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Libras ANTÔNIA KARINA MOTA SIMPLÍCIO GÉRISON KÉZIO FERNANDES LOPES 1ª EDIÇÃO Sobral/2016 ANTÔNIA KARINA MOTA SIMPLÍCIO GÉRISON KÉZIO FERNANDES LOPES LIBRAS Libras 5 INTA - Instituto Superior de Teologia Aplicada PRODIPE - Pró-Diretoria de Inovação Pedagógica Diretor-Presidente das Faculdades INTA Dr. Oscar Rodrigues Júnior Pró-Diretor de Inovação Pedagógica Prof. PHD João José Saraiva da Fonseca Coordenadora Pedagógica e de Avaliação Profª. Sonia Henrique Pereira da Fonseca Professores Conteudistas Antônia Karina Mota Simplício Gérison Kézio Fernandes Lopes Assessoria Pedagógica Sonia Henrique Pereira da Fonseca Evaneide Dourado Martins Design Instrucional Sonia Henrique Pereira da Fonseca Revisora de Português Neudiane Moreira Félix Revisora Crítica/Analista de Qualidade Anaisa Alves de Moura Diagramadores Fábio de Sousa Fernandes José Edwalcyr Santos Diagramador Web Luiz Henrique Barbosa Lima Produção Audiovisual Francisco Sidney Souza de Almeida (Editor) Operador de Câmera José Antônio Castro Braga 1 2 Palavra do Professor autor ................................................................................... 09 Sobre os Autores ................................................................................................... 11 Ambientação ........................................................................................................... 12 Trocando ideias com os autores ........................................................................... 14 Problematizando .................................................................................................... 16 Marcos na História Educacional dos Surdos A importância de conhecer a História da Educação dos Surdos ...................................21 A História dos surdos na Idade Antiga ......................................................................................21 Na Idade Média ..................................................................................................................................23 Na Idade Moderna ............................................................................................................................24 Na Idade Contemporânea .............................................................................................................26 Decadência na Educação dos Surdos ........................................................................................27 Oralismo ................................................................................................................................................30 Comunicação Total ............................................................................................................................32 Bilinguismo para Surdos .................................................................................................................37 LIBRAS e Cultura Surda Cultura e Identidade do povo surdo ..........................................................................................43 A luta pela conscientização ............................................................................................................44 Conhecendo a Surdez e suas causas ..........................................................................................46 Surdez: Graus e perdas ....................................................................................................................46 Linguagem e Surdez .........................................................................................................................48 Bilinguismo, Linguagem, Língua de Sinais e Educação .......................................................49 A Escola e o ensino de LIBRAS......................................................................................................54 Gramática da Língua de Sinais......................................................................................................55 O tradutor intérprete de Língua de Sinais................................................................................61 Prática de LIBRAS Alfabeto .................................................................................................................................................72 Saudações .............................................................................................................................................73 Dias da semana e mês .................................................................................................................... 78 Números ................................................................................................................................................80 Membros da família ..........................................................................................................................81 Adjetivos ................................................................................................................................................82 Materiais escolares ............................................................................................................................84 Expressões faciais e movimentos com o corpo .....................................................................85 Alimentos ..............................................................................................................................................85 Frutas ......................................................................................................................................................86 Animais ................................................................................................................................................. 87 Verbos .....................................................................................................................................................87 Condições climáticas ........................................................................................................................88 Cores .......................................................................................................................................................89 Profissões ..............................................................................................................................................90 Estados Brasileiros .............................................................................................................................90 Revisando................................................................................................................ 98 Autoavaliação....................................................................................................... 104 Bibliografia........................................................................................................... 108 Bibliografia Web.................................................................................................. 111 3 Libras 9 Palavra do Professor autor Olá estudantes, Você perceberá no decorrer de nossos estudos que os surdos eram vistos pela sociedade como pessoas incapazes, eram tratadas com piedade, compaixão, como pessoas castigadas pelos deuses, como seres enfeitiçados e discriminados. A história cultural das pessoas surdas não era reconhecida, essas pessoas eram vistas como deficientes, anormais, doentes ou marginais. Sua história de luta e con- quista só veio a ser reconhecida após o reconhecimento da Língua de Sinais como língua natural das comunidades surdas. Os estudos sobre a identidade surda e sua subjetividade são caracterizados por posições político-culturais que revelam mani- festos e ideais de poder e imposição da comunidade surda, que busca a concretiza- ção de suas conquistas. Conhecer a história dos surdos lhe proporcionará além de conhecimento o auxilio na reflexão de diversos fatos que ocorreram, relacionados à educação dos surdos. Você poderá se perguntarpor que apesar de todo trabalho realizado sobre inclusão ainda existe pessoas surdas excluídas da sociedade? A educação de surdos, hoje em dia, advoga a solidariedade e o respeito mútuo às diferenças individuais, cujo ponto central está na relevância da sociedade apren- der a conviver com as diferenças. Contudo, muitos problemas são enfrentados na implementação desta propos- ta, já que a pessoa surda é considerada como sendo diferente, incapaz de realizar atividades do dia a dia e o atendimento às suas características particulares implica formação, cuidados individualizados e revisões curriculares que não ocorrem ape- nas pelo empenho do professor, mas que dependem de um trabalho de discussão e formação que envolve custos e que tem sido muito pouco realizado. Os autores! Libras 11 Sobre os autores Graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA, é especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional - pela Universidade Estadual do Ceará - UECE, formado em Professor Tutor para Educação à Distância pelo Centro FAPAZ de Ensino e Formação de Professores - CEFOP e cursista do Curso de Extensão de Formação em Tutores Bilíngues pela UFC Virtual, possui o Exame Nacional para Certi- ficação de Proficiência no Uso e no Ensino da LIBRAS e na Tradução e Interpretação da LIBRAS/Português/LIBRAS - PROLIBRAS, Bacharel em Letras LIBRAS pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC com pólo na Universidade Federal do Ceará - UFC. Atualmente é professor da Graduação, Pós-Graduação e da Extensão do Instituto Superior de Teo- logia Aplicada - INTA, professor substituto da Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA, em Sobral-Ce e Mestrando em Ciências da Educação. Gérison Késio Fernandes Lopes Graduada em Ciências Sociais pela Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, é especialista em Educação Inclusiva e Gestão Educacio- nal pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA, formada em Aten- dimento Educacional Especializado pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e curso em LIBRAS e Braile pela SEDUC. Atualmente é professora na SEDUC – CE na sala de Recursos Multifuncional e defen- sora da Educação Especial, é professora da Graduação na Faculdade de Educação Teológica – IFETE e no Instituto de Estudos e Pesquisas do Vale do Acaraú – IVA. Antônia Karina Mota Simplício aAMBIENTAÇÃO À DISCIPLINAEste ícone indica que você deverá ler o texto para ter uma visão panorâmica sobre o conteúdo da disciplina. Libras 13 O termo língua natural é utilizado para distinguir as línguas faladas por se- res humanos e usada como instrumento de comunicação, das línguas que são lin- guagens formais construídas, tais como as linguagens de programação de com- putadores e as linguagens utilizadas pela lógica formal ou lógica matemática. As línguas apresentam diferentes modalidades. Uma língua falada é oral-auditiva, ou seja, utiliza a audição e a articulação através do aparelho vocal para a compreensão e produção dos sons que formam as palavras dessas línguas. Uma língua sinalizada é visual-espacial e neste caso utiliza a visão e o espaço para compreender e produzir os sinais que formam as palavras nessas línguas. As pessoas surdas têm direito a uma educação bilíngue, definida como a edu- cação que se propõe tornar acessível à criança duas línguas no contexto escolar. A educação bilíngue procura promover na criança surda um desenvolvimento cog- nitivo e linguístico equivalente ao conseguido pela criança ouvinte, estabelecendo assim uma relação de harmonia com os ouvintes. Essa heterogeneidade deve ser perspectivada como uma oportunidade de aprendizado coletivo e não como um obstáculo. A Língua Portuguesa é a L1 das crianças ouvintes brasileiras e deverá ser ensinada de modo diferente para crianças surdas que a adquirirão como L2. A língua de sinais não pode ser estudada tendo como base a língua portugue- sa, porque ela tem gramática diferenciada, independente da língua oral. Apresen- tando a criança falta de audição, ela até poderá vir a adquirir essa língua, mas nunca de forma natural e espontânea como ocorre com a língua de sinais. A proposta bilín- gue deve ponderar o fato da maioria dos surdos que chegam à escola, serem filhos de pais ouvintes e que, a criança precisa ter contato com surdos adultos. A presença de surdos adultos apresenta vantagens dentro da proposta bilíngue. A língua portuguesa apresenta uma ameaça para os surdos, pois essa é a lín- gua institucionalizada, sendo que as políticas públicas determinam que os surdos devem aprender português; porém os surdos lutam pelo direito de serem ensinados na sua primeira língua – a língua de sinais. Sendo assim, torna-se necessário a revi- são do status do português pelos próprios surdos; a reconstrução de um significado social a partir dos mesmos de forma que o aprendizado da língua portuguesa seja considerado como algo significativo para os surdos. Esta visão do aprendizado das LIBRAS e da língua portuguesa é defendida por Ronice Müller de Quadros, pesquisadora na área da educação inclusiva de crianças surdas, na sua obra: “Em Língua de Sinais Brasileira: Estudos Linguísticos”, cuja leitu- ra se recomenda. QUADROS, Ronice Muller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de Sinais Bra- sileira: Estudos Linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2007. tiTROCANDO IDEIAS COM OS AUTORES A intenção é que seja feita a leitura das obras indicadas pelos(as) professores(as) autores(as), numa tentativa de dialogar com os teóricos sobre o assunto. Libras 15 Agora é o momento de trocar ideias com os autores Sugerimos que faça a leitura da obra Educação de Surdos, cuja autora apresenta os princípios do trabalho com pessoas surdas, em especial no ambiente escolar, tais como: aspectos sociais e culturais de uma proposta educacional, língua de sinais e aspectos relacionados à sua estrutura e aquisição da língua portuguesa. QUADROS, Ronice Müller de. Educação de surdos: aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artmed, 2008. 126 p. Propomos também a leitura da obra Atualidade da educação bilíngue para surdos: interfaces entre pedagogia e linguística. Esta obra apresenta relatos de educadores com a alfabetização dos surdos, com a escrita e a leitura e da relação com os pais ouvintes e suas famílias. Aborda fundamentos teórico-práticos norteadores de experiências em instituições educacionais. SKLIAR, CARLOS (ORG.). Atualidade da educação bilingue para surdos: interfaces entre pedagogia e linguística. Porto Alegre: Mediação, 1999. 1 v. 207 p. Após a leitura das obras escolha uma e faça uma resenha crítica e compartilhe com seus colegas na sala virtual. PLPROBLEMATIZANDOÉ apresentada uma situação problema onde será feito um texto expondo uma solução para o problema abordado, articulando a teoria e a prática profissional. Libras 17 Existem pessoas surdas em todo o Brasil. O primeiro contato com uma pessoa surda pode ocasionar espanto, sentimento de pena ou mesmo incompreensão. No entanto, após uma aproximação, estes sujeitos, deixam de provocar curiosidade e passam a motivar principalmente respeito. Contudo, algumas questões frequentes, tais como: Como conseguem falar tão rápido com as mãos? Como decorre o pro- cesso de desenvolvimento da aprendizagem dos surdos? Deverão os surdos apren- der a falar oralmente ou só deverão usar a Libras ou aprender as duas coisas? Para adquirir a capacidade de ler é necessário saber falar? Os surdos podem se tornar produtores de textos em Língua Portuguesa? A pessoa surda deve se apropriar da língua oral ou da língua de sinais? Essas indagações remetem a uma análise dos paradigmas do trabalho de alfabetização de surdos. Após fazer uma reflexão sobre as pessoas surdas responda os questionamentos acima citados e comente com seus colegas na sala virtual. ApAPRENDENDO A PENSARO estudante deverá analisar o tema da disciplina em estudo a partir das ideias organizadas pelos professores autores do material didático. 1 MARCOS NA HISTÓRIA EDUCACIONALDOS SURDOS CONHECIMENTOS Conhecer os fundamentos históricos educacionais dos surdos, bem como as metodologias aplicadas nesse processo. HABILIDADES Identificar as características do processo histórico educacional dos surdos; Reconhecer o surdo dentro da sociedade como cidadão consciente de sua identidade. ATITUDES Desenvolver o poder de conscientização no que diz respeito ao processo educacional dos surdos. Libras 21 A importância de conhecer a História da Educação dos Surdos Nesta unidade de estudo você terá a oportunidade de entender a importância da Educação dos Surdos, como eram encaradas pela sociedade, quais as transfor- mações que passaram até os dias de hoje, quem são eles e como a comunidade surda surgiu. Você já teve a curiosidade de saber sobre a história dos surdos? A história dos surdos lhe dará prazer. Estudar história em geral é importante, pois através desta conhecemos o pas- sado de uma sociedade, como os homens se organizam e se relacionam, no caso, estudar a história dos surdos nos dará a oportunidade de conhecer o povo surdo, quais as transformações que enfrentaram e o surgimento das comunidades surdas. A educação do surdo só pode ser compreendida a partir de uma perspectiva mais ampla que abranja a sua história e que mostre quais as fundamentações teó- ricas, filosóficas, políticas e ideológicas que a embasaram desde o seu início. Você é convidado a partir de agora a viajar nas raízes da história dos surdos. A História dos Surdos na Idade Antiga Na história dos surdos, vários povos como os gregos, os egípcios, chineses e romanos os viam com um olhar diferente um dos outros. Vamos elencar cada um deles com suas respectivas visões: Os gregos viam os surdos como animais, pois para eles o pensamento se dava mediante a fala. Sem a audição eles na época ficavam fora dos ensinamentos e com isso, não adquiriam o conhecimento, por isso eram lançados do alto dos rochedos. Libras22 No Egito eram vistos como deuses, pois serviam de mediadores entre os deu- ses e os Faraós, sendo temidos e respeitados pela população. Mas essa admiração e respeito se limitavam apenas ao Egito, na cultura dos chineses eles deviam ser lançados ao mar. O conjunto de populações celtas que viviam na Gália lançava os surdos ao mar em sacrifício aos deuses Teutates. Os Romanos privavam os surdos de direitos legais, eles não se casavam, não herdavam os bens da família eram vistos como imperfeitos, sem direito de pertencer à sociedade e diante da religião, a igreja católica considerava os surdos sem salva- ção, ou seja, não iriam para o reino de Deus após a morte. Na Roma, o surdo, as pessoas com déficit intelectual e os cegos exerciam tare- fas a serviço da corte, tais tarefas eram praticamente iguais, eram serviçais e bobos da corte que eram mantidos nas vilas ou nas propriedades das famílias patrícias como protegidos do pater, que vem do Latim e significa “pai da família”, termo este que se refere a um território ou jurisdição governada por um patriarca. Pode-se dizer que a condição do sujeito surdo era a mais miserável de todas, pois a sociedade os considerava como imbecis, anormais, incompetentes. Você pode perceber que a sociedade pregava o homem como um ser forte, sa- dio e que não cedia à pressão, por tal razão, agia dessa forma, pois acreditavam não ser bom nem para a criança e nem para a República que ela vivesse, já que desde o parto mostrava-se fraca e má constituída e essa seria assim por toda a sua vida. Con- forme Carus, poeta e filósofo latino que viveu no século I a.C., era comum lançarem as crianças surdas ao rio Tibre, para serem cuidadas pelas Ninfas, deusas-espíritos naturais femininos, em especial as crianças pobres. Alguns dos grandes filósofos da Antiguidade também estavam em sintonia com estes procedimentos, em Atenas. Segundo Platão (428 - 348 a.C.), afirma que os que recebiam um corpo com qualquer deformidade eram levados a um paradeiro desconhecido. (PLATÃO apud SILVA 1986, p.124). Aristóteles (384 - 322 a.C.), dizia que “quanto, a saber, quais as crianças que se deve abandonar ou educar, deve haver uma lei que proíba alimentar toda criança disforme”. (ARISTÓTELES apud SILVA, 1986, p.124). Pessoas cegas, surdas, deficientes intelectuais, deficientes físicos e outros tipos de pessoas nascidas com “má formação,” às vezes, também, eram ligadas a casas comerciais como as tavernas, bordéis, desenvolvendo atividades em circos romanos, Libras 23 em alguns casos serviços simples e em outros humilhantes. Esse costume foi adota- do por muitos séculos na História da Humanidade. Na Idade Média A Igreja Católica na Idade Média era a principal organização política e econô- mica da época, a qual mantinha muitas instituições como asilos, hospitais, hospícios, entre outros. Algumas dessas instituições também eram mantidas por ricos senho- res, ambos mantinham nos aposentos das instituições pessoas idosas, doentes que não foram agraciados com boas condições de vida, algumas pessoas deficientes eram retiradas do convívio social e também eram mantidas nesses estabelecimen- tos, passando a viver junto a doentes e moribundos. Acreditava-se que a pessoa com deficiência tinha que ser conservada e cuida- da, transformando a rejeição numa duvidosa proteção discriminatória que estava dividida entre a caridade e o castigo. Para a organização social e cultural, o castigo vinha com o desconforto das algemas, da promiscuidade, a caridade era dizer a estes, que no asilo que estavam, tinha direito a um teto, a uma alimentação. Para os cristãos o castigo é a caridade, pois o melhor meio de salvar a alma de um cristão das garras do demônio era livrando a sociedade de suas condutas indecorosas ou antissocial que o “monstruoso” apresentava. Santo Agostinho (354-430 D.c) foi um filósofo, escritor, teólogo, responsável pela filosofia patrística e pelo pensamento cristão medieval. Aderiu o pensamento maniqueísta que pregava o bem e o mal. A ideia defendida por Santo Agostinho era de que os pais de filhos surdos es- tavam a pagar por algum pecado que haviam cometido. A Igreja Católica, até mea- dos da Idade Média, acreditava que os surdos não possuíam uma alma imortal, uma vez que eram incapazes de proferir os sacramentos. Conforme Silva, (2008: 19), “na Antiguidade, passando pelos gregos, pelos romanos e pela igreja, de Santo Agosti- no até a Idade Média, os surdos eram considerados seres inferiores e, portanto, não tinham chance de salvação”. Durante um longo período, no mundo todo, as pessoas deficientes estavam situadas à margem da educação. Estudantes com deficiência eram atendidos sepa- radamente ou exclusos do processo educacional, pois esses não se enquadravam nos padrões de normalidade. Libras24 Na história encontramos uma situação que é pouco citada em obras publica- das sobre a história do processo educativo dos surdos. Trata-se de um fato ocorrido antes do Século XVI. Assim como muitas metodologias e técnicas de ensino apren- dizagem foram sucumbidas, com o tempo as estratégias educacionais utilizadas pelo Bispo John of Bervely em meados de 700 a 637 d.C., ficaram desconhecidas. Ele conseguiu fazer um surdo falar de forma clara e a igreja considera esse feito como um milagre tomando para si a autoria do fato. A Idade Moderna A mudança dessa situação só começou a ser remediada a partir do século XVI, pois nobres que tinham filhos surdos passaram a querer que estes recebessem suas heranças, a nobreza então passou a se preocupar em educá-los para que quando morressem não fosse negado aos seus próprios filhos, o que a eles pertenciam. Surgiu, nessa época, vários educadores como o Monge Beneditino Pedro Ponce de Léon e o Abade Charles Michael de L’Epée . Dentre os demais educadores e pesquisadores da surdez se destacam o espa- nhol Juan Pablo Bonet (1579-1629), o alemão Samuel Heinicke (1727- 1790), fundador da primeira escola oral de surdos na Alemanha, o francês Sicard (1742-1822), suces- sor de L’Epée,na direção do Instituto Nacional de Surdos-Mudos, o médico cirurgião francês Jean Marc Itard (1774-1838), o americano Thomas Gallaudet (1787-1851), que juntamente com o professor surdo francês, Laurent Clerc (1785 – 1869), fundaram a primeira escola pública para surdos em Hartford, o escocês Alexander Graham Bell (1847-1922), criador do telefone que casou-se com Mabel, surda oralizada. No Século XVI, na Espanha, foi registrado um fato realizado por um monge beneditino Pedro Ponce de Leon (1520-1584), que dedicou a sua vida a ensinar surdos dos filhos de nobres para que pudessem ter acesso aos bens familiares e a herança continuar no seio da família. Ensinou a falar diversas línguas como grego, latim e italiano, além de conceitos de Física e Astronomia, desenvolvendo métodos para a educação de pessoas surdas, incluindo a datilologia (representação manual das letras do alfabeto), a escrita e a oralização, criando uma escola de professores surdos, com atendimento individualizado e particular. Libras 25 No período de 1620, na Espanha, Juan Pablo Bonet, segue os passos de Leon e escreve sobre a deficiência auditiva e os problemas de comunicação e em seu livro Reduction de Las Letras y Arte para Ensenar a Hablarlos Mudos, condena os mé- todos brutais utilizados para o ensino de surdos e apresenta o alfabeto manual, pela primeira vez. Em seu trabalho com surdos proibia os gestos e optava pelo método oral. No século XVIII, surgiram as primeiras iniciativas de educação coletiva para surdos e os primeiros educadores: o abade francês, Charles Michel de L’Epée, o ale- mão, Samuel Heinicke, e o inglês, Thomas Braidwood, que por intermédio de suas pesquisas, desenvolveram métodos para que a educação de surdos acontecesse. No ano de 1750, na França, o Abade L’Epée se destacou bastante na educação de sur- dos, ensinou e apoiou os surdos, criando uma escola pública, o Instituto Nacional de Jovens Surdos-Mudos, em Paris, educando os surdos através do método combinado ou sinais metódicos. Além disso, proporcionou a passagem da educação individual para a educação coletiva. Aprendeu a Língua Gestual utilizada pelos surdos parisienses, à chamada “Antiga Língua Gestual Francesa” e utilizava-a nas aulas adicionando outros gestos que inventou e que lhe permitiram “cunhar” conceitos do francês escrito para os quais, aparentemente, não existiam equivalentes em Língua Gestual. Esta situação deve destacar-se porque durante muito tempo, em todo mundo e mesmo na França, a comunidade surda atribuía a L’Épée a criação da “Langue dês Signes Françaises”. Nascido por volta de 1712, Charles Michel de L’Epée, ensinava os surdos, por motivos religiosos, através do método manualista ou gestualista, reconhecendo que a Língua de Sinais realmente existia e que ela se desenvolvia, embora não a consi- derasse uma língua com aspectos gramaticais. A História Educacional de Surdos mostra que nas ruas da cidade de Paris, perambulavam surdos, foi então que L’Epée se aproximou dos surdos e com eles aprendeu a Língua de Sinais, criando os “sinais metódicos”, uma combinação de Língua de Sinais com gramática francesa. Com o imenso sucesso na educação de surdos, o Abade transformou sua casa em escola pública, que de 1771 a 1785 pas- sou a atender 75 estudantes, número bastante elevado na época. Charles de L’Epée acreditava que os surdos, independentemente de seu nível social, deveriam ter direito a educação de qualidade e que a mesma deveria ser Libras26 gratuita. Pensamento que também foi adotado por Roch-Ambroise Cucurron Sicard foi um abade francês, seguidor dos pensamentos de Abade L’Épée, ficou conhecido pelo seu trabalho em educar surdos, fundando a escola de surdos de Bordéus, no ano de 1782, e depois sucedeu L’Epée em seu instituto, como diretor. Também no período de 1750, Samuel Heinicke, na Alemanha, através de suas pesquisas deu os primeiros passos da Filosofia Educacional Oralista, que tem como objetivo principal o ensino de língua oral sem auxílio da língua de sinais, sendo ele precursor e fundador de escolas de orientação oralista que em sua maioria conta- vam com pequenas quantidades de estudantes (de 9 a 10). Na Idade Contemporânea O século XVIII é considerado por muitos estudiosos na área da surdez como o período mais fértil da educação dos surdos. Este século foi marcado pelo grande impulso, no sentido de quantidade, com o aumento de escolas para surdos, e quali- dade, já que através de sinais, surdos podiam aprender e dominar diversos assuntos e exercer várias profissões. A educação de surdos ficou mais vista pela sociedade, a partir de ações do Abade e seus seguidores que lutavam para o progresso da edu- cação dessa comunidade, surgindo novas perspectivas educacionais para surdos. Por outro lado, o Abade era considerado como bom educador, pois conseguia educar com qualidade os surdos, sendo a sua escola escolhida pelo governo para poder receber subsídios e então poder expandir-se em outras fontes, foi responsá- vel por ocasionar o sucesso de numerosos professores educadores de surdos. Antes de sua morte em 1789, Abade já havia fundado 21 escolas para pessoas surdas na França e em outros lugares da Europa. No ano de 1815, Thomas Hopkins Gallaudet (1787 – 1851), professor ameri- cano interessado em obter informações sobre a educação de surdos, seguiu para Inglaterra e encontrou-se com a família Braidwood. Eles utilizavam apenas a língua oral na educação de pessoas surdas, sendo que a informação dessa técnica foi ne- gada, fazendo com que fosse então buscar esses subsídios nas escolas gestualistas, que passou a conhecer a língua dos surdos franceses e os métodos de trabalho da escola. Libras 27 Conhecendo Laurent Clerc, um surdo, professor de surdos, decidiu viajar aos Estados Unidos com Gallaudet, para ajudá-lo em seu projeto. Ao acompanhar Tho- mas Hopkins Gallaudet aos EUA, Laurent Clerc abriu uma escola para surdos em abril de 1817, a Escola de Hartford. Gallaudet instituiu a Língua Gestual Americana que, ainda, passou a ser usado o inglês escrito e o alfabeto manual. A partir de me- ados de 1821, as escolas americanas nortearam suas ações com direção a American Sign Languagem – ASL, sendo que neste período houve uma elevação no grau de escolarização dos surdos que podiam aprender com facilidade as disciplinas minis- tradas em língua de sinais. Todavia, como os avanços tecnológicos facilitaram a aprendizagem da fala, isso fez com que em 1860 o enfoque oralista se difundisse ganhando forças, motivando os profissionais a tentarem investir na oralização de surdos, sendo o oralismo um método que, ainda hoje em dia, alguns profissionais defendem, sustentando a ideia de que a língua de sinais é prejudicial para aprendizagem de um estudante surdo. A filosofia oralista se difundiu proclamando a importância da língua oral e a não importância da língua de sinais. A abolição dos sinais na educação de surdos pela filosofia oralista, baseava-se na concepção de língua, pela maioria dos linguís- tas, como sendo exclusivamente a língua oral, reconhecendo os sinais como meras “mímicas”, sem qualquer valor linguístico, e precisam ser evitados a todo custo, a fim de que o aprendizado da língua oral, por parte do surdo, não fosse estorvado. A abordagem oral dominou os educadores por muitos anos. Esse era o mé- todo mais natural para os ouvintes e como os professores geralmente faziam parte desse grupo usava a fala em sala de aula não conhecendo e nem adotando a com- petência dos sinais. Decadência na Educação dos Surdos Em 1880 no Congresso de Milão representou um momento obscuro na história dos surdos, uma vez que lá um grupo de ouvintes tomou a decisão de excluir a língua gestual do ensino de surdos, substituindo-a pelo oralismo (método de ensino para surdos, no qual se defende que a maneira mais eficaz de ensinar o surdo é através da língua oral, ou falada). Em consequência disso, o oralismo foi a técnica preferida na educação dos surdos durantefins do século XIX e grande parte do século XX. Libras28 Essa decisão causou um retrocesso, pois se esses estudantes utilizassem a língua gestual eram punidos. Essas punições consistiam em amarrar as mãos, trancá-los em porões, armários e até mesmo serem castigados fisicamente ou ridicularizados em público. Contudo, o problema estava bem mais além das severas punições e da distância de familiares, que por consequência da falta de comunicação se afastavam desses estudantes. A privação da língua nos surdos na infância levou a níveis bastante altos de doenças mentais na faixa etária de 30 e poucos anos. A partir da morte de Laurent Clerc, forte defensor da Língua de Sinais, o Oralismo ganhou forças, através de Alexander Graham Bell (inventor do telefone e do audiômetro), um dos maiores defensores do Oralismo. Graham Bell era casado com uma surda que se chamava Mabel, ele acreditava que os surdos não deveriam casar entre si, pois se acomodariam e não iriam aprender a língua oral. Ele caracterizava a Língua de Sinais inferior a fala e que só deveria ser usada como um apoio. No início do século XX todas as escolas deixaram de utilizar a língua de sinais passando a oralizar todos os estudantes surdos, pois o aprendizado da língua oral passa a ser o grande objetivo dos educadores de surdos. Acreditavam que poderiam desenvolver-se como os ouvintes no aprendizado da fala. Mesmo com o Congresso de Milão proibindo, por muito tempo, as pessoas surdas de usarem a língua de sinais, ela resistiu devido à obstinação de seu povo. Dentro das escolas de surdos, muitas crianças praticavam às escondidas entre si, de forma que não fossem percebidos. A atriz francesa Emmanuelle Laboritt (com surdez profunda e congênita recebeu o prêmio Moliéri do teatro). Em sua obra autobiográfica diz que: “Quando o professor se virava para escrever no quadro-negro, tínhamos hábito de trocar informações na língua de sinais, persuadidos de que ele não nos escutava, já que não nos via. Ora, no começo, ele se voltava todas às vezes, era estranho, não compreendíamos imediatamente por quê. Com o passar do tempo, dei-me conta de que, ao falar com as mãos, sem saber, emitimos ruídos com a boca. A partir daí cuidamos de não mais emitir nenhum som e, desde aquele dia, trocamos nossas lições o mais tranquilamente possível” (LABORITT, 1994:84). O ensino das disciplinas como História, Geografia, Matemática, entre outras, foi deixado em segundo plano ocorrendo então uma queda nos aperfeiçoamentos desses surdos. Ficando resistente até 1970, o oralismo dominou todo o ensino do mundo, até que William Stokoe publicou o artigo “Sign Language Structure: Na Out Libras 29 line of the visual Comunication System of the American Deaf,” demonstrando que American Sign Language (língua de sinais americana) é uma língua com características iguais às das línguas orais. William C. Stokoe Jr. (1919 - 2000), foi um estudioso que em seus estudos pesquisou extensivamente a Língua de Sinais Americana – ASL, enquanto trabalhava na Universidade Gallaudet, como professor e chefe do departamento de Inglês, em meados de 1955 a 1970. Dentre suas obras podemos citar a publicação da Estrutura da Língua Gestual e a coautoria do Dicionário de Língua Gestual Americana, que ao abordar seus princípios linguísticos, dava prestígio a ASL nos círculos acadêmicos e pedagógicos. A publicação de suas obras foi fundamental na mudança da percepção da ASL, que partiu de uma versão simplificada ou incompleta do Inglês para uma complexa e próspera língua natural, com fonética, fonologia, morfologia e sintaxe independente como qualquer língua falada no mundo. Logo em seguida apareceram diversas pesquisas baseadas na publicação de Stokoe, a qual mostrava a língua de sinais e a sua aplicação na educação e vida de pessoas surdas. Dorothy Schifflet, professora e mãe de surdos, começou a utilizar e divulgar um método onde a língua de sinais e a língua oral, leitura labial, alfabeto manual (datilologia), treino auditivo estavam presentes na educação de pessoas surdas, fazendo surgir e denominando assim, o seu trabalho de Total Approach, ou seja, abordagem total. Ainda na década de 60, Ray Hoolean adotou o método de ensino total “approach”, mudando seu nome para “total comunication”, originando a filosofia Comunicação Total. Uma filosofia que utiliza variadas formas possíveis de comunicação para que ocorra sucesso na educação de surdos, acredita nas totais formas de comunicação possíveis na educação escolar do surdo, acreditando que a Comunicação Total não é língua e sim uma Filosofia Educacional. Já utilizando o inglês sinalizado, a Universidade Gallaudet adotou a Comunicação Total, tornando-se o maior centro de pesquisa da área. Na década de 1970, alguns países tais como Inglaterra e Suécia, perceberam que a Língua de Sinais deveria ser utilizada independentemente de uma língua oral, onde em algumas ocasiões, a língua oral deveria ser utilizada e em outros momentos a Língua de Sinais, e não as duas em igual momento como já estavam sendo desenvolvidas em algumas entidades. Libras30 Em meados de 1980 a 1990, surge então a filosofia Bilíngue, afirmando que o surdo deve adquirir sua língua materna, a Língua de Sinais. Essa filosofia a cada dia vem ganhando mais adeptos em todos os lugares do mundo. Hoje em dia os estudos sobre as Línguas de Sinais, possibilitam que crianças surdas tenham acesso a esta língua como a primeira, o mais cedo possível, tendo como a língua oral de seus pais, a segunda, ou seja, uma abordagem bilíngue para a educação de surdos. Oralismo A modalidade oralista baseia-se na crença de que é a única forma desejável de comunicação para o sujeito surdo, e a Língua de Sinais deve ser evitada a todo custo porque atrapalha o desenvolvimento da oralização. Essa técnica de leitura labial: ”ler” a posição dos lábios e captar os movimentos dos lábios de alguém que está falando é só útil quando o interlocutor formula as palavras de frente com clareza e devagar. Quando médicos, professores e um grupo de ouvintes tomaram a decisão de excluir a língua gestual do ensino de surdos, o oralismo ganhou força e desse modo foi a técnica preferida na educação dos surdos durante fins do século XIX e grande parte do século XX. Ao abolir a Língua de Sinais na Educação de Surdos, se deu a concepção de que os sinais não tinham valores linguísticos, não passavam de mímicas, e que essa necessitava ser evitada, estabelecendo então, que todas as disciplinas escolares fossem repassadas através da Língua Oral. Para o Oralismo, surdez é uma deficiência que necessita ser minimizada, visando que o surdo viva e seja igual ao ouvinte. A fim de atingir sua meta os oralistas trabalham com um conjunto de especialistas médicos e terapêuticos, tais como neurologistas, fonoaudiólogos, psicólogos e otorrinolaringologistas, aproveitando resíduos auditivos caso existam (por meio do aparelho). O Método Oralista tornou-se dominante e, consequentemente, a Educação Oral apoderou-se, expulsando do meio educacional os professores surdos e banindo a Língua de Sinais que fora considerada uma ameaça para a oralização. Essa metodologia busca o ensino de palavras respaldadas na afirmação de que o surdo tem dificuldade de abstração. O aprendizado da fala se torna mais importante que a aquisição da leitura e da escrita considerando o surdo como um deficiente que precisa ser curado, corrigido, recuperado. Libras 31 Repercutindo a valorização do Método Oral, as línguas de sinais eram consideradas como método tradicional e essa visão acomodou o surdo, o desmotivou a falar, passando a viver numa “subcultura ”. Os surdos eram vistos unicamente como deficientes, e não como um povo, com cultura própria. Com a ênfase dessa filosofia, os surdos eram rotulados como: “surdos-mudos”. Entretanto, a Educação de Surdos com o Método Oral não obteve bons resultados. Pesquisas revelam resultados esmagadores no requisito davida acadêmica desses estudantes, foi observado um rebaixamento significativo no desempenho cognitivo dos surdos. Uma pesquisa realizada pelo colégio Gallaudetno no ano de 1972 mostra que o nível de leitura entre os graduados de dezoito anos nas escolas secundárias nos EUA equivalia ao quarto ano do Ensino Fundamental. O psicólogo R. Conrado, em suas pesquisas evidencia que na Inglaterra o nível dos estudantes surdos de graduação liam a nível de crianças de nove anos de idade. Foi observado, também, que estudantes surdos de 15 a 16 anos que participavam do ensino oral, apenas 25% (vinte e cinco por cento) conseguiam articular a fala de modo compreensível. No quesito leitura e escrita menos de 10% (dez por cento) apresentava um nível de leitura apropriado para a sua idade e 30% (trinta por cento) eram analfabetos. As habilidades de leitura labial eram insatisfatórias. O processo educacional de surdos norteados pela filosofia oralista não era suficiente para o bom aprendizado da leitura e da escrita de estudantes surdos. Conforme a trajetória educacional dos surdos a língua oral não deu conta das necessidades da comunidade surda e muitos aspectos importantes para o desenvolvimento foram deixados de lado. Quando as línguas de sinais passaram a ser disseminadas, as pessoas surdas puderam se desenvolver intelectualmente, profissionalmente e socialmente. O Método Oral enfatizou a escrita de forma mecânica, onde o estudante era condicionado à repetição sucessiva de textos, o ensino de surdos através desse método não deu conta da demanda de necessidades por eles apresentadas, formando discentes com baixa compreensão na leitura e na escrita, devido ao vocabulário reduzido, a maioria teve um processo de fala ilegível. Uma criança só pode construir uma língua se participar inteiramente de uma sociedade, compartilhando seus conceitos, não apenas da aprendizagem imposta da língua oral, que é proposta pelo Oralismo. Essa aprendizagem não pode ser comparada a aquisição espontânea, pois não garante a formação de um sistema que alcance níveis abstratos, já que a aprendizagem da língua oral pela criança surda ocorre de forma sistemática. Libras32 Raríssimo são os surdos, que apenas, oralizados conseguem ter bom desempenho em Língua Portuguesa, a não ser aqueles que adquiriram a surdez quando já haviam iniciado o processo de aquisição do Português ou que apresentam surdez leve. Mas mesmo esses apresentam dificuldade na produção de um texto escrito, entretanto no Brasil, assim como em outros países, foram evidenciados no sujeito surdo oralizado dificuldades na aquisição e desenvolvimentos da linguagem e da escrita, assim como um vocabulário limitado. O surdo sofre atraso na linguagem e sem contato com uma língua natural, não tem condições de adquirir pelo ensino formal, conceitos científicos. O oralismo parece ignorar essas dificuldades que o atraso da linguagem proporciona e continua a posicionar a necessidade do surdo em ser oralizado. Mesmo alcançando sua meta, o oralismo é insuficiente, pois parte de uma noção de língua e linguagem, que provoca nos surdos um atraso de linguagem e suas consequências, não considera os aspectos cognitivos determinados pela linguagem e pela cultura, prendendo-se ao canal auditivo para a transmissão de conteúdos. Os surdos que não obtêm o sucesso determinado são considerados fracassados, incapazes e perdedores. Surdos, oralizados ou não, sentem a necessidade de conviver com outros surdos. Essa necessidade de se integrar é uma razão de extrema importância para que a LIBRAS lhes seja oferecida desde cedo. Ao conhecermos a comunidade surda percebemos que muitos, mesmo na idade adulta, sentem a necessidade de aprender LIBRAS e fazer parte da comunidade surda, gerando uma mudança nas atitudes de surdos e educadores perante a Língua de Sinais e suas condições particulares diante a linguística. Comunicação Total Nos anos Setenta e Oitenta, a Comunicação Total foi utilizada por muitos países. Utilizando de vários artifícios, essa Filosofia Educacional, tem como objetivo integrar o surdo na sociedade ouvinte, acreditando que ele terá uma boa comunicação seja atra- vés da fala, sinais ou escrita. E quando comparada ao Oralismo, por meio de estudos e avaliações, chegaram à conclusão de que os surdos obtiveram melhor desempenho na compreensão e comunicação, apesar das dificuldades em expressar os sentimentos e ideias. Libras 33 Acredita-se que para o surdo obter uma leitura e uma escrita satisfatória, neces- sitará de diversos artifícios para chegar a uma boa comunicação na língua de seu país. Preocupada com a comunicação de surdos com surdos, surdos com ouvintes e com a aprendizagem da língua oral, que é considerada por esta Filosofia, de grande rele- vância para o desenvolvimento dos aspectos sociais, cognitivos e emocionais, defende também, a utilização de recursos viso manuais. Essa visão postula a valorização de abordagens alternativas que permitam ao sur- do trocar ideias, sentimentos e informações com ouvintes. A Comunicação Total possui objetivos básicos, o de facilitar a integração do surdo com o meio, e fornecer condições adequadas para o bom desenvolvimento psicolinguístico. Seja pela linguagem oral, por meio dos sinais, datilologia ou pela combinação de todos os métodos, a Comunicação Total permite uma aproximação entre as pessoas envolvidas na educação dos surdos. Na Comunicação Total se utiliza muito o alfabeto manual para chegar a uma co- municação com os ouvintes, também conhecido como datilologia. A sua difusão gera, entre muitos ouvintes, a pressuposição de que o alfabeto é a própria Língua de Sinais, mas esse é apenas um suplemento dessa língua, sua função é a soletração de nomes, siglas, aqui no Brasil, este possui 27 (vinte e sete) configurações, incluindo as letras k, w, y, e também o ç. Libras34 Veja abaixo a representação do alfabeto: Libras 35 O Alfabeto Manual é um sistema gestual e cada letra do alfabeto escrita corresponde a uma configuração específica da mão, é um sistema de escrita no espaço. Ao fazermos a datilologia de um nome, a mão realiza diversas configurações e cada uma representa uma letra da sequência do nome. Os seguidores dessa filosofia vêem o surdo de forma diferente do oralismo, não como um portador de uma patologia de ordem médica que deveria ser eliminada e sim como uma pessoa normal, permitido assim a aquisição e o desenvolvimento normais da linguagem, afirmando que tudo e qualquer meio que façam o surdo aprender é de suma importância, inclusive, os sinais. Essa filosofia relata que o uso de todos os meios que possam facilitar a comunicação é necessário, desde a fala, passando por todos os sistemas artificiais, até a Língua de Sinais, abrindo canais para comunicações diversas. A Comunicação Total trabalha simultaneamente com a língua oral e a sinalizada, denominando essa forma comunicativa de bimodalismo , um dos recursos utilizados por essa filosofia no processo de aquisição da linguagem pela criança e na facilitação da comunicação entre surdos e ouvintes. Acredita-se que essa forma de ensino permitirá o estudante surdo decodificar as regras da língua falada na escrita, que deverá aprender por intermédio da língua de sinais. Embora a comunicação entre surdos e ouvintes estivesse melhorando, foi observado que as habilidades de escrita e leitura ainda continuavam abaixo do esperado. O surdo enfrenta dificuldades em aprender significados, quando ouvintes se comunicam com ele por meio do bimodalismo, uso dos sinais e da fala de forma simultânea. A visão do surdo se sobrecarrega ao tentar ler os lábios do interlocutor, a fim de perceber palavras, e ao mesmo tempo, olhar os formatos das configurações das mãos. Essa combinação de língua oral com língua de sinais impede o surdo de perceber e distinguir a estrutura sintática da língua oral e de sinais. Por esse motivo, o aprendizado da leitura e da escrita fica prejudicado, consequentemente,os surdos não sabem ler, nem mesmo textos breves e simples e ao escreverem na língua oral de seu país transportam para essa língua a estrutura sintática da Língua de Sinais. É interessante observar que, mesmo utilizando a Língua de Sinais, a Comunicação Total continuou apresentando dificuldades de aprendizagem no quesito leitura e escrita. Pode-se então, concluir que isso aconteça em virtude de que, a Língua de Sinais, ao ser usado nas práticas dessa filosofia, suas características linguísticas não tenham sido respeitadas como uma verdadeira língua, sendo então utilizada apenas Libras36 como um subsídio para aprendizagem e não como um elemento principal para o acontecimento da aprendizagem. Procurando descobrir se o ensino oral e sinalizado estava acontecendo, com efeito, na produção da leitura e escrita, os pesquisadores decidiram filmar os professores no ato da ministração da sua aula, percebendo que a educação não acontecia de forma perfeita. Com essa filosofia, os surdos despertaram para a valorização da Língua de Sinais, pois o ensino com sinalização não era de forma plena como era para ser, logo emergiu a posição em que a Filosofia da Comunicação Total deveria ser substituída pelo bilinguismo para surdos, o qual afirma que a Língua de Sinais e a língua falada podem viver lado a lado, mas não simultaneamente. Foi então a partir dessa prática, que a língua de sinais passou a ocupar certo destaque como meio de comunicação efetivo nas Comunidades Surdas. Em alguns países como Suécia e Inglaterra, perceberam que essa língua deveria ser utilizada independentemente da língua oral, e não as duas em momentos iguais, como eram utilizadas. Surge então, a Filosofia Bilíngue, que, ao contrário do Oralismo e da Comunicação Total, defende o respeito e o valor que deve ser dado à Língua de Sinais. A Comunicação Total admitia na escola o uso dos sinais, não como uma língua de direito do surdo, mas para auxiliar a aquisição da língua oral escrita e falada, mas com o passar do tempo, a língua falada não parecia mais suprir as necessidades da comunidade surda, professores ouvintes de surdos começaram a abrir os olhos para a riqueza das línguas de sinais. As experiências práticas forneceram questionamentos metodológicos para considerar uma nova metodologia, o bilinguismo para surdos. A combinação Língua Oral e Língua de Sinais foi um obstáculo para o surdo discernir as estruturas de uma língua para a outra, tendo como consequência o aprendizado da leitura e da escrita prejudicado, tornando o surdo um leitor não competente e um escritor limitado a textos pequenos. A Comunicação Total tem aspectos positivos e negativos, ela ampliou a visão do surdo e da surdez, deslocando a necessidade do surdo ser oralizado e ajudou o processo da utilização dos sinais, mas não a viabilizou suficientemente. Essa filosofia considerou o surdo uma pessoa capaz e a surdez repercutiu nas relações sociais e no desenvolvimento afetivo e cognitivo do surdo. Libras 37 Bilinguismo para Surdos Na Comunicação Total ocorre a utilização simultânea da linguagem oral e gestual, empregando todas as formas possíveis de comunicação, usando a fala, leitura labial, língua oral sinalizada, alfabeto manual, audição residual, e outros, diferenciando-se do bilinguismo que aborda as duas línguas, de forma que, elas sejam usadas sem que uma interfira ou prejudique no aprendizado da outra. Portanto, as línguas seriam usadas em momentos diferentes. O bilinguismo percebe o surdo de forma diferente do Oralismo e da Comunicação Total, pois nessa filosofia o surdo não necessita almejar uma vida igual a do ouvinte, podendo assumir sua surdez formando uma comunidade, com cultura e língua. A origem do bilinguismo se dá pela insatisfação de surdos com a proibição da Língua de Sinais e a mobilização de diversas comunidades em prol do uso dessa língua, aliado aos estudos linguísticos, comprovando o status dessa língua. Utilizando, neste viés, a surdez para denominar um grupo linguístico e cultural, e para denominar um grupo por condição física e falta de audição. O bilinguismo tem como foco principal os surdos atendendo-os em sua língua, cultura e aceitando sua forma de agir e pensar. Quando se fala de bilinguismo no campo da educação de surdos, relata-se à existência de duas línguas nesse ambiente, ou seja, a Língua Oral dos ouvintes, no caso do Brasil, o Português Brasileiro e a Língua de Sinais no caso dos surdos do Brasil, a LIBRAS. A escrita da língua oral pode ser adquirida de forma plena pela pessoa surda, a metodologia para a aquisição da escrita precisa ser visual, evidenciando a LIBRAS sem focar a relação letra-som, sendo similares às abordadas no ensino de segunda língua. A fala apresenta um papel fundamental na aquisição da escrita, no que se refere aos conceitos e ideias, podendo ser substituído pelos sinais que é a “fala” das línguas de sinais, língua de modalidade gestual visual. Essa tendência traz como objetivo uma educação que permite aos indivíduos um acesso completo a uma língua natural, que seria a língua de sinais. Após a aquisição desta, seria introduzido a eles a língua escrita de seu país, e seria viabilizada por intermédio da língua de sinais. Na educação de crianças surdas essa abordagem Libras38 exige um profissional ouvinte, conhecedor da língua de sinais e participante da comunidade surda, que se torna responsável pela transmissão da língua oral e um profissional surdo responsável pela transmissão da língua de sinais. Esse novo olhar para a Educação de Surdos vem superando muitas dificuldades provenientes dos antigos planos educacionais, sendo apoiado por sua comunidade que pressupõe o reconhecimento de expressão da língua de sinais como ponto central para o desenvolvimento educacional. Considerando a língua de sinais como a primeira língua dos surdos e a língua da sociedade em que está inserida sua segunda língua, a leitura e a escrita da segunda língua seria uma forma de integração de surdos com ouvintes e essa como já falada será repassada pela Língua de Sinais. Ao adquirir a língua de sinais, essa língua assume um papel fundamental na aquisição da segunda, a língua oral, possibilitando a construção do conhecimento de mundo, compreendendo o significado da leitura e da escrita, deixando de ser apenas decodificador da escrita que pode ser totalmente acessível à visão, considerada necessária para a construção das habilidades de língua. O bilinguismo relata que se o surdo não adquirir logo nos primeiros anos de vida a língua de sinais, eles sofrerão consequências como a perda da oportunidade de usar a linguagem. Como o surdo não pode fazer uma leitura do mundo pela fala, então é imprescindível que a outra forma de se comunicar com o mundo seja pela Língua de Sinais. Assim, ele ficará inteirado do mundo. A Língua de Sinais, para os surdos, assim como a língua oral, para os ouvintes, fornece um aparato linguístico cognitivo. A aquisição de uma primeira língua deve ser assegurada a uma criança, sendo ela surda ou ouvinte, se ela não puder ter uma participação ativa em sua situação comunicativa não poderá contar com um desenvolvimento normal dessa primeira língua, que deverá ser de fácil acesso. O passo mais importante para concretizar o bilinguismo foi dado na Suécia, o primeiro país a reconhecer, politicamente, o sujeito surdo como uma minoria linguística, com seus direitos políticos assegurando a educação na língua de sinais e na língua falada. O bilinguismo foi constatado com sucesso na Dinamarca, onde pesquisadores acompanharam durante oito anos, nove crianças surdas, de seis aos quatorze anos de idade, obtendo bons resultados na leitura e escrita. O primeiro ano foi dedicado, Libras 39 exclusivamente, ao desenvolvimento da Língua de Sinais usando inicialmente descrições de desenhos animados. Depois de dois anos constataram que sete das nove já se comunicavam fluentemente em sinais, mostrando um vocábuloelevado correspondente a sua idade. A partir do segundo ano de pesquisa, a língua dinamarquesa falada e escrita foi introduzida como primeira língua estrangeira, alguns já tinham grandes habilidades devido os programas de leitura precoce. Neste ensino de leitura e escrita foram usados vários recursos entre esses, está à sinalização, a língua falada e os textos escritos. Houve uma expansão excelente, aos doze anos de idade, cinco das nove tinham nível de leitura conforme o das crianças ouvintes, sendo que ao chegarem aos quatorze anos de idade, nove das crianças conseguiam ler com certa fluência. Foi através desse programa que o bilinguismo, hoje em dia, tem grande aceitação na Dinamarca, por todas as escolas e comunidades em geral. Como esse é um exemplo do resultado mais eficaz no ensino de pessoas surdas, é necessário colocar essa proposta educacional para os surdos o mais cedo possível, pois, em contato com a língua de sinais, o estudante aparecerá com um desenvolvimento rico e pleno da linguagem, assim logo após a linguagem oficial de seu país será ensinada com base nos conhecimentos adquiridos por intermédio da língua de sinais. Libras 41 2 LIBRAS E CULTURA SURDA CONHECIMENTOS Compreender a gramática da Língua de Sinais e compreender como ocorre o processo de aquisição da linguagem do sujeito surdo; Conhecer sobre o profissional Tradutor Intérprete de Língua de Sinais. HABILIDADES Reconhecer a dimensão real das lutas do povo surdo e sua difusão da cultura e da identidade surda. ATITUDES Aplicar os conhecimentos adquiridos no processo de aquisição da criança surda e contribuir para o desenvolvimento como estudante e cidadão nas Línguas Brasileiras de Sinais. Libras 43 Cultura e Identidade do Povo Surdo Você sabe o que é cultura? A definição de cultura no sentido amplo são com- portamentos de um grupo que vivenciam os mesmos valores, regras comportamen- tais, tradições e uma língua, compartilhando metas, responsabilidades e ideais. Podemos definir cultura surda como a forma de entender o mundo, e torná-lo apto a viver em sociedade com identidades ajustadas à sua cultura e também a uma língua diferente dos demais que vivem no mesmo ambiente social. As releituras do sentido constituído de identidade surda envolvem a língua, ideias, crenças, hábitos e costumes do povo surdo. “A cultura surda é então a di- ferença que contém a prática social dos surdos e que comunica um significado” (PERLIN, 2004, p. 77). Segundo Perlin, as identidades surdas adotam as definições a seguir: As releituras do sentido constituído de identidade surda envolvem a lín- gua, ideias, crenças, hábitos e costumes do povo surdo. “A cultura surda é então a diferença que contém a prática social dos surdos e que comunica um significado” (PERLIN, 2004, p. 77). As identidades surdas dentro dos aspectos da cultura surda se adaptam de acor- do com a receptividade cultural. E através de tal receptividade protegem-se contra a inclusão entre os deficientes, e a sensação de serem recebidos como inválidos. A comunidade surda é formada por surdos membros da família, tradu- tora intérprete, professores, amigos e demais que compartilham suas ideias. A surdez ultrapassa a condição médica, ser surdo é pertencer a uma cultura, a uma língua gestual, ao seu idioma natural. Libras44 Os surdos, aglutinados em um mesmo espaço escolar têm possibilidades de trocar ideias, experiências. A partir dessa convivência podem ser criados novos valores dentro de um grupo linguístico comum. A luta pela conscientização Você conhece algum surdo? Como a família, a sociedade e a escola, o vê? Conforme visto em nossos estudos, na antiguidade os surdos eram discriminados, e somente após o reconhecimento das línguas de sinais, o povo surdo começou a se destacar e lutar por seus direitos políticos e culturais, através das línguas de sinais o surdo pode construir sua identidade. Segundo Perlin, o adulto surdo em contato com outro surdo adotam as definições a seguir: O grupo onde entram os surdos que fazem uso com experiência visual propriamente dita. O adulto Surdo, em contato com outros Surdos, vai construir sua identidade fortemente centrada no ser Surdo (a Cultura Surda), “a identidade política surda”. É a consciência de ser definitivamente diferente e de necessitar de implicações e recursos completamente visuais. (PERLIN, 2004, p. 77-78). Muitos surdos, no Brasil, usam e desenvolvem a LIBRAS, alguns vivem isolados ou em locais onde não existe ou não se conhece a comunidade surda, e se comunicam através de mímicas ou gestos soltos que se fazem compreendidos por aqueles que vivem ao seu redor. A construção da identidade da pessoa surda ocorre inicialmente através de sua aceitação, reconhecimento do seu “eu” como surdo, esse processo LEITURA OBRIGATÓRIA STROBEL, Karin Lilian. As imagens do outro sobre a Cultura Surda.Florianópolis:Editora da UFSC, 2008. Libras 45 ocorre de forma gradativa, muitas vezes na infância ou na fase adulta, com contato com surdos e participação na comunidade surda. Muitos fatores podem contribuir para o andamento desse processo, dentre estes, podemos destacar a família, que dependendo de sua formação e envolvimento, poderá ajudá-lo a se encontrar como sujeito surdo, pois geralmente quando uma família descobre que tem um filho com surdez essa entra em estado de choque e mistura emoções, tristeza, culpa, surpresa, dúvidas, dentre outros fatores. Essa reação inicial é comum, pois a maioria dos ouvintes não conhece as possibilidades de desenvolvimento do surdo e acredita que em sua família possui um deficiente e não um sujeito diferente, com língua diferente, mas com a mesma capacidade intelectual de qualquer outra pessoa dita “normal”. Muitas famílias superprotegem seus filhos não os deixando ser independentes ou não acreditando que são capazes de levar uma vida comum, sem a presença de outra pessoa para acompanhá-lo à escola, trabalho, associações, lazeres... Podemos destacar outro ponto importante para nossa discussão que é a forma como é repassada essa informação para a família pelos profissionais da saúde, pois muitos dizem que o surdo precisa urgente de treinamento de voz, para que esse se ajuste a sociedade através da correção da fala, dos exercícios terapêuticos, leitura labial. É preciso que os profissionais da área da saúde estejam também conscientes da cultura surda, em orientar a família de forma adequada e não criando mitos como: a LIBRAS prejudica a capacidade intelectual, cognitiva da pessoa surda e a desestimula a falar. O sujeito surdo pode perfeitamente fazer treinamento auditivo, impostação de voz e usar LIBRAS como sua língua natural, mas se este for o seu desejo e de sua família, pois a língua de sinais não impede o desenvolvimento da fala do surdo. Mas existem fatores que podem dificultar o desenvolvimento do surdo, podemos citar: • Período em que a surdez é descoberta; • Encaminhamentos equivocados; • Filosofias, pensamentos educacionais equivocadas; • O envolvimento da família com a educação do filho; • Metodologia educacional escolhida, entre outros. Libras46 O processo de conscientização e esclarecimento é demorado, mas precisamos trabalhar para fazer a diferença na vida de pessoas surdas, pois muitas vezes a própria família acha ‘feia’ a LIBRAS e é nesse momento que a Cultura Surda faz a diferença juntamente com os ouvintes da família do surdo, amigos, até mesmo a sociedade, somente a partir desses elementos envolvidos a Educação dos Surdos pode avançar. Conhecendo a Surdez e suas Causas Estima-se que pelo menos uma em cada mil crianças nasce profundamente surda. Muitas pessoas desenvolvem problemas auditivos ao longo da vida, por causa de acidentes ou doenças. Existem dois tipos principais de problemas auditivos. O primeiro afeta o ouvido externo ou médio e provoca dificuldades auditivas “condutivas” (também denominadas de “transmissão”), normalmente tratáveis e curáveis.O outro tipo envolve o ouvido interno ou o nervo auditivo. Chama-se surdez neurossensorial. Surdez: Graus e Perdas Em média noventa por cento das pessoas com surdez nascem de famílias ouvintes, ou seja, que ouvem, sem restrições auditivas e noventa por cento das pessoas surdas tem filhos ouvintes, por isso devemos realçar o papel fundamental das escolas, que atendem crianças surdas, a transmissão da língua e da cultura da comunidade surda. Caros estudantes, para começarmos nossa unidade que aborda assuntos relacionados à cultura, linguagem, o significado e a importância da LIBRAS para a comunidade surda é preciso conhecer e entender os tipos de surdez, sabendo que para a educação de pessoas surdas, o enfoque central é a LIBRAS, independente de seu grau de perda auditiva, ela visa socializar e integrar o surdo à sociedade. Libras 47 Veja o quadro, a seguir, e conheça a Surdez Condutiva, Sensório-Neural, Mista e Central: Surdez Condutiva Interferência na transmissão do som desde o conduto auditivo externo à orelha interna, conhecida como cóclea. A cóclea possui sua capacidade funcional normal, mas não é estimulada pela vibração sonora, que poderá ocorrer com o aumento da intensidade do estímulo sonoro. Surdez Sensório-Neural Impossibilidade de recepção do som por lesão das células ciliadas da cóclea ou nervo auditivo. Surdez Mista Ocorrida pela alteração na condução do som até o órgão terminal sensorial associado à lesão do órgão sensorial ou do nervo auditivo. Surdez Central Esse tipo de surdez não, necessariamente, acompanha uma diminuição da sensitividade auditiva, mas se manifesta por graus diversos de dificuldade de compreensão de informações sonoras devido às alterações nos mecanismos de processamento da informação sonora no sistema nervoso central. Surdez e perdas auditivas: • Surdez leve: perda auditiva entre 25db e 40db; • Surdez moderada: perda auditiva entre 41db e 55db; • Surdez acentuada: perda auditiva entre 56db e 70db; • Surdez severa: perda auditiva entre 71db e 90db; • Surdez profunda: perda auditiva acima de 91db. Podemos definir essa classificação, basicamente assim: • Surdez Leve: Distinção da linguagem falada; • Surdez Média: Distingue barulhos; • Surdez Profunda: Não percebe nem os grandes ruídos. Libras48 Linguagem e Surdez Conforme a teoria de Vygotsky a linguagem surge inicialmente como um meio de comunicação entre a criança e as pessoas em seu ambiente. Sabe-se que essa linguagem está presente no comportamento dos homens. A linguagem é o meio de comunicação dos homens, sendo o modo de se comunicar natural ou artificial. A criança surda não nasce muda, nasce chorando como qualquer outra, por isso não podemos dizer que existem surdos-mudos. Assim como uma criança ouvinte, a surda possui suas cordas vocais em perfeito estado. Ao nascer, a criança busca imitar todas as ações do adulto, inclusive a fala, mas se essa não recebe estímulo auditivo, logo não conseguirá imitar, produzir a fala igual a dos adultos ouvintes, enquanto a criança ouvinte automaticamente, sem esforços, reproduzirá. As crianças surdas passam por um período inicial que se assemelham ao balbucio das crianças ouvintes. É nessa fase que produz sequências que, fonologicamente, assemelham-se a sinais do mesmo modo de desenvolvimento. Período apresentado desde o nascimento, até por volta dos quatorze meses de idade. O balbucio é fruto da capacidade inata da linguagem, manifestada não só através de sons, mas também por sinais, bebês surdos possuem balbucios manuais: silábicos e gesticulação. Os silábicos apresentam combinações fonéticas das LS, enquanto que as gesticulações não apresentam organizações internas. O surdo aprende a nomear e unir o sinal ao objeto, produzindo suas primeiras “palavras”. Assim como a criança ouvinte não pronuncia corretamente as palavras nesta fase, as crianças surdas também fazem os sinais com erros nos parâmetros, alterando a configuração das mãos, o ponto de articulação ou o movimento, mas o adulto surdo, assim como o ouvinte, compreende o que está sendo falado. Em torno dos dois anos e meio, a criança começa a produzir frases de dois sinais, essa fase continua até os cinco anos quando já produz frases maiores e mais complexas. Pode-se perceber que o processo de aquisição da língua de sinais é semelhante ao da língua oral-auditiva e quanto mais cedo ela entrar nesse processo, mais “natural” será. A leitura e a escrita da Língua Portuguesa para o surdo deve ser ensinada como uma segunda língua e o estudante necessita ter domínio de sua língua “natural” para que este processo ocorra de forma eficaz. Libras 49 O processo aquisitivo da língua de sinais é igual ao da língua oral-auditiva. À medida que a criança se desenvolve e interage de forma contextualizada e “natural” com os usuários da língua, ela vai se apropriando e desenvolvendo a compreensão e expressão desse sistema. A criança ouvinte percebe através da audição o que está acontecendo ao seu redor e vai desenvolvendo sua personalidade conforme as experiências vividas. Mas a linguagem não se desenvolve unicamente através da audição, mas sim da oportunidade de comunicação. O uso das LS não nega o surdo o direito de integração na sociedade, pelo contrário, quanto mais cedo o seu uso, mais rápido se desenvolverá cognitivamente e emocionalmente. Bilinguismo, Linguagem, Língua de Sinais e Educação Podemos definir língua comzo uma linguagem, sistema abstrato e repleto de regras e conceitos indicando uma estrutura em diversos planos. Para que isso ocorra, ela deve ser acessível, eficaz e praticável. A língua de sinais é estruturada pelo o processo visual do cérebro que processa estímulos eficientes. Através dessa língua o surdo pode comunicar-se livremente, pois, novas informações são processadas e compreendidas, sendo capaz de receber e decodificar significados. Essas estruturas e significados tornam a língua possível. Portanto, a língua é uma forma de linguagem, pois, está dentre os diversos meios de comunicação. Como a língua oral, a Língua de Sinais Brasileira possui gramática própria, sua estrutura é diferenciada da Língua Portuguesa Brasileira, sendo enfatizada como natural, ou seja, não artificial, por possuir equivalência a qualquer outra língua natural conhecida. Como não existe apenas uma língua oral no mundo, também não há uma só Língua de Sinais, mas existem várias comunidades linguísticas, conforme a língua oral. Muitas pessoas pensam que a Língua de Sinais é o Português nas mãos, no qual os sinais substituem as palavras, crendo que é limitada, expressando apenas situações concretas, não sendo capaz de transmitir ideias abstratas. A língua de sinais não é uma decodificação da língua oral, pelo contrário, tem a sua própria estrutura gramatical que deve ser aprendida igual a todas as outras línguas, diferencia-se da língua oral, pois, seu canal comunicativo é a visão e não a audição como na língua oral utilizada por ouvintes. Libras50 Ao aprender a língua de sinais, a criança surda desenvolve de forma mais rápida a língua oral na modalidade escrita, além de compreender o mundo em que está inserido. A escola deve proporcionar oportunidades na qual a criança possa desenvolver também sua identidade pessoal. A imensa quantidade de surdos que não tem direito de se educar com qualidade ou até mesmo de não se educar, no sentido literal, vem revelando um quadro apavorante. A esses surdos são privadas a possibilidade de exercerem sua cidadania e identidade como uma pessoa normal. De acordo com dados oferecidos pela Comissão de Direitos Humanos da Federação Mundial dos Surdos (World Federation of the Deaf, WFD), no ano de 1995, aproximadamente 80% das pessoas surdas do terceiro mundo não recebem nenhuma educação básica. Libras 51 COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DA CONFEDERAÇÃO MUNDIAL DOS SURDOS : A Federação Mundial dos Surdos (FMS), os seus membros e os 2.100 participantes de 125 países no Mundial XVICongresso da Federação Mundial de Surdos em Durban, África do Sul, 18-24 Julho de 2011. Recordando a Declaração do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos na Cerimônia de Abertura do Congresso Mundial“, a participação é um princípio fundamental dos direitos humanos. No entanto, sem acesso adequado à interpretação em língua de sinais, educação bilíngue e o reconhecimento da língua de sinais como língua, há importantes barreiras para o pleno exercício por pessoas surdas de seus direitos humanos. Reafirmando a importância da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, especificamente: Artigo 3: o respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas surdas como parte da diversidade humana e da humanidade; Artigo 9: possibilitar às pessoas com deficiência participar plenamente em todos os aspectos da vida, incluindo acesso à informação e comunicação, incluindo fornecimento de intérpretes profissionais de língua de sinais; Artigo 21: reconhecer e promover o uso de línguas de sinais; Artigo 24: garantir que a educação de crianças surdas seja ministrada nas línguas mais adequada para o indivíduo e no ambiente que maximiza o desenvolvimento acadêmico e social e empregando professores que são qualificados em língua de sinais; Artigo 25: garantir às pessoas surdas o direito ao gozo do mais alto nível possível de saúde sem discriminação; Artigo 30: reconhecer o direito das pessoas surdas a participar em pé de igualdade com os outros na vida cultural, incluindo o reconhecimento e apoio de línguas de sinais e cultura; surda, Lembrando também que as mulheres surdas e as meninas são frequentemente vítimas de discriminações múltiplas e enfatizando a necessidade de incorporar uma perspectiva de gênero em todos os esforços para promover o pleno gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais pelas pessoas com deficiência. Leia mais em: http://www.inclusive.org.br/?p=20850 Libras52 O bilinguismo defende que a língua de sinais e a língua oral sejam utilizadas pelos surdos sem que uma prejudique a outra, tendo como objetivo principal do enfoque bilíngue, que o surdo aprenda comunicar-se pelas duas línguas. Acredita- se que, por intermédio da língua materna do surdo (língua de sinais), este possa desenvolver-se linguisticamente e cognitivamente sem enfrentar tantas dificuldades. Essa ideologia é de postura política, cultural, social e educacional, não se resumindo apenas à aquisição de duas línguas. É necessário que os profissionais percebam a importância da Língua de Sinais para o desenvolvimento do surdo. Pois, essa é a língua que pode ser adquirida de forma espontânea através das relações sociais e diálogos do cotidiano. O bilinguismo é simples e eficaz, pois o surdo adquire a Língua de Sinais na mesma rapidez que o ouvinte adquire a língua oral. Sua origem se dá pela insatisfação dos surdos com a proibição da língua de sinais e através das mobilizações em busca das conquistas de direitos linguísticos. A proposta bilíngue para surdos é definida como uma oposição às práticas características da educação e da escolarização dos surdos nas últimas décadas. Todos os que compõem o estabelecimento de ensino necessitam preparar-se melhor para atender esses estudantes. Esses profissionais devem utilizar-se da língua de sinais para que o discente possa melhor aprender, percebendo que essa língua é visual, podendo desenvolver através do ver, tocar, descobrir o mundo a sua volta, trazendo o meio social em que ele está inserido para as práticas de ensino. Como um estabelecimento de ensino, a escola deve estar preparada para atender os estudantes surdos, disponibilizando professores, administradores e profissionais preparados e capacitados para adequar-se a essa realidade. A escola tem que estar preparada para o repasse de conteúdos, incentivando os familiares a compartilharem da vida escolar de seus filhos, participando também no processo de ensino de LIBRAS, (no caso de pais ouvintes não conhecedores da Língua de Sinais) e conhecer mais da Cultura Surda para haver uma melhor interação na comunicação familiar. Este incentivo e estímulo são um grande apoio por parte da família para com esses estudantes. O grupo de educadores de surdos, por sua vez, deve repassar aos familiares a importância da língua de sinais para o estudante surdo, explicando que este poderá aprender a língua oral, assim como o estudante ouvinte, pois existe uma comunicação visual (a língua de sinais), que ao ser utilizada pelo surdo permite o desenvolvimento da linguagem, podendo descobrir o mundo de diversos sentidos que está ao seu redor. Libras 53 A escola tem um papel importante para o estudante surdo e seus familiares; o de propagar que uma pessoa surda não tem um mundo de tragédias pela frente, pelo fato desta não se comunicar como a pessoa ouvinte, mas sim com um mundo de possibilidades, pois estão à frente de uma forma diferente de comunicação que envolve uma cultura e uma língua visual-espacial. Nessa proposta de ensino, a língua oral deve ser baseada em técnicas de aprendizagem de segunda língua, enfatizando a leitura e a escrita como modalidades de acesso a língua majoritária (em oposição ao acesso através da metodologia oral). A língua oral deve ser ensinada em momentos específicos das aulas e os estudantes deverão saber que estão trabalhando com o objetivo de desenvolvê-la, trabalhando a leitura e a escrita. A proposta bilíngue concebe o seu desenvolvimento, baseando-se em técnicas de ensino de segunda língua, ou seja, o ensino da língua oral deverá ser ministrado enfatizando a escrita, considerando que o canal de aprendizagem do estudante surdo é o visual, podendo este ter acesso ao processo de aprendizagem e do desenvolvimento linguístico e cognitivo. Essa técnica parte das habilidades interativas e cognitivas já adquiridas pela criança ao longo de suas experiências naturais com a língua de sinais, que é considerada como primeira língua. A língua de seu país será considerada como segunda língua. A escola precisa atender o surdo como um membro pertencente a sua comunidade cultural, social e linguística, ou seja, precisa haver interação entre a criança surda e a escola, um surdo adulto ou um Intérprete/Tradutor de Língua de Sinais. Essa presença terá grande valor no desenvolvimento do estudante, possibilitando que ele construa sua própria identidade e consequentemente desenvolva a sua língua natural. Por meio da interação, adulto / criança ou criança / criança, o sujeito reage, constrói e organiza seu conhecimento. Ao transmitir seus conhecimentos para as crianças, o adulto acaba por interferir no desenvolvimento da cognição e propicia o desenvolvimento linguístico da mesma. Na situação de interação com o outro, a linguagem é construída em conjunto, e, por intermédio de alguns processos dialógicos, a criança se torna um ser na linguagem. O principal propósito de uma língua é a transferência de informações entre duas ou mais pessoas. Através da interação, a criança aprende com o adulto a sua língua. Na vida das crianças surdas é crucial esse entrosamento entre o adulto e a Libras54 criança para obter a aprendizagem dessa língua de modalidade gesto visual, que traz movimentos expressivos que, por sua vez, são interpretados pela visão. Para que o estudante possa desenvolver a linguagem e o seu pensamento, a escola deve proporcionar a ele um ambiente favorável que o levará ao ensino da segunda língua, esse ensino deve ser específico, sempre mostrando o que está sendo trabalhado e sua finalidade, tendo como objetivo principal desenvolver a língua oral. A língua de sinais é capaz de fazer com que o surdo possa perceber um mundo repleto de aprendizagens que por ele pode ser conquistado. Observa-se que a maioria dos surdos é exposta à língua oral e não à língua de sinais e, por eles não dominarem a língua oral e nem terem experiências linguísticas ricas
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