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Ana Paula Veras Carvalho Menezes Aluna do Mestrado Profissional em Administração Pública Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP Disciplina Política Social: Teoria e Estudos de Caso – Turma 1/2019 Avalie a necessidade e os riscos de uma reforma previdenciária no Brasil. Considere as três dimensões enfatizadas no curso: proteção social, incentivos/desincentivos e custos. O problema previdenciário no Brasil deve-se ao desequilíbrio das regras de aposentadoria em certos casos muito benevolente em relação ao padrão adotado pela maioria dos outros países e extremamente onerosas em relação ao arrecadado, causando déficit e desequilíbrio no sistema previdenciário. Apesar do entendimento de que os aposentados vêm sendo prejudicados pelas reformas realizadas nos governos anteriores, o fato é que ainda existem regras muito benéficas de aposentadoria no Brasil. Giamibagi e outros (2004, p. 366) entendem que deveria haver uma espécie de “Lei de Responsabilidade Previdenciária”, semelhante a Lei de Responsabilidade Fiscal que limitasse o aumento dessas despesas em relação ao PIB para guiar as autoridades a alcançar um equilíbrio de contas, com o fim de mitigar riscos de falência do sistema, com isso a “dívida previdenciária” poderia ser honrada pelas futuras gerações. Esses autores entendem que as principais causas de desequilíbrio da previdência social no Brasil são: ausência de idade mínima no regime geral; aposentadoria precoce das mulheres; aposentadoria precoce dos professores; vinculação entre o piso previdenciário e o salário mínimo; e programas assistenciais com despesas crescentes. Ausência de idade mínima no regime geral Há um senso comum no Brasil de que tendo o indivíduo trabalhado por muito tempo, mais de 30 ou 35 anos, seria justo que se aposentasse, mas essa visão não pondera outras questões, tais como se há recursos públicos para arcar com essa despesa e como essa regra é definida em internacionalmente. Com relação os recursos públicos, observa-se no Brasil que os altos custos das benevolências da previdência impactam fortemente na alocação de dinheiro em investimentos necessários para resolver questões de infraestrutura ou outras necessidades, resultando em baixas taxas de crescimento do país. Quanto a práticas internacionais, verifica-se que existem critérios de aposentadoria antecipada, mas eles resultam em descontos nos valores das aposentadorias muito mais pesados que o modelo do fator previdenciário praticado no Brasil. Nesse sentido, observamos que no Brasil, há um incentivo muito maior para que as pessoas se aposentem precocemente do que ocorre em outros países onde a perda na percepção do benefício previdenciário é muito mais impactante, levando as pessoas a optarem em permanecerem ativas por mais tempo. No que reporta a proteção social, Giambiagi (2004, p. 383) frisam, portanto que ... é importante introduzir na agenda de questões previdenciárias no Brasil a necessidade de incorporar às regras dos filiados ao INSS uma idade mínima, inicialmente similar à dos funcionários públicos — 60 anos para os homens e 55 para as mulheres — e, posteriormente, aumentá-la. O documento divulgado pelo Ministério da Fazenda com as diretrizes para a ação do governo, no início de 2003, diz, corretamente, que “apesar do montante de recursos alocados aos programas sociais pelo governo central no Brasil não ser pequeno, sua eficácia em diminuir a pobreza ainda é bastante reduzida (...). A pouca capacidade dos gastos sociais da União em reduzir a desigualdade decorre do fato de que boa parte dos recursos é destinada aos não-pobres” [Ministério da Fazenda (2003, p. 14)]. Os autores entendem que há um grande desperdício de recursos no Brasil, pois um cidadão pode obter uma aposentadoria integral com menos de 60 anos, enquanto em países como Estados Unidos, Suécia ou Suíça, é necessário estar na ativa até 65 anos para se aposentar sem perdas, diante disso deixa de direcionar recursos para atendimento de outras prioridades do Estado. Apesar da sensação da população brasileira concentrar-se no fato do governo esvair recursos pagando privilégios para o funcionalismo público, a situação real é bem mais complicada, porque a maior fonte de gastos primários é o INSS, cujas maiores custos estão nas aposentadorias por tempo de contribuição. A aposentadoria precoce das mulheres A aposentadoria precoce das mulheres, cinco anos antes dos homens, tanto por tempo de contribuição quanto por tempo de serviço implica em um aumento considerável de gastos na previdência. Esse incentivo às mulheres se aposentarem cedo distancia o Brasil, apesar de não ser uma prática exclusiva do país, faz com que as taxas de participação por faixa de idade se distanciem em relação a outros países. A justificativa dessa prática previdenciária que beneficia as mulheres reporta à compensação pela “dupla jornada de trabalho”, respaldada na ideia de acumulação de funções que a mulher arca com a soma dos encargos do emprego ao trabalho doméstico. No entanto, Giambiagi (2004, p. 385) destaca que isso traz impactos relevantes ao equilíbrio do sistema previdenciário no Brasil, traz um efeito elevado diante da realidade fiscal do país: a) o efeito fiscal disso é mais nocivo, pois uma coisa é adotar uma legislação benevolente em um país que tem um déficit público de 1% ou 2% do PIB e outra é adotá-la em um país como o Brasil, em que o déficit público médio dos cinco anos — de 1999 a 2003 — foi de 5% do PIB; e b) o impacto fiscal é acentuado pelo fato de diversos países permitirem a aposentadoria das mulheres alguns anos antes dos homens, sem a possibilidade de aposentadoria por tempo de contribuição e sem requisito de idade mínima. Importante ressaltar que a situação se agrava pelo fato de as mulheres terem uma expectativa de vida em média maior que a dos homens, isso agregado ao fato de estarem cada vez mais presentes no mercado de trabalho, o que resulta em crescimento exponencial do impacto da aposentadoria feminina na previdência. Nesse contexto, a regra de aposentadoria feminina com antecedência de 5 anos em relação à masculina implica, com o decorrer dos anos, na diminuição da média de idade das aposentarias no contexto geral, enquanto as pessoas passam a viver mais. A aposentadoria precoce dos professores A mesma argumentação do impacto da aposentadoria das mulheres é usada para tratar das regras especiais de previdência para os professores, que podem se aposentar com cinco anos a menos de tempo de contribuição que os demais cidadãos. Destaca-se, ainda, que esse benefício se acumula para as professoras, com a redução de mais cinco anos dada as mulheres em geral, o que significa uma redução total de 10 anos, possibilitando que se aposentem com apenas com 25 anos de trabalho, ou seja, se começam a exercer essa função com 20 anos de idade, estão aptas a se aposentar com 45 anos, sujeita ao fator previdenciário. Para não serem impactados pelo fator previdenciário e obterem o benefício integral, de acordo com a tabela atualmente vigente, caso tenham iniciado aos 20 anos de idade, uma professora se aposentaria aos 56 anos e um professor com 58. No Regime Jurídico Único dos servidores públicos, após a reforme ocorrida no Governo Lula, os servidores públicos passaram a obedecer a idade mínima para aposentadoria de 60 anos para os homens e de 55 para as mulheres, e os professores mantiveram a redução de cinco anos, podendo se aposentar os homens sem perdas com 55 anos e as mulheres com 50 anos. Essa situação causa grande impacto aos estados e municípios por que sua folha salarial é muito onerada pelo pagamento de salários dessa categoria profissional, especialmente pela sua maioria ser ainda do sexo feminino. As críticas sobre a concessão desse tipo de benefício para os professores, como o entendimentode que deveria ser extinto, se agravam pelo entendimento de que a atividade não se enquadra nas motivações consideradas adequadas para de redução de tempo de serviço para concessão de aposentadoria, que deveriam estar pautadas em critérios de dano comprovado à saúde ou redução da expectativa de vida em razão da atividade laboral exercida. A vinculação com o salário mínimo A elevação dos valores do salário mínimo no decorrer dos anos, contemplando ganhos reais maiores que os ajustes da inflação, causou impacto direto no aumento do gasto do INSS e em sua relação com o PIB. Há uma crença questionável no país de que o aumento real do valor do salário mínimo implica em aumento da proteção social, considerando que a Constituição prevê que nenhum benefício que substitui salário pode ser menor que um salário mínimo. No entanto, o aumento do piso da aposentadoria não ataca diretamente os objetivos incontestes da proteção social, que são diminuir a desigualdade social e a pobreza (não leva recursos aos mais necessitados porque a pobreza extrema não se localiza entre os aposentados) e aumentar a capacidade de crescimento da economia para o futuro (o crescimento dependo dos que estão ativos no mercado de trabalho). Dessa forma é justo que as aposentadorias sejam ajustadas com base na inflação para que não haja perda do poder de compra dos aposentados, mas é questionável que sejam repassados ganhos reais concedidos ao salário mínimo, pelo impacto desse custo sobre os recursos públicos escassos e porque em nenhum lugar do mundo aposentados percebem aumentos reais. Por isso, há propostas de que as aposentadorias tenham seus valores adequados apenas pela inflação anualmente, desvinculando-as do valor do salário mínimo, o que causaria economia às contas públicas, permitindo maior focalização dos programas sociais em grupos que demandam maior proteção pelo seu grau de pobreza mais elevado, tais como as crianças e jovens. O assistencialismo Tem crescido, no decorrer do tempo o número de programas e benefícios sociais, apesar deles não impactarem diretamente os recursos da previdência, pois são financiados pelo Tesouro, aumentam as despesas do Governo independentemente de sua classificação orçamentária. Um exemplo, disso está na garantia de benefício no valor de um salário mínimo concedido pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) para deficientes e idosos com renda familiar por pessoa inferior a 1/4 do SM, independentemente de terem contribuído para o INSS. Alguns autores entendem que esse programa incentiva o trabalho informal, pois tendo assegurada a renda de um salário mínimo pela assistência social não haveria motivação para o indivíduo filiar-se ao INSS em que deveria contribuir para depois receber igual valor. Giambiagi (2004, p. 390) reporta que de 1995 a 2003 o número de beneficiados por benefícios assistenciais aumentou 7,0 % a.a. enquanto o volume de concessão de aposentadorias cresceu em média 3,3% a.a. Isso implica na assunção pelo país de uma dívida futura crescente a cada ano, que não contribuiu previamente com o sistema, o que se agrava ainda pelo ganho real obtido por esses benefícios estares vinculados aos valores do salário mínimo. Também, quanto ao impacto sobre a proteção social, faz-se a mesma crítica anterior, que os beneficiários desses programas não são de fato o público mais necessitado, que sofrem com problemas sociais mais graves, como crianças e jovens. Riscos da reforma previdenciária Os riscos relacionados a reforma da previdência são, dentre outros, os seguintes: • Demora na aprovação e aumento do déficit previdenciário, da dívida pública e estagnação econômica do país; • Negociação para obter apoio no Congresso do pacote de alterações podem diminuir seu potencial • Impacto da reforma sobre o crescimento econômico do país pode ser baixo, muito diferente do esperado; • Se não houver crescimento econômico haverá ainda mais aumento da desigualdade e os mais pobres sofrerão mais perdas; • Descolamento dos valores da aposentadoria em relação ao salário mínimo podem resultar em desincentivo para o trabalho formal, pois benefícios sociais para idosos asseguram o salário mínimo sem que haja contribuição prévia; • Impactos da tecnologia da informação e da automação na redução da disponibilização de postos de trabalho, podem impactar na arrecadação da previdência, reduzindo o impacto da reforma; • Redução da fertilidade e aumento da expectativa de vida gradativamente trará maiores impactos à previdência, implicando na necessidade de outras reformas no futuro; • Perdas tangíveis de grupos específicos decorrentes da reforma causam choque entre preferências políticas e pode prejudicar ambições eleitorais; • Efetividade da reforma, que é limitada, na redução do déficit da previdência • O envelhecimento produz uma enorme pressão sobre as contas da saúde, implicando no aumento com os gastos governamentais com saúde. • Alta informalidade no mercado de trabalho pode resultar em baixa cobertura previdenciária e necessidade de gastos com assistência social • Adoção pelos trabalhadores de estratégias privadas de segurança social. Referências BARRIENTOS, Armando. The Rise of Social Assistance in Brazil. Development and Change. Institute of Social Studies, The Hague. p. 887-910. 2013. GIAMBIAGI, Fábio et al. Diagnóstico da Previdência Social no Brasil: o que foi feito e o que falta reformar?. 2004. p. 365-418. Disponível em http://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/article/viewFile/73/47 Acesso em 22/09/2019. PAIVA, Luiz Henrique. Sistemas de Proteção Social – Apresentação utilizada no Curso de Mestrado em Administração Pública do IDP. 2019. http://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/article/viewFile/73/47 http://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/article/viewFile/73/47