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1 2 Referência Bibliográfica BUENO, André; CREMA, Everton; ESTACHESKI, Dulceli; NETO, José Maria [org.] Um Pé de História: estudos sobre aprendizagem histórica. Rio de Janeiro/União da Vitória: Edição Especial Ebook LAPHIS/Sobre Ontens, 2017. ISBN: 978-85-65996-45-7 Edição Especial Ebook LAPHIS/Sobre Ontens: www.revistasobreontens.blogspot.com.br 3 ANDRÉ BUENO DULCELI ESTACHESKI EVERTON CREMA JOSÉ MARIA NETO UM PÉ DE HISTÓRIAS: ESTUDOS SOBRE APRENDIZAGEM HISTÓRICA Edição Especial LAPHIS/Sobre Ontens 2017 4 Nota Introdutória É com grande alegria e satisfação que apresentamos este nosso novo livro, Um Pé de Histórias. Ele é resultado da terceira edição do Simpósio Eletrônico Internacional de Ensino de História [www.simpohis2017.blogspot.com.br], e traz as comunicações apresentadas nas mesas de Ensino de História e História do Ensino. No momento crucial que o campo da História vem passando em nosso país, as investigações sobre a arte de ensinar história, bem como seu desenvolvimento ao longo dos anos, nos trazem subsídios fundamentais para pensarmos o que erramos, o que acertamos, o que podemos e precisamos melhorar. Tanto a escola quanto a academia estão imersos em um profundo momento de reflexão, buscando resignificar a dimensão de seu trabalho histórico. Nesse sentido, o que pode ser feito? Junto com Canteiro de Histórias e Jardim de Histórias [outros dois livros dessa série] esse nosso volume visa dar uma pequena contribuição a essas questões. Seja bem vindo! 5 Sumário ENSINO E APRENDIZAGEM DA HISTÓRIA: ASPECTOS COGNITIVOS E CULTURAIS............ 13 PORNOGRAFIA E ENSINO DE HISTÓRIA ............................................................................... 17 ENSINO DE HISTÓRIA E TURISMO CULTURAL: AS POSSIBILIDADES DE EDUCAÇÃO EM AMBIENTES NÃO FORMAIS DE APRENDIZAGEM ................................................................. 21 BRASIL: PENSAMENTO E PRÁTICA SOCIAL DA LAICIDADE NO AMBIENTE PÚBLICO ESCOLAR ............................................................................................................................... 25 FILOSOFIA E ENSINO DE HISTÓRIA NA OBRA DE PAULO FREIRE ....................................... 29 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES: O TRABALHO DO HISTORIADOR/PROFESSOR DE HISTÓRIA E A LITERATURA DE CORDEL.............................................................................. 33 UMA GERAÇÃO SEM HISTÓRIA: DO PROJETO ESCOLA SEM PARTIDO À REFORMA DO ENSINO MÉDIO ...................................................................................................................... 39 A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR: PARA QUE SERVE A HISTÓRIA? UMA PRETENSÃO DE RESPOSTA ........................................................................................................................ 42 NOVAS PERSPECTIVAS DA HISTÓRIA DA ARQUITETURA NA CONTEMPORANEIDADE ..... 46 ENSINO, PESQUISA E MEMÓRIA: A PRESERVAÇÃO DO ACERVO DO ARQUIVO PÚBLICO NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ..................................................................... 49 A APRENDIZAGEM HISTÓRICA DE JORN RÜSEN, O CONSTRUTIVISMO DE JEAN PIAGET E A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL DE LEV VYGOTSKY: DIÁLOGOS POSSIVEIS? ........ 52 O ENSINO DE HISTÓRIA SOB O VIÉS DO ANARQUISMO: É POSSÍVEL? ................................ 58 O PROFESSOR DE HISTORIA E O ALUNO EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA ................................................................................................................ 61 ENTRE A HISTÓRIA ENSINADA E O DIREITO A OPINIÃO: DILEMAS E PERSPECTIVAS ....... 65 ENSINO DE HISTÓRIA E A TEMÁTICA DOS DIREITOS HUMANOS ........................................ 69 OS ESPAÇOS MUSEOLÓGICOS E O ENSINO DA HISTÓRIA: POSSIBILIDADES NA EDUCAÇÃO BÁSICA .................................................................................................................................. 72 MEMÓRIA E PATRIMÔNIO DIALOGANDO NAS AULAS DE HISTÓRIA: A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA NA CONTEMPORANEIDADE ....................... 76 AS RELAÇÕES ENTRE O PODER E COMPORTAMENTOS TRANSGRESSORES E OS DESAFIOS DA PRÁTICA DE ENSINO ....................................................................................................... 80 AS DISCIPLINAS ESCOLARES: UM ESTUDO A PARTIR DO UNIVERSO DA CULTURA ESCOLAR ............................................................................................................................... 83 AS AMAZÔNIAS PRESENTES NOS LIVROS DIDÁTICOS REGIONAIS: REFLEXÕES SOBRE ABORDAGENS E PROBLEMAS DE IDENTIDADE DISCIPLINAR ............................................. 87 “PRA QUÊ ESTUDAR O QUE JÁ PASSOU? ”: A PERCEPÇÃO DOS JOVENS SOBRE O ENSINO DE HISTÓRIA ......................................................................................................................... 90 TEMPORALIDADES E ENSINO DE HISTÓRIA: CONSIDERAÇÕES ACERCA DO CONCEITO TEMPO A PARTIR DE LIVROS DIDÁTICOS PARA O ENSINO MÉDIO (PNLD 2012) ................. 93 6 ENSINO DE HISTÓRIA, ORALIDADE, ALTERIDADE E SURDEZ ............................................. 97 QUEM QUER SER PROFESSOR? APONTAMENTOS PARA REFLEXÃO ................................. 100 ENSINO DE HISTÓRIA E PATRIMÔNIO ................................................................................ 104 SENTIDOS DO ENSINO E APRENDIZAGEM DE HISTÓRIA PARA ESTUDANTES DO ENSINO FUNDAMENTAL ................................................................................................................... 108 ENSINO DE HISTÓRIA E A NOÇÃO DE PATRIMÔNIO CULTURAL CONTEMPORÂNEA ....... 112 ENSINO DE HISTÓRIA E MUDANÇA CLIMÁTICA: UMA REFLEXÃO NECESSÁRIA ............. 116 O RANKING NOS PRÉ-VESTIBULARES E O MODELO TERCEIRÃO DE ENSINO .................. 120 OS LUGARES DA JUVENTUDE NO ENSINO SUPERIOR........................................................ 125 ENSINAR HISTÓRIA: UM DILEMA ENTRE PENSAR HISTORICAMENTE OU PREOCUPAR-SE COM A CALIGRAFIA? .......................................................................................................... 129 REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE HISTÓRIA NA ERA DA INFORMAÇÃO .......................... 133 CONSIDERAÇÕES SOBRE A MONITORIA ACADÊMICA DO CURSO DE HISTÓRIA DA UNIFESSPA: UM OLHAR DISCENTE ..................................................................................... 136 ENSINO DE HISTÓRIA & HISTÓRIA PÚBLICA: REFLEXÕES ACERCA DA PRÁTICA DOCENTE ............................................................................................................................................. 139 HISTÓRIA, RELIGIÃO E ENSINO: BREVES REFLEXÕES PARA A EDUCAÇÃO ..................... 142 PROJETO DE EXTENSÃO DE HISTÓRIA COMO UM ELEMENTO DE FORMAÇÃO DO DISCENTE BOLSISTA ........................................................................................................... 147 DO VESTIBULAR À SALA DE AULA: O PAPEL SOCIAL DA HISTÓRIA E DO PROFESSOR DE HISTÓRIA ............................................................................................................................. 150 ENSINO DE HISTÓRIA E PATRIMÔNIO CULTURAL: UM ROTEIRO ..................................... 154 ENSINO DE HISTÓRIA NO ENSINO FUNDAMENTAL ........................................................... 158 O ENSINO DE HISTÓRIA NO ENSINO FUNDAMENTAL: DIFICULDADES E PERSPECTIVAS 161 PROFESSOR EM TERRA ESTRANHA: UMA POSSIBILIDADE DE ESTUDO DA HISTÓRIA DA CIDADE ................................................................................................................................ 165 REFLEXÕES A RESPEITO DOS LIMITES E POSSIBILIDADES DO ENSINO DE HISTÓRIA DO PARANÁ NA GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA ........................................................................... 169 A PRODUÇÃO COMUNITÁRIA COMO INTERMEDIADORADE CONHECIMENTO E PRODUÇÃO DE SABERES EM DIÁLOGOS COM A ESCOLA ................................................. 173 A HISTÓRIA ENSINADA NO ENSINO FUNDAMENTAL SÉRIES INICIAIS ............................. 177 REFLEXÕES EM TORNO DA HISTÓRIA ENSINADA: QUESTÕES URGENTES ...................... 181 A RELAÇÃO ENTRE O PASSADO E O PRESENTE NAS AULAS DE HISTÓRIA ...................... 185 PRÁTICAS INTERDISCIPLINARES EM SALA DE AULA: A MELHORIA NO ENSINO DE HISTÓRIA ............................................................................................................................. 189 A CHINA NOS LIVROS DIDÁTICOS: O ESTADO DE UMA QUESTÃO ................................... 193 7 FUNDAMENTOS DO ENSINO DE HISTÓRIA EM ESCOLAS PÚBLICAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA ........................................................................................................................... 197 EDUCADORES E EDUCANDOS ENTRE DISCURSOS, POLÍTICAS E PRÁTICAS: REFLEXÕES ACERCA DOS DESAFIOS DO ENSINO DE HISTÓRIA NO SÉCULO XXI ................................ 201 UM MANIFESTO SOBRE A PERTINÊNCIA E PERMANÊNCIA DA HISTÓRIA ESCOLAR ....... 206 O USO DO TEATRO NAS AULAS DE HISTÓRIA: UMA PRÁXIS A SER DISCUTIDA .............. 209 APRENDIZAGEM HISTÓRICA NO ENSINO DE HISTÓRIA: PONTUANDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ................................................................................................................ 213 HISTÓRIA LOCAL E ENSINO DE HISTÓRIA: NOVAS PERSPECTIVAS PARA O ESTUDO DO LUGAR ................................................................................................................................. 217 NOVO ENSINO MÉDIO: PRIMEIROS DEBATES .................................................................... 221 HISTÓRIA REGIONAL: ESTUDO DE MÚLTIPLAS DEFINIÇÕES ............................................ 225 HISTÓRIA PRA QUÊ? ............................................................................................................ 229 AINDA PRECISAMOS DEFENDER A HISTÓRIA COMO DISCIPLINA ESCOLAR? .................. 232 REFLEXÕES NECESSÁRIAS EM TEMPOS SOMBRIOS: A DISCIPLINA HISTÓRIA E O SEU LUGAR NA ESCOLA ............................................................................................................. 236 QUESTÕES HISTÓRICAS REFERENTES ÀS FACETAS DA EDUCAÇÃO E TRABALHO ......... 240 EDUCAÇÃO ESCOLAR E ENSINO DE HISTÓRIA NO BRASIL: ENTRE PERMANÊNCIAS E MUDANÇAS ......................................................................................................................... 243 DOCUMENTOS HISTÓRICOS CONTIDAS NO LIVRO DIDÁTICO E SEU POTENCIAL COMO SUPORTE PARA O ENSINO/APRENDIZAGEM DE HISTÓRIA................................................ 248 A IDENTIFICAÇÃO DO SUJEITO COMO FERRAMENTA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA ..... 252 METODOLOGIA E PRÁTICAS: O PAPEL DO PROFESSOR NO ENSINO DE HISTÓRIA ........... 255 HISTÓRIA TEMÁTICA: APONTAMENTOS PARA UMA REFLEXÃO ...................................... 259 PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA E EDUCAÇÃO HISTÓRICA: CONTRIBUIÇÕES PARA O ENSINO DE HISTÓRIA NAS ETAPAS 7,8 E 9 DO EJA ............................................................ 263 PATRIMÔNIO LOCAL: OS BENS URBANOS COMO TEMA PARA A FORMAÇÃO CIDADÃ NO ENSINO DE HISTÓRIA .......................................................................................................... 268 CLAMOR À HISTORICIDADE DA EDUCAÇÃO: O PROJETO DO FRACASSO E A MEDIDA DO SUCESSO .............................................................................................................................. 272 POR QUE TORNAR A DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO FREQUENTE NAS AULAS..................................................................................................... 277 ENSINO DE HISTÓRIA: NARRATIVAS DE ALUNOS DO CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA, UEL ........................................ 281 ENSINO DE HISTÓRIA: EXPERIÊNCIAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM A HISTÓRIA LOCAL ............................................................................................................................................. 286 A LITERATURA NO ENSINO DE HISTÓRIA: O DOCUMENTO, OS CUIDADOS E A PRÁTICA290 8 O ENSINO DE HISTÓRIA NOS CURRÍCULOS DO CURSO DE PEDAGOGIA ........................... 295 HISTÓRIA, MEMÓRIA E ENSINO: CAMINHOS E DESCAMINHOS PARA UMA PRÁTICA DOCENTE ............................................................................................................................. 300 COMO OS ALUNOS APRENDEM HISTÓRIA? ........................................................................ 303 A POLISSEMIA DA PALAVRA VIOLÊNCIA NO AMBIENTE ESCOLAR ................................. 307 A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR - BNCC E O ENSINO DE HISTÓRIA ................. 311 A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE HISTÓRIA LOCAL E REGIONAL NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE SOCIAL DE ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL ....................................... 315 ENSINO DE HISTÓRIA COMO PRÁTICA EDUCATIVA .......................................................... 319 DIÁLOGO EM SALA DE AULA: REFLEXÕES SOBRE INTERAÇÕES VERBAIS NO ENSINO .. 321 METODOLOGIAS PARA PESQUISA EM HISTÓRIA DA ARTE: O PROBLEMA DA FALTA DE DATAÇÃO EM PINTURAS ESTUDADAS ............................................................................... 324 O ENSINO E APRENDIZAGEM DE HISTÓRIA: PRÁTICAS E METODOLOGIAS ..................... 328 EIXOS PARA PRÁTICA DO ENSINO DE HISTÓRIA ............................................................... 331 JÖRN RÜSEN, A RAZÃO HISTÓRICA E O ENSINO DE HISTÓRIA ......................................... 335 ALUNOS DO ENSINO MÉDIO E SUAS REPRESENTAÇÕES SOBRE A RELAÇÃO ENTRE POLITICA E ENSINO DE HISTÓRIA ...................................................................................... 338 A HISTÓRIA LOCAL E SUAS IMPLICAÇÕES: CONSIDERAÇÕES SOBRE ALGUMAS ESTRATÉGIAS DE ENSINO NAS SÉRIES INICIAIS ................................................................ 342 ROMPENDO AS FRONTEIRAS HISTÓRICAS: CONCEITOS CONTEMPORÂNEOS SOBRE HISTÓRIA E PEDAGOGIA ..................................................................................................... 348 DIFERENTES LINGUAGENS E SUA UTILIZAÇÃO NO ENSINO DE HISTÓRIA ...................... 352 ESTUDO DO MEIO: ENSINO DE HISTÓRIA ALÉM DA SALA DE AULA ................................ 355 CIDADANIA E EDUCAÇÃO NO PROJETO NEOLIBERAL ...................................................... 358 O ENSINO DE HISTÓRIA E A AMEAÇA DA NOVA REFORMA DO ENSINO MÉDIO .............. 364 POR UM ENSINO DE HISTÓRIA PARA A VIDA ..................................................................... 367 ENTRE PARADIGMAS E DESAFIOS DO ENSINO DE HISTÓRIA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL II .................................................................................................. 370 PENSAMENTO E EDUCAÇÃO HISTÓRICOS EM CRIANÇA BRASILEIRA ................................ 372 A HISTÓRIA VIVIDA EM ATO – UMA APROXIMAÇÃO ........................................................ 375 ENSINO DE HISTÓRIA E A ABORDAGEM DAS “RELAÇÕES ECONÔMICAS” EM SALA DE AULA: UMA BREVE DISCUSSÃO ......................................................................................... 379 O LIVRO DIDÁTICO E O ENSINO DE HISTÓRIA: UMA PROPOSTA DE PESQUISA ............... 383 NOVAS ABORDAGENS PARA O ENSINO DE HISTÓRIA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS ..... 387 O ENSINO DE HISTÓRIA: NOVAS LINGUAGENS E RECURSOS METODOLÓGICOS ............. 390 O PROFESSOR DE HISTÓRIA COMO SUJEITO DE TRANSFORMAÇÃO ................................ 393 9 _Toc478322721O GRUPO ESCOLAR ESPERIDIÃO MARQUES: A HISTÓRIA DO ENSINO PÚBLICO NO INTERIOR DO ESTADO DE MATO GROSSO .................................................... 397 OS LIVROS COMO AGENTES FORMADORES DA NOBREZA PORTUGUESA NA TRANSIÇÃO DO MEDIEVO PARA A ÉPOCA MODERNA (SÉCULO XV) ....................................................400 O ENSINO DE TRABALHOS MANUAIS NA EDUCAÇÃO PRIMÁRIA NO ESTADO NOVO EM PERNAMBUCO (1937-1945) ................................................................................................... 405 HISTÓRIA E MEMÓRIA DA FAZENDA GRANDE DO RETIRO-SALVADOR-BA ..................... 408 MÚSICOS NEGROS E PARDOS NO BRASIL DO SÉCULO XVIII ............................................. 412 O ENSINO DE HISTÓRIA NO PRIMEIRO GOVERNO VARGAS (1930-1945) ............................ 416 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O PERFIL DO ALUNADO DAS ESCOLAS DA CANGO (1940-1950): ANÁLISE DAS FICHAS CADASTRAIS ............................................................... 420 O ENSINO DE HISTÓRIA ATRAVÉS DOS DIVINOS SABERES DOCENTES: O QUE OS GREGOS TÊM A NOS ENSINAR? ......................................................................................................... 425 A DICOTOMIA ENTRE ‘COLÔNIAS DE EXPLORAÇÃO’ E ‘COLÔNIAS DE POVOAMENTO’ E O ENSINO DE HISTÓRIA DOS ESTADOS UNIDOS NO BRASIL ................................................ 430 BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS ................................................................ 434 MEMÓRIAS EM MOVIMENTO SOBRE O ENSINO DE TEMAS CONTROVERSOS NO PARÁ (1964 – 1985) ......................................................................................................................... 439 LER, ESCREVER E GRAMATICA LATINA: ASPECTOS DA INSERÇÃO DAS AULAS RÉGIAS NO ESPAÇO POLÍTICO REGIONAL DO SUL DE MINAS GERAIS ................................................ 443 COMEMORAÇÕES, ESCRITA, LEITURA E ENSINO DE HISTÓRIA ........................................ 447 O ESTADO NOVO E A AFIRMAÇÃO DO ENSINO DE HISTÓRIA COMO APARELHO IDEOLÓGICO NACIONALISTA ............................................................................................. 451 ENTRE DITADURA E DEMOCRACIA: UMA ANÁLISE COMPARATIVA DA HISTÓRIA E MEMÓRIA NOS LIVROS DIDÁTICOS DE 1976 E 2016 ........................................................... 454 ENSINAR HISTÓRIA DO BRASIL COLONIAL: O PROFESSOR DE HISTÓRIA ENTRE CHOQUES DE PERSPECTIVAS ............................................................................................................... 458 EDUCAÇÃO PARA POUCOS NOS PRIMEIROS ANOS DE INDEPENDÊNCIA DO BRASIL ...... 463 A ESCOLA VISTA POR DENTRO: A SITUAÇÃO DAS ESCOLAS DO ENSINO PRIMÁRIO NA CIDADE DE SALVADOR EM 1913 ......................................................................................... 466 CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS SOBRE AS POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO BRASIL ........................................................................................................................... 469 CONJUNTURA EDUCACIONAL DA DÉCADA DE 1980: NOVAS PROPOSTAS PEDAGÓGICAS E SUA INFLUÊNCIA SOBRE A PRODUÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS....................................... 474 CONFRONTOS POLÍTICOS EDUCACIONAIS: CONTEXTO HISTÓRICO DA CRIAÇÃO DAS LEIS DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL DE 1961 ........................................... 479 ANTIGUIDADE TARDIA OU ALTA IDADE MÉDIA: O ENSINO DA DIVISÃO HISTORIOGRÁFICA EM UMA PERSPECTIVA CONTEMPORÂNEA ....................................... 483 10 A COMPANHIA DE JESUS E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA NOS SEUS PRIMEIROS ANOS ...... 487 EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO NOS PRIMÓRDIOS DA FUNDAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS ................................................... 491 A CONCEPÇÃO EDUCACIONAL PARA O “HOMEM NOVO” MOÇAMBICANO: 1975-1983..... 495 ESBOÇOS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL COLÔNIA E IMPÉRIO ............................ 499 A HISTÓRIA DA HISTÓRIA: PORQUE SE ESTUDA A HISTÓRIA ANTIGA PRIMEIRO? .......... 502 CONHECENDO A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE SURDOS: UM PASSO PARA LIBRAS (LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS)....................................................................................... 505 O IDEAL DE FORMAÇÃO E EDUCAÇÃO NA GRÉCIA ANTIGA ............................................ 509 O ENSINO DE HISTÓRIA E A DITADURA MILITAR NO SERTÃO ALAGOANO ATUAL ........ 512 CAMÉLIA BRANCA: O PROCESSO DE ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO EM SALA DE AULA .. 516 ENSINO DE HISTÓRIA PARA CRIANÇAS: LIÇÕES DE HISTÓRIA DO BRASIL DE JOSÉ SCARAMELI ......................................................................................................................... 520 APONTAMENTOS SOBRE ENSINO DE HISTÓRIA E QUESTÃO NO MARANHÃO ................. 524 O POSITIVISMO E O CONTROLE DOS CORPOS NAS ESCOLAS PAULISTAS DOS SÉCULOS XIX E XX .............................................................................................................................. 528 ANÁLISE DOCUMENTAL HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO (1952 – 2016): BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE ELEMENTOS DA PEDAGOGIA TRADICIONAL NO ENSINO ATUAL ............................................................................................................................................. 532 A FORMAÇÃO DO CIDADÃO NOS PRIMEIROS ANOS DA REPÚBLICA: O LIVRO DIDÁTICO “NOSSA HISTÓRIA”.............................................................................................................. 537 O CARÁTER PEDAGÓGICO DA OBRA DOUTRINA PARA CRIANÇAS (C. 1274-1276) DE RAMON LLULL .................................................................................................................................. 541 GYMNASIO AMAZONENSE PEDRO II: PROSOPOGRAFIA DO CORPO DISCENTE (1930-1933) ............................................................................................................................................. 544 ENSINO DE HISTÓRIA NAS ORIENTAÇÕES CURRICULARES – EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE SÃO PAULO (2005-2012) ............... 547 VERDADES ETERNAS DAS SAGRADAS LETRAS: HSTÓRIA, EDUCAÇÃO E IMPRESSOS PROTESTANTES NO NORDESTE BRASILEIRO (SÉC XIX-XX) .............................................. 553 A PÓLIS COMO EDUCADORA DA HÉLADE NA GRÉCIA ANTIGA ........................................ 557 DITADURA CIVIL- MILITAR NAS UNIVERSIDADES: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS ........................................................................................................ 560 AS DATAS COMEMORATIVAS NO CONTEXTO ESCOLAR: UMA REFLEXÃO ...................... 565 EDUCAÇÃO, ESCOLARIZAÇÃO E REPÚBLICA: AS PRIMEIRAS REFORMULAÇÕES NO ENSINO NO PARÁ REPUBLICANO (1890-1897) ..................................................................... 568 OS INTELECTUAIS DO IHGP E A HISTÓRIA ENSINADA NO PARÁ REPUBLICANO (1900-1920) ............................................................................................................................................. 572 11 12 13 ENSINO E APRENDIZAGEM DA HISTÓRIA: ASPECTOS COGNITIVOS E CULTURAIS Adriano José Dias Rodrigues Introdução Observa-se atualmente que, apesar das transformações curriculares, o ensino formal de História continua intimamente ligado a construção da identidade e a transmissão da memória coletiva. Em especial, os contemporâneos têm vivenciado esta permanência, após uma época de grandes mudanças estruturais para a história da humanidade. Em diferentes culturas e sociedades vemos aparecer apelações identitárias, que tentam urdir as suas reivindicações na semente, sempre nutriente, da história. No âmbito de um processo de globalização que põe em permanente conexão cultural, social, econômica e política aos diversos setores mundiais, as comunidades demonstraram diversas maneiras de adaptar-se aos novos desafios desta atualidade globalizada. Mas a apelação à identidade histórica como fonte de legitimidade frente as certas tendências homogeneizadoras do mundo global reforçou e demandou uma aproximação mais profunda sobre seu significado. O ensino de História tem como objetivo fundamental que os estudantes adquirem os conhecimentos e as atitudes necessáriospara compreender a realidade do mundo onde vivem, as experiências coletivas passadas e presentes, assim como o espaço no qual desenvolve-se a vida em sociedade. Mas além da transmissão da memória coletiva e o patrimônio cultural, tempos, espaço e sociedade devem ser articulados nas representações mentais dos estudantes para compreender o presente no qual vivem, para interpreta-lo criticamente. Ao longo das últimas décadas o papel moralizante e instrutivo no ensino da História não o deixou ao reconhecimento da sua importante função na formação de cidadãos críticos e autônomos (ROMERO, 2004). Desde esta nova concepção, o ensino da História não se vértebra já em torno dos personagens, as datas e os acontecimentos significativos do passado. Se pretende que os estudantes compreendam os processos de mudança no tempo histórico e a sua influência ao momento presente, ou seja, que aprendem a pensar historicamente. Se trata de uma importante dimensão que enfatiza os aspectos cognitivos e disciplinares do ensino da História. Da mesma maneira que de outras matérias da Educação Secundária, as Ciências Sociais em geral, e a História em especial, tem um importante papel na formação de capacidades de pensamento e a promoção das capacidades de aprender a aprender dos estudantes. Mas quais competências intelectuais podem ser consideradas características da aprendizagem da História? Quais dificuldades provocam o seu ensino? Quais recursos didáticos podem ser empregados para ensinar e pensar historicamente? Pensar historicamente provoca múltiplas habilidades, que vem sendo estudadas na literatura, como avaliar provas e interpretações, analisar a mudança ao longo do tempo, raciocinar causalmente, entre outras habilidades de caráter intelectual. Desta forma, 14 importante se faz as duas capacidades fundamentais: a capacidade de compreender o tempo histórico e raciocinar causalmente, por um lado; e a capacidade de avaliar e interpretar criticamente as fontes de informação histórica, por outro lado. O conhecimento histórico se fundamenta em relatos, mas também em interpretação explicativa dos fenômenos históricos, as suas causas e as suas relações com acontecimentos posteriores. Frequentemente estas relações não podem ser reduzidas a relações simples entre uma causa e uma consequência. Os fatos do passado são frequentemente intérpretes no âmbito de uma complexa rede de relações causais e motivacionais. Alguns eventos ou condições podem ser explicados em forma aditiva, enquanto outros serão explicados por um critério de simultaneidade (ou vice-versa). Entre outras ocasiões, os fatos históricos se interpretam sucessivamente como sequência à uma série de fatos precedentes e como causa de outros posteriores. Além disso, os ingredientes dos fenômenos históricos não se circunscrevem aos acontecimentos mais sobressalientes ou as ações dos seus personagens. Para compreendê-los é necessário contextualizar estes elementos nas condições estruturais da época, de tipo socioeconômico, político, cultural, entre outros. Tudo isso explica as dificuldades que os estudantes de diferentes níveis educativos encontram para raciocinar com conteúdos históricos de caráter multicausal. Sabe-se, por exemplo, que os estudantes tendem a simplificar as explicações causais sobre os fenômenos históricos. Esta simplificação pode produzir-se por uma expressão de cercania, ou seja, para atribuir mais importância às causas temporariamente mais próximas que à as mais afastadas, ou por uma tendência narrativa, que destaca os fatores que fazem parte da principal linha de mudança, em prejuízo de outros que tornam mais complexos ou tiram coerência ao relato. Por outro lado, os eventos históricos estão frequentemente protagonizados por indivíduos e grupos humanos cujos valores e motivações desempenharam um papel crucial. A sua interpretação pode provocar diversas dificuldades. Pode, por conseguinte, ser traduzido na tendência a pensar que um evento, semelhante à outro que em certas circunstâncias produza um determinado efeito, produziria também uma consequência semelhante em outro tempo e contexto. Finalmente, muitos adolescentes tendem também “a personificar a História” (GONÇALVES, 2006, p. 13), ou seja, atribuem da excessiva relevância às ações ou as intenções dos indivíduos, e encontram mais dificuldades para compreender a influência destas condições estruturais. Esta última expressão causal não se reduz simplesmente superestimar a influência de conhecidos personagens históricos. Se manifesta também quando se atribui motivações ou sentimentos a grupos sociais, instituições e mesmo condições situacionais (ROMERO, 2004). Outro importante conjunto de habilidades intimamente relacionadas com a aprendizagem significativa da História se relaciona com que é chamado geralmente como pensamento crítico. Dado que a História é construída sobre os valores ideológicos e as visões subjetivas (não há “fatos puros”), é importante aprender a questionar as próprias versões e evidências históricas. 15 Pensar historicamente supõe, por conseguinte, muito mais que acumular uma informação sobre os fatos que se sobressaíram no passado. Requer também a capacidade de avaliar criticamente as fontes de informação, primárias ou secundárias, e as interpretações ideológicas que inevitavelmente realizamos dos eventos históricos. Com efeito, “alguns estudos demonstraram que os estudantes têm muitas dificuldades para compreender a natureza interpretativa e subjetiva das explicações históricas” (BITTENCOURT, 2008, p. 45). A este respeito (que poderíamos chamar de objetivação) provém, em parte, de limitações cognitivas dos adolescentes, mas também dos métodos de ensino e a linguagem utilizada nos próprios livros didáticos. É notório que os livros escolares não expõem geralmente dúvidas ou interpretações divergentes sobre um mesmo fenômeno histórico, mas tendem a apresentar os conteúdos de maneira fechada e com tratamento de certezas. Neste contexto, ensinar a raciocinar e a pensar criticamente se revela como um objetivo complexo, que não se deveria esperar atingir sem um tratamento explícito no currículo escolar e em sala de aula. “Desde certas posições “logicistas” pensava-se que um estudo sistemático e aplicado da lógica formal (através de exercícios de validação de silogismos, por exemplo) poderia reforçar a “competência raciocinadora” dos estudantes” (BITTENCOURT, 2008, p. 24). Contudo, hoje se tende melhor a importância de formar o raciocínio e a crítica com conteúdo específicos. Raciocinamos melhor quando desenvolvemos estratégias e “esquemas retóricos próprios da disciplina” que permitem-nos conferir um raciocínio a uma estrutura mais clara e mais ordenada), e quando praticamos o debate sobre estes conteúdos específicos. Entre outras, se consegue ajudando os estudantes que descubram o conteúdo ideológico ou os prejuízos implícitos num texto; quem analisem as carências ou as inconsistências na informação, ou os pontos de vista conflituosos que são expostos em várias fontes; quem critiquem a argumentação que sustenta certo autor ou teoria, busquem contra-argumentos e debatem explicitamente em sala de aula. Conclusão A análise sobre os aspectos cognitivos e culturais do ensino de História vai além da consciência de implicar o objetivo básico que se esboçou para a construção das identidades. É forçoso que o ensino da História seja voltado para o estudante pensar criticamente. O desenvolvimento deste duplo eixo temático (pensar historicamente e construir identidade) deve abordado, além disso, desde uma visão intercultural e interdisciplinar. O ensino de História, seja no ensino básico ou no ensino superior, deve ser voltado para o sujeito consciente de seu tempo. De uma consciência histórica que deve ser elucidativa, ou seja, todo fato ou fenômeno pode (e deve) ser historicizado. O ensino de História, portanto, torna-se fundamental no crescimento cognitivodo alunado, pois em tempos ditos pós-modernos, tecnológicos e utilitários, a História torna-se a disciplina mestra das humanidades. 16 Finalmente, nesta análise, pode-se destacar que o ensino de História não pode repetir os erros dos antigos livros didáticos, os quais os grandes eventos, os heróis e as gestas dos reis são importantes para o estudo. O ensino de História deve ser humanizado e, por conseguinte, dar voz aos atores silenciados na história. Já não se ensina ou aborda fatos e eventos, mas uma abordagem consciente e crítica da natureza das coisas. Referências BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008. GONÇALVES, Pedro Alves. A Construção da Memória Histórica na Era Global. São Paulo: Coutrix, 2006. ROMERO, Jair Lopes de Assis. Aprender a Pensar a História. 2. ed. São Paulo: Coutrix, 2004. 17 PORNOGRAFIA E ENSINO DE HISTÓRIA Alexandre Guilherme da Cruz Alves Junior Introdução Pensar a pornografia no ensino de História pode parecer, para grande parte da população, algo impróprio e até mesmo ofensivo. Embora haja certo consenso em torno da importância de se tratar temáticas relativas à sexualidade nas escolas, a simples menção da palavra pornografia causa estranhamento, por se tratar de algo considerado proibido, sujo, lascivo, sem qualquer relação aparente com atividades educacionais. O presente ensaio pretende estimular uma visão alternativa, ou seja, refletir sobre as possibilidades de se pensar historicamente a própria noção de pornografia, e as relações jurídicas, políticas e culturais que o conceito e a prática ensejaram em diferentes contextos ao longo do tempo, tornando-se um interessante objeto de estudo para estimular reflexões acerca da construção social de conceitos como marginalidade, repressão, outsiders, etc. História e Pornografia: Brevíssima apresentação Conceituar pornografia pode ser extremamente difícil, pois ao mesmo tempo que descreve um comportamento, também lhe imputa um valor, que muda ao longo do tempo. A primeira tentativa conhecida de elaborar uma definição moderna para o termo pornografia surgiu no Oxford English Dictionary, em 1857, buscando descrever a relação entre saúde pública e prostituição feminina. Entretanto, a palavra pornografia e suas variações, com conotações modernas, já circulavam na França em meados do século XVIII. “O conceito foi definido historicamente, e seu desenvolvimento como categoria esteve sempre sujeito a conflitos e mudanças. A pornografia especifica um argumento, não uma coisa, e designa uma zona de batalha cultural.” (HUNT, 1999, p.14) De fato, no século XV iniciou-se uma maior produção e distribuição de livros contendo passagens com forte apelo sexual. Entre os séculos XVI e XIX, houve um crescimento gradual de produções literárias consideradas “indecentes”. “O desenvolvimento da pornografia ocorreu a partir dos avanços e retrocessos da atividade desordenada de escritores, pintores e gravadores, empenhados em pôr à prova os limites do ‘decente’ e a censura da autoridade eclesiástica e secular” (HUNT, 1999. p.10) 18 Não por acaso, McConahy (1988) aponta que os autores de histórias classificadas como pornográficas eram justamente os hereges, livres-pensadores e libertinos de reputação considerada duvidosa. “A pornografia não foi espontânea, foi definida num longo processo de conflito entre escritores, pintores e gravadores, por um lado, e espiões, policiais, padres e funcionários públicos, por outro. Seu significado político e cultural não pode ser separado de seu aparecimento como categoria de pensamento, representação e regulamentação.” (MCCONAHY, 1988, p.30) De modo geral, ao longo dos séculos XVI e XVIII, obras com forte apelo sexual censuradas eram postas ao lado de outros escritos contestatórios da ordem política e social, como os panfletos que criticavam o poder absoluto dos reis, o estilo de vida dos nobres e a moralidade cristã. Neste sentido, obras com teor considerados pornográficos não possuíam um estatuto específico, o que passaria a ocorrer apenas no final do século XVIII. (HUNT, 1999) Neste sentido, é possível localizar neste período a gênese de uma tradição pornográfica relacionada diretamente com à crise geral das sociedades do Antigo Regime e o apogeu do Iluminismo. Por outro lado, no começo do século XIX, obras pornográficas passaram a ser consideradas inferiores aos outros escritos contestatórios da ordem social vigente. Os editores e escritores de livros considerados pornográficos se afastaram dos círculos políticos, ou foram expulsos deles. Na Inglaterra, o Obscene Publications Act, reformulado em 1859, considerava obsceno qualquer material “que tivesse a tendência de depravar e corromper aqueles cujas mentes estavam abertas a tais influências morais”. Mais tarde, buscando uma classificação mais precisa, foi instituído o teste Hicklin. O teste, também aplicado nos Estados Unidos, consistia em indagar se um pai de família conseguiria ler, sem constrangimento, e em voz alta, para a sua mulher e seus filhos, o texto em questão. Apenas um pequeno trecho de um livro bastaria para que a comercialização da obra fosse proibida. Como aponta Silva (2013, p.114), “Até meados do século XX era bastante comum que tribunais estadunidenses apoiassem a censura a obras literárias de mérito insuspeitável, como ‘O amante de Lady Chatterly’, ‘Ulisses’ e obras de Balzac. Ulisses foi proibido em 1920 a pedido da “Sociedade de Nova Iorque pela Supressão do Vício”, pelo fato de que o personagem principal do romance se masturba em determinado ponto da narrativa”. A reversão do teste Hicklin no âmbito da Suprema Corte dos Estados Unidos viria ainda em 1957, com o julgamento do caso Roth v. United States. Para os juízes da Suprema Corte, sexo e obscenidade não seriam sinônimos, e a Primeira Emenda deveria proteger, portanto, qualquer obra que tivesse alguma relevância social. Não por acaso, revistas pornográficas, no final dos anos 1950, passaram a ter seções dedicadas a artigos sobre saúde, lazer e comportamento. De forma irônica, editores de revistas e produtores de filmes passaram a incluir trechos de obras de Shakespeare nas 19 revistas ou nos diálogos entre os atores pornôs, de modo a caracterizar “a relevância social da obra” (BOULWARE, 1997) Nas últimas décadas do século XX, a pornografia tornou-se o principal adversário de dois movimentos socais aparentemente opostos: o conservadorismo religioso e uma determinada corrente do feminismo. A partir dos anos 1970, o discurso religioso contra as revistas e filmes pornôs ganhou força. Grupos passaram a lutar a nível local contra obras que consideraram um risco às famílias. “A década de 1970 serviu de terreno fértil para o cultivo da nascente plataforma dos ‘valores familiares’. A ideologia da Guerra Fria tinha posto as saudáveis famílias americanas como um baluarte crítico contra o comunismo, e com o declínio da posição global dos Estados Unidos em face do fracasso no Vietnã, o embargo do petróleo da OPEP, e outros debacles, apoiar a família americana, uma instituição outrora venerável, mas abalada pela revolução sexual, assumiu uma importância social e política recém- descoberta pelos conservadores religiosos” (STRUB, 2010, p. 181) Para o grupo que mais tarde seria identificado como feminismo antipornô, todo e qualquer tipo de material pornográfico deveria ser censurado, ou até mesmo eliminado, pois utilizava o corpo feminino como mercadoria, reforçando o machismo, ao estimular, direta ou indiretamente, o uso da mulher como objeto e o aumento da violência sexual. As ativistas Andrea Dworkin e Catherine MacKinnon se destacaram como líderes do movimento feminista antipornografia. “Para Dworkin, a pornografia constituía um ethos, o ethos central do mundo dominado pelos homens. ” (STRUB,2010, p. 245) Para Dworkin e MacKinnon, mulheres que trabalhavam na indústria pornô, fossem em filmes e/ou revistas, na verdade, seriam vítimas, muitas vezes inconscientes, do sistema patriarcal norte-americano. De fato, como aponta McConahay (1988), em diversos momentos as feministas antipornografia se uniram à Direita Cristã em seu objetivo de não permitir que a Primeira Emenda protegesse obras pornográficas, gerando fortes críticas de outros setores do movimento feminista, defensores da liberdade de expressão. Entretanto, é preciso estar atento para o fato de que não havia nenhuma questão religiosa presente na retórica das feministas antipornografia. Na verdade, a base do seu discurso era extremamente sofisticada. “MacKinnon, em particular, dirigiu sua crítica para o liberalismo, cujos ideais abstratos de ‘liberdade, igualdade, privacidade, e expressão’ funcionavam para ratificar a ordem social existente ao atomizar direitos como questões estritamente individuais e, assim, desviar as pesquisas sobre as desigualdades institucionalizadas”. (STRUB, 2010. p.248) Como resposta a este movimento, surgiu o Feminist Anti-Censorhip Taskforce (FACT), alegando que, na verdade, o discurso antipornografia feminista seria um desvio, por reproduzir justamente uma característica da cultura patriarcal norte-americana, na qual as mulheres precisavam ser “protegidas” das questões sexuais. “Para as feministas 20 defensoras da liberdade de expressão, a impureza do pornô era um preço pequeno a pagar pelas liberdades duramente conquistadas sobre seus corpos e crenças”. (STRUB, 2010, p.248) Estes debates ainda carecem de estudos mais profundos. Por outro lado, caracterizá-lo como uma “guerra” interna no movimento feminista, mesmo com os duros discursos dos dois lados, é sugerir que houve um movimento feminista consensual, ignorando a sua pluralidade característica. Considerações finais O presente ensaio não pretende encerrar o debate, mas justamente estimular reflexões acerca das possibilidades de se pensar a pornografia e todas as questões que se colocam ao seu entorno, como um importante objeto para o Ensino de História, possibilitando, principalmente, a discussão crítica acerca da historicidade das noções de comportamentos sociais considerados marginais e/ou transgressores. Referências Bibliográficas BOULWARE, Jack. Sex, American Style: an illustrated romp through the Golden age of heterosexuality. Venice: Feral House, 1997. DUGGAN, Lisa. HUNTER, Nan D. Sexual Wars: sexual dissent and political culture. New York: Taylor & Francis, 2006. HUNT,Lynn. Obscenidades e as Origens da Modernidade, 1500 – 1800. In: HUNT, Lynn. A Invenção da Pornografia. São Paulo: Hedra, 1999. MCCONAHAY, John B. Pornography: The simbolic politics of fantasy. In: Law and Contemporary Problems. vol 51.n.1, 1988. SILVA, Júlio César Casarin Barroso. Liberdade de Expressão, Pornografia e Igualdade de Gênero. In: Estudos Feministas. Florianópolis, 21(1): 424, jan.-abr.,2013. STRUB, Whitney. Pervesion for Profit: The politics of pornography and the rise of the New Right. NY: Columbia University Press, 2010. 21 ENSINO DE HISTÓRIA E TURISMO CULTURAL: AS POSSIBILIDADES DE EDUCAÇÃO EM AMBIENTES NÃO FORMAIS DE APRENDIZAGEM Amanda Cristina dos Santos Costa Alves Introdução O presente artigo busca-se discutir as possibilidades do Ensino de História e do Turismo Cultural nos ambientes não formais, valendo-se como referência o Parque Estadual do Guartelá, localizado no município de Tibagi- Paraná. O parque foi criado no ano de 1992, é classificado como sendo uma Unidade de Conservação, e tem como propósito preservar a riqueza natural, biológica, arqueológica, histórica e geográfica do local. (IAP, 2002). O Parque tratar-se de uma reserva de Unidade de Conservação, ou seja, uma área protegida, que tem a necessidade de preservar e conservar o meio em que se insere. Logo é um espaço de incentivo e propulsor para o ensino de história não formal, avivando as ações educativas de ensino-aprendizagem, que propicia a compreensão da salvaguarda e do acondicionamento do patrimônio histórico-cultural e social. O Ensino de História e o Turismo Cultural relacionados tem a necessidade de pensar o parque como um ambiente de educação não formal, como tantos outros espaços educativos fora da sala de aula, desenvolvendo ações de cunho educacional. Diante disso, é considerável pontuar a relevância frente aos espaços não formais, contribuindo nas ações que tencionam as atividades turísticas e educativas do local, que enseja a visitação do turista, uma vez que gera a oportunidade de ter contato com o patrimônio cultural. Ou seja, a importância do patrimônio para a concepção histórica. Segundo Prats (1998, p.63), o patrimônio cultural pode ser entendido como “todo aquello que socialmente se considera digno de conservación independientemente de su interes utilitário”. Por conseguinte, faz-se necessário assinalar a associação do patrimônio à comunidade, a importância que o parque exerce frente ao turista enquanto processo impulsor para o Ensino de História e para o Turismo Cultural. Espaços não formais de aprendizagem A Educação não formal caracteriza por ser uma educação que atua fora dos âmbitos escolares, promove ações em ambientes motores como museus, parques, pontos 22 turísticos, praças, cidades, dentre outros, que dispõem de um perfil cultural, histórico e artístico. Segundo Gohn (2014): “A educação não formal é aquela que se aprende "no mundo da vida", via os processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianas. Nossa concepção de educação não formal articula-se ao campo da educação cidadã – a qual no contexto escolar pressupõe a democratização da gestão e do acesso à escola, assim como a democratização do conhecimento. Na educação não formal, essa educação volta-se para a formação de cidadãos (as) livres, emancipados, portadores de um leque diversificado de direitos, assim como de deveres para com o(s) outro(s)”. (GOHN, 2014, p. 40). A educação não formal acontece de uma maneira distinta da educação formal, ocorre fora da sala de aula. Em ambientes que não necessariamente foram construídos para serem estudados ou relacionados à pesquisa, mas tem uma relação direta com o ensino formal. O ensino não formal relaciona com as vivências e os conhecimentos do indivíduo mediante a relação com a sociedade. Segundo Simson, Park e Fernandes (2007): “A educação não-formal é toda aquela que é mediada pela relação ensino/aprendizagem; tem forma, mas não tem uma legislação nacional que a regule e incida sobre ela. Ou seja, uma série de programas, propostas, projetos que realizam ações e interferências, que são perpassados pela relação educacional, mas que se organizam e se estruturam com inúmeras diferenças – em suma, um leque bastante amplo de possibilidades. (SIMSON, PARK, FERNANDES, 2007, p.16). Em outras palavras, a educação não formal dialoga com a sociedade, com o cotidiano, com as representações, a cultura, os costumes e os indivíduos. Logo, pode acontecer em diversos espaços sociais e culturais independente da utilidade do meio físico, o importante é que este espaço forneça meios para que ocorra a intenção de ensinar e relacionar o ambiente com o aprendizado. Portanto, o Parque Estadual do Guartelá, referindo-se características de elementos históricos, turísticos e patrimoniais, considerado nos âmbitos da educação não formal, um propulsor que possibilita a prática de atividades, como parte de um processo educativo não escolar, que garante meios para que ocorra o Ensino de História e o Turismo Cultural, através deste espaço como recurso didático pedagógico. Discussões entre Ensino de História e Turismo Cultural A relevância do ensino de história e o turismo cultural abordam aspectos do passado e do presente, contando a históriado local, da cultura, dos costumes e dos povos. Segundo Moletta (1998, p.09-10), a definição de Turismo Cultura pode ser entendida como: 23 “Turismo cultural é o acesso a esse patrimônio cultural, ou seja, à história, à cultura e ao modo de viver de uma comunidade. Sendo assim, o turismo cultural não busca somente lazer, repouso e boa vida. Caracteriza-se, também, pela motivação do turista em conhecer regiões onde o seu alicerce está baseado na história de um determinado povo, nas suas tradições e nas suas manifestações culturais, históricas e religiosas”. (apud. BATISTA, 2005, p. 30-31). A atividade turística é importante tanto para o a comunidade residente impulsionando à economia, a cultura, a história da cidade, tanto para o público que visita que busca atividades turísticas de lazer, tanto para ensino- aprendizagem que estimula o conhecimento e o aprendizado histórico do local. Segundo Costa (2009, p. 190): “O turismo cultural pode ser compreendido como um segmento da atividade turística que, por meio da apreciação, da vivência e da experimentação direta dos bens do patrimônio cultural, material e imaterial, e da mediação da comunicação interpretativa, proporciona aos visitantes a participação em um processo ativo de construção de conhecimentos sobre o patrimônio cultural e sobre seu contexto sócio-histórico. Em última escala, este processo auxiliará na produção de novos conhecimentos e a conservação dos bens visitados”. (apud CARVALHO, 2010, p. 56). De fato, viabiliza efetuar o Ensino de História extramuros, fora da sala de aula, oportunizando o diálogo com o Patrimônio, a História, o Turismo e com a identidade, a memória e o próprio indivíduo. Portanto, pontuam importantes aspectos como sociais, culturais, saberes, aprendizados, conhecimento a cerca do local visitado e dos elementos históricos do passado e do presente. Diante disso, o Ensino de História nos espaços não formais e o Turismo Cultural dialogam e possibilitam desenvolverem ações que valorizam o patrimônio histórico e cultural, atuando de maneira interdisciplinar à medida que são considerados componentes propulsores do patrimônio. Considerações Os espaços não formais de aprendizagem são importantes ferramentas que eleva o potencial educativo. Através de monumentos e patrimônios culturais, dentre outros, que reafirmam a valorização do patrimônio e a História. Auxilia no enriquecimento da cultura individual, coletiva e o fortalecimento dos sentimentos de cidadania e o respeito às culturas. O Ensino de História e o Turismo Cultural em ambientes não formais, desde que estejam inseridos em um contexto histórico-cultural revela a importância e a possibilidade de promover ações educativas que proporciona o reconhecimento dos atrativos naturais e culturais dos patrimônios. E o Turismo para a cidade impulsiona a economia garantindo a possibilidade do processo de visitação, estimulando o fluxo de 24 turistas, e consequente assegura elementos que instigam o Ensino de História e a preocupação com os recursos patrimoniais. Referências Bibliográficas BATISTA, C.M. Memória e Identidade: Aspectos relevantes para o desenvolvimento do turismo cultural. Caderno Virtual de Turismo. Vol. 5, n° 3. 2005, p. 27-33. CARVALHO, D.K. Turismo Cultural e Arqueologia nos espaços urbanos: caminhos para a preservação do patrimônio cultural. Turismo e Sociedade. Curitiba, Vol.3, nº 1. Abril de 2010, p. 51-67. GOHN, Maria da Glória. Educação Não Formal, Aprendizagens e Saberes em Processos Participativos. Revista Investigar em Educação - II ª Série, n° 1, 2014, p. 35-50. IAP–INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ. Plano de Manejo do Parque Estadual do Guartelá. Curitiba, 2002. PRATS, Llorenço. El Concepto de Patrimonio Cultural. Revista Política y Sociedad, Universidad de Barcelona, 1998, p. 63-76. SIMSON, O.R.M; PARK, M.; FERNANDES, R.S. A Educação não-formal: um conceito em movimento. Visões singulares, conversas plurais.São Paulo: Itaú Cultural, (Rumos: Educação, Cultura e Arte,3) 2007, p. 13- 38. 25 BRASIL: PENSAMENTO E PRÁTICA SOCIAL DA LAICIDADE NO AMBIENTE PÚBLICO ESCOLAR Ana dos Anjos Santos Costa O ponto inicial deste trabalho foi a leitura do texto Ideias fora do lugar, de Roberto Schwarz e também do texto de Silvano Santiago intitulado Interpretes do Brasil. Nesses textos observamos as culturas diaspóricas e como podemos analisá-las academicamente. Partindo dessas análises, refletiremos sobre o conceito de laicidade, mais especificamente, inserindo-o no ambiente público e escolar no Brasil. No texto de Schwarz o autor traz à tona as contradições entre os discursos filosóficos e acadêmicos das práticas cotidianas da elite brasileira. Focando mais especificamente na questão entre liberdade e escravidão, mostra que a elite brasileira, que tinha acesso aos discursos e debates filosóficos europeus, se interessava pela ideia de liberdade entre os homens, mas, apesar da aceitação da teoria, o grupo esclarecido não mencionava a pretensão de mudanças na estrutura econômica e social da escravidão brasileira. Para Schwartz essa elite brasileira que se formava não conseguia ou não queria relacionar suas ideias com seu cotidiano escravista. Existiria um “defeito”, uma lacuna a ser observada em nossa sociedade. Já Silvano Santiago aponta que os primeiros escritores sobre essa terra colonial eram os viajantes europeus, que tinham suas visões eurocêntricas sobre como era e como deveria ser o Brasil. Ele aponta que, após a independência política brasileira perante Portugal, foram os próprios brasileiros, intelectuais da elite local que se debruçaram em entender o pensamento e a sociedade nacionais. Santiago não enxerga como um defeito as disparidades entre reflexões e ações das elites intelectuais no Brasil. Para ele ocorre um jogo de correspondência e de comparação. E esse jogo de comparações faz sentido na lógica da manutenção da hierarquia de poder no Brasil (SANTIAGO, 2000 p.19). Também aborda de relance a questão da educação quando cita a reforma pombalina que modificou a educação no reino português, a qual antes era comandada pelos jesuítas. É nessa questão que começaremos a discutir o tema de nosso trabalho. Até então, a educação no reino e nas colônias era delegada a uma ordem religiosa, a Companhia de Jesus, que ensinava o currículo tanto as crianças portuguesas como aos recém descobertos índios americanos. Pombal entrou na administração do reino português (1750 – 1777) implementando reformas em diversos setores, inclusive no setor educacional. O governo pombalino tenta atribuir à Companhia de Jesus todos os males da Educação na metrópole e na colônia. Ocorreu então a primeira separação entre religião e educação no território colonial. Mesmo que sendo de forma mais formal do que prática, com inspiração nas ideais iluministas, Pombal lança uma profunda reforma educacional. O pensamento iluminista impulsionava as reformas pombalinas. O ensino jesuítico já não alcançava as necessidades da nova administração portuguesa e a ideia de uma 26 educação controlada pelo Estado (moderno) ganha espaço. Nas reformas pombalinas o Brasil adere à ideia da educação controlada pelos atores políticos. O que nos interessa é como essa ideia de laicidade foi e é aplicada em nossa sociedade. O termo laicidade vai aparecer relacionado ao ambiente escolar em 1871, quando foi associado ao ensino público da França no Novo Dicionário de Pedagogia e de Instrução Primária de Ferdinand Buisson, publicado em 1887. O verbete sobre laicidade expressa que: A laicidade ou a neutralidade da escola em todos os graus não é nada senão a aplicação à escola do regime que prevaleceu em todas nossas instituições sociais. Partimos, como a maioria dos povos, de um estado de coisas que consistia essencialmente na confusão de todos os poderes e de todos os domínios, na subordinação de todas as autoridadesa uma autoridade única, aquela da religião. É somente através do lento trabalho dos séculos que, pouco a pouco, as diversas funções da vida pública distinguiram-se, separadas uma das outras e livres da tutela estreita da Igreja.(BASTOS, 2010. P. 268) Buisson deixa claro seu entendimento do conceito de laicidade como o oposto do que ocorria com a “confusão de todos os poderes e todos os domínios” dentro do ambiente escolar. O autor continua seu verbete escrevendo que: Apesar das reações, apesar de tantos retornos diretos ao antigo regime, apesar de quase um século de oscilações e de hesitações políticas, o princípio sobreviveu: a grande ideia, a noção fundamental do Estado Laico, quer dizer, a delimitação profunda entre o temporal e o espiritual entrou nos costumes de maneira a não mais sair. (BASTOS, 2010. P. 268) No Brasil, a ideia de um governo laico teve seus apoiadores. De Rui Barbosa até Benjamin Constant, a laicidade também perpassava pela escola pública como sendo fundamental para a boa educação. A primeira Constituição brasileira, de 1891, reafirma a ideia desses pensadores e estabelece a separação entre a Igreja e o Estado, a liberdade de culto e o reconhecimento a liberdade religiosa. Atualmente alguns pesquisadores se debruçam sobre o tema da laicidade na escola. Luiz Antônio Constant Rodrigues da Cunha, professor titular da Faculdade de Educação da UFRJ, em seus estudos, defende o que denomina princípios de uma educação pública, ou seja, uma educação para todos, onde no espaço escolar não pode haver qualquer tipo de doutrinação. Seria o ensino religioso e catequizante um risco à escola pública. O risco estaria no desrespeito aos estudantes e o que podem querer no futuro. Cunha aponta também que é um erro atrelar valores morais e éticos a uma determinada religião. Isso poderia passar a ideia equivocada de que só quem segue aquela religião específica é que possui valores. Cunha diz que “Só uma concepção totalitária da vida imagina que é a religião que vai embasar a Pedagogia e dar sentido ao ensino público e aos valores humanos.” (CUNHA, 2013) 27 Nossa questão é até que ponto a ideia francesa de laicidade se encaixa em nossa sociedade. Aqui observamos uma problemática. Assim como Schwarz, inicialmente pensamos em ideias e práticas dissonantes entre si. É interessante verificar o caminho percorrido pela elite intelectual no Brasil. Tempos depois da Era Pombalina, a Constituição de 1824, já com o Brasil independente, dava a Igreja Católica condição de representante da religião oficial. Nascimentos, casamentos e mortes ficaram a cargo da administração católica. Além disso, a educação primária e secundária foram entregues à Igreja, tirando novamente o discurso da laicidade e retornando à educação confessional. A indagação que fazemos é se a separação total entre religião e ambiente escolar tem sido realizada e se ela é realmente necessária. Isso porque presenciamos práticas cotidianas escolares que não se enquadram na ideia francesa. É nesse ponto que pensamos nos aproximar das ideias de Silvano Santiago que aponta para um discurso vindo de fora, não como algo fora do lugar, mas como um discurso que irá favorecer um determinado grupo social. Nesse sentido, entendemos que a laicidade muitas vezes é utilizada não como um conceito para se colocar em prática efetiva no cotidiano escolar, mas como um argumento que irá impedir determinadas religiosidades de percorrerem os ambientes escolares. Ocorre que, em muitos casos, a escola pública brasileira não é laica em sua prática. A manutenção de discursos religiosos é aceitável, desde que estes se enquadrem no pensamento dominante. Também é interessante ressaltar o aspecto racista pode estar envolvido nesta questão. Uma vez a laicidade não se estabelecendo na escola, são muitos os casos em que religiosidades de matriz africana são excluídas do ambiente escolar. Sabendo do número de negros em nosso país, principalmente nos endereços periféricos e assistidos pela escola pública, a questão que nos incomoda é o porquê da exclusão. Até que ponto a ausência de determinados grupos e suas culturas expressa a laicidade é o que se pergunta. Em que momento devemos distinguir a separação necessária do Estado e sua escola das crenças religiosas das ações que visão aos silenciamento de um grupo pertencente à sociedade brasileira? Não temos a pretensão de ser uma resposta fechada e definitiva. Antes, fizemos a elaboração de uma reflexão sobre a prática educacional e quais discursos perpassam o ambiente escolar. Mostramos como a laicidade é importante para o ambiente de uma escola pública de qualidade. Mas também tentamos demonstrar que o fato do conceito muitas vezes parecer fora do lugar no Brasil, é motivo para indagação de como e por quem ele é utilizado. Bibliografia BASTOS, Maria Helena Camara. Introdução Verbete Laicidade. BUISSON, Ferdinand. Verbete Laicité/Laicidade. Dictionnaire de pédagogie et d'instruction primaire publié sous la direction de Ferdinand Buisson (1878-1887, p. 1469-1474). História da Educação. Pelotas: Asphe, v. 14, n. 32, 2010, p. 267-276. 28 BRASIL. Constituição Federal. (1891) Art.72. (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm visto em 5/01/2017). CUNHA, Luiz Antônio. "A escola pública não pode ser uma arena de disputas religiosas". Revista Nova Escola, Maio de 2013. (disponível em http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/escola-nao-pode-nem-impor- religiao741655.shtml visto em 04/01/2017) SANTIAGO, Silviano. Intérpretes do Brasil. São Paulo: Nova Aguilar, v. 3, 2000. SCHWARZ, Roberto. Ideias fora do lugar. Ao vencedor as batatas. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1992. 29 FILOSOFIA E ENSINO DE HISTÓRIA NA OBRA DE PAULO FREIRE Anderson Romário Pereira Corrêa Introdução A presente comunicação tem por objetivo informar como Paulo Freire pensava a História. Buscou-se identificar a “concepção freireana de História”. Foi elaborada uma contextualização da trajetória das discussões no Campo da história e os principais paradigmas historiográficos. Analisou-se o conjunto das obras, através de método qualitativo, com técnicas de análise de discurso e concluiu-se que Paulo Freire participou da construção de uma “nova” concepção de estruturalismo e que, sua filosofia pedagógica, defendia uma concepção crítico- dialética de História. A História: uma ciência em construção Francisco Ricardo Rudiger (1991, p.185), escreve que um dos principais temas da reflexão epistemológica contemporânea, no terreno das ciências humanas, é em relação ao caráter do conhecimento histórico. É um assunto que preocupa tanto filósofos quanto historiadores. Segundo Rudiger do ponto de vista geral, os paradigmas epistemológicos da história podem ser divididos em basicamente três: historicismo, positivismo e dialético. Dentro destes paradigmas existem varias correntes. Estes paradigmas divergem quanto a concepção de ciência, quanto ao método empregado pelo historiador e quanto a matéria da história (Idem, p. 186). Francisco R. Rudiger, afirma que no paradigma crítico-dialético, o campo factual do historiador é visto como práxis humana, limitada por determinadas condições, cujo caráter, sempre mediado pelos sujeitos da ação social, podem ter cunho estrutural ou sistêmico. (Idem, p.187) Em termos de prática historiográfica, a retomada de pressupostos como a interdisciplinaridade, a relação com as Ciências Sociais, a à História problema, e a substituição do Marxismo, no sentido de aprimoramento do saber histórico, terá aqui o conceito de “Paradigma Crítico Dialético”. Paulo Freire e sua concepção de História Ao fazer análise de conteúdo nas obras de Paulo Freire observou-se que sua idéia de História é contraria ao fatalismo e defende a visão de História como possibilidade. Rejeita o determinismo, considerando que existem condicionantes,mas nada pré- determinado em relação aos acontecimentos históricos. Segundo Paulo Freire, não existe uma causa determinante nos acontecimentos, mas vários fatores que interagem na realização dos fatos. Sua concepção é dialética, admitindo o papel condicionante das estruturas sociais, porém enfatizando as experiências a nível do cotidiano. A seguir 30 apresenta-se a concepção de Paulo Freire sobre a História como fatalidade ou destino, a concepção mecanicista e determinista da história, os condicionantes na História, a possibilidade, a concepção dialética, as experiências e o cotidiano. Segundo Paulo Freire (1987), pensar a história enquanto fatalidade ou destino é pensar o passado como algo pré-dado ou imutável, o presente domesticado e bem comportado e o futuro prefixado e inexorável. Esta concepção é castradora e negadora da liberdade. Nesta concepção, os indivíduos tornam-se espectadores da história, esperando a manutenção do presente e a espera que o futuro já conhecido se instale. (1987, p.26) Ainda na “Pedagogia da Autonomia” Paulo Freire (1996, p.38) destaca que a concepção mecanicista e determinista da história reduz a consciência a puro reflexo da materialidade. Da mesma forma que a fatalidade, o determinismo (seja ele mono-causal ou pluri-causal) também servem aos interesses do imobilismo. São as chamadas concepções teleológicas, que afirmam existir um “destino já traçado”. Assim explica ele: “Sempre recusei os fatalismos. Prefiro a rebeldia que me confirma como gente e que jamais deixou de provar que o ser humano é maior que os mecanicismos que o minimizam.” (1996, p.44) Paulo Freire é contrário a idéia do fatalismo e do determinismo, porém, acredita que existem condicionantes sociais. Em “Política e Educação” o pedagogo apresenta a defesa da idéia de condicionamentos, que não determinam o comportamento dos seres humanos, mas impõe-lhes certos limites: “A nossa experiência, que envolve condicionamentos mas não determinismo, implica decisões, rupturas, opções, riscos.” (2001, p.09) Na mesma obra salienta que: “Esta inteligência da História, que descarta um futuro predeterminado, não nega, porém, o papel dos fatores condicionantes a que estamos mulheres e homens submetidos.” (Idem, p.47) Desde sua primeira obra a “Pedagogia do Oprimido” que ele escreve sobre os condicionantes e não determinantes na História: “Os homens, pelo contrário, porque são consciência de si e, assim, consciência do mundo, porque são um “corpo consciente”, vivem uma relação dialética entre os condicionamentos e sua liberdade.” (1987, p.90). A crítica ao marxismo aparece quando ele escreve que embora não podendo compreender a história contemporânea sem a luta de classes, a luta de classes tão pouco pode explicar tudo. Em “Pedagogia da Esperança” Paulo Freire escreve: “Nunca entendi que as classes sociais, a luta entre elas, pudessem explicar tudo, até a cor das nuvens numa terça-feira à tardinha, daí que jamais tenha dito que a luta de classes, no mundo moderno, era ou é o motor da história. Mas, por outro lado, hoje ainda e possivelmente por muito tem o não é possível entender a história sem as classes sociais, sem seus interesses em choque.” (1992, p.47) Logo a seguir Paulo Freire escreve que o “sonho”, os ideais, são também um dos “motores da história”, e acrescenta sua visão de que a realidade e a história é o resultado de vários fatores, sendo que não aponta nenhum deles como tendo primazia sobre os outros: “O sonho pela humanização, cuja concretização é sempre processo, e sempre devir, passa pela ruptura das amarras reais, concretas, de ordem econômica, política, social, ideológica etc., que nos estão condenando à desumanização. O sonho é assim uma exigência ou uma condição que se vem fazendo permanente na história que fazemos e que nos faz e re-faz.” (Idem,p. 51) 31 O ensino de História A história fatalista e determinista que organiza o passado estanque, apresenta-se na didática, na forma de narração e exposição dos fatos, geralmente de forma cronológica, enfatizando datas e nomes. Na “Pedagogia do Oprimido” ele escreve: “Narração de conteúdos que, por isto mesmo, tendem a petrificar-se ou a fazer-se algo quase morto, sejam valores ou dimensões concretas da realidade. Narração ou dissertação que implica num sujeito – o narrador – e em objetos pacientes, ouvintes – os educandos.” (1987, p.57) Acrescenta Paulo Freire: “A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão.” (Idem, p.58) Esta concepção e forma de trabalhar com os conhecimentos históricos é conhecida pelos professores de história como “História Tradicional”. Ao contrário da concepção fatalista e determinista da história (História Tradicional), que tem na narração e na repetição de fatos, datas e nomes seu ponto forte, a concepção dialética de história, que trabalha com a concepção de possibilidades condicionadas, destaca a “história problema.” Em “Pedagogia do Oprimido” Freire escreve que: “A concepção e prática “bancárias”, imobilistas, “fixistas”, terminam por desconhecer os homens como seres históricos, enquanto a problematizadora parte exatamente do caráter histórico e da historicidade dos homens.” (1987, p.72) A problematização da realidade parte sempre do seu aqui e agora. Freire explica que é necessário problematizar os fatos, pois não existe nada que não possa ser ainda desvelado. Em “Extensão e Comunicação” Paulo Freire (1985) escreve: “É necessário que ele reflita sobre o porquê do fato, sobre suas conexões com outros fatos no contexto global em que se deu.” (1985, p.35). Destaca o pedagogo a tarefa do profissional educador da área de história: “Poder-se-ia dizer que esta é a tarefa própria de um professor de História; a de situar, na totalidade, a “parcialidade” de um fato histórico. Parece-nos, entretanto, que sua tarefa primordial não é esta, mas a de, problematizando a seus alunos, possibilitar-lhes o ir-se exercitando em pensar criticamente, tirando suas próprias interpretações do porquê dos fatos.” (Idem) Conclusão O que mais Paulo Freire enfatiza em seus textos é uma concepção dialética de História (História como movimento e contradições). Escreve bastante, como não deveria deixar de ser, do saber histórico escolar. Para ele, a história é importante para “conhecer” a realidade (o presente histórico). Ele defende um saber histórico que parta das experiências, porém crítico e metódico, para atingir a “Consciência histórica”. Critica o fatalismo, os mitos e a mitificação do passado. A história para ele é multi-causal, destacando a “vontade de potencia” (discurso e instrumento das relações de poder). Em sua filosofia (histórica) Paulo Freire critica o idealismo e o determinismo, afirmando que a história é possibilidade e se manifesta no cotidiano. A História Escolar deve ser problematizada, critica o “narrativismo” de fatos, datas e nomes. A História escolar 32 deve proporcionar práticas reflexivas através de problematizações em busca dos porquês, em fim, deve ser explicativa e responder a problemas do presente. Bibliografia DOSSE, François. A História em migalhas: dos Annales à Nova História. Bauru, SP:EDUSC, 2003. FREIRE, Paulo. Conscientização: Teoria e pratica da libertação – uma Introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo, Cortez & Moraes, 1979. (a) FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 12ª Ed. São Paulo, Paz e Terra, 1979. (b) FREIRE, Paulo. Ação Cultural para a liberdade. 5ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981. FREIRE, Paulo. Extensão e Comunicação. Rio de Janeiro, Ed. Paz e Terra, 1985. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 17ª Ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra,1987. FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1992. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática educativa. São Paulo, Paz e Terra, 1996. FREIRE, Paulo. Professor sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo, Ed,Olha D’agua, 1997. FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: Editora UNESP, 2000. FREIRE, Paulo. Política e Educação: ensaios. 5ª Ed, São Paulo, Cortez, 2001. REIS, José Carlos. Da “história global” a “história em migalhas”: o que se ganha, o que se perde? In: Questões de teoria e metodologia da história.Porto Alegre: Ed.Universidade/UFRGS, 2000. RUDIGER, Francisco Ricardo. Paradigmas do estudo da história: os modelos de compreensão da ciência histórica no pensamento contemporâneo. Porto Alegre:IEL/IGEL, 1991. 33 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES: O TRABALHO DO HISTORIADOR/PROFESSOR DE HISTÓRIA E A LITERATURA DE CORDEL Andrea Cristina Marques Pretendemos neste artigo apresentar e problematizar a relevância da literatura para o trabalho do historiador/professor de história, seja dentro ou fora da sala de aula. Essa relação da literatura, nesse caso do cordel, com a história é bastante produtiva, mesmo que história e literatura apresentem caminhos diversos, embora convergentes, ambas trabalham com as representações do mundo social, por isso a riqueza desta união. Também é necessário colocarmos que essa união se torna possível a partir da interdisciplinaridade proposta pelos Estudos Culturais, que alargaram o campo de estudos não só da História com de outras tantas disciplinas, e trouxe consigo rupturas e incorporações que contribuíram para uma nova perspectiva teórica, assim como novas problemáticas. Assim, documentos como o cordel, por exemplo, puderam ser vistos e utilizados como documentos históricos. Pois, a cultura passou a ser vista e concebida pelos estudiosos dos estudos Culturais como uma relação de intercâmbio e não mais como um confronto bipolar ente as culturas, sedo uma superior e a outra inferior. Logo, “(...) Elas não são vistas como exteriores entre si, mas comportando cruzamentos, transações, intersecções. Em determinados momentos, a cultura popular resiste e impugna a cultura hegemônica; em outros, reproduz a concepção de mundo e de vida das classes hegemônicas.” (ESCOSTEGUY, 2006, p.147) Dessa forma, uma das grandes contribuições trazidas pelos Estudos Culturais foi esse alargamento das possibilidades de trabalho com fontes antes não concebidas assim, e que ganharam a devida legitimidade a partir desses estudos que deixaram de privilegiar somente as questões econômicas e de classe. O que deu maior mobilidade para o trabalho do historiador que pode agora construir seu trabalho analisando a partir de outras perspectivas e fontes. Com essa interdisciplinaridade conquistada pelos Estudos Culturais, os textos literários passam a ser alvo das problematizações e análises feitas pelos historiadores e é nesta perspectiva que nas últimas décadas os textos literários passaram a ser vistos pelos historiadores como materiais propícios à múltiplas leituras, especialmente por sua riqueza de significados, para o entendimento do universo cultural, dos valores e das experiências subjetivas de homens e mulheres no tempo. O que PESAVENTO confirma, ao dizer que: 34 “A literatura tem se revelado o veículo por excelência para captar sensações e fornecer imagens da sociedade por vezes não admitidas por esta ou que não são perceptíveis nas tradicionais fontes documentais (...)” (PESAVENTO, 1995, p.118) Desta forma, os cordelistas ao escreverem seus cordéis, teriam também essa capacidade de conseguir perceber sensivelmente o que se passa em sociedade. E a partir daí transformariam em versos suas percepções, repassando-as ao público. Porém, para conhecermos melhor a produção dos cordelistas, devemos mostrar quais seriam as características do cordel, dos cordelistas e de sua poesia, e para isso é preciso colocar que os poetas de cordel revelam-se, quase sempre, como homens com pouca instrução, mas com grande talento para contar histórias. Para GRILLO, “(...) a relação deles com a realidade, pilar de sua produção poética resulta, sem dúvida, das condições de vida quase sempre inóspitas e sem acesso às fontes seguras de transmissão sistemática do conhecimento acessível apenas aos cidadãos das classes mais favorecidas”. (GRILLO, 2008, p.2). Ela afirma também que o Nordeste seria a região do Brasil privilegiada com relação à quantidade dos cordelistas existentes nela. E o interessante é que numa época e numa região em que a maioria da população era constituída de analfabetos, os cordéis encontravam um grande público de auditores, já que as poesias eram apresentadas em reuniões, saraus e feiras e o que facilitava sua memorização é que são desde essa época escrita em forma de versos. A literatura de cordel funcionou no século XIX como o meio de comunicação mais eficiente para os que viviam longe dos grandes centros, sendo capaz de levar notícias aos lugares mais remotos, a literatura de cordel sempre foi vista como incapaz de sobreviver aos adventos da tecnologia, mas eis que, em pleno século XXI, pode ser encontrada em sites voltados apenas para este tipo de produção havendo, inclusive, cordelistas que existem apenas no mundo virtual, sem jamais ter imprimido sequer um folheto. E eram inicialmente impressos em papel pardo, 12x18 cm, com 8, 16 ou 32 páginas, contendo ilustrações em xilogravuras. Nesse sentido, a literatura de cordel deve ser percebida em vários níveis: o simbólico, o artístico, o linguístico, o social, o político, o econômico e principalmente o histórico (GRILLO, 2008, p.1). Especialmente, porque o cordel através de sua narrativa conta os acontecimentos de um dado período e de um dado lugar, o que se transforma em memória, documento e registro da história brasileira. Assim, “(...) Tais acontecimentos recordados e reportados pelo cordelista, que além de autor é conselheiro do povo e historiador popular, dão origem a uma crônica de sua época.” (GRILLO, 2008, p.3). Um exemplo disso é o cordel denominado “Cordel do Império Romano”, onde o cordelista, Medeiros Braga narra a história da Roma Antiga, tratando segundo ele dos 35 períodos que vai do Patriarcado ao Republicanismo. Assim, ele mostra a história romana de maneira rimada e poética. Vejamos um trecho dessa história romana: Falarei nesse cordel Do grande Império Romano, Seu ciclo Patriarcal, Monárquico e Republicano, Sua expansão pelo mundo, O seu domínio, segundo O seu poder soberano. A hierarquia romana, Sua escala social Começava por Patrícios aqueles Aristocratas rurais Depois Plebeus em geral, Mais abaixo os Clientes, Sob esses excrescente, Os escravos no final. A poesia de cordel seria então uma história popular no sentido de que ela relata os eventos que fizeram a história numa perspectiva popular, levando em consideração que seus poetas são do povo e o representa em seus versos. Porém, erroneamente, alguns afirmam que a poesia de cordel reproduz o discurso oficial, os valores tradicionais e conservadores, sendo dessa maneira, uma produção incapaz de construir seus próprios significados simbólicos. O que a historiadora rebate, colocando que: “(...) não se pode deixar de lembrar que, na poesia de cordel, há uma grande quantidade de personagens estradeiros, astutos, trapaceiros, anti-heróis, que sobrevivem por expedientes e artimanhas que lhes valem como alternativa para escapar do sistema opressor.” (GRILLO, 2008, p.3) Essa maneira simplória de perceber a literatura popular é também alvo de críticas, pois quando esta afirma que de uma forma geral quando fala-se de cultura
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