero romance é a do tempo. Como vimos, a dimensão temporal na epopeia estava direcionada para o passado. Como o destino do herói estava traçado, importava mais como a história seria narrada. Mas no romance, o elemento imprevisto constitui-se em um elemento-chave, por representar uma regressão em relação à linearidade da epopeia. Uma das grandes inovações do gênero romance, portanto, é a tensão da ação, tendo em vista a imprevisibilidade dos atos do herói. Como esses fatos não estão solidificados dentro da harmonia de uma tradição, como acontecia na epopeia, mas são agora fortuitos, o leitor fica com a prerrogativa de questionar sua verossimilhança. Representação formal do romance Para Lukács, o romance é uma luta contra o processo temporal. O tempo só tem interesse quando a transformação do homem tem significação: é por isso que na epopeia a dimensão temporal não tinha a importância que tem no romance, e estava voltada para o passado, onde as ações obviamente já tinham se realizado, e não eram passíveis de questionamentos; lá, as personagens são planas, seu caráter não se altera durante a narrativa. É com o romance que surge a alternativa para o herói, haja vista sua imprevisibilidade. Representação formal do romance Outra categoria, dentre as verificadas nas transformações estruturais do romance, é a do espaço. Na epopeia o herói estava plenamente inserido em um mundo que lhe era familiar; a ação se dava em um espaço restrito. Já no romance, o espaço tem uma retração não só como dimensão, mas também na atividade de aquisição de objetos. O autor abandona os instrumentos essenciais íntimos do homem, que passa a se relacionar com objetos que lhe são obsoletos, adquiridos por interesses secundários, ressaltando o valor de troca desses objetos (e não o seu valor de uso). Era Medieval “Apareceram assim nas literaturas europeias da Idade Média extensas composições romanescas, frequentemente em verso, em que podemos discriminar duas grandes correntes: por um lado, o romance de cavalaria; por outro, o romance sentimental” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 673). Período Renascentista “No período renascentista, alcançou grande voga o romance pastoril [...]. O romance pastoril, no qual a prosa se mescla com o verso, é uma forma narrativa marcadamente culta: os seus pastores, movendo-se numa natureza idealizada ou fabulosa, estão apenas nominalmente ligados à vida da pastorícia, revelando-se antes como personagens de requintada sensibilidade e cultura que discorrem, em cenas não raro saturadas de simbolismo, sobre múltiplos problemas do homem, desde o amor, em geral conceituado e analisado neoplatonicamente, até às servidões e hipocrisias da vida social historicamente concreta, ante a qual a vida pastoril se ergue como um sonho de harmonia e de tranquilidade” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 675-676). Século XVII: Barroco “É no século XVII, porém, sob pleno signo do barroco, que o romance conhece uma proliferação extraordinária. O romance barroco aparenta- se estreitamente com o romance medieval e caracteriza-se geralmente pela imaginação exuberante, pela abundância de situações e aventuras excepcionais e inverossímeis: naufrágios, duelos, raptos, confusões de personagens, aparições de monstros e de gigantes, etc. Ao mesmo tempo, o romance barroco responde ao gosto e às exigências corteses do público do século XVII, através de longas e complicadas narrativas de aventuras sentimentais, semeadas de subtis e doutas discussões sobre o amor” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 676). Século XVII: Barroco “No concerto das literaturas europeias do século XVII, a espanhola ocupa um lugar cimeiro no domínio da criação romanesca. O Dom Quixote de Cervantes, espécie de anti-romance centrado sobre a crítica dos romances de cavalaria, representa a sátira desse mundo romanesco, quimérico e ilusório, característico da época barroca, e ascende à categoria de eterno e patético símbolo do conflito entre a realidade e a aparência, entre o sonho e a vileza da matéria” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 676-677). Século XVII: Barroco “Ainda à literatura espanhola dos séculos XVI e XVII se deve o romance picaresco, cuja origem remonta à famosa .Vida de Lazarillo de Tormes (1554), obra de autor anónimo, e que tem na Vida de Guzmán de Alfarache (1559-1604), de Mateo Alemán, o seu exemplar mais representativo. O romance picaresco, através de numerosas traduções e imitações, exerceu larga influência nas literaturas europeias, encaminhando o género romanesco para a descrição realista da sociedade e dos costumes contemporâneos” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 677). Século XVII: Barroco “[...] o romance barroco representa uma espécie de grau zero do romance, e é precisamente com a dissolução desse «ópio romanesco» que aparece o romance moderno, o romance que não quer ser simplesmente uma «história», mas que aspira a ser «observação, confissão, análise», que se revela como «pretensão de pintar o homem ou uma época da história, de descobrir o mecanismo das sociedades, e finalmente de pôr os problemas dos fins últimos»” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 677). O romance no século XVIII “É inegável que o romance, até ao século XVIII, constitui um género literário desprestigiado sob todos os pontos de vista. Embora desde há muito se reconhecesse o singular poder da arte de narrar [...], o romance era todavia conceituado como uma obra frívola, cultivado apenas por espíritos inferiores e apreciado por leitores pouco exigentes em matéria de cultura literária. O romance medieval, renascentista e barroco dirige-se fundamentalmente a um público feminino, ao qual oferece motivos de entretenimento e de evasão” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 678). O romance no século XVIII “Além da sua situação inferior num plano puramente literário, o romance era ainda considerado como um perigoso elemento de perturbação passional e de corrupção dos bons costumes, razões por que os moralistas e os próprios poderes públicos o condenaram asperamente. Esta atitude de desconfiança e animadversão dos moralistas em relação ao romance prolongou-se, sob formas várias, pelos tempos modernos.” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 679). O romance no século XVIII “Quando o sistema de valores da estética clássica começa, no século XVIII, a perder a sua homogeneidade e a sua rigidez, e quando, neste mesmo século, começa a afirmar-se um novo público, com novos gostos artísticos e novas exigências espirituais - um público burguês, o romance, o género literário de ascendência obscura e desprezado pelos teorizadores das poéticas, conhece uma metamorfose e um desenvolvimento muito profundos, a ponto de Diderot não aceitar a identificação do romance anterior ao século XVIII e do romance novo deste mesmo século” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 679-680). “O público cansara-se do carácter fabuloso do romance e exigia das obras narrativas mais verossimilhança e mais realismo” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 681). O romance no século XVIII “Durante o século XVIII, o romance transforma-se em penetrante e, por vezes, despudorada análise das paixões e dos sentimentos humanos [...], em sátira social e política ou em escrito de intenções filosóficas. Ao mesmo tempo, o romance torna-se um dos veículos mais adequados da sensibilidade melancólica, plangente ou desesperada, do século XVIII pré- romântico”(AGUIAR E SILVA, 2007, p. 681). “Quando o romantismo se revela nas literaturas europeias, já o romance conquistara, por direito próprio, a sua alforria e já era lícito falar de uma tradição romanesca Entre os finais do século XVIII e as primeiras décadas no século XIX, o público do romance alargara-se desmedidamente e, para satisfazer sua necessidade de leitura, escreveram-se e editaram-se numerosos romances” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 681-682). O romance no século XIX “O romance em folhetins, invenção das primeiras décadas do século XIX, constituiu igualmente uma forma hábil de responder ao apetite romanesco das grandes massas leitoras, caracterizando-se, cm geral, pelas suas aventuras numerosas e descabeladas, pelo tom melodramático e pela frequência de cenas emocionantes, particularmente adequadas a manter bem vivo o interesse do público de folhetim para folhetim” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 682). “Com o romantismo, por conseguinte, a narrativa romanesca afirma-se decisivamente como uma grande forma literária, apta a exprimir os multiformes aspectos do homem e· do mundo” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 682). O romance no século XIX “O romance assimilara sincreticamente diversos géneros literários, desde o ensaio e as memórias até à crónica de viagens; incorporara múltiplos registos literários, revelando-se apto quer para a representação da vida quotidiana, quer para a criação de uma atmosfera poética, quer para a análise de uma ideologia” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 682-683). “Se o século XVII constitui a época áurea da moderna tragédia, o século XIX constitui inegavelmente o período mais esplendoroso da história do romance. Depois das fecundas experiências dos românticos, sucederam-se, durante toda a segunda metade do século XIX, as criações dos grandes mestres do romance europeu. Forma de arte já sazonada, dispondo de uma vasta audiência e disfrutando de um prestígio crescente, o romance domina a cena literária” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 683). O romance no século XIX “Com Flaubert, Maupassant e Henry James, a composição do romance adquire uma mestria e um rigor desconhecidos até- então; com Tolstoj e Dostoiewskíj, o universo romanesco alarga-se e enriquece-se com experiências humanas perturbantes pelo seu carácter abismal; estranho e demoníaco; com os realistas e naturalistas, cm geral, a obra romanesca aspira à exactidão da monografia, de estudo científico dos temperamentos e dos meios sociais. ” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 683). “Em vez dos heróis altivos e dominadores, relevantes quer no bem, quer no mal, tanto na alegria como na dor, característicos das narrativas românticas, aparecem nos romances realistas as personagens e os acontecimentos triviais e anódinos extraídos da baça e chata rotina da vida ” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 683). O romance no século XX “Depois, no declinar do século XIX e nos primeiros anos do século XX, começa a processar-se a crise e a metamorfose do romance moderno, relativamente aos modelos, tidos como "clássicos»" do século XIX: aparecem os romances de análise psicológica de Marcel Proust e de Virgínia Woolf; James Joyce cria os seus grandes romances de dimensões míticas, construídos em tomo das recorrências dos arquétipos (Ulisses e Finnegans Wake); Kafka dá a conhecer os seus romances simbólicos e alegóricos. Renovam-se os temas, exploram-se novos domínios do indivíduo e da sociedade, modificam-se profundamente as técnicas de narrar, de construir a intriga, de apresentar as personagens. Sucedem-se o romance neo-realista, o romance existencialista, o nouveau roman” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 684). O romance no século XX “O romance não cessa, enfim, de revestir novas formas e de exprimir novos conteúdos; numa singular manifestação da perene inquietude estética e espiritual do homem” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 684) “Segundo alguns críticos, o romance actual, depois de tão profundas e numerosas metamorfoses e aventuras, sofre de uma insofismável crise aproximando-se do seu declínio e esgotamento. Seja qual for o valor de tal profecia, um facto, porém, não sofre contestação: o romance permanece a forma literária mais importante do nosso tempo, pelas possibilidades expressivas que oferece ao autor e pela difusão e influência que alcança entre o público” (AGUIAR E SILVA, 2007, p. 684). A consolidação do gênero romance No período setecentista, o rompimento com os gêneros tradicionais e a fixação do romance como um gênero digno de valor não foi uma tarefa fácil. A prosa romanesca era tida como inferior, tal como era na Antiguidade Clássica. Os autores e críticos da Idade Moderna, ao recuperarem o conhecimento clássico durante o Renascimento e também durante o Iluminismo, resgataram o mesmo olhar de desconfiança em relação ao romance. (CASTILHO, 2014, p. 8) As críticas que o romance sofreu se estenderam também aos séculos XIX e XX. [...] Mesmo assim, já no final do século XVIII, apesar das fortes críticas, ele tornou-se um dos principais gêneros literários. (CASTILHO, 2014, p. 9) A consolidação do gênero romance A tentativa de representar o homem e o universo em que vive, procurando entendê-lo, é motivo de inspiração para muitos romancistas, desde os primórdios do romance, no século XVIII. Essa tendência encontrou caminho certo pela forma narrativa, retratando, ao longo do século XIX, pela sua estruturação formal, as possibilidades de representação do homem e suas relações na sociedade burguesa. No século XX o romance não apenas não morreu, como se consolidou como gênero adequado para o estudo das representações humanas. Neste início do século XXI, o romance tem se desdobrado em subgêneros, em variadas linhas de força, alcançando uma dimensão significativa nas tendências contemporâneas, o que reforça seu caráter ambivalente e, ao mesmo tempo, inacabado. Classificação tipológica do romance Têm sido várias as tentativas para estabelecer uma classificação tipológica do romance. Wolfgang Kayser, por exemplo, tomando em consideração o diverso tratamento que podem apresentar o evento, a personagem e o espaço, fundamentais elementos constitutivos do romance, estabelece a seguinte classificação tipológica. Classificação tipológica do romance a) Romance de acção ou de acontecimento. Romance caracterizado por uma intriga concentrada e fortemente desenhada, com princípio, meio e fim bem estruturados. A sucessão e o encadeamento das situações e dos episódios ocupam o primeiro plano, relegando para lugar muito secundário a análise psicológica das personagens e a descrição dos meios. Os romances de Walter Scott e de Alexandre Dumas exemplificam esse tipo de romance. Classificação tipológica do romance b) Romance de personagem. Romance caracterizado pela existência de uma única personagem central, que o autor desenha e estuda demoradamente e à qual obedece todo o desenvolvimento do romance. Trata-se, frequentemente, de um romance propenso para o subjectivismo lírico e para o tom confessional, como sucede com o Werther de Goethe, o Adolphe de Benjamin Constant, o Raphael de Lamartine, etc. O título é , em geral, bem significativo acerca da natureza deste tipo de romance, pois é constituído, com muita frequência, pelo próprio nome da personagem central. Classificação tipológica do romance c) Romance de espaço. Romance que se caracteriza pela primazia que concede à pintura do meio histórico e dos ambientes sociais nos quais decorre a intriga. É o que se verifica nos romances de Balzac, de Zola, de Eça de Queirós, de Tolstoj, etc. Balzac, ao colocar a sua obra romanesca sob o título genérico de Comédie humaine, revelou bem o seu desejo de oferecer um vasto quadro da sociedade do seu tempo. O meio descrito pode ainda ser geográfico ou telúrico, como sucede na Selva de Ferreira Castro ou nas Terras do demo de Aquilino Ribeiro, embora este meio telúrico seja indissociável, na visão do romancista, do homem que nele se integra.O romance brasileiro, por exemplo, tende poderosamente para este tipo de romance
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