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O Mito do Bom Selvagem

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Módulo I – O mito do bom selvagem 
Imagens para pensar o Outro 
Imagens para pensar o Outro 
Módulo I - O mito do bom selvagem 
 
Introdução 
Ao discorrer sobre a gênese do pensamento antropológico, Laplantine pondera, no 
capítulo 1 do seu livro Aprender antropologia (2005, p.38-53), sobre os relatos e discussões 
ligadas historicamente ao descobrimento do Novo Mundo (América, Ásia e África). São as 
observações de viajantes ou missionários que constituem os primórdios da Antropologia, ou 
a “pré-antropologia”. 
Para o autor a Antropologia tem sua origem justamente no momento em que os 
“descobridores” passam a se deparar com o Outro, o desconhecido, elaborarando questões 
a partir deste confronto: “aqueles que acabaram de serem descobertos pertencem a 
humanidade?” 
Começa assim a se delinear, pelo menos, duas ideologias antagônicas sobre o Outro: 
 
1) a recusa do estranho: apreendida pelo que falta no Outro e pela boa consciência de si; 
2) a fascinação pelo estranho – apreendida pela má consciência sobre si e sua própria 
sociedade. 
 
 
Essas ideologias são colocadas pelo autor em dois tipos de discursos: 
 
1) A figura do mau selvagem e do bom civilizado 
 
 Falava-se, nessa ideologia, dos “outros” descobertos, como “naturais” ou “selvagens” 
(seres da floresta) opondo-se a humanidade e parecendo como aberrações: são “sem 
religião, sem moral, sem leis”; “eles estão nus”; “comem carne crua”; “falam uma língua 
inteligível”. Nessa mesma época (1555), Oviedo escreve em sua História das índias: 
 
 
“As pessoas desse país, por sua natureza, são tão ociosas, viciosas, de pouco 
trabalho, melancólicas, covardes, sujas, de má condição, mentirosas, de mole 
constância e firmeza (...). Nosso Senhor permitiu, para as grandes, 
abomináveis pecados dessas pessoas selvagens, rústicas e bestiais, que fossem 
atirados e banidos da superfície da Terra”. 
 
 Da mesma forma, Cornelius de Pauw acrescentará, no século XVIII: "sem barba", 
"sem sobrancelhas", "sem pêlos", "sem espírito", "sem ardor para com sua fêmea". 
 
 
Módulo I – O mito do bom selvagem 
Imagens para pensar o Outro 
" É a grande glória e a honra de nossos reis e dos espanhóis, escreve Gomara 
em sua História Geral dos índios, ter feito aceitar aos índios um único 
Deus, uma única fé e um único batismo e ter tirado deles a idolatria, os 
sacrifícios humanos, o canibalismo, a sodomia; e ainda outras grandes e maus 
pecados, que nosso bom Deus detesta e que pune. Da mesma forma, tiramos 
deles a poligamia, velho costume e prazer de todos esses homens sensuais; 
mostramo-lhes o alfabeto sem o qual os homens são como animais e o uso do 
ferro que é tão necessário ao homem. Também lhes mostramos vários bons 
hábitos, artes, costumes policiados para poder melhor viver. Tudo isso - e até 
e cada uma dessas coisas - vale mais que as penas, as pérolas, o ouro que 
tomamos deles, ainda mais porque não utilizavam esses metais como moeda". 
 
 
 No século XVIII, as enciclopédias, em alusão a uma divisão da civilização e da barbárie, 
mostram o mapa mundial separado em hemisférios, onde “a natureza tirou tudo de um 
hemisfério deste globo para dá-lo ao outro". 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Theodor de Bry 
Cena de canibalismo, a partir de “Americae Tertia 
Pars”, 1592. Gravura colorida. Service Historique 
de La Marine, Vincennes, France. 
 
Módulo I – O mito do bom selvagem 
Imagens para pensar o Outro 
 
2) A figura do bom selvagem e do mau civilizado 
 
 Laplantine lembra que nesta ideologia sobre o Outro os termos da atribuição 
permanecem os mesmos, assim como o sujeito do discurso (o civilizado) e seu objeto (o 
natural). Porém, desta vez, o que era apreendido como “um menos” agora se torna “um 
mais”. Ou seja, o selvagem, mesmo sem clero, sem leis, sem tecnologia, passa a ser 
valorizado, suas ausências são vistas como vantagens. 
 
Cristóvão Colombo, apontando no Caribe, descobre, ele também o 
paraíso: 
 
“Eles são muito mansos e ignorantes do que é o mal, eles não sabem se matar 
uns aos outros (...) Eu não penso que haja no mundo homens melhores, como 
também não há terra melhor”. 
 
Do lado dos livres pensadores, é o mesmo grito de entusiasmo: 
 
Ah! Viva os Hurons que sem lei, sem prisões e sem torturas passam a vida 
na doçura, na tranquilidade, e gozam de uma felicidade desconhecida dos 
franceses”. 
 
 
 
Nas palavras do autor “a imagem que o ocidental se fez da alteridade (e 
correlativamente de si mesmo) não parou, portanto, de oscilar entre os polos de um 
verdadeiro Movimento pendular” (p. 51). Pensou-se alternadamente que o selvagem: 
 
 levava uma existência infeliz e miserável, ou, pelo contrário, 
vivia num estado de beatitude, adquirindo sem esforços os 
produtos maravilhosos da natureza, enquanto que o Ocidente 
era, por sua vez, obrigado a assumir as duras tarefas da 
indústria; 
 era trabalhador e corajoso, ou essencialmente preguiçoso; 
 não tinha alma e não acreditava em nenhum Deus, ou era 
profundamente religioso; 
 vivia num eterno pavor do sobrenatural, ou, ao inverso, na 
paz e na harmonia; 
 era um anarquista sempre pronto a massacrar seus 
semelhantes, ou um comunista decidido a tudo compartilhar, 
até e inclusive suas próprias mulheres; 
 era admiravelmente bonito, ou feio. 
 
 
Independente da ideologia há uma alteridade sendo construída. O que Laplantine 
quer dizer é que o outro, em ambos os casos, “não é considerado para si mesmo. Mal se 
Módulo I – O mito do bom selvagem 
Imagens para pensar o Outro 
olha para ele. Olha-se a si mesmo nele”. Ou seja, há um interesse nesse “outro” que não o 
leva em conta, ele é muitas vezes, apenas objeto-pretexto para todo tipo de exploração 
econômica, política quanto à conversão religiosa ou à emoção estética. 
 
 
 
José Maria de Medeiros 
Iracema, 1864 
óleo s/ tela, 167,5 x 250,2 cm 
Museu Nacional de Belas Artes, RJ.

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